1.
Tu tens medo dos lobos, tontinha!? - pronunciou Louvadeus em tom amável de repreensão.
- Olha que os lobos são bichos valentes, bichos simpáticos.
- Medo do homem, sim, do homem ladrão, do homem fera! Os lobos não metem medo.
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Kate Moss by Mert and Marcus |
2.
Quando os bobos uivam, até os lobos precisam de recolher à toca para recuperarem alguma paz. E levam consigo um livro.
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Kate Moss by Tim Walker |
(Pego então num livro antes de me recolher)
3.
A confiança não vive de uma imagem estática ou aprisionada do outro. Ter confiança é admitir a possibilidade de mudança, de viragem, de deslocação e, num certo sentido, também de 'traição'.
Para sermos fiéis ao núcleo mais fundo de autenticidade, temo-nos de interrogar constantemente: 'o que é trair?'. Não esqueçamos o que ensina Kierkegaard: a única traição é não ter querido nada, profunda e autenticamente.
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Kate Moss by Tim Walker |
(E num outro livro)
4.
Sorriu, alegre, sentada na beira da mesa, e escutou a música baixa, quase em surdina, rigorosa, talvez Vivaldi transparente, sem inquietação e sem perguntas, caindo leve sem tocar em nada.
A nota discordante, pensou. E sorriu outra vez, porque o que quer que dissesse seria uma agressão a tudo isso, começaria falar e iria abrindo brechas na perfeição fictícia das coisas, e deixaria entrar subitamente a angústia.
É um mundo que começou a enlouquecer, disse de repente, sem preparação. Um mundo eficiente, de silêncio total, em que ninguém mais fala com ninguém. As pessoas estão sentadas, ombro contra ombro, à espera, mas o motivo da espera é sempre falso, o autocarro, o comboio, o avião, porque todos os lugares são iguais e nada é diferente em parte alguma.
Nada a dizer no dia claro, nada a dizer no dia claro. Assim fora, assim era, portanto. Voltou para dentro e fechou a janela.
Um homem vencia os obstáculos do caminho e voltava finalmente para uma mulher amada, que tinha esperado por ele a vida inteira.
Havia milénios que homens e mulheres viviam a esperança dessa história. E uma vez por outra, talvez não muitas vezes e talvez apenas para alguns, bafejados pela sorte, pelo acaso ou pelos deuses, essa história inverosímil do regresso a casa entrava na vida real e acontecia.
As leituras pertencem respectivamente (e sendo que cada excerto não segue por vezes a ordem original nem a ordem que escolhi obedece a nenhuma lógica - transcrevi tal como me apareceu e apeteceu) a:
1 - Aquilino Ribeiro, Quando os lobos uivam (excerto que abre o livro seguinte)
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Kate Moss by Mert and Marcus |
É um mundo que começou a enlouquecer, disse de repente, sem preparação. Um mundo eficiente, de silêncio total, em que ninguém mais fala com ninguém. As pessoas estão sentadas, ombro contra ombro, à espera, mas o motivo da espera é sempre falso, o autocarro, o comboio, o avião, porque todos os lugares são iguais e nada é diferente em parte alguma.
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Kate Moss by Mario Testino |
Nada a dizer no dia claro, nada a dizer no dia claro. Assim fora, assim era, portanto. Voltou para dentro e fechou a janela.
(E ainda um outro livro)
5.
Um homem vencia os obstáculos do caminho e voltava finalmente para uma mulher amada, que tinha esperado por ele a vida inteira.
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Kate Moss by Tim Walker |
Havia milénios que homens e mulheres viviam a esperança dessa história. E uma vez por outra, talvez não muitas vezes e talvez apenas para alguns, bafejados pela sorte, pelo acaso ou pelos deuses, essa história inverosímil do regresso a casa entrava na vida real e acontecia.
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As leituras pertencem respectivamente (e sendo que cada excerto não segue por vezes a ordem original nem a ordem que escolhi obedece a nenhuma lógica - transcrevi tal como me apareceu e apeteceu) a:
1 - Aquilino Ribeiro, Quando os lobos uivam (excerto que abre o livro seguinte)
2 - Onésimo Teotónio Pereira, Quando os bobos uivam
3 - José Tolentino mendonça, Nenhum caminho será longo
4 - Teolinda Gersão, O silêncio
5 - Teolinda Gersão, A cidade de Ulisses
A música é Verão de Vivaldi, interpretada por Julia Fischer no violino, acompanhada pela "Academy of St Martin in the Fields".
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Permitam ainda que vos informe:
- Sobre o 55º aniversário de Madonna e os respectivos festejos reais é descer um pouco mais, é já no post a seguir.
- E muito gostaria ainda de vos convidar a virem comigo até ao meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa. Hoje, levada pela mão de Armando Silva Carvalho as minhas palavras são calientes como convém a um dia quente de verão. Segue-se-lhes a voz de uma grande fadista, Gisela João.
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E por hoje é isto. Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela terça feira. E boas leituras!