De que coisa é feita o amor? Que mistério é esse que aproxima quem antes se ignorava? Com que invisíveis laços se unem pessoas que antes nem se pressentiam?
Pode amar-se alguém cujo olhar nunca se tocou? Podem as mãos não se tocar e os corações já se sentirem próximos?
Não sei.
Nem sei em que momento se pode usar a palavra. Pode ser apenas uma curiosidade, uma vontade de descoberta, a intuição de um afecto que se esboça, uma aproximação de interesses, pode ser só isso, nada de mais. Pode nem ser amor. Ou pode até nem ser importante saber qual a palavra a usar. Talvez a palavra só sirva para atrapalhar, ser como que um compromisso desnecessário, ou uma ameaça. Pode ser até mais cómodo fazer de conta que nem se suspeita disso.
Olho os retratos de Gala e tantos são eles e não a acho atraente. E, no entanto, que paixões despertou.
Do que sei (ou julgo saber), o que faz com que dois seres se sintam próximos de uma forma especial e queiram manter-se assim e cada vez mais e cada vez mais, não é algum aspecto físico em particular, não é a voz, não é o olhar, não é a inteligência, não é a sensualidade, não é a generosidade, não é o apelo da sedução, não são ss afinidades: é a mistura harmoniosa de todos estes factores e de outros e é a forma como um completa o outro, como um consegue aproximar-se do outro, como um consegue tocar o outro, como um se deixa invadir pelo outro.
Talvez tenha sido isto que Gala conseguia junto dos homens que a amaram.
Max Ernst, Gala Dali e Paul Éluard
Elle est debout sur mes paupières
Et ses cheveux sont dans les miens,
Elle a la forme de mes mains,
Elle a la couleur de mes yeux,
Elle s'engloutit dans mon ombre
Comme une pierre sur le ciel.
Elle a toujours les yeux ouverts
Et ne me laisse pas dormir.
Ses rêves en pleine lumière
Font s'évaporer les soleils,
Me font rire, pleurer et rire,
Parler sans avoir rien à dire.
poema dito por Gilles-Claude Thériault
Éluard et Gala casaram-se em 21 de Janeiro 1917
Un poème, comme une tentative de surmonter un amour agonisant : l'infidélité de son égérie russe, de sa muse Gala avec le peintre allemand dadaïste Max Ernst, sorte de 'ménage à trois', et son départ avec Salvador Dali.
« Ta chevelure glisse dans l'abîme
qui justifie notre éloignement. »
Entre un passé heureux et quelques souvenirs, la brisure du lien amoureux.
No post abaixo falei da humilhante prova para liquidar a dignidade e o amor próprio dos pobres professores que se vêem confrontados com a necessidade de se submeter a uma coisa alarve destas.
Mais abaixo ainda falei da grave doença da Saúde em Portugal às mãos da grande espingarda que nos saíu o Paulo Macedo que ainda se mantém ministro, e, para não correr o risco de falar do que não sabia, dei a palavra a um médico.
Mas isso é a seguir. Agora, aqui, a conversa é outra.
Somos nada na imensidão do espaço, errantes partículas perdidas num infinito incolor e quase silencioso, povoado por infinitos objectos flutuantes.
Num infinitamente pequeno planeta que gira monotonamente em volta de uma das infinitas estrelas desse infinito universo pululam pequenos seres das mais variadas espécies. Nós somos uns desses insignificantes seres, os mais irracionais de todos os seres que habitam o pequeno planeta azul. Enquanto os outros se limitam a sobreviver da melhor forma, nós afadigamo-nos a destruir-nos uns aos outros ou a desperdiçar o curto espaço de vida que nos é dado com teorias absurdas, agonias, angústias inúteis.
Eu sou um desses seres. Invejo a felicidade das árvores, a serenidade das rochas, a liberdade dos pássaros. Quis o acaso que tivesse vindo a este mundo sob a forma de mulher. Tento não me atormentar nem atormentar os outros mas pela força da organização deste mundo humano, não posso usar o meu tempo apenas a fazer aquilo que a cada momento me daria mais prazer.
