Nas empresas, quando se fala em reduções de pessoal, fazem-se contas, muitas contas.
As pessoas não vão para o desemprego de livre vontade. Para irem, as figuras mais usadas são a do despedimento colectivo, a extinção de posto de trabalho ou a negociação. Seja como for, há lugar a indemnização (até ver falamos de 1 mês por cada ano de trabalho).
No caso hoje anunciado an Assembleia da República por Passos Coelho, incidindo a redução nos dirigentes, admite-se que já trabalham há uns anitos e que têm um ordenado acima da média, pelo que a indemnização não deve ser pequena. Como são >1.700, estaremos a falar certamente em muitos milhões de euros. Ou seja, quando Passos Coelho fala de uma economia de 100 milhões de euros, duvido que esteja a descontar os custos dos despedimentos.
Mais: nas empresas, quando se tem que reduzir pessoas (coisa que, do que conheço, as empresas tentam evitar até mais não poderem e só o fazem quando não há alternativa), geralmente saem as que trabalham há menos tempo e as que ganham menos e isto, claro, para reduzir a verba das indemnizações porque, se as empresas estão com a corda na garganta, tomara terem dinheiro para pagar aos que ficam, pagar segurança social e impostos, pagar a fornecedores. Isto é, muitas vezes não têm dinheiro para pagar indemnizações.
Por isso, acontece, quando as empresas estão descapitalizadas, com problemas de tesouraria, atrasarem a redução de pessoal ou fazem-no de forma faseada.
Pasmo, por isso, com o anúncio de Passos Coelho: há free cash flow para investir nas indemnizações desta gente toda? E isto vai ser one time shot ou é para ir acontecendo? (Ou será que apenas conversa?)
Mais: Em gestão, analisa-se o custo de oportunidade. Exemplifico. Tenho aqui 100 milhões para investir. Qual o melhor sítio para o investir? Invisto em verbas para despedimentos (e sabendo que essas pessoas depois irão ainda receber subsídio de desemprego, ou seja, que isto vai implicar um agravamento de custos)?, é preferível isso ou é preferível cortar noutro tipo de custos (por exemplo em estudos, pareceres, assessorias, comunicação, etc)? ou é preferível pegar nessa verba e atribuir subsídios para ajudar a criar empresas?
É preciso fazer as contas todas. E fazê-las com seriedade e competência.
Não quero dizer que não haja necessidade de reduzir redundâncias, mas que isso seja analisado com pés e cabeça e tendo em conta a falta de dinheiro que há no país pelo que não deve ser gasto de forma populista e precipitada.
(E nem quero agora questionar se, sendo funcionários públicos, podem ser 'reduzidos')
Ok, já perceberam as minhas dúvidas, não é? Então agora deixem-me que partilhe convosco:
'Das feições de alma que caracterizam o povo português, a mais irritante é, sem dúvida, o seu excesso de disciplina. Somos o povo disciplinado por excelência. Levamos a disciplina social àquele ponto de excesso em que coisa nenhuma, por boa que seja – e eu não creio que a disciplina seja boa – por força que há-de ser prejudicial.
Tão regrada, regular e organizada é a vida social portuguesa que mais parece que somos um exército do que uma nação de gente com existências individuais. Nunca o português tem uma acção sua, quebrando com o meio, virando as costas aos vizinhos. Age sempre em grupo, sente sempre em grupo, pensa sempre em grupo. Está sempre à espera dos outros para tudo. E quando, por um milagre de desnacionalização temporária, pratica a traição á Pátria de ter um gesto, um pensamento, ou um sentimento independente, a sua audácia nunca é completa, porque não tira os olhos dos outros, nem a sua atenção da sua crítica.
Parecemo-nos muito com os alemães. Como eles, agimos sempre em grupo, e cada um do grupo porque os outros agem.
Por isso aqui, como na Alemanha, nunca é possível determinar responsabilidades; elas são sempre da sexta pessoa num caso onde só agiram cinco. Como os alemães, nós esperamos sempre pela voz da autoridade – acatar criaturas que ninguém sabe porque são acatadas, citar nomes que nenhuma valorização objectiva como citáveis nomeou para as responsabilidades da acção. Como os alemães, nós compensamos a nossa rígida disciplina fundamental por uma indisciplina superficial, de crianças que brincam à vida. Refilamos só de palavras. Dizemos mal só ás escondidas. E somos invejosos, grosseiros e bárbaros, de nosso verdadeiro feitio, porque tais são as qualidades de toda a criatura que a disciplina moeu, em quem a individualidade se atrofiou.
(…)
Somos incapazes de revolta e de agitação. Quando fazemos uma ‘revolução’ foi para implantar uma coisa igual ao que já estava. Manchámos essa revolução com a brandura com que tratámos os vencidos. E não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; não nos resultou uma anarquia, uma perturbação das consciências. Ficamos miserandamente os mesmos disciplinados que éramos. Foi um gesto infantil, de superfície e fingimento.
Portugal precisa de um indisciplinador. Todos os indisciplinadores que temos tido, ou que temos querido ter, nos têm falhado. Como não acontecer assim, se é da nossa raça que eles saem? As poucas figuras que de vez em quando têm surgido na nossa vida política com aproveitáveis qualidades de perturbadores fracassam logo, traem logo a sua missão. Qual é a primeira coisa que fazem? Organizam um partido… caem na disciplina por uma fatalidade ancestral.'
