domingo, maio 17, 2020

As fantásticas mulheres que querem casar com uns fantásticos agricultores




Fomos e viémos. Tínhamos coisas a fazer e eu queria estar com a minha mãe e ver o outro pessoalzinho. Mas a cidade, numa situação como a que vivemos, condiciona os nossos movimentos.

Imagino o sufoco que tem sido o confinamento para quem está fechado num andar com crianças pequenas. O contacto com a natureza parece-me fundamental, cada vez mais. E, para suportar a perda de liberdade, nada como a largueza do campo. 

Saímos na quinta feira ao fim do dia, debaixo de chuva, e regressámos este sábado com um calorzinho bom.

Uma luz bonita de fim de tarde. Se não estivesse com preguiça ia buscar a máquina fotográfica para ver as fotografias que fiz. Os meninos sorriam e brincavam em contra-luz e eu via-os através da lente, encantada com a luz que vinha deles. Deles e da mãe deles.

Agora que já todos se acomodaram para o descanso, estou aqui. Estou com um pouco de dor de cabeça. Acordei cedo a pensar no muito que tinha que fazer e com a pressa nem dei tempo a acordar como deve ser. E não me passou. Por vezes passa-me ao longo do dia mas hoje ainda não. Nada de mais mas é uma presença desnecessária. 

Depois de jantar. estivemos a ver a Frankie e a Grace, dois episódios de seguida. Até o meu marido gosta de ver.

Mas agora estou na base da digital terrestre, circunscrita aos canálios nacionálios e, depois de vistoriados os demais, foquei-me na sic, nos agricultores. Chega a ter graça de tão extraordinário que é. Não sei como recrutam os agricultores-candidatos nem as candidatas a putativas mulheres dos ditos. Mas repito: tudo fantástico. Este mundo encerra infindáveis surpresas. Eu não acho bem nem mal, apenas fico beige com o que vejo, estrangeira num mundo em que as pessoas falam a mesma língua que eu mas onde tudo me surpreende.
Por exemplo, um António, já não especialmente jovem, com um brinco e ar marialva, parece que sempre a fazer-se à câmara, com três jeitosas com idades compatíveis com a dele e que funcionam num comprimento de onda idêntico ao dele. Ele, que mais parece um puto apalermado,  fá-las cair e elas rebolam-se no chão, anafadas e divertidas. Um triunvirato feminino de alto lá com o charuto a ver se cativam um barrigudo pintarolas que, diria eu, não interessa nem ao menino jesus. Mas há gostos para tudo e ainda bem e, se estão todos divertidos, melhor para eles.
Em Rio Maior um outro curioso pintarolas, empertigado, cabeludo, com um boné com pala para trás e que a toda a hora diz que é bom demais, com uma Mafalda assanhada e uma loura apardalada que está para ali a chorar porque acha que os outros gozaram com ela por ser gorda. E o curioso é que não é gorda. A outra, a Mafalda, tem uma vozinha do caneco e, para se desculpar, alega que chama porta-chaves ao cabeludo. E o cabeludo diz que também lhe chamam micro-ondas e outras coisas, concluindo que lhe chamam mais nomes que ao tabefe. E eu olho para aquilo tudo e acho que, na volta, estão a representar alguma peça de Beckett. 
Um mundo paralelo àquele em que vivo. Olho-o com curiosidade. Ao mesmo tempo penso que é gente corajosa, que não teme expor-se, que não teme envolver-se emocionalmente perante o olhar das câmaras. Na volta são aventureiros e sentem-se felizes assim.


Mas estou a ver isto e com a cabeça noutra coisa: tenho participado em reuniões e visto relatórios e planos a prepararem o regresso. Encaro-os com sentimentos mistos. Não consigo entusiasmar-me com essa perspectiva. Se pudesse, ficaria a trabalhar remotamente durante mais uns tempos. Haveria de aprender a dosear, a não trabalhar até me esgotar. Talvez fosse melhor do que voltar ao trânsito, à confusão. E pior ainda há-de ser tudo já que vai ser isso mas misturado com máscaras, com desinfecções de mãos, com medo de tocar aqui, ali e acolá, com receio de que esteja contaminado. E eu, que não sou disto, distraio-me e toco em tudo e, a toda a hora, me chamam a atenção e, às tantas, já estou desorientada, enervada, impaciente.

Mas, sobretudo, não sei se vou conseguir viver longe do canto dos pássaros ou da luz pousada nas folhas e nas flores.

Enfim. Tempos de perplexidade.


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Já agora, deixem que vos diga que as pinturas são de Rafael Martínez Padilla e que partilhe convosco um vídeo muito bonito, com apontamentos destes tempos de recolhimento


E a todos os que aí estão desse lado desejo um feliz dia de domingo

1 comentário:

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Ui essa cena manhosa da mais fina telebasura está de volta? Eu por acaso até tenho algum conhecimento de bons candidatos a embarcar numa tanga dessas.

Aí au paradis, esteve rico dia? Aqui está maravilhoso.

Uma bela semana.