terça-feira, junho 21, 2011

Time for lipstick, ladies! Vamos lá a afastar a crise! .... Sugiro Le Rouge (Chanel, bien-sûr)

No post abaixo já falei da dupla e vexatória rejeição de Fernando Nobre para presidente da Assembleia da República, do Passos Coelho que, ainda não começou, e já as coisas lhe estão a correr mal, da Grécia, da crise e dessas maçadas todas.

Pois bem, penso que sabem que em épocas de crise há um artigo cujo consumo, invariavelmente, dispara: são os batons e não estou a ironizar, estou mesmo a falar a sério. Vendem-se que nem ginjas (... ok, mau exemplo, já não há ginjas à venda; talvez, então, como pipocas nos cinemas).

Acho muito bem: haja glamour, haja sedução, haja charme, haja auto-estima. Penso que é a Kate Moss que diz que, 'não se pode entrar num lugar, sem um brilho nos lábios'. Concordo o mais possível.

E, assim, aqui está o meu modesto contributo. O Rouge não é para todas as ocasiões mas, nem que seja para uma ocasião especial, o Rouge é a cor. E, claro, já sabem das minhas preferências: Rouge é Chanel.

(Ok, vá lá, também pode ser Dior e um dia destes ainda volto à carga, trazendo aqui a Bellucci). 

It´s lipstick time!


Ok, que futilidade e que cabecinha de vento, patati-patata. Sigam lá então para o post abaixo, para falarmos de coisas sérias.

segunda-feira, junho 20, 2011

Fernando Nobre, depois da invulgar humilhação a que Passos Coelho o submeteu, diz que parte com a sensação de dever cumprido. 'Parte'? Para onde? No 1º dia como deputado já diz que vai partir. Bonito serviço. 'Dever cumprido'? Mas que dever é que cumpriu? Baixas estão as expectativas. E a Grécia que está um caos. E os riscos que Portugal corre. E o euro. E, finalmente, e acima de tudo, a língua portuguesa.

Em tempo recorde, cerca de duas semanas depois das eleições, toma amanhã posse o novo governo.

Hoje reuniu pela primeira vez a nova Assembleia da República e por duas vezes Fernando Nobre foi rejeitado pela Assembleia para seu Presidente. Inédito e humilhante.

Mas não apenas humilhante para Nobre: humilhante sobretudo para Passos Coelho. Foi uma péssima opção de Passos Coelho, foi uma má gestão do assunto, foi, de facto, uma situação que envergonha os envolvidos.

Esperemos que situações destas, de puro amadorismo - e, pior, que revelam uma má avaliação de competências e das situações - não aconteçam com a frequência que, a sucessão dos últimos dias, faz temer.

Passos Coelho, a 3ª figura de Estado e Fernando Nobre que, afinal, não vai ser a 2ª figura 

Cavaco Silva, um homem sem chama, conotado com grande parte das medidas que trouxeram o País até onde estamos, na Presidência da República; Passos Coelho, inexperiente em cargos de governação, com fraca experiência profissional (rodeado, em grande parte, de um grupo de académicos, inexperientes como políticos) no Governo; e, agora na Assembleia da República, esta embaraçosa situação. Assim vamos.

E, infelizmente, fora das nacionais fronteiras, há focos de preocupação que podem ter também efeitos nefastos sobre nós.

A Grécia tem uma dívida que é uma chaga a sangrar, biliões que ameaçam a estabilidade financeira europeia dado o enorme envolvimento sobretudo do BCE e de bancos alemães.

A Europa e as suas hesitações, o seu andamento a várias velocidades, faz-me lembrar aquela história que o António Lobo Antunes diz que o marcou sobremaneira e o inspirou literariamente: conta ele que um dia um seu doente (de psiquiatria) lhe disse: ’O mundo foi feito por trás’. Só isto - mas para António Lobo Antunes, esse crazy guy, terá sido uma epifania.

António Lobo Antunes e o mundo feito por trás

O mundo eu não sei mas a Europa parece, de facto, ter sido feita por trás.

Foi a arregimentação fácil de mais países, com práticas e políticas muito díspares, especialmente a nível fiscal, depois foi a agregação em torno do euro que, à primeira vista parecia um sucesso, e que agora vem revelar que não há almoços grátis, é a ausência de mecanismos de correcção (valorização ou desvalorização cambial) e, aqui chegados, com o mundo financeiro a chiar por todo o lado (a Europa em risco de gangrena, os EUA a patinarem, o crescimento chinês demasiado aquecido - no conjunto, um bolo a desandar, uma maionese a talhar), constatamos que as verdades inabaláveis das últimas décadas ruíram sem que outras as tivessem ainda substituído.

O mundo financeiro tem pés de barro, isso sabemo-lo todos muito bem, deslumbrou-se e, alguns, desataram a praticar o perigoso esquema da pirâmide, preocupou-se sobretudo com as quotas de mercado a qualquer custo, vendendo dinheiro a quem não tinha como o pagar, procurando o lucro imediato (o que propicia bónus de gestão elevados); os países mais fracos, esses, deslumbraram-se com o crédito fácil e endividaram-se muito para além das suas possibilidades, adquirindo hábitos de novo-riquismo; as agências de rating, organizações espúrias, perversas, (embora desmascaradas à saciedade), continuam a ditar as regras do mundo sem que nada se faça para as impedir; os investidores que dão pelo genérico nickname de 'os mercados', cada vez mais, às escâncaras praticam agiotagem a céu aberto sem que ninguém mexa uma palha para o impedir (taxas de juro acima dos 20 ou 30% onde é que já se viu uma coisa assim?!) – e, enquanto este descalabro se desdobra perante os olhos de toda a gente, as grandes figuras visionárias, os políticos de grande calibre, estão mortos ou reformados e a vida pública, um pouco por todo o lado, está entregue a gentinha que emerge dos cantos da rua, gente que há uns anos não quereríamos nem para tomarem conta dos serviços de economato. Apetece-me dizer que é o fim dos tempos. Pelo menos destes tempos que tomávamos como adquiridos, de uma democracia capitalista quase igualitária, de uma democracia, apesar de tudo, humanista, de uma democracia que zelava pelo chamado 'estado social'.

Assim estamos.

Grécia a ferro e fogo

Quase meio século depois de 68 e dos grandes tumultos que marcaram esses tempos de revolta, voltamos a ter as ruas das capitais invadidas por gente descontente, gente que apedreja a polícia, que se barrica. Grécia oscila entre as greves gerais e a maior confusão de rua, mas também Madrid, Barcelona – e veremos se as coisas se ficam por aí.

Tempos assim prenunciam fracturas.

Depois de vários países assistirem ao que seria impensável há dois ou três anos atrás (redução de salários, pensões, subsídios, direitos que se tinham por adquiridos), já se aceita como benéfico que haja perda de autonomia financeira nacional, entregando-se a gestão a um ministério europeu.

É a globalização. É a externalização. A deslocalização. O outsourcing da gestão financeira nacional. Shared services. Talvez não falte muito para que haja um Governo europeu e que os actuais países passem a regiões ou estados. Mas perante o estado de ruptura eminente, perante a desgraça anunciada, vamos defender outra coisa?

