Sou devota de dióspiros. Costumo comer maioritariamente dos meus, que são certificadamente biológicos, mas, este ano, o meu diospireiro não deu um único. Por isso, este ano tive que me render à sua compra. Como é sabido, é fruta cara e nem sempre de garantido bom sabor. Se não está bem maduro, pode ser desagradavelmente adstringente, se está bem maduro, pode ficar tão mole que não se aguente inteiro até chegar a casa.
Agora há uns grandes, rijos, caros, vindos sabe-se lá de onde, que nunca me cativaram.
Mas isto é o meu natural conservadorismo a funcionar, pois nada como a necessidade para fazer cair por terra os preconceitos.
Acontece que o local onde vivo, tal como tantos outros locais, imagino eu, está pejado de lojas chinesas. Eram bazares, restaurantes; depois passaram também para lojas de roupas, depois restaurantes pretensamente japoneses e, agora, são frutarias. Nunca lá ia, achava que fruta vendida por chineses só poderia ser fruta de qualidade duvidosa.
Eis senão quando vejo na montra diospiros, dos grandes, claro, vendidos a menos de um euro o quilo.
Aí, a minha tal costela mista (atenção que eu disse mista, não mística), a que tem também o gosto pelas pechinchas, não resistiu. Se fosse um quilo eram 90 cêntimos, se fossem mais de dois, seria a 80 cêntimos o quilo. Trouxe quase dois quilos e meio.
Rijos que só visto. Grandalhões, um exagero. O meu marido olhou-os com suspeição, devem ser de quinta escolha.
Eu própria vinha um pouco desconfiada, parecia-me muita fruta. Experimentei então comê-los descascados, imaginando já a casca áspera, deixando a boca encortiçada.
Depois cortei uma rodela e, sabido que é que me maravilho com pouco (faço parte, certamente, daquele insuportável grupo da população que prefere a doçura ao azedume), fiquei deliciada com a beleza fresca e suavemente colorida da flor que ali se descobriu.
Dei-lhe uma dentada. Doce, macia, agradável. Não é aquela polpa quase sumarenta, quase músculo macio, dos dióspiros tradicionais. Não, nada disso. É consistente, homogénea, floral, doce, coisa apropriada para se digerir em sociedade. Nada daquela gula desenfreada com sumo e polpa a escorrer por entre os dedos, a esvair-se na boca, com os meus dióspiros caseiros, rústicos, mal educados.
Depois - não vos quero esconder nada - experimentei comer a casca. Uma delícia. É certo que tinha um pouco de polpa agarrada, já que eu, temendo a sua adstringência, tinha-os descascado bastamente. Mas que bom. A consistência quase crocante da casca, o sabor mais acentuado do fruto, que bom.
O meu marido fica chocado com estes meus comportamentos. A comeres cascas… lamenta-se, ar de censura, para que é isso? Mas eu digo que gosto e que, além disso, é sob a casca da fruta que residem as vitaminas. Não se convence, acha mal que eu coma cascas de fruta, ainda por cima à mesa.
No sábado, também, ao fim da tarde, apeteceu-me uma infusão de lúcia-lima. Mas como tenho dificuldade em cingir-me às coisas tal e qual, juntei ao saquinho umas quantas cascas de tangerina. Que bom que ficou.
Pois bem, nem de propósito, este fim de semana a secção alimentar da BBC publicou um artigo justamente relativo à utilização alimentar das cascas de fruta.
Convido-vos a entrar aqui para verem. Verão que afinal não sou assim tão doida varrida.
Sei também que a sogra do meu filho fez no outro dia um bolo com cascas de fruta, maçã, pêra e manga ou papaia, não sei bem, e que estava muito bom.
Assim, e parafraseando o Bruno Nogueira, poderia agora ter o meu 'momento Isabel Jonet' e recomendar-vos que, em vez de fruta, passem antes a comer as respectivas cascas. Mas, como sou uma perdulária, digo de outra maneira, isto é, recomendo antes que se deliciem com a fruta inteira, tentando não desperdiçar a casca.
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Aqui chegada deverei, talvez, desculpar-me pelo baixo valor deste texto (baixo valor em originalidade do tema ou em qualidade literária, sim, mas, terão que condescender, muito valioso em termos de vitaminas e anti-oxidantes e, ainda, em termos económicos).
Deveria talvez pronunciar-me sobre temas divertidos como, por exemplo, o apoio explícito e entusiástico, publicamente divulgado, do Vai-Estudar-ó-Relvas ao pobre (pobre salvo seja) do Seara na sua candidatura a Lisboa.
