domingo, novembro 30, 2014

Natal, árvores de natal, reinvenção de antigos símbolos, o Congresso do PS, António Costa, a esquerda - "estes são os dias em que o frio desce sobre a terra"



estes são os dias em que o frio desce sobre a terra
e afasta as últimas sombras que o verão espalhou
tudo agora se recolhe na pura intimidade
para que em segredo se possa preparar o advento



Chegámos ao último dia de Novembro deste 2014 que tem sido tão avaro em boas notícias. Mais umas horas e estamos no último mês, a caminho do fim do ano. Pelo meio teremos momentos de festa em família, para quem a tem, e, por fim, despedir-nos-emos sem saudade deste ano, recebendo com expectativa o que aí vem.

É neste ambiente de fim de festa, de cansaço, desilusão e medo que o Partido Socialista se reúne em congresso tentando encontrar um caminho novo, e mobilização para o palmilhar.


Mas vamos com música, se não se importam

Giving up everything




Num dia atribulado é a custo que aqui consigo vir hoje fazer prova de vida. Não foi fácil o meu dia e pensei que não teria condições para aqui escrever qualquer coisa. Mas tenho isto de me parecer que estaria a baldar-me se não viesse. No trabalho também sou assim, ao fim de muitos anos mantenho a mesma exigência de nunca me baldar ou desenfiar que tinha quando comecei a trabalhar  No trabalho é o sentido do dever, acho que devo merecer aquilo que ganho. Aqui é quase isso também. O meu filho às vezes diz que já é vício, mas eu acho que não: é prazer. Mas, pensando bem, acho que é também dever. Recebo diariamente cerca de mil visitas (e por vezes mais do que isso: esta semana houve dias de mais de 4.000 visitas) e custa-me pensar que, se não escrevesse nada, poderia desiludir os Leitores que aqui se habituaram a vir. Recebo mails de pessoas que me dizem que é como se eu fosse a família que não têm, ou que se habituaram a ir ver o que eu escrevi mal ligam o computador ou que me escrevem mails pungentes relatando-me factos dolorosos da sua vida. Leio essas palavras e acho que nunca poderei fazer o suficiente para sentir que mereço a confiança e estima que depositam em mim.




as folhas que juncam o chão anunciam o negrume
traçam estranhos signos pelas avenidas
onde cães vadios lêem a avareza do nosso destino
e uivam incendiados pelo tempo que os abandonou



Por isso, apesar de já passar da uma e meia da manhã e com algum esforço, aqui estou.

Apenas nos últimos minutos consegui ouvir um pouco do que se tem passado no Congresso do PS. Melhor, apenas agora ouvi um pouco do discurso de António Costa e acho que falou bem, e falou com intensidade, de improviso, com convicção.

No entanto, apesar de não ter visto aquelas reportagens que costumam fazer nos congressos, há certamente mixed feelings entre os participantes. É como organizar-se um casamento quando um dos familiares mais próximos acaba de ser detido. Uns interrogar-se-ão sobre se haverá alguma coisa que justifique isto, outros terão muita pena pelo que ele está a passar. Uns tenderão a ter uma postura mais institucional, outros terão vontade de exprimir o que lhes vai na alma. Contudo, todos sabem que é hora do PS se unir, de se reinventar, reaprender a interpretar o sentimento do povo, ser criativo na forma de melhor dar um salto no sentido do desenvolvimento, não se deixando tolher por preconceitos, peias aparelhísticas, compromissos datados. O PS tem que saber ser diferente. Como partido socialista que é, tem que colocar as pessoas no centro de todas as políticas mas tem que ser rigoroso na prossecução de políticas de desenv e ter sempre presente que só faz sentido ser poder se for para ser melhor, para nunca abdicar dos mais puros princípios éticos, se for para trazer esperança e felicidade às pessoas.




diante dos meus olhos passam corpos em silêncio
e eu vou nesses corpos levedado pelo olhar
sou a frágil sombra que o frio em segredo dissolveu
sou o uivo que o tempo sobre a terra espalhou



Francisco, o Papa que irrompeu das cinzas de uma igreja retrógrada e corroída por escândalos, inconfessáveis vícios e hábitos antigos, tem vindo a mostrar que o segredo está na simplicidade e na proximidade.

Não sendo eu pessoa de crenças, é sempre com emoção que ouço Francisco. Não lhe ouço teorias, ilusões, ideais longínquos. Não. A Francisco eu ouço palavras de inclusão, amor, compreensão. Mas também, em simultâneo, ouço firmes palavras de condenação pelo que de mais torpe tem vindo a minar o crescimento económico, financeiro e moral. Francisco não é de meia palavras, frases de conveniência. Perante a injustiça, arrogância e maldade Francisco não se acobarda.

A esquerda tem que se reinventar nesta Europa decadente que perdeu o pé, o norte, a vergonha. A esquerda para mim deve ser moderada, sensata, pragmática mas, ao mesmo tempo, sensível e, ainda, firme, corajosa. A esquerda tem que ser capaz de contribuir para reafirmar a Europa.

A esquerda hoje não é mais a esquerda leninista, castrista, maoísta. A esquerda hoje deve visar sobretudo uma democracia social, livre, desenvolvida. Tem que ser uma esquerda capaz de encontrar o seu caminho por entre a mediocridade, os escolhos que o liberalismo mais trauliteiro e iletrado deixou espalhados pelo terreno como minas potencialmente devastadoras, uma esquerda que não se intimide, não se acobarde, não rejeite a emoção, a paixão dos grandes desígnios, que lute valorosamente. Se não se sentir paixão pela conquista de uma vida melhor para o nosso país, vai sentir-se paixão por quê?




Claro que se pode sentir paixão por uma outra pessoa, por um desporto, por um passatempo. Mas essas serão escalas do domínio privado, cabem dentro da vida de quem as sente. Agora a paixão pela luta por uma vida melhor para todos é maior do que isso, bem, bem maior - tem que ser.

Não é demais pedir isso a António Costa porque isso é o que se pede aos líderes de um partido. Os socialistas têm que encontrar dentro de si próprios o carisma, a força e a crença que os conduza nesse sentido e que faça com que os outros acreditem e se ponham a caminho a seu lado.




Palavras, palavras, palavras - dirão. E é verdade. Mas com palavras se descrevem os nossos sonhos e é sabido: os sonhos comandam a vida. Mas juntem a essas palavras outras ainda: despojamento, criatividade, simplicidade, entrega.

E de uma coisa estou eu muito certa: para bem do país, é bom que o PS consiga mobilizar o País nesse sentido. O terreno que o PSD e o CDS vão deixar não estará apenas minado: estará e já está habitado por larvas nefastas. A cobardia, a inveja, a maldade, a mediocridade desenvolvem-se doentiamente, reproduzem-se, multiplicam-se e no dia em que possam exercer a sua vontade, o País mergulhará numa noite que há muito se julgava longínqua, desintegrada - mas que está ainda viva e tão próxima que se lhe sente o fétido bafo.