Tantos anos de história para isto.

João Ferreira do Amaral, homem sério que gosto de ouvir, diz que há outra saída, aliás, a única. Portugal está como aquele pobre trabalhador a quem saíu a lotaria e que, sem se dar conta, gastou o dinheiro todo sem ser em proveito próprio e, ao fim de maia dúzia de anos, volta a estar tão pobre como antes. Já ninguém o quer no clube dos ricos. Desgraçado, sem dinheiro para mandar cantar um cego, só lhe resta voltar à situação anterior, de trabalhador pobre. Assim, segundo Ferreira do Amaral, está o País: segundo ele a única saída digna é sair do euro, do clube dos ricos.

As consequências seriam temíveis mas, com o descaminho que as coisas levam, não estou a ver alternativas animadoras.

Mas não sou capaz de escrever mais sobre o assunto. Não analisei estudos, não sei.

Tenho esperança que, algures, entre os tempos de chumbo que atravessamos e o tempo das grandes decisões, surjam figuras de relevo, gente de cultura, de visão, gente com ambição, gente com sentido histórico, sentido de estado, que consiga deitar as mãos ao País.

Seja como for, no meio desta hecatombe que nos está a conduzir no sentido do empobrecimento, que nos está a sorver no sentido do declínio, da perda de dignidade, uma coisa deveremos defender com a vida: a nossa inalienável, sagrada, língua portuguesa. Porque a nossa pátria é a língua portuguesa.

Ao pé da língua portuguesa, tudo o resto é efémero.

Aqui, in heaven, Jeanne descansa enquanto Modigliani a olha, Eugénio de Andrade e Herberto Hélder falam-me de amor - e eu penso em Pilar del Rio, a mulher que iluminou a vida de José Saramago

Acabei agora de ver a 2ª parte do filme José e Pilar. Estou emocionada. A imagem do casal no aeroporto, abraçados, Saramago quase amparado por Pilar del Rio, ele magro, cansado, andando a custo, fazendo uma festa na cabeça da mulher, o amor tantas vezes dito, tantas vezes demonstrado. Não consigo agora falar disso.

*

Esteve ontem, domingo, um dia de calor. À beira do verão as cigarras começam a ficar loucas, as flores, no pino do sol, ficam com um perfume mais intenso e só se consegue estar bem à sombra. Vou então para junto da grande figueira onde a sombra é acolhedora, fresca.

A árvore está pesada como uma mãe carregada de filhos, carregada de leite, mas, como um mãe, sempre disposta a acolher mais alguém que a procure. Aqui, neste recanto reservado e fresco, as mulheres podem estar à vontade e Jeanne, mulher amada, desejada, descansa, lânguida.  (Mais tarde, não conseguindo viver sem o seu Modi, um dia depois dele morrer, ela, grávida de 9 meses, voou para junto dele. Mas aqui, Amedeo ainda a pintava, nua, esguia, amante, dedicada).


É também aqui, nos bancos debaixo da grande figueira que Herberto Helder vem sentar-se e diz, em voz alta, palavras que já sei de cor, que já adaptei como se alguém as tivesse dito para mim, para Jeanne, para todas as mulheres que se abrigam à sombra desta árvore fresca e maternal: 'Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher - seus ombros beijarei/ dai-me um torso dobrado pela música, um ligeiro pescoço, de planta, /onde uma chama comece a florir o espírito - as coisas nascem de ti/ como as luas nascem dos campos fecundos o meu desejo traz o perfume da tua noite/ Beijarei em ti a vida enorme - e em cada espasmo morerei contigo'


E eu, que tanto amo as palavras, fecho os olhos, e peço que me diga mais uma e outra vez as mesmas palavras, 'beijarei em ti a vida enorme', 'as coisas nascem de ti' e eu, mulher, orgulhosa de ser mulher, sorrio, porque assim é, e reclino-me, um livro nas mãos, a máquina fotográfica sobre a mesa, junto a Jeanne:


E, então, chega Eugénio de Andrade, (les beaux esprits se rencontrent) pousa também um livro, refresca-se, bebe um copo de água fresca e diz:


'Foi para ti que criei as rosas, foi para ti que lhes dei perfume/ Para ti rasguei ribeiros e dei às romãs a cor do lume/ Foi para ti que pus no céu a lua e o verde mais verde nos pinhais/ Foi para ti que deitei no chão um corpo aberto como os animais', diz Eugénio com a sua bela voz, palavras que digo de cor, talvez sem grande rigor porque as adaptei a mim.

E Jeanne faz o mesmo, fingimos ambas que acreditamos que foi para nós que ele deitou no chão um corpo aberto para os animais. Sorrimos.


Depois, com as palavras que nos beijam junto ao nosso coração, sentimo-nos felizes. Jeanne, pudica, tapa os seios mas sorri, oferece-se ao seu amor. Esconde-se atrás das ramagens quando percebe que eu a fotografo. Mas sorri, não consegue disfarçar a sedução com que envolve Amedeo, o seu amor.

E eu sorrio também. Gosto de estar aqui in heaven. É boa a sombra desta grande árvore, serão bons os figos daqui por pouco tempo, e são abençoados aqueles que, com as suas palavras nos mostram outros caminhos, são abençoados aqueles que, com a sua obra, para sempre iluminam a existência dos que vêm depois, como nós, como eu, aqui à sombra desta figueira.

sexta-feira, junho 17, 2011

Picasso em acção, um homem vigoroso e de bem com a vida, para sempre entre nós

Ainda mal refeita do impacto do que ouvi ao futuro Ministro Paulo Portas que, ontem à tarde no Altis Belém, veio pôr-se ao meu lado para fazer telefonemas reservados (tal como descrevo no post abaixo deste),  passo para um outro Paulo, um Paulo muito especial.

Pablo Picasso (1881 – 1973), pintor, escultor, ceramista, desenhador, artista plástico compulsivo, exuberante, moderno, homem sedutor, amante, marido dedicado, apaixonado, divertido, polémico, é uma personagem que me fascina. Tenho várias biografias e monografias sobre ele e a sua obra. Transborda de cor, de vida, de vivacidade. Inova, rompe, brinca, recria, cria.

Reading - Pablo Picasso

Quando ia a casa de Braque a mulher deste dizia ao marido que escondesse o que estava a fazer, senão Picasso copiava. E copiava mesmo. Mas não era por mal. Era porque queria experimentar, queria ter a sensação de fazer o mesmo, queria reproduzir, modificar, queria tudo. Se via o 'Déjeuner sur l'herbe' de Manet, entrava em órbita e atirava-se às telas e, de rompante, pintava dezenas de 'reproduções', de variações, e, no fim, já era pura abstração à volta do tema.  Se via as Meninas de Velasquez, aí estava Picasso em delírio, dezenas, centenas de meninas nasciam dos dedos de Picasso, cada vez mais feias, mais disformes, ou já só vestidos e o pintor, ou só a barbicha, ou já quase nada mas ainda lá o espírito, e isso é a joie de vivre, a exuberância, a arte diluida no sangue, o sangue em ebulição.