Coitado do Fernando Seara... Com o Relvas ao lado, olhe, azarinho: lá se foi Lisboa. |
O desgraçado do Seara não deve estar a viver tempos fáceis. Por um lado, deve ter a Judite de Sousa à perna. Sendo uma mulher informada e inteligente, é notório que não vai nem um bocadinho à bola com a turminha do ex-Doce. Deve moer, e muito justamente, a paciência do marido. Por outro lado, este apoio do Relvas, deve ter sido para ele como atirarem-no ao Tejo com os bolsos cheios de pedras, tantas quantas as palavras de apoio do outro. Faço ideia o que a Judite o deve ter xingado e faço ideia o desespero dele, mas… mas ó Judi…dite… o que… que que…rias tu que eu fi…fi…zesse?
E que triste e murcha ela estava hoje. Vi-a na TVI 24 com o Dr. Medina Carreira e estava aborrecida, impaciente, triste, não sei. Mas, enfim, toda a gente tem direito aos seus momentos de apreensão ou tristeza e sabe Deus o que tantas vezes estas pessoas que se expõem publicamente têm que se esforçar para aparecer de cara alegre.
Judite de Sousa, hoje (nos' Olhos nos Olhos', com Paulo Rangel e Medina Carreira), na versão Menina dos Olhos Tristes |
Medina Carreira também não estava muito animado. Foi curto e grosso (mais ainda do que é habitual) e, se tudo aquilo que se passou com ele foi mesmo um desvario da nossa Justiça (como parece que foi), tem razões de sobra para estar farto desta gente toda.
Mas não me apetece escrever sobre nada destes assuntos, alguns dos quais, como o que mete o Relvas, umas verdadeiras as pepineiras.
Até terem dado o Nobel da Paz à UE e ser o Durão, esse cherne de água doce, ou o candidato a poeta oriental Von Rompuy, ou o alemão de quem, apesar de tudo, gosto um pouco mais, o Martin Schulz, a receberem o prémio, me parece uma piada de mau gosto.
Até terem dado o Nobel da Paz à UE e ser o Durão, esse cherne de água doce, ou o candidato a poeta oriental Von Rompuy, ou o alemão de quem, apesar de tudo, gosto um pouco mais, o Martin Schulz, a receberem o prémio, me parece uma piada de mau gosto.
Parece que o mundo anda meio doido, não é? Não vos parece que grande parte das coisas a que se assiste são parvoíces?
Ou então, sei lá, mais do que certo é que sou eu que estou a ficar velha. Parece que o que me desperta mais interesse são as coisas simples, mas mesmo muito simples. Uma receita de culinária, o olhar de um gato, uma capa de um livro, o toque de um tecido macio, o som de um violoncelo ou o silêncio, uma cor ardente, o branco da neblina, o cheiro das castanhas assadas, um sorriso, coisas assim. Nada de teorias, nada de conversas muito elaboradas, nada de azedumes, nada de barulho.
*
E, já agora, por coisas simples e por gatos: não quererão fazer-me uma visita também na minha outra casa, o Ginjal e Lisboa? Hoje as minhas palavras esperam um amor clandestino, na companhia de um gato e de um poema de Maria do Rosário Pedreira. A música é um encanto, Ernesto Lecuona, claro.
*
E nada mais. Apenas vos quero desejar um dia muito bom.
14 comentários:
Não gostos de dióspiros , por causa da sua irritante adstringência , mas o seu texto ilustrado com fotos saborosamente legendadas à Revista de Decoração (que pachorra!) deram-me vontade de, mais uma vez, tentar gostar de dióspiros!
Apesar do seu saboroso texto não vou tentar gostar do Relvas , do Seabra, do Medina e do Barroso !
um abraço
Amiga,
Só comi dióspiros uma vez, dos muito maduros, a desfazem-se, enjoativos, não gostei, não tornei a repetir.
Depois de ler este seu texto, cheio de graça, vou experimentar.
Estes de agora, são diferentes, o aspecto que têm na sua taça é tentador.
Adorei as legendas das fotos, bem como as mesmas...mas as legendas, o máximo!! O seu sentido de humor supera tudo!
As personagens políticas, essas, detesto-as!
Um beijinho Grande.
MCP
Desculpe, ainda volto para falar das cascas...
A minha mãe fazia umas cascas de laranja cristalizadas que eram uma delícia!!
Como diz, o seu texto é simples, eu também sou!!
Agora sim, um abraço!!!
MCP
Portugal já é a pequena China da Europa.
Só não "dormimos nas fábricas" porque já quase não temos fábricas.
Quanto aos cromos, acredite que só no seu blogue é que consegui ver a imagem do cherne com o prémio nas guelras, perdão, nas mãos.
(ontem fiz gazeta à Tv, apenas vi e revi os golos do meu gorioso ;) )
Abraço
Cheguei de mansinho (primeira vez) fui lendo devagarinho e, quando vi os dióspiros, pareceu-e ver o que aqui no Brasil é chamado de caqui. Não tenho certeza.