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Caloroso é o apoio de Matteo Renzi, primeiro ministro italiano, a António Costa.

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As árvores de natal diferentes, bonitas e fáceis de fazer podem ser vistas aqui (num lugar onde há outras, todas interessantes).

O poema que aqui se encontra dividido sob as primeiras imagens é estes são os dias em que o frio desce sobre a terra e pode ser visto no belo blogue Kyrie Eleison.

A música lá em cima é Natalie Merchant interpretando Giving Up Everything

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(Sem rever e, portanto, pedindo desculpas pelas gralhas que devem ser muitas, por agora fico-me por aqui)

Desejo-vos, meus Carlos Leitores, um bom domingo.

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sábado, novembro 29, 2014

Ferreira Fernandes e João Miguel Tavares ou o 'pedaço de asno' que 'acha que engravida uma mulher só de olhar muito para ela'. Fernanda Câncio e Felícia Cabrita ou uma coisa em forma de Aproximadamente. O investigador e o suspeito segundo a Porta dos Fundos. A grávida religiosa. O político literato. O grande final de Paquita. [E se isto não é a Black Friday in UM JEITO MANSO então não sei o que é a black friday.]


No post abaixo já mostrei o Super-Juiz-Alex no Terço da Farinheira. Vale a pena ver para se perceber como ele é. Só gostava é de ver a letra do supersónico catador de milhões de provas (conforme li num jornal: no decorrer das buscas foram recolhidas milhões de provas. Gostava é de saber como é que se dá a volta, em tempo útil a milhões de provas mas, enfim, isso também não interessa para nada). Não sei se há documentos na net que tenham a sua letra manuscrita. Gostava de exercitar os meus dotes de grafóloga e, de caminho, tirar-lhe a pinta. 

Mas, enfim, o Super-Alex não é agora para aqui chamado, é só no post a seguir.

Aqui a conversa é outra. Noite de sexta-feira é noite de descompressão. Faz hoje uma semana que, quase acabada de chegar, pronta para uma noite descansada in heaven, recebi um sms da minha filha: 'Já sabes que o Sócrates foi preso?!'.  Então, estupefacta, quase à medida que ia sabendo do que se passava, fui escrevendo. Foi uma noite de sexta-feira atípica essa de há uma semana.

Uma semana depois, acabo de saber que Sócrates telefonou para o Expresso e disse que se sente mais livre do que nunca


Ri ao saber disto. É dele. E acredito que seja verdade, que se sinta livre. Se ele se sabe inocente, se tem grandes reservas de dignidade - e acredito que as tenha -, deve sentir que, quando tudo se tiver provado, voltará de novo a andar em liberdade, forte e lutador. Ou seja, se sabe que está inocente, José Sócrates sabe que sairá a ganhar desta guerra tão violenta.


E, portanto, a vida continua e uma sexta-feira continua ser uma sexta-feira. E esta sexta feira é a badaladésima black friday e o Um Jeito Manso, que gosta de se armar em fashion, alinha.


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Debica indícios cronista, debica, e bolça certezas
[diz Ferreira Fernandes a propósito de João Miguel Tavares, essa criatura que é uma de muitas que infestam os meios de comunicação social e que, sem rigor e ao sabor das suas inimizades pessoais, se arrogam o direito de insinuar acusações sobre quem querem - no DN ]



João Miguel Tavares que,
segundo Ferreira Fernandes,
é um pedaço de asno
(e eu é rara a vez que o leia ou ouça
que não pense a mesma coisa)

João Miguel Tavares julga que por olhar muitas vezes para uma mulher a consegue engravidar. Ora, o indício de um interesse não garante a prova do teste positivo. Ontem, defendeu, no Público, que os "fazedores de opinião", a expressão é dele, deviam culpar Sócrates porque "ali entre 2007 e 2011, (...) se não havia provas, havia infindáveis indícios". A tese é velha, muitos dizem-na assim: "Não há fumo sem fogo...", "Eu cá não sei, mas dele já ouvi do piorio..." Geralmente ouço o mesmo sentado no banco de trás, enquanto o taxímetro avança 

(Texto completo aqui, via o Chove)




NB: Este assunto tem uma sequela. João Miguel Tavares replicou e escreveu 'As 50 sombras de Fernandes' dando assim a resposta a Ferreira Fernandes. Sobre isto, falo aqui.

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Aproximadamente
[diz Fernanda Câncio no DN, respingando algumas das muitas contradições de Felícia Cabrita, revelando como, com o mesmo tom de suspeição, esta diz uma coisa e o contrário: ora são luvas, ora é herança, ora a casa é dele, ora é de outra pessoa, mas, seja como for, de tudo e do contrário Sócrates é culpado ]



Laura Passos Coelho com Felícia Cabrita,
a bógrafa do marido
Felícia Cabrita, 22 de novembro de 2014, TVI: "Estamos a falar de corrupção, toda a gente percebe. Este dinheiro tem a ver apenas com este período em que José Sócrates [JS] esteve à frente do país, de 2005 a 2011. (...) Terá recebido luvas no montante de 20 milhões de euros aproximadamente."

Felícia Cabrita, 22 de novembro de 2014, TVI: "Assim [com o esquema que imputa a JS, em que os alegados 20 milhões estariam em nome de um amigo mas seriam de JS, usando o amigo o dinheiro para comprar casas à mãe, que por sua vez o entregaria ao filho] JS pode justificar publicamente a vida que tem e a casa que tem Paris é paga com a herança que recebeu da mãe."


(Texto completo aqui no mesmo sítio)

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O SUSPEITO
(Porta dos Fundos)



Desculpem que transcreva o texto que acompanha o vídeo. Como sempre acontece, o texto não tem nada a ver com o vídeo mas, enfim, abre o apetite. O palavreado não é de salão mas a história não mete salão: mete sala de averiguações, mete um investigador a não conseguir dar conta do suspeito. Pode parecer que estou a escrever a propósito do Rosarinho ou do Super-Alex mas não, juro que é mesmo matéria da Porta dos Fundos. A ver é se nunca aparece um destes ao Super-Alex senão nem sei que medida de coação lhe iria ele aplicar. Credo, nem imagino. Se calhar frigideira - nem que tivesse que mandar construir uma lá no pátio da prisão de Évora.

Suspeito basicamente é o cara com cara de suspeito que se desconfia que tenha feito alguma merda. Quando não se tem um suspeito, enfia-se a porrada em algum cara suspeito pra que ele confesse ser suspeito mesmo não sendo suspeito de merda nenhuma. Quando se tem um suspeito, enfia-se a porrada do mesmo jeito pra ele deixar de ser otário e aprender que não devia ter cara de suspeito. Em outras palavras, ser suspeito não depende de você. A não ser que ser suspeito seja alguma tara erótica e te dê tesão. Mas aí eu sou suspeito pra falar. 