Pintava em pratos, em papéis, tinha uma cabra que andava pela casa, sentava-se em cadeiras desmanchadas, ria-se, era feliz. A neta Marina diz que o avô não lhe ligava, ficou-lhe uma mágoa. Mas Picasso não se devia dar conta da menininha que por ali andava, no meio da confusão, querendo afecto.

As mulheres, é claro, amavam-no. Teve várias e a todas amou e retratou. Picasso, bigger than life.

Um dia perguntaram-lhe: 'Como é que começa uma obra?'. Ele pensou e respondeu 'Primeiro sento-me'. 'Ah, não sabia, pinta sentado?!' exclama o entrevistador. 'Não', responde-lhe Picasso. O entrevistador fica à espera de mais explicações mas Picasso mais nada diz sobre o assunto.

Acho o máximo.

O que Picasso se devia divertir a responder a perguntas assim. Tinha lá ele regras... Pintava de qualquer maneira, em qualquer lugar, e se lhe faltava uma cor, pintava sem essa cor (e assim apareceram alguns períodos... Pintava quase tudo dessa cor, porque não tinha as outras, what's the big deal?)

Pintou e, ao que parece, fez amor até se ir embora, já passava dos 90. Mas não foi. Tinha muitas células imortais. Ainda está por aí, moderno, alegre, apaixonado. Vejam-no aqui, nos anos 50, aos 69 anos, um menino.


quinta-feira, junho 16, 2011

O futuro ministro Paulo Portas desenvolveu hoje de tarde conversações relativas ao futuro governo no Altis Belém?

Deck da esplanada do Altis Belém, local pelos vistos muito apreciado por Paulo Portas. Tem bom gosto.

Alô, alô, futuro senhor ministro quiçá dos Negócios Estrangeiros, ex-ministro da Defesa, Sr. Dr. Paulo Portas!

Daqui lhe envio uma sugestão: da próxima vez que quiser atender telefonemas sigilosos, relativos a matérias que requerem alguma reserva, lembre-se que não basta afastar-se das pessoas com quem está reunido... não, é preciso mais algum cuidado...

É que veio pôr-se ao pé de mim, a dois palmos se tanto, de calcinha escura, perna dobrada com o pézinho em cima de uma cadeira, camisinha branca de manga arregaçada, caderninho na mão e, 'Ok, tudo bem, está combinado [...]' e o mais que eu, por questões de ética social e sentido de estado, não vou aqui reproduzir.

Como é que quer ocupar-se de assuntos diplomáticos e confidenciais se depois comete lapsos destes, ó meu Caro! Olhe se a sua amiga Ana Gomes estava por ali. Acha que ela ia deixar escapar esta?

E só não coloco a fotografia a comprovar o que estou a dizer porque estava noutra, não andava em reportagem...

Bom...! Vamos lá a ver se ganha tento.

'Hay vida antes de la muerte?', 'Composto de mudança', células imortais - e a estranha e inquietante beleza dentro de nós

Num blogue a que fui dar por acaso, O Fazedor de Auroras, o autor, reportando-se a um graffiti que fotografou em Montevidéu, interroga-se, 'Hay vida antes de la muerte?'.

Justamente hoje, ao ler algumas crónicas de Pedro Mexia em Nada de Melancolia, dei com uma que achei particularmente interessante, que ele intitulou 'Composto de Mudança'.

Transcrevo o começo, 'Que as células todas do organismo se renovam de sete em sete anos. Que sete anos depois não há nenhuma célula viva daquelas que tínhamos antes, substituídas por outras mais recentes. (...)' e conclui: 'Também eu um dia percebo que não sei quem são (os outros), que não nos aproximámos por causa disto mas do oposto, por motivos diferentes ou caducos. Sete anos passados, umas células mortas, lições aprendidas sem préstimo. E continuamos, uns com outros, como prisioneiros na mesma cela. Ou como um guarda fronteiriço que olhasse para o passaporte e para o rosto do viajante e a foto não correspondesse. Um guarda que visse nos papéis e na carne rostos diferentes e não achasse isso ilegal, apenas inevitável e triste. E deixasse seguir automóvel e passsageiro, pois não há regresso possível e o destino ninguém sabe onde fica'.

Ora, justamente no livro a que me referi no outro dia de Eduardo Punset li que:

'Pelo menos 50 mil milhões de células corporais morrem todos os dias por apoptose (suicídio celular programado) e são substituídas por outras novas.


No entanto, continuamos a ser a mesma pessoa. Ou isso julgamos.


Quando nós morremos, o que é que morre?

Porque os átomos de que somos feitos são praticamente eternos e só as células somáticas é que morrem realmente.

Célula tronco ou germinal

As germinais, responsáveis pela perpetuação da espécie, são imortais.'


Ora, porque estas questões me causam alguma perplexidade (sabemos tão pouco do que se passa dentro de nós...), comecei a ler 'A Física do Futuro - como a ciência moldará o mundo nos próximos cem anos' da autoria de Michio Kaku, professor catedrático de Física Teórica na Universidade de Nova Iorque, autor de vários livros e um comunicador reputado. Um dos capítulos é 'O futuro da medicina - perfeição e não só'.

O livro não é futurologia, ficção literária. Pelo contrário, é baseado na consulta e compilação das investigações em curso um pouco por todo o mundo. O que se refere resulta de planos de trabalho em curso, de estimativas com base em resultados obtidos ou em vias disso, em extrapolações efectuadas com rigor científico.

Ainda não cheguei ao capítulo que referi mas já dei uma vista de olhos e, face à nossa vida de hoje, é inquietante. No início do capítulo podemos ver 3 citações entre as quais a de Geral Sussman, 'Não acho que seja para já, mas está próximo. Infelizmente, faço parte da última geração a morrer'.

Células estaminais embrionárias - beleza biologicamente perfeita

E, ao pegar agora no livro, volto a dar uma leitura transversal e, quase ao acaso, escolho o início de um sub-capítulo: " O pioneiro da biotecnologia, William Haseltine, disse-me uma vez: 'A natureza da vida não é a mortalidade. É a imortalidae. Apareceu pela primeira vez há 3,5 mil milhões de anos aproximadamente. Essa mesma molécula, através de duplicações, anda por aí neste momento [...] É verdade que nos esgotamos, mas já falámos sobre a possibilidade de alterarmos isso no futuro. Primeiro, para duplicar ou trriplicar o nosso tempo de vida. E, talvez, se compreendermos o cérebro suficientemente bem, para alargar indefinidamente a duração do nosso corpo e também a do nosso cérebro. E não penso que seja um processo contranatura."

Voltanto ao blogue acima referido e a Pedro Mexia: morremo-nos? renascemo-nos? mutamo-nos? somos perecíveis? somos imortais?

Difícil responder, não é?

Fico-me por outro aspecto: que beleza infinita transportamos dentro de nós, quantos mistérios, quantos atraentes abismos.

quarta-feira, junho 15, 2011

Alpinistas à janela durante o dia, o Tejo e Lisboa, Palmela e o Cristo-Rei de noite

Saio de casa e, no curto espaço que medeia até ao carro, aproveito para respirar bem. Geralmente, só voltarei a andar ao ar livre cerca de 10 horas depois.

