Mostrar mensagens com a etiqueta Shinrin-Yoku. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Shinrin-Yoku. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, junho 10, 2019

Banho de sol, de sabedoria e de floresta -- in heaven





Ontem, esqueci-me de referir que, a meio da tarde, quando voltámos para mais perto da casa, quase todas as meninas grandes e quase todos as meninas e meninos pequenos pegaram em vassouras e pás e desataram a varrer e a apanhar folhas secas e a transportá-las nos carrinhos de mão e que foi uma alegria ver como, num instante, todo aquele espaço ficou limpo e como todos estavam felizes pela ajuda. Até o bebé andava de vassoura e pá no meio daquela azáfama. Não colaborei porque estava de repórter. E não apenas enviei fotografias aos próprios que ali estavam em acção, para memória futura, como à minha mãe porque sei que ela gostaria muito de também ali estar, e certamente naquela altura estaria também a varrer, e que, não podendo vir (ou melhor, não querendo deixar o meu pai em casa, ao cuidado de outra pessoa), pelo menos pôde ir vendo a sua família e amigos na maior boa disposição.

Mas isto foi no sábado, dia grande in heaven, mais um daqueles alegres dias em que nem se ouviram os pássaros tanta a conversa e risota que ocupou todo o espaço. Imagino que os pássaros ficaram em suspenso, lá em cima, nas árvores, a observar toda a correria e brincadeira que decorria cá em baixo.


Este domingo, pelo contrário, foi um daqueles dias de completo descanso, sem horários, sem compromissos, sem ter que ir a lado nenhum, sem ter nada, mas mesmo nada de nada, para fazer.

O meu marido, como sempre, madrugou. Acordei por volta das oito, vi o relógio, e já ele não estava em casa. Anda pelo campo, curte o nascer do dia, aprecia as cores e a frescura do nascer da manhã, vai dar os seus passeios solitários. Já desistiu de me convencer a acompanhá-lo. Eu voltei-me para o outro lado, a largueza da cama toda por minha conta, e adormeci de novo. Levantei-me manhã alta. E fui fazer a minha caminhada, até que dei com ele. Os passeios já tinham ficado para trás e já andava na sua luta com o tojo e com as silvas. 

E eu continuei a caminhar por entre as árvores. Pequenas lagartixas fugiam à minha passagem e, certamente, outros bichinhos que, apesar de não ver, ouvia a esconderem-se por entre a folhagem. E os pássaros, na maior alegria, cantavam de gosto, de vez em quando esvoaçavam à minha passagem. 


O almoço foi um resto do de ontem quando ainda só estava metade do grupo. Portanto, nem isso tive que fazer.

Depois de almoço fui lá para fora, para uma espreguiçadeira, ao sol, com um curioso livro que um amigo me deu no outro dia. Os livros que vêm dele são sempre do mais incomum que se possa pensar, nem imagino onde os descobre. Este sei que encomendou de propósito para me dar pois um dia, numa das longas viagens que fazemos, veio à conversa. Mas nunca mais eu me tinha lembrado de tal coisa. Agora, ao ler o livro, espanto-me com a qualidade da escrita, com a inteligência de quem o escreveu, com a superioridade intelectual que revela. E, como tantas e tantas vezes, pasmo com o meu nível de ignorância. Como pude eu desconhecer a qualidade desta escrita até aqui? Como é assustadoramente vasta a minha ignorância... E fala de um compositor e das suas obras e eu constato como era superficial também o meu conhecimento desse compositor. Fui à wikipédia ler sobre o autor do livro e desconhecia tudo o que ali li, inclusivamente que ganhou o Nobel. Pensava-o apenas dramaturgo e mesmo isso que sabia não passava disso -- ou seja, na prática, não sabia nada.