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A melhor short story




Um jornal dava um prémio a quem fizesse a melhor short story que envolvesse sexo, religião e mistério.

Depois de apurada selecção, o prémio foi para a seguinte:


"Oh meu Deus... estou grávida... Quem terá sido...?"




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A ESTRANHA BELEZA DA LÍNGUA PORTUGUESA




Um político que estava em plena campanha chegou a uma pequena cidade, subiu para o palanque e começou o discurso: 

“Compatriotas”, “companheiros”, “amigos”! 

Encontramo-nos aqui, “convocados ”, “reunidos” ou “juntos” para “debater”, “tratar” ou “discutir” um “tópico”, “tema” ou “assunto”, o qual me parece “transcendente”, “importante” ou de “vida ou morte”. O “tópico”, “tema” ou “assunto” que hoje nos “convoca”, “reúne” ou “junta” é a minha “postulação”, “aspiração” ou “candidatura” a Presidente da Câmara deste Município.

De repente, uma pessoa do público pergunta:

 - Ouça lá, porque é que o senhor utiliza sempre três palavras, para dizer a mesma coisa? 

O candidato respondeu:

- Pois veja, caro senhor: a primeira palavra é para pessoas com nível cultural muito alto, como intelectuais em geral; a segunda é para pessoas com um nível cultural médio, como o senhor e a maioria dos que  estão aqui; a terceira palavra é para pessoas que têm um nível cultural muito baixo, pelo chão, digamos, como aquele alcoólico, ali deitado na esquina.

De imediato, o alcoólico levanta-se a cambalear e 'atira':

- Senhor “postulante”, “aspirante” ou “candidato”, (hic) o “fato”, “circunstância” ou “razão” pela qual me encontro num estado “etílico”, “alcoolizado” ou “mamado” (hic), não “implica”, ”significa”, ou “quer dizer” que o meu nível (hic) cultural seja ”ínfimo”, “baixo” ou mesmo “rasca” (hic). E com todo a “reverência”, “estima” ou “respeito” que o senhor me merece (hic) pode ir “agrupando”, “reunindo” ou “juntando” (hic) os seus “haveres”, “coisas” ou “bagulhos” (hic) e “encaminhar-se”, “dirigir-se” ou “ir direitinho” (hic) à “leviana da sua progenitora”, à “mundana da sua mãe biológica” ou à “puta que o pariu”!

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Paquita Grand Finale
[Os Trocks em grande estilo]


 Les Ballets Trockadero de Monte Carlo, 
Música de Ludwig Minkus, Coreografia de Marius Petipa


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The end - até porque, à hora a que aqui estou a chegar no texto, já é sábado

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Relembro: para procissões cantadas nas quais desfila o Super-Judge Alex desçam, por favor, até ao post que se segue.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, um bom fim de semana. 

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Carlos Alexandre no Terço da Farinheira. O Super-Alex gosta mesmo da ribalta! Anunciou que também gosta de ir a Fátima e um dia destes lá teremos alguém a filmá-lo. Cá para mim, quando se reformar, ainda vai fazer presenças. Gosta de ser visto, o homem.


A coisa passa-se em Mação, a sua terra. Carlos Alexandre vai na procissão enquanto é filmado e depois o entrevistador interrompe-o e chama-o para uma entrevista à qual ele acede de bom gosto. Vê-se que gosta de verbalizar a sua opinião sobre a actualidade.


Estive a vê-lo até ao fim do vídeo. A forma de falar fez-me lembrar o Otelo o que não sei se é uma boa coisa num Super Juiz que tem tanto poder. 

Diz que se lembra bem da expressão 'quando o dinheiro fala, a verdade cala' e que ele nunca se deixou condicionar. Acho bem. 

Mas a sua opinião enquanto cidadão é uma coisa e outra, muito diferente, é usar a sua opinião como bitola de decisão nos processos sobre os quais tem que ajuizar. O pior é quando um juiz constrói uma narrativa do que é bem e mal para condicionar a sua decisão, e, em vez de ser um juiz imparcial que aplica secamente a lei, começa a querer pôr em prática o seu paradigma de moralidade, querendo ele próprio fazer aplicar a sua opinião do que é o bom caminho.

E a coisa torna-se tanto mais perversa quando, quase invariavelmente, nos casos mais mediáticos, as estações de televisão são avisadas antes dele chegar, quando o temos omnipresente, mediático, os media alimentados cirurgicamente com fugas de informação oriundas dos processos que estão nas mãos dele. Não sei se as fugas partem dele, se de outros (aliás seria grave demais se partissem directamente dele, acredito que não se exponha tão candidamente), o que sei - e sei eu e sabe o País inteiro - é que a sua figura é badalada até mais não. Aliás, isso é referido claramente no vídeo aqui abaixo e vê-se que é coisa que ele toma como elogio.

Pode ter um aspecto que se presta a que o digam rude. Contudo, os factos mostram-no com apetência para a política. A wikipedia diz que há quem chame a Carlos Alexandre o Gárzon português. Contudo, Gárzon foi impedido de exercer a magistratura em Espanha, acusado de várias coisas, incluindo de abuso de poder.



Vídeo de Carlos Alexandre na procissão




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sexta-feira, novembro 28, 2014

O Super-Alex voltou a atacar. Uma vez mais, o omnipresente Juíz Carlos Alexandre munido com 200 agentes e 14 magistrados passou 34 edifícios a pente fino. Bancos, casas, nada lhes escapou. Desta vez foi o BES mas esta semana fez o pleno. E vamos lá a ver o que é hoje.


No post abaixo homenageei alguns dos grandes do meu País que enobrecem o que nele é grande. De vez em quando há assuntos que me deixam feliz. Espero que também gostem.

Mais abaixo ainda, o espaço é de humor. Foi atar e pôr ao fumeiro: os Leitores a enviarem e eu a partilhar convosco. 


Mas isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra. É tempo de falar de Justiça, ou melhor, do nosso fantástico super-Justiceiro.

Ele está em todas. Numa mesma semana avia buscas, inquéritos, numa tarde produz um despacho de 250 páginas, sei lá: um verdadeiro Speedy Gonzalez.

Depois, a seguir, embrulha-se tudo, muitas vezes provas mal paridas, suspeições infundadas, trapalhadas, recursos, e geralmente nunca nada dá em nada. Mas isso não interessa. O super-Justiceiro deve mover-se por objectivos: revirar 50 casas por semana, fazer 100 horas de interrogatório por semana, produzir 600 páginas de despachos. Se isso vale de alguma coisa, ora abóbora, problema dos outros que ele já fez a parte dele.


E vá de Música, por favor.




Vou já avisando: não o conheço, não tenho fontes directas nem de alguma forma tenho inside information. Apenas sei o que leio nos jornais e ouço e vejo na televisão - mais nada.

Isto dito, deixa-me lá voltar à cold cow.