No percurso até ao trabalho, faça sol ou chuva, tento levar a janela tanto quanto possível aberta, não usar o ar condicionado. Contudo, nem sempre é possível.

Passado algum tempo, às vezes muito tempo, chego ao meu destino, uma zona agradável, bem arranjada, e desço, de carro, até às catacumbas do edifício. A partir desse momento comecei a abrir cancelas, a fazer mover o elevador e a abrir portas com um cartão que reconhece que tenho permissão para tal.

Das catacumbas, no interior da terra, subo então de elevador até ao andar onde se encontra o meu gabinete.

É um edifício moderno, eficiente, inteligente, todo de vidro, alguma pedra, aço. Por dentro, as instalações são muito agradáveis, abertas, brancas, sem paredes excepto as dos gabinetes individuais, e essas são transparentes, prevalece o vidro, as superfícies são lisas – o arquitecto pretendeu, e conseguiu, um aspecto clean.

Estou, pois, rodeada por vidro transparente, vejo a rua, o verde das copas das árvores lá em baixo, nas ruas. Essencialmente por questões de eficiência energética o edifício não tem janelas, ou melhor, é como se existissem, são grandes superfícies de vidro a toda a altura da parede, mas nada abre. Apenas respiramos ar condicionado.

Às vezes, acontece vermos passar algumas cordas do lado de fora. Passado algum tempo, temos uma visão assustadora. Aparecem duas pernas que surgem do nada. Como já sabemos do que se trata não imaginamos que foi alguém que se tenha enforcado ali ao nosso lado. Passado um bocado descaem mais um pouco e aparece o corpo todo. Estão vivos e são alpinistas que lavam os vidros. Podem estar a menos de 1 metro de nós, apenas o vidro transparente nos separa mas desenvolveram a técnica de não nos olharem. Temos dois homens pendurados junto à nossa janela (já aconteceu aparecer uma mulher), estão virados para nós mas é como se fossemos invisíveis. Fazem o trabalho, com uma destreza mecânica e deixam-se descair até ao andar de baixo. Hoje um dos rapazes tinha um complexo penteado rasta, dezenas de torcidas que lhe chegavam ao meio das costas, já nem parecia cabelo, apenas cordas secas e desfiadas, com aspecto de estar assim enredado há anos, já sem salvação possível, só mesmo cortando. O outro era muito franzino, óculos, custava a perceber como tinha força para andar naquelas ginásticas e como é que os óculos se aguentavam presos à cara.

À hora de almoço, desloco-me outra vez até às entranhas da terra, meto-me no carro e vou almoçar. Geralmente levo o carro até ao parque subterrâneo de uma superfície comercial, subo ao restaurante, aproveito para conviver com alguém de fora do ambiente profissional (gosto de espairecer, cansa-me falar de trabalho ao almoço), faço compras, vou à livraria, vou ver em que param as modas. Apenas ar condicionado.

Depois de almoço, volto de carro, desço às profundezas, subo até à torre de vidro e ali permaneço, enclausurada. As salas de reunião não dão para a rua, tudo luz artificial, mas brancas, perfeitas, e eu tantas vezes ansiando por poder abrir uma janela, sentir o perfume de relva cortada, de flores - mas infelizmente não há como. E, assim, durante o dia, estou em perfeita sintonia com o espírito do edifício: sou executiva, eficiente, condicionada.

Até que, depois de um dia de mails, telefonemas, power-points, reuniões, planos, pontos de situação, coordenação, decisões, contemporizações, mediações e outras coisas do género, volto a descer às profundezas, entro no carro e, por uma estreita e íngreme espiral, subo à superfície, tudo sempre com cartão, para me inserir numa longa fila e vir quase sempre em pára-arranca até casa.

Desesperada por ar livre, anseio, nessas alturas por ir para a rua, caminhar, respirar a maresia, o fresco do rio, fotografar tudo, o mar, o céu, os barcos que chegam, os barcos que partem, os que passam, e, sobretudo, as pessoas, as que estão juntas, as que estão sós, as que andam, as que olham.

Hoje não foi um desses dias mas aqui na minha sala abro a janela e posso respirar um ar imenso que passa pelo Tejo,

Hoje ao chegar a casa, o Tejo, magnífico, e uma gaivota a cruzar os céus

um ar que sobrevoa Lisboa,

Lisboa, a bela, luminosa, hoje sob uma luz dourada de fim de dia

que corre até à margem sul até à serra de Palmela,

A sul, os braços do Tejo, até à serra

e me leva, na volta, a ser abençoada pelo Cristo Rei.

Quase noite e o Cristo Rei a abençoar o eclipse lunar que não tardava

Deixa-me encher bem os pulmões…! O que eu gosto de grandes espaços, de ar livre…! O que eu gosto de liberdade!

As pessoas da terra diziam 'antes havia uma mulher da aldeia'; agora a mulher da aldeia sou eu

As pessoas da terra diziam que ‘antes havia uma mulher da aldeia que sabia de chás e mezinhas, que aqui vinha apanhar estas ervas. Sabia distingui-las, sabia para que serviam. Vinha a pé lá de baixo e andava por aqui, curvada, a espreitar as ervas, a ver quando estavam boas para apanhar. Depois secava-as e, quando alguém estava doente, chamava-a ou ia ter com ela’.

Mas isso foi há muitos anos.


Neste pequeno bocado de terra cheio de pedras, há um caminho debruado com estevas, perpétuas amarelas, salvas, orégãos, rosmaninho, funcho, tomilho, era doce, muito tojo. Parece mato selvagem e é e, por isso, há quem queira cortá-lo, :), mas, para mim, é o meu jardim. Defendo-o de uma forma que pouca gente entende.


Os cheiros e as cores vão variando ao longo do ano. Em alguns sítios, pelo meio, crescem, desordenadas, vigorosas, agressivas, as silvas. Os seus longos braços aparecem onde menos se espera mas agora também não quero que se corte, depois do verão se tratará disso. Antes estavam cobertos por delicadas pequenas flores que agora se estão a transformar em pequenos frutos, amoras, tão boas que vão ficar.


Aqui e ali a madressilva desenvolveu-se de tal maneira que agora são grandes tufos que vão enleando a vegetação à volta, trepando pelas árvores. Na primavera fica toda florida, são pequenas flores de uma graciosidade que parece inventada.



E o perfume é suave, tal como as cores o são. Agora, com o calor, as flores, que quase parecem minúsculas fadinhas, praticamente desapareceram.


Há quatro eucaliptos mas eu prefiro o grande, enorme, cuja folhagem suspensa ondula e perfuma o vento e cujo tronco se descasca deixando à vista as velhas escamas acobreadas. No chão, à sua volta, ficam uns chapelinhos impregnados de um aroma fresco que se acredita que purifica os pulmões.