E, como sempre que me confronto com uma situação destas, penso que alguma coisa tem faltado no meu processo de aprendizagem. E presumo que, se isto acontece comigo, se calhar acontece com quase toda a gente. A escolaridade deveria ser obrigatória até ao fim da nossa vida e deveria haver escolas sempre dispostas a acolherem alunos avulsos, ad hoc, gente curiosa ou gente bronca, gente escolada ou analfabrutos, escolas vocacionadas para ensinar a aprender: aprender a pensar, aprender a procurar, aprender a descobrir diferentes perspectivas -- escolas que abram janelas imensas para a diferença, para a os outros, para a cultura em geral, para a sabedoria. 


Mas isto foi de tarde e depois o sol começou a baixar e eu já não conseguia ler a menos que fosse para a sombra mas aí ficaria com frio (até porque estava vestida à verão) e, por isso, voltei para casa. E tapei-me, porque estava fresco, e adormeci. Não foi por muito tempo mas soube-me bem. E, quando acordei, estava uma luz dourada, aquela luz suave que faz brilhar as folhas em contraluz e de que tanto gosto. Então, fui outra vez para a rua, fui andar no meio das árvores, cheirar o alecrim, aspirar o ar fresco e depurado pelos eucaliptos, pelos cedros e pelos pinheiros, passando a mão pelo rosmaninho, pelos orégãos já tão floridos e cheirosos, fotografando tudo, absolutamente despreocupada de tudo, entregue ao momento.

Agora que aqui estou, revejo as fotografias que fiz durante o dia e constato como os motivos se repetem e como ao longo dos anos me continuo a encantar-me com as mesmas coisas: as árvores, as flores, os frutos, a cor vibrante da natureza, a luz, a minha sombra reflectida nas coisas, o tempo suspenso.


Li, outra vez, que andar na floresta é tão saudável que no Japão é recomendado como terapia. Shinrin-Yoku. Já aqui falei nisso, no banho de floresta. Dizem, e eu acredito, que reduz o stress, melhora o estado geral de saúde, pacifica. Estive a ler o artigo Getting back to nature: how forest bathing can make us feel better, no The Guardian.
The Japanese have known for years that spending mindful time in the woods is beneficial for body and soul. Now western doctors – and royals – agree.  
Every day, apart from when it’s raining heavily, Dr Qing Li heads to a leafy park near the Nippon Medical School in Tokyo where he works. It’s not just a pleasant place to eat his lunch; he believes the time spent under the trees’ canopy is a critical factor in the fight against diseases, of the mind and body. 
Once a month Li spends three days in forests near Tokyo, using all five senses to connect with the environment and clear his mind. This practice of shinrin-yoku – literally, forest bath – has the power to counter illnesses including cancer, strokes, gastric ulcers, depression, anxiety and stress, he says. It boosts the immune system, lowers blood pressure and aids sleep. And soon it could be prescribed by British doctors. (...)

Não consigo dizer que este meu bocado de terra, aqui in heaven, é uma floresta. Claro que não é. Gostava que fosse, que da terra brotasse riachos, que as águas se enchessem de peixes, que aparecessem esquilos, raposas, veados. Gostava mesmo. Talvez um dia. Mas, para já, tem árvores plantadas por nós e acredito que tudo aqui floresceu muito por força do meu grande amor -- e eu sinto-me revigorada e feliz de cada vez que por aqui ando.

Ainda não comecei a abraçar as árvores ou, sequer, a afagar a sua pele ou a falar com elas mas acredito que, quando o fizer, me sentirei ainda mais próxima da verdadeira essência da paz intrínseca da natureza. Hoje, mesmo ao fim do dia, quando as árvores pareciam banhadas por uma suave poalha dourada, tive vontade de fazê-lo. Depois pensei que também gostava de me deitar no chão, com o ouvido encostado à terra. Gostava de saber se se ouve o que se passa no seu interior. Mas depois, apesar de estar sozinha, receei achar-me ridícula e não fiz nem uma coisa nem outra. Parvoíces minhas.

A ver se esta segunda-feira, Dia de Portugal, o faço.