Não há dia que passe que o Super-Alex não dê nas vistas. Super-Mediático chama-lhe Proença de Carvalho e não o podemos negar: ele tem um comportamento super-sónico e as câmaras de televisão esperam-no para onde quer que ele vá. [Como é que as câmaras chegam lá antes dele é outro pormenor que também não interessa].


O super-Justiceiro Carlos Alexandre, o grande moralizador da sociedade portuguesa, aplica mão pesada em quem cospe no passeio ou diz palavrão, em quem dá pum, em quem esconde o bolo do primo ou apalpa o rabo da vizinha e, com um bocado de sorte, talvez se ocupe ainda de alguns criminosos a sério.

É que ele está em todas, senhores. Ora interroga o Ricardo Salgado para perceber para onde mandou ele os milhões que sumiram do BES, ora revira a Administração Pública a ver onde se escondem os malandros que aceitam garrafas de vinho a troco de favores a chinocas, ora revista farmácias e laboratórios a ver se descobre onde é que guardam as coisas que não apareceram nas primeiras buscas meses atrás, ora prende Sócrates e tenta descobrir em que gaveta da sua casa é que ele guarda as cartas que troca com a mãe ou manda revirar a garagem onde ele guarda os papéis a ver se descobrem quem o corrompeu (porque, caraças, alguém há-de ter sido), ora, alguns meses depois do alerta, volta à carga com o BES a ver se alguém deixou alguma prova esquecida - e por aí anda ele. Esta quinta feira parecia ir tudo de arrastão, casas do Salgado e de mais não sei quantos, banco, escritório de advogados, e sei lá que mais, trinta e quatro sítios revistados, uma festa. 


De cada vez que as noticias dão conta de que o Super-Alex anda pela cidade com 200 agentes à solta, a gente pensa: quem é que será que vai dentro desta vez? O que é que ainda falta passar pelo crivo do Castigador Super-Alex? Quem é que ele vai punir desta vez? E como vai ele exercer as punições: chibatadas, pimenta na língua, solitária, câmaras de televisões em tempo real apontadas à cara?

E a gente interroga-se ainda mais: mas será que são sempre os mesmos agentes ou há-os por aí aos montes, aos cachos, em resmas, paletes? É que, dia sim, dia não, a gente ouve que há nova investida, ouve que foram largados nada mais nada menos que 200 ou mais agentes e mais uma dúzia de magistrados. E, quando ouvimos isso, já sabemos: aí andam o super-Alex e o infalível Rosário Teixeira em nova surtida (aquele tal que, até hoje, ainda não acertou uma, umazinha que seja - pelo menos de entre as que se lhe conhecem). Uma dupla gira esta, Alex & Rosy.

É certo que com tanta busca, tanta prova, tantas horas de gravações, tanto material recolhido por tanta centena de agentes, tanto processo, tanto arquivo, tanta trapalhada, a coisa não poderia correr bem: cometem erros, dá ideia que se metem em tanta coisa ao mesmo tempo que depois não conseguem dar vazão, os processos arrastam-se durante anos, ensarilhando-se uns nos outros, uma seca. Ao longo de anos, chocam, chocam mas a gente nunca vê nascer nenhum pinto.

Outra coisa, ignorância minha: ainda não percebi bem - com esta coisa da separação de poderes e esta frase que não há papagaio que não repita, à política o que é da política e à justiça o que é da justiça - se cada um depende de cada qual, quem é que articula esta tropa e gere esta barafunda toda?

Será que uns são geridos pela Loura da Cruz e outros pela Vidal de Saias ou nem isso e estão em roda livre? 

E será que as duas se coordenam entre si para ver se a coisa corre bem ou a tal da separação de poderes passa por aí? Não sei, pergunto. 

O Super Alex e o fofinho do Rosarinho pertencem a filmes diferentes que apenas se juntam na ponta final ou andam unidos a ver se tramam bem tramados os suspeitos? O segundo apura provas e o outro, imparcialmente, vê se o Rosarinho não se excedeu? Ou estão sempre em sintonia? Pergunto, e perguntar não ofende.

A questão é que me preocupo com estas coisas, é claro que me preocupo, que eu cá sou lerdinha das ideias e não percebo nada disto.

Ponho-me à varanda a pensar nestas coisas complicadas, e só ouço as sirenes lá fora a cruzar as ruas, a cidade em estado de sítio, banqueiros e reguladores, polícias e notários, ex governantes e secretários gerais, farmacêuticos, enfermeiros e analistas, toda a gente suspeita, toda a gente a ser revistada, toda a gente de pulseira electrónica.

Bem que me ponho à varanda, uma catatua no corrimão a cantar-me cantigas de amor, e eu a tentar distrair-me, a imaginar que o super-Alex me vai aparecer aqui, me vai tirar para dançar, e eu linda, formosa, XL e fogosa, e as mangas desaparecem e transformam-se em alças e o decote insinua calientes desmandos e os cabelos crescem e tornam-se louros e ele põe um chapéu e arranja tempo para me fazer rodopiar no salão. Ah, que bom seria, que bom. 

Sonho impossível, o meu? Porquê? Se ele arranja tempo para tanta coisa porque é que não há-de arranjar um tempinho para vir aqui ter comigo, dançar no salão, os 200 polícias a guardarem o nosso slowzinho gostoso, o nosso segredo, o senhor do SIS a vigiar, e nós, ternurentos, a sussurrarmos palavrinhas doces*?

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* Fugas de informação? Quem é que falou em fugas de informação? Eu disse palavrinhas doces e, de resto, isto sou eu a imaginar, que eu, como é sabido, sou uma moça muito imaginativa, ora essa. O Super-Alex tem lá tempo para bailaricos e outros devaneios.


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As imagens representam pinturas de Fernando Botero. Mas a primeira imagem, a do senhor que está lá em cima a pensar se há-de dar uma perninha de dança, é o Super do Ticão, ou seja, o Juíz Carlos Alexandre a quem eu, porque sou dada a carinhos, aqui trato por Super-Alex.

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Tinha ideia de falar ainda no Estado Negreiro em que este desGoverno está a transformar Portugal, pegando em desempregados e pondo-os a trabalhar por tuta e meia. A indignidade a que esta gente obriga os desprotegidos e indefesos parece não ter limites. Mas já não consigo, estou muito cansada. A ver se amanhã.
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Relembro: no post já a seguir, o palco é dado, muito justamente, a gente muito boa que faz coisas muito boas, coisas que são Património Imaterial da Humanidade. Mais abaixo ainda é tempo de desbunda, de gargalhada e de humor (ainda que talvez a atirar para o humor negro)

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Tenho sono demais e não consigo reler o que escrevi. Por isso, por favor relevem barbaridades que encontrem.

Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela sexta-feira. 

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O palco aos grandes do meu País e ao que é grande no meu pobre País. Fado e Cante Alentejano são ambos Património Imaterial da Humanidade. Carlos do Carmo e os Cantadores Alentejanos.