Gosto de aprender e, se pudesse, dedicava a minha vida essencialmente a actos que me proporcionassem a aquisição de mais e mais conhecimento – para além, claro está, de assegurar a minha sobrevivência, procriar (enfim, procriar propriamente dito, já cumpri com o que tinha a cumprir), cuidar das minhas crias e das crias das minhas crias, cuidar da minha toca, estar ao sol ou recolhida junto a uma lareira nos dias de frio, passear, nadar, andar junto à beira de água e etc.
Mas tenho que fazer mais do que isso e, portanto, o tempo para fazer aquilo para que a minha natureza me puxa é escasso.
Mas não me queixo. De vez em quando o acaso coloca no meu caminho outros seres que me trazem mais conhecimentos e, com isso, iluminam ainda mais a minha vida.
À hora de almoço estive por minha conta e, à solta, voltei a prevaricar. Ainda os últimos não arrefeceram e já trouxe mais uns quantos. É aquele medo absurdo de que alguma coisa me possa suceder e me impeça de comprar mais. O meu lado irracional leva-me a ter comportamentos de açambarcadora. E a felicidade que eu sinto quando os escolho e quando os transporto e quando lhes tomo o pulso...!
Mal cheguei a casa, pu-los em cima da cama e fotografei-os, lindos meninos. E que me perdoem os meus Leitores com dificuldades económicas que isto, ao preço a que eles estão, até pode parecer ofensivo para quem mal tem com que comer o mês inteiro quanto mais gastar tanto dinheiro em livros. Mas a verdade é que os comprei e que não é por escondê-lo que as finanças dos meus Leitores mais desfavorecidos ou a atravessar um momento de tristeza e preocupação vão ficar mais folgadas.
Amanhã ou outro dia falarei um pouco deles. Terei forçosamente que vos mostrar o belo livro Cesariny - Em casas como aquela, com texto de José Manuel dos Santos de cuja escrita eu tanto gosto (e relativamente a quem continuo a ter pena que tenha tenha saído do Expresso) e fotografias de Duarte Belo, o talentoso filho de Ruy Belo.
Mas o que me levou até à livraria tão pouco tempo depois de ter trazido aqueles de que vos falei no outro dia foi a vontade de recordar Éluard e conhecer Cioran. Do primeiro tenho um livro em tradução portuguesa e não o encontro. Do segundo nunca tinha lido nada. Guiada, fui ao encontro de dois livros. Mal tive tempo de os folhear e, no entanto, a felicidade que já se desprendeu deles.
Pudesse eu, ah meu Deus, pudesse eu escolher a sombra mais fresca do regaço de uma árvore ou o encosto mais macio de uma rocha ao sol e deixar-me estar um dia inteiro a lê-los, só a música da aragem nas folhas, o cantar dos pássaros e eu a ler os poemas de Paul Éluard e a lucidez cristalina de E. M. Cioran.
Não fora o sono que tenho e pôr-me-ia aqui, de gosto, a exercer o mister de copista. Mas não consigo, já mal me tenho de olhos abertos e, por isso, passo a palavra.
Cioran na primeira pessoa
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ÉLUARD, Paul - La courbe de tes yeux.
(...)
Parfums éclos d'une couvée d'aurores
Qui gît toujours sur la paille des astres,
Comme le jour dépend de l'innocence
Le monde entier dépend de tes yeux purs
Et tout mon sang coule dans leurs regards.
Paul Eluard : Liberté
(...)
Sur la santé revenue
Sur le risque disparu
Sur l’espoir sans souvenir
J’écris ton nom
Et par le pouvoir d’un mot
Je recommence ma vie
Je suis né pour te connaître
Pour te nommer
Liberté.
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A música lá em cima é de Philippe Gaubert "Soir PaÏen" numa interpretação de MirAnDa Trio (MirAnDa Trio - Mirjam Rietberg (harp), Anna Azernikova (soprano), Dasha Beltiukova (flute), video - Masha van Berkel
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Relembro que no post a seguir falo do estado da desEducação e mais abaixo ainda falo da maceda doença que atacou a Saúde.
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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa quinta-feira.