Mas, o que importa, é que gostei de toda a crônica: saborosa, inteligente, abrangente...
Bom, só sei que hei de voltar.
Um abraço,
da Lúcia
Olá Caro Joaquim Castilho,
Pois, também eu, quando via estes dióspiros com ar de não estarem bem maduros, imaginava o estado em que me iriam deixar a boca, toda encortiçada. Mas não, nada, nada. Nem sei se serão autênticos dióspios. Talvez sejam alguma variante. São bem diferentes dos outros. Duvido que os outros façam aquela flor se forem cortados transversalmente. Mas são óptimos. Agora de manhã como sempre um e que bem que me sabe.
Mas se posso recomendar que tente descobrir por aí algum para poder experimentar, já concordo consigo quando diz que não vai esforçar-se por gostar dos espécimes que referiu e de quem hoje nem me apetece escrever os nomes.
Obrigada pelas suas palavras.
Um abraço!
Olá MCP,
Não me quero repetir em relação ao que escrevi acima mas, se houver por aí alguma frutaria chinesa veja se têm destes dióspiros e experimente um. São tão baratos que , se não gostar, o prejuízo não será grande. Estes não são enjoativos, não se desfazem. São mesmo bons.
Quanto às legendas, quando leio essas revistas, aquilo é um tal desfiar de conversa fiada (tudo herança de família, pratas de família, coisas trazidas de destinos exóticos, etc) que acabo por achar um piadão. Qualquer dia ainda abro um capítulo aqui no UJM dedicado à decoração e ponho-me a tirar fotografias na minha casa e depois arranjo umas legendas 'à maneira'...
Quanto a detestar as personagens políticas, sou mais uma a juntar-se ao grupo dos que não podem com eles.
Um abraço, MCP!
MCP,
Ponho-me, disciplinadamente, a responder comentário a comentário e não 'optimizo' as respostas... Se por aqui passa um consultor daqueles que tenta 'capturar' eficiências, já me dava na cabeça...
Quanto às cascas de laranja, a minha mãe faz um pudim de laranja que é decorado com rodelas de laranja caramelizada e essas rodelas levam casca e a casca é a melhor parte.
E uma coisa que adoro são farripas de casca de laranja caramelizada envoltas em chocolate.
Não tarda, com esta conversa,a tenho que ir à cozinha ver se descubro alguma coisa doce para comer...
Um beijinho, MCP!
Olá jrd,
Essa das guelras do cherne é boa. Mas já viu coisa mais disparatada: aquele fulano com um prémio Nobel da Paz nas mãos...? Mas, enfim, ele é que a leva direitinha.
Quanto ao que escreveu abaixo, se eu fosse mais tendenciosa, teríamos aqui um diferendo grave. Mas como os meus filhos degeneraram (especialmente ele, porque ela é mais agnóstica que outra coisa), vou relevar. Antes de ter um filho benfiquista, eu achava que todos os benfiquistas eram assim mais para o arruaceiro. Agora já dobro a língua antes de dizer o que quer que seja. Mas, enfim, apesar das desgraças, e ó que desgraças!, o verde não é mais 'evoluído'...? Não sei se 'evoluído' será a palavra certa, acho que não é. Mas não me ocorre agora outra.
;)
Um abraço, jrd.
Olá Lúcia,
Que bom que veio até aqui. Venha sempre, será sempre muito bem vinda.
Fui atrás do seu nome, e que bonito que ele é, e fui dar ao seu blogue, Da Cadeirinha de Arruar, e não podia ter tido melhor surpresa, logo a evocação de uma escritora fantástica. Gosto muito da escrita de Clarice lispector de quem aqui, no Um Jeito Manso já falei algumas vezes. Há nela (e escrevo deliberadamente no presente) uma escrita com os sentidos que me fascina apesar de me inquietar.
Percorri rapidamente outros textos, por exemplo sobre o seu irmão, e gostei muito da afabilidade com que escreve.
Volte sempre, sim. Irei também visitá-la no seu.
Muito obrigada.
Um abraço, Lúcia.