Quando ouvi que a UNESCO tinha reconhecido o Cante Alentejano como Património Imaterial da Humanidade fiquei feliz e, como ando em maré de emocionar, deixei que as lágrimas me chegassem aos olhos assim que ouvi aquela boa gente a cantar.


É um canto que tem raízes na terra e que brota da alma das pessoas.

Gosto muito de ver e ouvir aquela gente, em comunhão, unida no canto tal como se une perante as adversidades da vida ou se une para festejar os momentos felizes.

O Alentejo é especial e belo em todos os meses do ano e as suas gentes, pelo menos as que conheço, são genuínas, francas, gente com quem se está sempre muito bem - e o seu canto é o espelho do Alentejo, da sua cultura despojada e das suas gentes.




Festas das Cruzes - Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento



Pudesse eu fazer uma grande, grande festa, juntando todos os meus Leitores (... bem, todos não, só os que não me insultam e gostam de por aqui passar), e teria como convidados Cantadores Alentejanos para nos irmanar a todos, não apenas entre nós mas também entre nós e a terra.


Mas convidaria também um Senhor que engrandece Portugal: Carlos do Carmo.

Há dias Carlos do Carmo subiu ao palco grande do mundo do espectáculo e, dedicando-o aos portugueses, recebeu um Grammy. Não é coisa pouca e é uma honra que alguém que se tem mantido fiel à sua arte, à tradição do seu País, leal às suas convicções, veja reconhecido o seu talento desta forma tão brilhante.


Já antes tinha dado a cara aquando da bem sucedida candidatura do Fado a Património Imaterial da Humanidade de que foi grande impulsionador. Portugal deve-lhe muito. Faz mais pelo prestígio de Portugal do que mil Cavacos Silvas* ou Paulos Portas - mas, enfim, não quero agora falar desses vendilhões da Pátria que por aí andam a vender o meu País dizendo que tem sol, mulheres bonitas e uma companhia aérea em cima da mesa.


Adiante.

O vídeo que convosco partilho aqui abaixo é muito bonito, muito íntimo, Carlos do Carmo e Bernardo Sassetti a nu, vivendo em sintonia e total entrega a beleza da música.



Carlos do Carmo e Bernardo Sassetti na gravação da música "Cantigas do Maio" 


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Já agora, os azulejos são outra das maravilhas do património artístico de Portugal. 

Estes que usei neste post encontram-se no Palácio dos Marqueses da Fronteira - de que aqui já falei a propósito de um maravilhoso dia de fim de verão em que festejámos o lançamento de um novo painel de azulejos da Paula Rego e de um livro conjunto, dela e de Antonio Tabucchi - , palácio habitado até há pouco por outra figura ímpar da cultura portuguesa, Fernando Mascarenhas.


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Caso vos apeteça um pouco de humor negro envolvendo Passos Coelho, alentejanos, porcos e motoristas, e os Cavacos vendendo Vistos Gold desçam, por favor, até ao post seguinte.


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Passos Coelho, o motorista, o alentejano e o porco. E a família Cavaco vendendo Portugal (sol, mulheres bonitas, companhias de aviação e, quiçá, Vistos Gold)


A propósito de porcos, acabadinha de chegar transcrevo uma anedota que Leitor atento, e a quem agradeço, fez o favor de me enviar. Quem não apreciar o estilo humor negro deverá abster-se de prosseguir a leitura.


A Morte do porco



O Passos Coelho e o seu motorista passeavam por uma estrada no Alentejo quando, subitamente, atropelaram um porco, matando-o instantaneamente.


O Passos Coelho disse então ao seu motorista que fosse até à quinta e explicasse o que tinha acontecido ao dono do animal.

Uma hora mais tarde, Passos Coelho vê o seu motorista a cambalear em direcção ao carro, com um charuto numa mão e com uma garrafa de uísque na outra. A roupa estava toda amarrotada.

- O que é que aconteceu!?? - perguntou o Passos Coelho.

O motorista respondeu:

- Bem... o dono da quinta deu-me vinho, a sua mulher, cigarros, e a sua charmosa filha de 19 anos fez amor comigo, apaixonadamente.

- Meu Deus! Mas o que é que lhes disseste?! - perguntou Passos Coelho.

- Disse: sou o motorista do Passos Coelho e acabo de matar o porco!


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[NB: Para que fique claro. Sou uma pacifista e nunca faria uma festa nestas circunstâncias, com ou sem equívocos.]


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A propósito da visita de Cavaco Silva e seu usual séquito (onde se inclui o vice-Portas) aos Emiratos Árabes Unidos, nomeadamente a Dubai e Abu Dhabi, recebi o seguinte desenho a que acho um piadão e que, como é bom de ver, provém do blogue 77 Colinas






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quinta-feira, novembro 27, 2014

Comunicado de José Sócrates a partir da prisão de Évora, "há cinco dias fora do mundo". O animal feroz que enjaularam e que dá pelo nome de Preso 44 está a acordar e, pronto para a luta, diz que "este processo só agora começou."


No post abaixo já falei das notícias que dão conta da fortuna que a família de José Sócrates tinha numa conta numa offshore e, supostamente, à pala da qual estão sob investigação no âmbito do Processo Monte Branco. Fiz as contas e retirei as minhas conclusões. (Os vasos comunicantes entre a investigação e o jornalismo linha branca continuam em grande estilo mas, enfim, nem foi sobre isso que falei).

Mais abaixo ainda, apresentei as minhas explicações aos Leitores que têm deixado comentários e que eu, mal agradecida, tenho deitado fora. E, em contrapartida, deixo-lhes um desafio.

Mas tudo isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra.


Desde que cheguei ao computador que estou com vontade de espairecer e tinha aqui uma na manga que era uma gracinha. 

Mas pus-me a ver os comentários, a varrer alguns, a proceder à devida desinfestação e o tempo foi passando.


Quando agora, finalmente, vinha fazer o gosto ao dedo, dou uma espreitadela pelas notícias e toda eu sorri. Ah menino lindo!


Mas, porque não há machado que corte a raiz ao pensamento, vamos com música, por favor.




E que vi eu?

Pois bem: um comunicado de José Sócrates ditado ao bacano do seu advogado, o Dr. João Araújo enviado à TSF e ao Público.




Li as palavras e o que me ocorreu foi que um lobo saído da noite uivou e uivou bem alto.

O que eu gostei de ler o que ele escreveu... E, também, o que eu gostei que ele o tivesse escrito!

Há quem os prefira mansarrões, cabeça baixa, sempre batendo com a mão no peito, sempre dizendo ámen, nunca levantando cabelo, sempre nas tábuas. Eu não. Eu gosto de gente que não se acobarda, que vai à luta, que se levanta, ergue a cabeça, olha sem medo, marra de frente. Assim, acho eu, são os líderes, os que têm carisma, os que sabem o que querem e não se deixam ficar pelo caminho.