Numa curva do caminho há um pequeno arbusto e que pena ser só um, que agora está coberto de pequenas flores quase etéreas, tão perfumadas. Dali vão nascer pequenas e saborosas bagas. É a murta. É a flor de Afrodite e de Vénus, e, na Grécia, era com murta que se enfeitavam as noivas; e a sua madeira é a mirra sagrada.

Está perto de um medronheiro que irá dar uns suculentos pequenos frutos encarnados, que se desfarão na boca, de tão maduros e doces, aqueles que conseguirmos disputar aos pássaros.


E há os pinheiros que têm um cheiro doce e morno e que deixam o chão atapetado de caruma e os loendros cobertos de flores, duros e cheirosos como Natália os descreveu.


E há as figueiras, agora vergadas pelo peso das folhas e dos figos, uma sombra fresca e escura, um cheiro algarvio, a lembrar as figueiras dos caminhos junto ao mar na Boca do Rio. Não tarda os figos estarão doces, chamam-se pingo de mel porque deles sairá uma gota de suco espesso e doce, e ficarão com a pele a estalar, um sulcos brancos na pele verde, suculentos. Dá gosto comê-los da árvore, de manhã ou ao fim da tarde.

E há alguns pequenos recantos em que a sombra se fecha com as azinheiras ou com os cedros e em que o chão fica atapetado de folhas, cascas e aí o odor torna-se orgânico, húmido, íntimo.

Apareceu e desapareceu, foi apenas o tempo de o fotografar

Por vezes, à passagem, sente-se algum bicho a correr sem que vejamos nada. Às vezes ainda se vê um gatinho, ou coelhos,  mas quem sabe são cobras (de que vemos, por vezes, a pele) ou lagartixas que há lá tantas - é uma vida quase invisível, a maior parte das vezes apenas se ouve. Outras vezes, de dentro das árvores ouvem-se sons, asas a bater com força, às vezes um pássaro grande que se solta e se eleva pelos céus.

E agora que o calor de verão se aproxima, há muitas abelhas, o alfazema está lotado, arrisco-me muito para o apanhar, mas há-as por todo o lado, abelhas e também borboletas. Muitas borboletas, a maioria, amarelas, resplandecentes de luz. Mas também brancas e, de vez em quando, as maravilhosas mariposas multicores.


Por aqui, por estes caminhos, muitas vezes vou eu, feliz por poder continuar a fazer este caminho ('se hace camino al andar').


Nota 1: Se quiser saber mais sobre o meu bocado de céu siga para aqui ('um dia chegámos lá, era uma casa no meio do mato')

Nota 2: Já agora sugiro que vejam também o post abaixo, sobre as reticências ao casamento por parte de Darwin antes de conhecer a bela Emma Wedgwood

terça-feira, junho 14, 2011

Emma Wedgwood, a mulher que comprovou junto de Charles Darwin que 'existe uma felicidade maior que a de tecer teorias e acumular factos em silêncio e solidão'


Charles Darwin

Quando estava perto dos 30, acabado de uma viagem de 5 anos à volta do mundo, no Beagle, Darwin equacionou se deveria ou não arranjar mulher e, para ver se conseguia decidir, fez uma tabela. Numa coluna escreveu as razões para se casar, na outra as razões para não o fazer.

A coluna dos 'nãos' estava cheia (iria perder tempo a aturar os familiares da futura mulher, iria ter menos dinheiro para ele próprio, não poderia viajar tanto, etc).

Mas a coluna dos benefícios foi difícil de preencher... No final deu a entender que ter esposa era melhor que ter um cão. Completou essa coluna com um apontamento ‘Encantos da conversação feminina e da música (coisas boas para a saúde), mas que grande perda de tempo!’


Emma Wedgwood

No entanto, alguns meses mais tarde Darwin apaixonou-se loucamente pela sua prima Emma Wedgwood. A correspondência que trocaram demonstra que rapidamente esqueceu as suas reticências e como, passado algum tempo, já estava desesperado por se casar com ela, ‘Creio que me vai humanizar, ensinar que existe uma felicidade maior que a de tecer teorias e acumular factos em silêncio e solidão’.

E assim viria a ser. Tiveram 10 filhos (que educaram de forma pouco convencional, face à rigidez da época), formaram uma equipa apesar de algumas diferenças especialmente a nível religioso e apenas a morte os separou.


(História retirada do livro de Eduardo Punset referido aqui)

Fernando Pessoa, um poeta intemporal, jovem aos 123 anos. E um cheirinho a alfazema.

Já acabou há pouco o dia de Stº António, santo da nossa afeição, e que, em Lisboa, é tido por abençoar casamentos em grupo e, assim sendo, se a data apela de tal forma ao amor, partilhei convosco algumas descobertas científicas que explicam os mecanismos do dito (no post abaixo deste, reportando-me ao último livro de Eduardo Punset).

Mas fez também anos ontem Fernando Pessoa e embora o tenha festejado no Ginjal e Lisboa não me apetece deixar passar em branco a data aqui no Um Jeito Manso.

Contudo, antes, para que a data fique bem temperada, junto-lhe aqui uns cheirinhos populares que, se fosse daqui por uns anos, desmaterializava e enviava-os para que, aí, ao abrirem este blogue, pudessem fazer o download destes belos aromas bem portugueses (lá chegaremos). Por enquanto são apenas palavras e imagens.

Andei a apanhar, in heaven, oregãos que já estão bem floridos e cheirosos (para serem secos e depois servirem para temperarmos as saladas, especialmente as de tomate), alfazema que está com uma cor vibrante e um perfume intenso e fresco e, de passagem, também algum louro.

Que perfume, meus amigos... cheira a serra, cheira a campo, cheira a alegria.

Depois, fui colocando espigas de alfazema um pouco por todo o lado para que a casa fique com aquele cheirinho bom a gavetas com lençóis com dobras de renda, toalhas de linho, brocados, enxovais de fino bragal, saquinhos bordados com cheirinhos, e outras coisas boas da nossa memória.

Enchi este bule - que é de esmalte lilás pintado à mão, muito antigo - de espigas de alfazema e a sala ficou logo cheirosa.


Mas, se o que estou a escrever é dedicado a todos, em geral, que me lêem, tem também um destino em particular. Como não poderei oferecer pessoalmente um pequeno e cheiroso bouquet deste alfazema à Laurinda Alves, daqui lhe envio estas imagens, desejando que os dias de despreocupação voltem rapidamente.

E agora, então, a palavra a Fernando Pessoa:

Não sei se é sonho, se realidade,
se uma mistura de sonho e vida,
aquela terra de suavidade
que na ilha extrema do sul se olvida.
É a que ansiamos. Ali, ali
a vida é jovem e o amor sorri.

Talvez palmares inexistentes,
áleas longínquas sem poder ser,
sombra ou sossego dêem aos crentes
de que essa terra se pode ter.
Felizes, nós? Ali, talvez, talvez,
naquela terra, daquela vez.

Mas já sonhada se desvirtua,
só de pensá-la cansou pensar;
sob os palmares, à luz da lua,
sente-se o frio de haver luar
Ah, nesta terra também, também
o mal não cessa, não dura o bem.