Dióspiros! Uma árvore de fruta que tínhamos no nosso jardim, na nossa casa de praia, lá no Norte, onde, todos os Verões (vindos do Porto), passávamos férias e onde ficaram muitas saudades e amigos, até virmos, mais tarde, para Lisboa, residir. Curiosamente, um fruto que ninguém lá em casa gostava de comer! Aquilo nascia como sei lá o quê, todos os anos, mas ali ficavam os pobres dos frutos no relvado do jardim sem que ninguém se dignasse comê-los! Quanto ás cascas, sempre que posso, como fruto com casca. Lavadinhos é uma beleza de sabor! Recordo-me até, que meu avô beirão (Beira-Alta) nos ensinou a comer as cenouras (não sendo um fruto) cruas, tiradas da terra e depois de bem lavadas, mergulhavamos as ditas em sal e “truca” lá as íamos comendo (“faz bem aos olhos, meninos!”), enquanto passeávamos, ou o seguíamos na caça, em silêncio, “para não espantar as lebres!” Mudando de assunto. Quanto ao Seabra, para além de não nutrir nenhuma simpatia pelo Professor, zero, sempre achei obsceno que um carola de um político se apresente ontem em Santarém, amanhã em Oeiras, ontem em Sintra, hoje em Lisboa, ontem na Figueira, depois em Lisboa, etc e tal. O mesmo para os Deputados. O sr. Portas por Aveiro, vivendo em Lisboa, hoje até Ministro (longe de seguir os interesses dos “seus” eleitores) e por aí outros do mesmo e de outros Partidos. Os políticos portugueses não têm um pingo que seja de vergonha. De consideração por quem os elege. Também é certo que quem os elege nem quer saber se tal e tal Deputado defende os seus interesses. Nem lhes sabe o nome! Ora, isto deveria ser radicalmente alterado. Um Autarca só poderia ser eleito se fosse daquele Concelho, ou ali vivesse há anos. O mesmo no que respeita a um Deputado. Que deveria pôr sempre os seus eleitores à frente do seu Partido. Como sucede noutros países. Quanto ao Nobel e o Cherne (e “Companhia limitada”), aquilo não é para levar a sério. Uma “entidade” como a UE e Comissão, que faz uma clara distinção entre os seus mais fracos membros e os mais poderos, no plano de auxílio e apoio, como o que está a suceder actualmente, não merece nenhum prémio. A não ser que haja um específico: o prémio do papel higiénico! Ouvir outro dia D.Barroso, na entrevistazinha que deu, no seu gabinete em Bruxelas, meteu-me asco. Assim como me metem todos aqueles burocratas da treta, a comerem (e bem!) da malga da UE, ou seja, dos contribuintes dos 27. Estou farto daquela gente inútil! Sinceramente. Estou como você, minha cara e estimada UJM, prefiro as coisas simples: o cheiro das castanhas assadas, de uma boa culinária, uma boa neblina (outro dia presenciei uma ás 7 da manhã, que beleza!), uma boa música de fundo enquanto se desfruta um bom livro (e com a lareira a crepitar), afagar o meu cão, etc.
Tenha uma boa e confortável noite! Brrr, está uma noite fria!
P.Rufino
Olá P. Rufino,
Que agradável que é ler o que escreve, sempre uma vivência tão bem descrita, umas palavras tão bem escritas. Vê-se que escreve com fluência e gosto.
Lê-se e imagina-se o ambiente. A fruta, as cenouras, as palavras do avô, a vida tão boa que deve ter sido na sua infância.
Quanto ao resto, é mesmo isso. Um dia são inspectores, no outro são guionistas, depois presidentes de câmara, enquanto isso vêmo-los na televisão a comentar tudo o que se passa e por aí andam, sempre com tempo para tudo, sempre muito requisitados. Depois, se for preciso, candidatam-se por outro lugar ao qual não têm qualquer ligação.
Tem razão: temos que ser exigentes. enquanto formos permissivos, vamos deixar o país entregue a estas figuras de pacotilha.
Hoje estava a pensar escrever mais ou menos sobre isso mas, afinal, apeteceu-em não sujar as mãos. No post que acabei de escrever o registo é outro. Não que me saísse um texto feliz, muito peo contrário, mas ao menos não falei no Relvas e nesses figurões que por aí andam.
Antes de acabar: uma vez mais muito obrigada pelas suas palavras cuja leitura nos prende.
Uma boa noite ou um bom dia, consoante a hora!
Falemos antes de fruta e da sã.
Tambem já tive essa agradável surpresa, no Verão, encontrei as melhores cerejas na lojinha do chines. Nem as frutarias as tinham e nem por isso eram mais caras que as outras menos boas. Não sei como fazem, mas há dias comprei as verdadeiras laranjas do Algarve tambem na loja do chines.
A relutancia de antes quanto a alimentos nestas lojas vai-se desvanecendo. Será consequencia deste mundo louco que se nos depara dia a dia?
Olá Pôr do Sol,
Eu agora ao fim de semana vou passar a ir a esta frutaria. Não sei onde desencantam eles fruta tão boa e barata e, se calhar, estão a fazer concorrência a fruta portuguesa mas...
Também trouxe de lá umas anonas doces que só visto e também a um preço incrível.
Um beijinho, Sol nascente!
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