Olha para o que lhe deu, dirão os meus amigos, achando que a uma hora destas me deu para dissertar.
Pois.
Mas lamento desiludi-los, meus Caros, não fui eu que disse, foi Fernando Pessoa em 'Os Portugueses, a opinião pública' da Alma Azul
Fernando Pessoa por Júlio Pomar |
6 comentários:
Dear...
'penso eu de que', o que ele pretende é 'despromover' essas pessoas, não 'despedir'.
Voltam atrás na carreira, capisce?
Passam do 12 para o 9.
Hã? De génio, não?
Assim, recebem menos.
mas, lá está, 'penso eu de que'...
(como, em tempos, me sucedeu, imagino que a outros também possa acontecer...)
Será?
Não percebi que fosse isso. Mas, sendo, reduz 100 milhões?
Vamos ver. Eu sou tão céptica em relação à forma como analisam as coisas, parece-me que é tudo em cima do joelho, tudo para inglês ver, ou melhor, para a Merkel ver.
Mas o que diz é que baixam de escalão, baixam de ordenado, voltam atrás no tempo, passam a estar ao nível dos subordinados, é isso?
Amanhã vou ver se percebo.
Seja como for, tudo isto é um tenebroso para quem passa por elas.
Na Irina - raio de nome, lembra girino/a - já tinha reparado porque a garina passou num anúncio televisivo vezes sem conta.
Compreendo o drama da D. Dolores que pode ver as suas receitas diminuídas sem que consiga expressar a sua raiva numa língua que a "nora" entenda. As maninhas - caras larolas, mas corpos de fugir, seguem a cartilha materna. Ai não!
Quanto ao Passitos, eu preferia que ele falasse menos, aparecesse menos, fizesse mais. É o conselho que dou à família, se é que alguém me ouve...
Também ontem não percebi bem, mas hoje vou ler os jornais a ver se entendo melhor. Sempre fui boa Matemática mas, de há seis anos para cá, as minhas contas não batem com as de ninguém...
Será que ando distraída e não me apercebi que os senhores do Governo já criaram alguma coisa para pôr o país a produzir? Criaram medidas para combater o desemprego?
É que não os vejo a fazer mais nada a não ser extinguir, fechar, criar novos impostos para os trabalhadores...
Façam alguma coisa de bom para bem dos cidadãos deste país. Ficamos todos a ganhar.
Isabel
Olá, Helena!
Eu não faço ideia como é a família da menina Irina lá sua terra natal. Pode ser que não difira muito do clã Aveiro e, assim, não se sentirá desintegrada.
Mas se for diferente, com a vivência internacional que tem, deve sentir-se muito estranha no meio das manas, do cunhado, da D. Dolores e do padrasto do CR7.
Quando fui à net procurar uma foto do clã apanhei com cada fotografia... cada toilette... coisas do além. Será que a Girina Aveira não dá umas aulinhas de moda ao sector feminino do clã?
Quanto ao adjunto do Miguel Relvas, tenho dificuldade em levar a sério o que quer que seja que ele diz porque diz o que calha, consoante a pessoa com quem esteve antes e consoante o que, no momento, lhe parece conveniente. No outro dia saíu daqui a favor dos eurobonds para, depois de estar com a Frau Merkel, dizer que eurobons nem pensar. Agora que o Durão Barroso as está a defender, sempre quero ver o que vai ele dizer.
Deve ser nisto que o Kundera tinha em mente quando inventou a expressão 'a insustentável leveza do ser'
Quanto à forma como vai arranjar 100 milhões de euros com a redução dos cargos dirigentes ainda não se percebeu. Li hoje o jornal Económico e o Diário Económico e tentei ver também nos telejornais e fala-se de várias hipótese - mas hipóteses em aberto.
Ou seja, penso que devem ter pensado que tinham que aparecer com um número cabalístico, coisa que ficasse no ouvido e alguém deve ter dito: 100 milhões. E o Gaspar, Moedas e companhia devem ter dito, 'Boa. 100 milhões é um número bom'.
Agora como lá chegam, quando, de que forma, etc,... isso ainda vão ver (pelo menos foi o que percebi).
Isto não está bom para quem pensa com base em números, não!
Olá Isabel,
Está como eu. parece que estamos numa rua descendente que acaba num poço e só sentimos que nos estãoa empurrar ladeira abaixo.
Ainda agora voltei a ouvir a Directora-Geral do FMI a insistir para as economias injectarem recursos para se criar emprego, para animarem a economia, para se fugir a sete pés da recessão cavada.
E aqui só se ouve falar em redução, em fechos, em aumentos de impostos e isto é um círculo vicioso perigoso.
Veja-se o que aconteceu na Grécia. Portaram-se mal, é um facto. Só que o tratamento é ainda mais fatal. Parece que estamos a ser sugados para um buraco terrível.
Aqui entre nós o Álvaro em vez de andar a reanimar a economia no País, anda enfiado no ministério a reduzir serviços.
Fico doida com isto. E preocupada, e desiludida.
Mas, enfim, pode ser que um dia consigamos sair desta.
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