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segunda-feira, agosto 25, 2025

Um dia em forma de assim

 

Hoje foi dia de rega manual. O sistema de rega não chega a todo o lado, nomeadamente a vasos ou a trepadeiras ou arbustos plantados no terraço. Já devo ter contado que é tarefa minha e que a faço de gosto, geralmente com pouca roupa vestida e descalça. A pouca roupa não se prende só com o facto de ser encalorada mas também porque ao puxar pela mangueira, volta e meia alguma coisa se solta e apanho um valente banho. Não me importo nada, sabe-me até bem, mas assim é mais fácil de secar do que se andasse vestida da cabeça aos pés. E isso foi uma das partes boas do dia.

Há alguma relva que parece não querer ficar saudável e verdinha e temos vindo a adiar a decisão de a substituir, nesses sítios, por outra coisa, supostamente por um tal trevo branco anão. Teremos que ir comprar as ditas sementes, ver qual a melhor altura para a semeadura, depois deitar mãos à obra e tapar. Sempre que tentámos semear qualquer coisa, nomeadamente relva, não tivemos esse cuidado e os pássaros chamaram um figo às sementinhas. 

Tirando isso, tivemos que ir à cidade pois temos andado com uns certos e determinados compromissos, coisa que tem dado algum trabalho e que a mim me tem trazido um bocado enervada pois sou muito germanófila no rigor do cumprimento do que se combina e tenho que tentar controlar-me para não mostrar excessiva irritação quando lido com pessoas que se estão a marimbar para o que está acordado, que acham que tanto pode ser assim como assado, tanto pode ser agora como quando calhar e que consideram que os compromissos estabelecidos foram um mero pro forma que não interessa nem ao menino jesus. O meu marido tenta pôr água na fervura e os meus filhos também aconselham alguma relativização. Mas, para mim, há uma ética, que é inegociável, no cumprimento dos compromissos. Não me desvio um milímetro do que se combinou e respeito escrupulosamente os outros. Por mais que me digam que ética é coisa que escasseia ou que gente imprestável é o que mais não falta, a mim custa-me fazer de conta que está tudo bem quando está tudo virado às avessas. Apetece-me espernear à força toda, confrontar ou penalizar quem se está nas tintas para o rigor, para a ética, para o respeito.

Mas, enfim, também compreendo que a vida é mais do que o somatório de todas as pequenas parcelas que a constituem, pelo que, por vezes, mais vale passar por cima das parcelas enviesadas, fazer de conta que nem as vemos, e tentarmos focar-nos nas parcelas escorreitas e na seiva que as irriga e nos bons sentimentos que alavancam o nosso bem estar. 

Portanto, siga o baile.

Estando na cidade, passámos por uma daquelas lojas de pão da moda, daquelas todas xpto, todas alto décor (e alto preço), todas biológicas e artesanais. Foi o meu marido que deu por ela e que sugeriu que entrássemos. O cheirinho daquilo é altamente convidativo. Esfomeada como sou e altamente amante de pão, fiquei logo cheia de vontade de experimentar aquelas variedades mais estranhas. Mas, depois, lembrei-me que, agora que os três leões da família também já fizeram a festa toda (depois de me terem feito comer bolo e mais bolo... isto a seguir aos três caranguejos), está mais que na altura de voltar a tentar fechar a boca. Portanto, foi o meu marido que escolheu: um de espelta e outro de centeio, tudo massa mãe. Mas depois vi uma focaccia de azeite e de alecrim e não resisti. Vi também um brownie de chocolate e pistácio e também não. Mas, em minha defesa, direi que não era um brownie, era uma partíula de brownie, ainda por cima uma partícula estupidamente minúscula. Cada um de nós dois deu uma dentada e o bolículo desandou. Mas era bom. Lá isso não vou negar. Não resisti também a uma espécie de pãozinho fofo com uns tininis de coco. Mínimo também. Não sabe a nada nem é doce. Não achei graça. O meu marido disse que não era mau.

E, feita maria deslumbrada de visita à cidade, ao passar por uma loja de coisas para a casa, entrei e, como sempre, fiquei estupefacta com a quantidade de apetrechos para tudo e mais alguma coisa. Resisti a trazer toda a espécie de bugigangas, algumas das quais tinha que ler na embalagem para perceber o que eram e para que serviam de tão desconhecidas para mim. Mas trouxe uns individuais para a mesa da casa in heaven pois os que lá temos já estão um pouco usados e é mais fácil usar individuais laváveis do que, de cada vez, estar a usar uma toalha grande que tem que ser lavada na máquina. 