Transcrevo pois, embora as suas inesperadas palavras estejam por todo o lado, não quero deixar de as ter aqui no Um Jeito Manso - embora preferisse que estivessem escritas sem respeitar o malfadado Acordo Ortográfico (mas, enfim, isso agora não interessa).



«Há cinco dias "fora do mundo", tomo agora consciência de que, como é habitual, as imputações e as "circunstâncias" devidamente selecionadas contra mim pela acusação ocupam os jornais e as televisões. Essas "fugas" de informação são crime. Contra a Justiça, é certo; mas também contra mim.

Não espero que os jornais, a quem elas aproveitam e ocupam, denunciem o crime e o quanto ele põe em causa os ditames da lealdade processual e os princípios do processo justo.

Por isso, será em legítima defesa que irei, conforme for entendendo, desmentir as falsidades lançadas sobre mim e responsabilizar os que as engendraram.


A minha detenção para interrogatório foi um abuso e o espetáculo montado em torno dela uma infâmia; as imputações que me são dirigidas são absurdas, injustas e infundamentadas; a decisão de me colocar em prisão preventiva é injustificada e constitui uma humilhação gratuita.



Aqui está toda uma lição de vida: aqui está o verdadeiro poder - de prender e de libertar. Mas, em contrapartida, não raro a prepotência atraiçoa o prepotente.


Defender-me-ei com as armas do Estado de Direito - são as únicas em que acredito. Este é um caso da Justiça e é com a Justiça Democrática que será resolvido.

Não tenho dúvidas que este caso tem também contornos políticos e sensibilizam-me as manifestações de solidariedade de tantos camaradas e amigos. Mas quero o que for político à margem deste debate. Este processo é comigo e só comigo. Qualquer envolvimento do Partido Socialista só me prejudicaria, prejudicaria o Partido e prejudicaria a Democracia.

Este processo só agora começou.

Évora, 26 de Novembro de 2014

José Sócrates»

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Poderia eu agora pôr-me a tecer comentários às palavras de José Sócrates mas, dado que já passa e bem das 2 e meia da manhã, limito-me a partilhar convosco as palavras de Proença de Carvalho no programa Pares da República na TSF sobre a Detenção de José Sócrates. 


Peço que ouçam. Peço que ouçam a comparação que ele faz com a Justiça antes do 25 de Abril, achando que regredimos. Proença de Carvalho não é socialista, não é soarista, não é um perigoso esquerdista, não é uma carpideira ou uma viúva de Sócrates. Muitas vezes me tenho referido a ele como uma eminência parda do regime mas, senhores, como gostei de o ouvir. Maria de Lurdes Rodrigues também fala, e fala muito bem mas, enfim, para os meus leitores mais cépticos pode não ser tão interessante, podem achar que não é isenta, que fala assim porque também passou por uma do além e porque foi ministra dele. Mas, então, ouçam, por favor, as palavras de Proença de Carvalho. Quem não tiver muito tempo, depois das suas palavras que vão mais ou menos até ao minuto 10 e picos (que são imperdíveis!), salte, por favor, ali para o minuto 18 e picos e deixe-se ficar a ouvir.

Carreguem aqui por favor e ouçam com atenção. As nossas opiniões são formadas com melhor conhecimento de causa quando ouvimos a opinião de quem sabe do que fala.


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A música lá em cima é Manuel Freire interpretando a Livre com letra de Carlos de Oliveira e música dele próprio. É acompanhado pelo mestre Fernando Alvim.

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Relembro: descendo há mais dois posts e eu tenho agora tanto sono que nem vos vou maçar a dizer sobre o que são.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa quinta-feira.



"Família de do ex-primeiro-ministro José Sócrates tem 383 milhões em offshores". "O número, astronómico, é o somatório dos movimentos bancários de uma empresa" cujos gestores são o tio, uma tia e primos do ex-primeiro-ministro José Sócrates", dizem notícias antigas postas outra vez a circular. Ora bem, então vamos lá outra vez a ver se a gente se entende.


Como referi no post abaixo - no qual deixei uma sugestão aos comentadores que não têm visto os seus comentários aqui publicados - tenho tido a caixa dos comentários a deitar por fora, uma coisa nunca vista. Muitos vão direitinhos para o lixo e, daí, no post a seguir, ter uma explicação para os lesados.

Mas há uns comentários que, de tão repetidos, merecem aqui uma resposta em post autónomo. Refiro-me a uns que transcrevem notícia antiga do Correio da Manhã e que hoje teve um refreshment no Sol e que já ouvi papagueado na TVI. Uns repetem outros, que repetem outros, que repetem outros, até que toda a gente repita como se de uma verdade inquestionável se tratasse. Assim funciona a boataria, a coscuvilhice. E depois ainda há quem venha, com ar de quem tem muita experiência na vida, dizer que onde há fumo, há fogo

Eu já transcrevo a notícia mas antes deixem que vos conte.


Imaginem um pequeno restaurante que, continuemos a imaginar, seja de tios e primos meus. 

Suponhamos que, por dia, são servidas 50 refeições a uma média de 10 euros cada. Teremos então 500 euros todos os dias, isto é 15.000 por mês, que entrariam na conta bancária

Mas todos os dias é comprado peixe, carne, legumes, fruta, etc, as matérias primas para confeccionar os pratos. Vamos supor que gastam 250 euros por dia. Teremos, pois 7.500 por mês. E há que pagar a renda do restaurante, e água, gás, electricidade, telefone, suponhamos 2.000 por mês para tudo isso, e mais os modestos ordenados, vamos supor 1.500 por mês. E há que pagar IVA e demais contribuições e há que pagar seguros, limpezas e sei lá que mais e, para facilitar os cálculos, admitamos que tudo isso fica em 4.000. Ou seja, no total teríamos 15.000 euros de despesas que sairiam da conta bancária.

Conclusão: coitados, a trabalharem todo o santo mês e são uns tesos, chapa ganha, chapa gasta, ou seja... saldo zero.

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Mas admitamos que alguma criatura avessa a matemática (ou de má fé) pegava no extracto bancário da conta do restaurante dos meus tios e primos, somava os movimentos bancários todos (os de entrada e os de saída) e concluía que essa conta tinha movimentado 30.000 euros (= 15.000 + 15.000). Não estaria errado de todo dizer isso, de facto, ao todo teriam sido movimentados os 30.000 euros, mas, se atendermos que uns eram movimentos de dinheiro a entrar e outros de dinheiro a sair, quem não prestasse atenção, concluiria Eh pá! gente rica! 30.000 euros por mês, ou seja 360.000 por ano! 

Se quisesse impressionar, até poderia pegar nos movimentos de 3 anos, chegando à linda quantia de 1.080.000€, ou seja, uma pequena fortuna! Poderia dizer: Os tios e primos daquela ali do blogue Um Jeito Manso têm uma empresa que movimenta autênticas fortunas! A soma dos movimentos bancários ultrapassa um milhão de euros!