[Ver o João Miguel Tavares é que não vejo. Ele personifica tudo o que não quero para o meu País; parvoíce, estupidez, ignorância, futilidade, superficialidade, incapacidade para pensar com um mínimo de neurónios. A promoção absurda que Marcelo fez dele é coisa que não sou capaz de entender (ou de perdoar). O País merece melhores exemplos]
------------------------------------

Forest Bathing



How forest heal people



E um bom Dia de Portugal a todos.

segunda-feira, abril 08, 2019

Shinrin-Yoku





Só por pretensiosismo é que eu, falando em público e a sério, poderia referir-me ao pedaço de terra a que chamo heaven como floresta. Mas, para mim, é como se fosse: é a minha floresta, é o meu bosque tão querido. 


Choveu todo o dia. Nada de mais mas o suficiente para a terra estar molhada, a vegetação estar lavada, enfeitada com gotas, a quietude ainda mais limpa, os pássaros ainda mais felizes.

Pus-me a filmar para aqui mostrar e fiz três vídeos. Mas porque estava a chover e eu a segurar no chapéu de chuva com uma mão e a máquina com a outra, a coisa ficou mais do que imperfeita. Além disso, esqueci-me que não posso movimentar a máquina depressa demais. Por vezes, ficou a parecer um carrocel. Portanto, não os vou aproveitar. Tentarei, para a próxima, que fiquem melhores. E depois a vozinha. Baixinha, rouca, pouco mais que um sussurro. Não me dá jeito andar por ali a falar alto, sozinha. Então, a falar baixo e com o som da chuva a bater na sombrinha, fica impraticável. O meu marido quis ver e até estava a ver com atenção mas volta e meia, porque não ouvia, pedia para eu pôr mais alto. Só que, de facto, não dá para pôr mais alto: é um sussurrar que quase se confunde com o sopro do vento nas ramagens.


Tenho que aprender a transmitir o bem que me sabe e o bem que sinto que me faz andar por ali, respirando um ar tão sereno, tão cheio de paz, sem radiações, sem ruído, sem intrigas ou pressas, um ar perfumado e atravessado pelo canto dos pássaros. Ao aspirá-lo penso que parte daquele maravilhoso ambiente está a entrar dentro de mim, a percorrer as minhas artérias, a irrigar a minha mente, a minha consciência, a minha alma.

Se me analisassem o sangue ou o batimento do coração, não sei se seria visível o bem que isso me faz. Ando devagar, os pés pisando a caruma sobre a terra macia, passando a mão pelo alecrim, pelo rosmaninho, espreitando a madressilva a quer despontar, deslumbrando-me com as ervinhas que crescem por entre o musgo, as pedrinhas cobertas de bocadinhos de tempo. Absorvo tudo através de todos os sentidos, fico melhor pessoa, fico ainda mais tranquila e feliz, sinto-me agradecida.

Se calhar estou a praticar Shinrin-Yoku, o banho de floresta, isso que os orientais acreditam que é uma forma de curar o corpo e a alma. Consiste em simplesmente estar na floresta.
Shinrin-Yoku is the practice of spending time in nature for the purpose of enhancing health, wellness, and happiness. It is a Japanese term that translates into “forest bathing” - taking in the forest atmosphere.

Não sou dada a medicinas alternativas -- sou a favor de rigor e de coisas que se podem comprovar. Não sou dada a religiões, não sou dada a crenças, a metafísicas, não frequento clubes ou seitas, não alimento correntes, não me ponho como seguidora seja do que for, não tenho grupos nem sequer do WhatsApp, não tenho gurus, não tenho rituais, não alimento superstições. Nada. Cultivo orgulhosamente a minha natureza de bicho.

Mas acredito na tranquilidade que vem da natureza, acredito no poder infinito que emana da terra, acredito na beleza, na imensa beleza das árvores, das flores, das pedras, dos animais, do sorriso no olhar daqueles que amamos, na beleza imaterial das palavras boas que transportam a harmonia e a música que atravessa os céus, acredito na paz que pode crescer dentro de nós -- acredito na tocante generosidade da natureza, acredito na felicidade que ela nos traz.


....................................


Fotografias feitas in heaven este domingo