Não é com ilhas do fim do mundo,
nem com palmares de sonho ou não,
que cura a alma seu mal profundo,
que o bem nos entra no coração.
É em nós que é tudo. É ali, ali,
que a vida é jovem e o amor sorri.
 
 
(Do Cancioneiro).

segunda-feira, junho 13, 2011

No dia de Santo António, santo casamenteiro, 'Viagem ao amor' e, en passant, também à felicidade - as novas descobertas científicas (Eduardo Punset dixit)

Ontem escrevi um post sobre o comportamento tão tipicamente português, que tão patente está em grande número de blogues - a descrença, a maledicência, o fatalismo, a autocomplacência - que nesta altura crítica da nossa existência, mais que nunca, não nos faz qualquer falta.

E agora, para aliviar das tensões políticas e, sobretudo, porque o dia é dia de marchinhas e balões, de casamentos múltiplos e manjericos, vou falar sobre um tema muito pouco erudito mas muito apropriado ao dia: amor.


Acabei hoje o último livro de Eduardo Punset (homem de múltiplas formações académicas, múltiplas profissões, agora essencialmente divulgador científico), 'Viagem ao amor - as novas descobertas científicas', no qual, através de recolha de múltiplos testemunhos junto de investigadores de renome e do estudo de numerosos estudos científicos, Punset faz uma viagem aos diversos mecanismos (essencialmente biológicos) que explicam a necessidade, o despoletar, a conservação e o fim do amor.

Diz ele, na introdução, que resolveu agora escrever um livro sobre um tema aparentemente tão banal porque, do contacto que tem tido por pessoas de todo o mundo, lhe pareceu que há uma apetência por temas que são de facto relevantes uma vez que 'As minorias estão amplamente servidas e mais que representadas, ao passo que a grande maioria vive desamparada', ou seja, ninguém escreve sobre assuntos que interessam às maiorias. E que o amor, é de todos, talvez aquele que mais interesse desperta a toda a gente.

Não vou dar-me ao desplante de tentar resumir o livro, nem sequer irei falar de hormonas para não ter que me alongar excessivamente. Vou apenas deixar algumas transcrições, aquelas que, de alguma forma, me parecem ilustrativas de verdades comuns mas cientificamente comprovadas. Todo o livro está repleto de referências a nome de cientistas, de Universidades, de revistas da especialidade, que fundamentam o que Punset vai enunciando. Nestas breves transcrições vou abster-me de também as citar, para que o texto não saia muito sobrecarregado.

Fusão

1. Sobre a influência da infância

A forma como o amor adulto se desenrola é forjada no ambiente maternal da infância.

Da mesma maneira que expectativas desmesuradas podem provocar uma resposta distorcida na criança, uma criança que convive com expectativas negativas e stressantes (‘se fosses bonito,,,’, ‘és um preguiçoso e sempre o serás…’, ‘és tão cobarde como o teu pai’) molda-se facilmente ao que se espera dela.


Sintonia

2. Sobre o que conduz ao amor

O amor desvanece o conceito de si próprio, ameaçando destruir as barreiras que separam dois seres e, em todos os inquéritos efectuados entre apaixonados, constata-se que a busca desta fusão prevalece sobre o desejo sexual.

Sentimo-nos cativados quando nos entretêm e nos arrancam da solidão.

Segundo Hermann Weyl (1885-1955) matemático alemão e grande amigo e colega de Einstein, ‘a simetria é a ideia através da qual a humanidade, em todos os tempos, tentou compreender e criar a ordem, a beleza e a perfeição’. As últimas investigações apontam também para a simetria como o factor de decisão na selecção sexual.

Numa investigação realizada, detectaram que as mulheres tendem a sentir-se atraídas pelos homens que as fazem rir, ao passo que os homens gostam mais das mulheres que se riem das suas piadas.

É necessário um nível moderado de stress para se começar uma relação. A fase inicial do amor assemelha-se a uma montanha russa hormonal, com subidas e descidas bruscas que estimulam os diferentes estados necessários de modo a fazer com que uma boa relação possa estabilizar-se mais à frente. Quem é que não se reconhece numa situação como esta, característica da paixão imprevista? É algo químico e repentino, mas que já possui todo o potencial do amor absoluto. Não é o momento adequado para a calma. Baixam os níveis de serotonina. Simultaneamente, surge uma recusa em deixar-se arrastar imediatamente por estímulos novos que alteram compromissos já adquiridos.

Pintura que fiz há tempo sobre Mulheres

3. Sobre o sexo e sobre as diferenças, nesta matéria, entre homens e mulheres

A mente regula a libido feminina muito mais que nos homens.

O espaço cerebral reservado às relações sexuais é duas vezes e meia superior nos homens face às mulheres, ao passo que nas mulheres os circuitos cerebrais activados com a audição e com as emoções são mais numerosos.

O orgasmo da mulher requer primordialmente uma inibição quase total do seu cérebro emocional, ou seja, uma desconexão de emoções como o medo ou a ansiedade. Ou seja, em linguagem corrente, para fazerem amor as mulheres necessitam de estar livres de preocupações em maior medida que os homens.

Partilha

4. Sobre o desamor e sobre a possibilidade de se renascer

O que se ignorava é que a ausência física durante muito tempo mata o amor. O que, de facto, interessa é a frequência dos impulsos amorosos. O amor não resiste à inexistência prolongada de manifestações amorosas.

A antítese do amor não é o ódio, mas sim o desprezo. Não há relacionamento que resista quando um dos membros do casal sente desprezo pelo outro.

O desamor tem efeitos potentes na psicologia das pessoas: por um lado, desestrutura e, por outro, aquele que é rejeitado não se sente digno de ser amado. É um efeito duplamente negativo.

Contudo...

Os efeitos da passagem do tempo eram imprevisíveis até que a Biologia Molecular permitiu aos neurocientistas penetrar nalguns dos seus segredos. Passado seis meses sobre um grande contratempo pessoal, a mente já o digeriu, a vida, que parecia inconcebível após a desgraça, começa a perfilar-se de novo e a esperança renasce.



Ternura, felicidade

X. (Nº extra) - Sobre a felicidade

A felicidade é a ausência de medo.

Por outro lado, quando se espera um acontecimento daí por algum tempo (um casamento, um nascimento) o maior erro que se pode cometer é desperdiçar a felicidade que ressuma todo o processo de busca. A felicidade está na sala de espera da felicidade.

Comprovadamente verifica-se a tese do neuropsiquiatra Elkhonon Goldberg catedrático de Neurologia da Universidade de Nova Iorque: o nível de felicidade aumenta à medida que a idade avança.


Felicidade

Aos meus leitores desejo grandes amores e muita felicidade!


Nota

Tinha-me esquecido de uma coisa e, por isso, horas depois de ter publicado o post, volto a ele porque não apenas é importante como de grande utilidade:

Magnífico mas vamos lá ver se alguma pavoa o quer

Em grande parte das espécies, os machos tentam conquistar as mulheres exibindo os seus dotes, mostrando que são melhores que a concorrência: abrindo a cauda, emitindo ruídos, realizando danças, mostrando os músculos e tudo o mais que se sabe porque, de forma geral, claro que são as fêmeas que escolhem qual o macho com querem ficar. Com a espécie humana é assim, como é sabido, desde o Adão e Eva (apesar da escassez da oferta, na altura).