E, no entanto, lá está, nem um tostão de saldo.

E mais: se a conta é de uma empresa dos meus tios e primos, por que raio tenho eu de ser metida na conversa? É que nem pouco mais ou menos. Sei lá eu das contas dos meus familiares. Era o que faltava.

Mas, sobretudo, somar todos os movimentos de uma conta bancária e chegar a um número bombástico pode dar parangonas no Correio da Manhã mas, de facto, apenas revela burrice, descredibilizando quem produz e divulga notícias destas.

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Finalmente transcrevo a notícia que Leitores - que querem pôr à prova a minha sanidade mental - me têm enviado e que está na base de notícias recentes do Sol e que há pouco ouvi na TVI:

O Correio da Manhã conta hoje que a família de do ex-primeiro-ministro José Sócrates tem 383 milhões em offshores. Os documentos foram entregues por Mário Machado. Acrescenta o CM que a empresa criada em 2000 no paraíso fiscal de Gilbraltar movimentou autênticas fortunas. Gestores são tio, tia e primos de Sócrates.
O número, astronómico, é o somatório dos movimentos bancários de uma empresa com sede em Caimão, cujos gestores são o tio, uma tia e primos dos ex-primeiro-ministro José Sócrates. A escritura da empresa foi feita em Gibraltar em 2000 e os documentos bancários relativos à mesma encontram-se no Departamento Central de Investigação e Acção Penal do Ministério Público, conta o Correio da Manhã.

Lá está, 380 milhões que resultam do somatório de movimentos. Linda coisa. Assim se faz o jornalismo em Portugal: imprecisões, manipulações, parvoíces. E assim se alimenta a coscuvilhice acéfala de tanta gente que por aí anda à cata de milho para pardais.
 

Como é óbvio sou totalmente contrária às contas em offshores, não conheço os tios e primos de Sócrates de lado nenhum nem faço ideia das verbas que têm nas contas bancárias, nem sei, nem me interessa se o dinheiro vem da herança da família ou se encontraram uma carteira debaixo de uma pedra. O que sei é que, se se quiser saber a riqueza de alguém ou de uma empresa, tem que olhar para o saldo e não para o entra e sai. 


Gosto que me enviem notícias, informações mas, por favor, não me enviem lixo, palermices. Sou pessoa dada a números, não é fácil deixar-me ir na cantiga de quem não respeita a lógica, o rigor, a verdade dos números.





Se o que está em causa é a honorabilidade de Sócrates, que a Justiça cumpra o seu papel, julgando com imparcialidade e verdade. A Justiça - não aqueles que não percebem sequer que não se soma alhos com bugalhos, nem percebem que uma pessoa não pode ser julgada pelos actos de outros.

Please.

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E agora desçam por favor para verem o conselho aos Leitores que me andam a enviar coisas como as que acima referi, ou conversas que metem insultos, porcos, maçonarias ou descortesias. 

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Oh meus Caros Comentadores que gostam de escrever sobre porcos, maçonarias, carros de alta cilindrada, contas bancárias e outras coisas do género, vamos lá a ver se a gente se entende, ok?


Como já no outro dia aqui o disse, isto agora, desde a detenção de Sócrates, é um ver se te avias de comentários impróprios para consumo.


Há um comentador que tem verdadeira pancada por porcos, uma coisa que nem sei se não será caso para concorrer à próxima Casa dos Segredos ('o meu segredo é: eu tenho um fétiche por porcos').

Há outro que gosta de se fazer passar por um habitual Leitor que antes se assinava por Bob Marley e eu a esse também aconselho que consulte um psicólogo que isso de querer assumir a identidade de outro também me parece uma coisa assim para o estranho (porque é que foi embicar com o Bob Marley? porque é que, em vez de copiar o nome do seu vizinho, não inventou um nome mais adequado a um tuga estiloso, uma coisa tipo Quim Barreiros, por exemplo?). 

Depois há outro que envia longos textos sobre a maçonaria como se estivéssemos a viver debaixo da alçada de sociedades secretas (e eu nem digo que não, sei lá, mas, com tanta convicção até me admira que não tenha também uma teoria sobre a Trilateral ou o Bilderberg, coisa mais em grande).

E há os que enviam palermices, coisas que nem se percebe a que propósito vêm ou insultos a este, àquele e ao outro.

Volta e meia, apesar do descabimento, acho a coisa tão divertida ou aberrante que até publico mas, outras vezes, esses comentários vão direitinhos para o espaço.

Por isso, porque não gosto de as fazer pela calada, aos que não têm o prazer de ver as suas palavras plasmadas no Um Jeito Manso, quero deixar uma sugestão: porque não fazem um blogue vosso onde destilem o vosso humor, a vossa criatividade, a vossa falta de chá, o vosso mau feitio, o que quiserem? 

Vá lá, tentem, vão ver que são capazes. Guardem o vosso mérito e talento para blogues lindos feitos por vocês, está bem? Força!

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Ou seja:


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quarta-feira, novembro 26, 2014

Sócrates e as suas personas






A noite passada dormi mal e, durante o dia, por mais do que uma vez, me senti profundamente triste. Ver um homem que já teve tanto poder, um homem orgulhoso, batalhador, agora assim, exposto como um animal aprisionado, vê-lo num carro da polícia ou com um saco de plástico na mão, cercado de polícias, parece-me de uma violência excessiva. Não me parece aceitável que se sujeite uma pessoa a tal humilhação. Atentar contra a dignidade de uma pessoa é sempre deplorável e saber de Sócrates nesta situação entristece-me mesmo.

Li há pouco, no Público, um artigo de José António Cerejo (que tenho por jornalista persistente) no qual ele descreve suspeições antigas de que Sócrates facilitava negócios aos amigos na zona da Covilhã, já lá vão quase 20 anos. Estar-se-ia então nos áureos tempos dos grandes investimentos públicos, das facilidades, das euforias. Não me lembro de Sócrates dessa altura. Teria ele trinta e tal anos e olho para as fotografias dele, de então, e não tenho grande ideia. Era Secretário de Estado, vejo na wikipedia. A ser verdade o que Cerejo refere, seria ele, então, um facilitador, alguém bem posicionado que agilizava contactos? 


Oriundo de uma família com posses, neto de um avô muito rico, filho de um arquitecto, Sócrates não precisava de sujar as mãos para ter dinheiro já que ele lhe viria parar às mãos por via da família.

Devo até confessar que, sendo a mãe dele uma mulher com posses, filha de um dos senhores do volfrâmio, me fazia espécie que (agora, infelizmente, sem outros filhos que não este) não pusesse já parte do dinheiro e dos bens em nome do filho. Não percebia que tivesse ele que se endividar quando teria dinheiro que poderia ir herdando ainda em vida da mãe. Mas, enfim, coisas de cada família.


Por isso, também sempre achei que, sendo ele um lutador a favor do desenvolvimento do país, um homem de convicções tão fortes e tendo uma fortuna considerável a herdar, não iria nunca macular a sua reputação a troco de dinheiro.

O que se veio a saber durante a sua governação - os projectos de moradias que assinava, as cadeiras que fez de forma talvez apressada para passar de engenheiro técnico a engenheiro (depois de entre um diploma e outro ter frequentado Direito e Engenharia no ISEL) - tudo me parecia coisa menor, ligeirezas que não aprecio mas às quais fechei os olhos pois entendi como coisa do passado, de uma altura em que se sabia ser isso algo que se fazia a pontapé, sem grandes preocupações morais.
Uma vez um amigo meu muito de direita gozava com o Sócrates e dizia-me que se espantava por eu, de moral tão estrita, não saltar a pés juntos em cima do então primeiro-ministro. Lembro-me de lhe ter respondido que não queria o Sócrates nem para meu marido nem para marido da minha filha (até porque tem idade para ser pai dela) e que, para se ser um bom governante, não tem que ser o nosso melhor amigo ou um candidato ao nosso coração.

Contudo, se, até ele ir para a frente do PS e do Governo, eu mal tinha dado por ele, depois fui ganhando apreço pelo seu desempenho. Não posso dizer que o achei excepcional em todas as áreas mas achei-o francamente bom em várias. Sócrates tinha e tem uma visão de progresso para Portugal e mostra, nas suas opções, ter respeito pela dignidade humana  e, melhor ou pior, andou para a frente, foi à luta, entregou-se de corpo e alma.

Cometeu erros, e como poderia não os cometer se é humano?, mas o primeiro governo foi muito bom. A economia deu um salto no sentido da industrialização, apostou no ensino, apostou e muito na investigação, a ciência e o conhecimento em Portugal passaram a ter grande prestígio, não desprezou a cultura, apostou e ganhou a batalha da modernização administrativa. Conteve o défice e não se atirou para fora de pé no que à dívida pública diz respeito. Infelizmente, a seguir veio a crise financeira internacional que afectou especialmente os países com uma base económica menos robusta, veio a queda da Grécia e, a seguir, a da Irlanda, vieram as indecisões da Europa, veio a instabilidade por ser um governo de minoria cercado por uma união espúria entre a esquerda e a direita - e Sócrates perdeu o pé.

Cercado, acossado, sem qualquer apoio (incluindo por parte de Cavaco Silva), esmagado por insinuações torpes, calúnias permanentes, e querendo resistir, resistir até à última, Sócrates portou-se como um animal feroz, atirou à esquerda e à direita, incompatibilizou-se com jornalistas, comprou guerras. Muitos não lhe perdoaram e fizeram-lhe a vida ainda mais negra.

Até que perdeu a última batalha, perdeu a guerra. Retirou-se, saíu do País. Foi viver com um dos filhos e foi, também ele, estudar. Os que o odiavam não lhe perdoaram. Por algum motivo acharam que ele era um pé rapado, alguém que deveria viver como um pobrezinho, alguém que não teria o direito a viver em Paris, muito menos a estudar Ciências Políticas. Se ele tivesse continuado em Portugal seria espezinhado e, qualquer trabalho que arranjasse, serviria para dizerem que estava feito com a empresa. Ora, afastando-se e indo estudar, já não o poderiam atacar - e, portanto, entretiveram-se a gozá-lo, a desprezá-lo, a desvalorizar o mestrado que fez (e que terminou com a melhor nota naquele domínio), a tentar perceber de onde lhe vinha o dinheiro. 




Ao longo dos anos em que o fui observando no governo, fui achando que ia ganhando maturidade, alargando horizontes, sedimentando uma visão mais sólida e abrangente da vida. Provavelmente ele próprio olhará para esse outro que foi no século passado com algum distanciamento. Contudo, leio que não esquece amigos e, portanto, mantém a amizade aos conterrâneos de juventude.




Ficarei muito triste e desolada se se vier a provar que aceitou dinheiro de que não precisava ou que escondeu dinheiro para não pagar impostos, e tenho esperança de que tudo o que se está a passar não passe de um equívoco ou coisa estúpida de um passado longínquo, quando era imaturo, ainda não homem feito.

Seja como for, enquanto vou ficar à espera que a Justiça seja rápida, justa, humana e que se prove tudo o que houver a provar ou, preferencialmente, que se prove que não há nada, vou ter esperança que os que irracionalmente já se precipitam sobre o que tomam por cinzas de um homem morto caiam em si, percebam a injustiça, a inclemência da sua atitude perante a detenção de José Sócrates, percebam o quão primária e indigna é a sua atitude justicialista perante um homem que ainda nem acusado* foi e que, do que lhe conhecemos, estará longe de ser um homem morto.


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* Sobre a questão da pré condenação na praça pública por se admitir que se alguém foi detido é porque alguma coisa há, permito-me transcrever parte de um texto que me chegou às mãos, um texto muito bem fundamentado, escrito por quem sabe do que fala. 

Conviria que alguém reconstituísse a história do Ministério Público no pôs-25 de Abril, de como ele assumiu algumas prerrogativas da polícia política e que prerrogativas são essas. 
Ou de como o DIAP de Lisboa gosta de evocar a sua taxa de sucesso, sempre acima dos 97% de eficácia, esquecendo-se de precisar que essa percentagem se refere ao números de inquéritos sobre os quais se deduz acusação e não ao número de acusações do DIAP de Lisboa que vencem em tribunal judicial: menos de 3% !!!!

E, nem de propósito, pode ler-se no DN, a propósito de Rosário Teixeira, que dirige as investigações do Caso Marquês que:


À volta de Jorge Rosário Teixeira já foram criados quase todos os tipos de mitos: um dos homens mais poderosos do país (chegando a integrar uma lista do Jornal de Negócios), especialista em crime económico, um "monge" que passa os dias e as noites no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), um investigador meticuloso... Porém, o magistrado de 52 anos tem contra si a sempre desconfortável estatística: nos últimos anos, não há memória de uma condenação em tribunal de um processo, sobretudo mediático, por si investigado.

Pois.
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O inominável insecto de Kafka.
A barata esmagada de Clarice.
No mar de rosas, a gilete escondida
no sabonete do filme de Ana Carolina.
Tudo tão íntimo assim, insistente
formam o refrão aflitivo
retido dentro do pensamento.
Nunca mais deixa de tocar:
obsessivo obstáculo, moto-perpétuo
inesquecível metamorfose.


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E agora, porque preciso de desanuviar, um momento de quase silêncio




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Lá em cima Leonard Cohen interpreta The Partisan

O poema é Na pedra repetente do poema de Armando Freitas Filho in Relâmpago Nº 34

O bailado é um pas de deux com coreografia de Uwe Scholz numa interpretação de Maiko Oishi e Rémy Fichet sobre Concerto para Piano de Mozart (3º movimento)

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa quarta-feira.


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