Penso que todos os homens que me estão a ler já perceberam isso há muito tempo mas agora podem ter mesmo a certeza, sobejamente comprovada em tudo o que é College, Institute, and so on. Têm (ou tiveram, consoante o estado) mesmo que mostrar do que são capazes para que as mulheres possam (ou pudessem) avaliar bem antes de se efectuar a escolha. Não há volta a dar. C'est la vie.



PS: O livro é uma edição da Dom Quixote de Maio de 2011 e as frases que constam dos vários pontos numerados, conforme referi, tão transcrições, embora não estejam entre aspas. Com excepção da 1ª fotografia (casamentos de Sto António) e a do magnífico pavão, as outras fotografias são, como é costume, feitas por mim.

domingo, junho 12, 2011

O Windows deve ser usado como um sistema operativo e não como um modus operandi, certo? Por isso, vizinhas deste país, deixem-se de estar de janela a dizer mal de tudo e de todos!

Dou uma volta pelos blogues que costumo visitar e, salvo os que são exclusivamente culturais e logo, imunes, à variação das circunstâncias e salvo algumas outras honrosas excepções, o que genericamente vejo é:

- alguns parece que perderam inspiração e entraram em stand by;

- outros, denotam algum ressabiamento, como se sentissem dificuldade em aceitar que a realidade mudou. De facto, o PSD ganhou as eleições e, de facto, vai formar governo com o CDS e tomáramos nós que consigam formar um bom governo, com gente competente, e que consigam dar boa conta do apertado programa de reestruturações que é indispensável pôr em prática. Tomáramos nós.

- outros, que antes tanto esconjuravam o PS de Sócrates, parece que já andam à procura de pretexto para começarem a roer no CDS e no PSD.

Quem me costuma ler, sabe que não sou admiradora de Passos Coelho, sabe que reconheço em Cavaco Silva o introdutor de grande parte das medidas que viriam, com o tempo, a destruir a economia e a competitividade do País.

Mas, se Cavaco Silva agora reconhece que foi mau destruir a agricultura (a as pescas?), ainda bem. Se os campos que foram postos ao abandono a troco de subsídios, voltarem a produzir, melhor. Se ele, agora, incentiva os jovens a apostarem numa agricultura diferenciada e rentável, só posso estar de acordo.

E se, para isso, for necessário revitalizar o interior, pois melhor ainda. 



Agora não podemos é ficar à janela, a olhar o que se passa na rua, para, quais vizinhas maledicentes, vir, a seguir, dizer mal de tudo. E isto aplica-se a todos, aos socialistas, aos votantes no psd, no cds, ou em quem quer que seja.

Atrás dos tempos vêm tempos e para a frente é que é caminho.

Este país que se compraz a lamber feridas, a fazer intriguinhas, a olhar para o passado, a desacreditar de tudo e de todos, tem que perceber que agora não é a hora para isso. Agora é tempo de olhar em frente, de mudar de hábitos, de arriscar, de ser produtivo e não destrutivo, de ser solidário, de acreditar, de ter alguma auto-estima.

Pode parecer conversa fiada mas é o que penso.

sábado, junho 11, 2011

Pedro Mexia e Pierre Bonnard, finalmente a felicidade

Gostei de ler a última crónica de Pedro Mexia no suplemento Actual do Expresso.

Finalmente um texto feliz, sobre um tema feliz, em que ele reconhece, ao ver a pintura de Pierre Bonnard, que a felicidade (ainda que "uma visão inquieta da felicidade") está nas coisas simples. Diz Pedro Mexia que Bonnard "acredita mais na paixão do visível do que no cepticismo intelectual".


Na intensidade do laranja e do violeta (conjugação cromática que, pessoalmente muito aprecio, como é bom de ver), na profusão de flores, de frutos, Pedro Mexia reconhece na obra de Bonnard que o que importa não é apenas o momento, é também a recordação do momento, a recriação emotiva do momento. E fala das mulheres de Bonnard sem lhes descobrir fatalidades, frustrações: não, fala-nos de mulheres sensuais, íntimas, recatadas, vibrantes, felizes. 


Pedro Mexia, o penitente pessimista, reconhece nesta sua bela crónica que a "felicidade não é apenas euforia", "a felicidade contenta-se com pouco porque esse pouco é muito", "Que acredita naquilo que vê porque vê aquilo em que acredita". Os pequenos ingredientes de que se faz a felicidade.

E, ao ler um texto assim, tão bem escrito como lhe é apanágio, mas em que o tema não é a desilusão, o desencanto, a tristeza plena de melancolia, olho para a sua fotografia e até o sorriso me parece quase feliz.


Acabei de ler essa crónica a sorrir: sabe bem ler textos felizes, sabe bem ler sobre explosões cromáticas, sobre composições perfeitas, sobre harmonia de enquadramentos, sobre a natureza, sobre flores, sobre frutos, sobre mulheres junto a banheiras, sobre homens que olham essas mulheres.

Salvé Pedro Mexia!

sexta-feira, junho 10, 2011

Alfred Stieglitz e Georgia O' Keeffe, fotografia, pintura, amor, escrita - a arte dos relacionamentos virtuosos

Alfred Stieglitz (1864 –1946) era para mim essencialmente o marido fotógrafo de Georgia O’Keeffe (vidé post anterior), pintora de que já aqui falei várias vezes.

No entanto, não foi apenas isso. De facto, foi um fotógrafo genial mas também autor de numerosos artigos, editor e promotor de arte moderna tendo gerido várias galerias nas quais divulgou numerosos artistas, fotógrafos e pintores.

Apesar de ter profusa e exigente formação académica em áreas diversas, entre as quais engenharia, grande parte dela adquirida na Europa, o seu interesse começou a concentrar-se na fotografia, adquirindo valiosa biblioteca e cedo escrevendo artigos relacionados com fotografia.

Enquanto na Europa, começou a participar em concursos fotográficos, ganhando prémios e consolidando o reconhecimento pela sua obra, conseguindo, sem esforço, ser publicado em várias revistas.

Entretanto, por razões familiares é chamado de volta à família e regressa a Nova Iorque em que, considerando-se já esencialmente um fotógrafo, inicia um negócio de fotografia em que a qualidade é tal que os custos são tão elevados que não consegue ter lucro. Aliás, esta forma de estar, será uma constante: qualidade extrema, prejuízos permanentes.

Venetian Canal - Alfred Stieglitz, 1894

Mas a escrita é também uma pulsão e continua a escrever artigos, agora para a revista The American Amateur Photographe, enquanto continua também a ganhar os concursos de fotografia em que participa. Em pouco tempo é bastante conhecido pela qualidade não apenas da sua fotografia mas também da sua escrita, tornando-se, em pouco tempo, co-editor da revista.

Aos 29 anos casa-se, muito por insistência da família que achava que era tempo de assentar, com uma mulher que não amava e o casamento viria apenas a consumar-se um ano depois. O casamento nunca o satisfaz, não existia uma empatia natural a nível de interesses culturais e artísticos. O dinheiro da família dela foi-lhe, no entanto, bastante útil e, embora tenham tido uma filha, viviam praticamente separados debaixo do mesmo tecto.

Mais tarde, em 1896, a partir de duas outras organizações, forma a Camera Club de Nova Iorque e cria a, então, melhor revista de fotografia do mundo, a Camera Notes, continuando, também, a fotografar e a expor.

Mais tarde, depois de alguns esgotamentos nervosos devidos ao excesso de trabalho, viria a formar uma outra revista, a Camera Work, que ele pretendeu que fosse a melhor e a mais sumptuosa revista de fotografia - e assim foi. A qualidade de impressão era tal que parecia estar-se em presença das fotografias originais. Trabalhava freneticamente em todas as frentes e os esgotamentos continuavam. O rigor que colocava em tudo, o perfeccionismo levado ao extremo, a centralização das decisões, levaram-no a incompatibilizar-se frequentemente com os seus colaboradores e amigos mais próximos que não lhe perdoavam aquilo que, por vezes, se parecia com arrogância. Mas todos lhe reconheciam qualidades ímpares e as relações acabavam por ser reatadas.

Mais tarde, um grande amigo desafiou-o a expor num apartamento que tinha umas salas vazias. E assim, em 1905 aí abre a sua 1ª galeria, The Little Galleries of the Photo Sucession, com 100 fotografias de 39 fotógrafos. Foi um sucesso imediato.

Alfred Stieglitz e a mulher, Emmeline

Portanto, com o suporte financeiro da família da mulher (mulher que nunca desistiu de tentar conquistar o seu amor), passou a ter mais uma ocupação, a de galerista. Mais tarde, para além de fotografia, viria a expor também desenho, pintura, cerâmica mexicana, escultura africana. Foi um percursor, um moderno.

No entanto, financeiramente havia sempre dificuldades. Apenas em 1909, com a herança do pai, viria a haver algum desafogo.

Os seus interesses foram-se alargando e em 1912 a Camera Work publicou um número especial dedicado exclusivamente a Picasso e Matisse que, desta forma, foram introduzidos ao público americano.

Mas Janeiro de 1916 foi, para ele, a data marcante. Alfred Stieglitz viu um portfolio de desenhos de uma jovem pintora, Georgia O’Keeffe, e ficou encantado, era diferente de tudo o que tinha visto. Sem a conhecer e sem lhe pedir autorização, resolveu organizar uma exposição numa sua nova galeria, a 291.

Quando ela soube, através de um amigo, que o seu trabalho estava exposto, dirigiu-se lá e naturalmente manifestou o seu profundo desagrado. Stieglitz sentiu-se imediatamente atraído por ela. Mas sem retribuição. Georgia viria a interessar-se, sim, por um amigo de Alfred, com quem trocaria correspondência romântica. Mas, ao fim de pouco tempo, o interesse acabou por se desvanecer.

No verão de 1917, iniciou-se então um período de correspondência intensa entre Georgia e Alfred que adorava escrever - partilhavam toda a espécie de pensamentos, até os mais privados.

Um afecto intenso começava a desenhar-se, uma paixão cada vez mais forte.

O afecto nascido da correspondência começa a querer materializar-se e, em breve, começam a encontrar-se sempre que podem.

Alfred desinteressou-se por tudo o que tinha feito até então. Fechou a galeria, fechou a revista, separou-se da sua mulher. Finalmente tinha encontrado a sua alma gémea (como ele se referia a ela), tinha encontrado o relacionamento que toda a vida tinha desejado. Já ia nos cinquenta e tais anos.

Levou 6 anos até que conseguisse o divórcio mas isso não os impediu de viverem juntos o seu grande amor.

No entanto, Georgia, um espírito livre, de vez em quando precisava de se isolar para pintar e ausentava-se durante meses, o que funcionava muito bem com Alfred.

Georgia O'Keeffe por Alfred Stieglitz

Para Alfred foi um período de ouro. Tinha encontrado a sua musa. Fotografou-a obsessivamente, especialmente a cara e as mãos mas também numerosos nus (não identificava o modelo). Ela tinha uma fortíssima personalidade e Alfred conseguiu captá-la. As suas fotografias são obras de arte.

Georgia O'Keeffe por Alfred Stieglitz

Em 1922 começa também uma série de fotografias de nuvens, especialmente para se pôr à prova, para ver o que tinha aprendido em 40 anos de fotografia, para provar que a sua fotografia tinha a ver com a maneira como via as coisas, as mesmas coisas que estavam à disposição de toda a gente. Durante cerca de 12 anos tira fotografias a nuvens. São as primeiras fotografias intencionalmente abstractas. Chamar-lhes-á Equivalents.

Equivalents - as nuvens de Alfred Stieglitz

Durante o período que viveram juntos, durante um dos períodos de isolamento de Georgia, ele fez uma série de nus com a mulher de um amigo, vindo a ter um affair com ela. Mais tarde Georgia descobriu mas não se importou, viu que tinha sido uma coisa física e passageira. Ela própria, mais tarde, viria a ter um affair com esse mesmo amigo.

Quando finalmente conseguiu divorciar-se, Alfred casou-se finalmente com Georgia, que não pretendia casar-se, dizendo que o relacionamento funcionava bem assim. Tinham temperamentos fortes e uma grande tendência para o confronto pelo que cuidadosamente o evitavam - grande parte do tempo nem se falavam. Georgia passava muito tempo no seu rancho em New México e Alfred em Nova Iorque, excepto no verão em que ia passá-lo com ela (ela gozava, dizia que ele, sendo hipocondríaco, não podia estar longe dos médicos) mas a escrita unia-os e fortalecia um afecto inabalável.

Dorothy Norman, por Alfred Stieglitz
Apesar de no decurso dos anos seguintes, ele se ter 'entusiasmado' por uma jovem, a quem fotografou nua inúmeras vezes, Dorothy Norman, com quem viria a ter um prolongado affair, o relacionamento com Georgia, com quem se encontrava geralmente apenas uma vez por ano, no verão, nunca esmoreceu, mantendo o hábito da escrita regular, intensa, uma vez por semana, pois ela era, de facto, a sua alma gémea.

Alfred morreu em 1946. Tinha estado em coma e parece que esperou que Georgia chegasse para só morrer com ela ao seu lado.

Georgia, espalhou as cinzas de Alfred e começou, então, um trabalho exaustivo de identificação e catalogação das milhares de fotografias da autoria do seu marido e de trabalhos de outros artistas.

Georgia doou praticamente todo esse espólio a museus, bibliotecas e universidades americanas. E continuou a pintar, a pintar, tendo vivido até aos 99 anos, até 1986.


(Texto traduzido e construido a partir de fontes disponíveis na internet, nomeadamente na Wikipedia e do livro 'Camera Work, the complete Photographs - Alfred Stieglitz', da Taschen)