E esta parte de ir à padaria ou à loja das coisas para a casa também foi boa. E as caminhadas que fizemos também foram boas. O tempo já está mais fresco, sabe bem voltar a sentir este arzinho que já prenuncia o doce outono.

Portanto, vendo bem as coisas, o dia até não foi mau de todo.

E bola para a frente porque para a frente é que é caminho. É ou não é? 

terça-feira, agosto 05, 2025

Dar de mamar até as crianças terem 6 anos? Mas está tudo doido ou quê? Poupem-me.

 

Não vi, até agora, nenhuma concretização de jeito por parte do Governo Montenegro. Antes das eleições, já por duas vezes, era vê-lo, fanfarrão: que fazia e que acontecia, era só chegar ao governo, e todos os problemas se resolveriam em 2 ou 3 meses -- e, afinal, como é público e notório, tudo em que tocou ficou ainda mais estragado.

Por isso, não pode haver dúvidas sobre a minha opinião geral sobre a falácia Montenegro. Mas isso não me tolda o raciocínio. Sou, e creio que enquanto tiver a mente a funcionar normalmente, assim serei isenta. Pelo menos, esforço-me por isso. E é assim que hoje vou sair em defesa de Madame Palma Ramalho.

Enfim... mais ou menos...

No que se refere ao tema da legislação laboral, continuo sem perceber qual a necessidade de tanto fuzuê. Trabalhei durante anos e anos e nunca vi que a legislação fosse um problema. Saídas por negociação, saídas por extinção de posto de trabalho, saídas por despedimento com justa causa ou mesmo despedimento colectivo são o pão nosso de cada dia. Sem espinhas.

Claro que não se consegue despedir, unilateralmente falando, alguém só porque sim. Pode não se gostar nem um bocadinho de uma pessoa, pode saber-se que é um traste de primeira, que é uma pessoa tóxica ou psicopata, e, ainda assim, não conseguirmos livrar-nos dela. Sei do que falo. Passei por situações em que toda a gente queria ver uma doida varrida pelas costas: má profissional, má colega, perigosa mesmo. Em relação a mim, por diversas vezes, usou tácticas intimidatórias. E, ainda assim, o mais que conseguimos foi mudá-la de funções. Poderíamos, claro, ter avançado para um despedimento individual coercivo. Mas teríamos que carrear provas, teríamos que nos preparar para que um advogado nos fizesse a vida negra, teríamos que arcar com o risco de que fosse para as redes sociais deturpar tudo e causar danos reputacionais à empresa. Engolimos em seco e engendrámos uma solução em que fizesse o mínimo de estragos. Mas, ainda assim, continuo a defender que é preferível arcar com as consequências de ter gente pestilenta e imprestável nas empresas do que correr-se o risco de que patrões desonestos ajam discricionariamente contra trabalhadores indefesos que não lhes caiam nas boas graças.

Por isso, de cada vez que vejo que a bandeira da legislação laboral anda outra vez de mão em mão, dou um passo atrás e fico, cepticamente, à espera de ver o que vai sair dali. Felizmente, de forma geral, as montanhas parem ratos. Haja paciência.

Não quero com isto dizer que não haja aspectos a burilar. Há. Pormenores, aspectos específicos, pontuais. E, nesses casos, mais inteligente seria se partidos, sindicatos e associações patronais pensassem no País e não nas corporações em que se entrincheiram.

Mas, aqui chegados, eis que salta para a arena o tema da amamentação. O Governo quer limitar a redução de horário (duas horas) aos primeiros dois anos. Quando ouvi, pareceu-me normal, inócuo. 

Contudo, de repente, levantou-se um banzé do caraças, toda a gente a defender que as mulheres devem ter duas horas a menos de trabalho para amamentar crianças até aos 6 anos. De loucos. Pela cabeça de quem é que passa que é normal uma mulher dar de mamar a crianças com mais de 2 anos? Em especial, que o faz em horário diurno? Está tudo maluco ou quê?

Falo com conhecimento de causa. Foi há muito tempo mas a realidade é a mesma: uma mãe a amamentar os filhos.

Amamentei a minha filha até ela ter 13 meses. Já o contei: já falava e andava e ainda mamava. Mamava de uma mama, depois levantava-se, dizia, 'agora a outa', sentava-se na minha outra perna, encostava-se a mim, e mamava. Claro que o fazia depois de ter comido a papa da manhã, antes de sairmos, e, à noite, antes de ir para a cama. Por fim, só à noite. E eu confesso: fui eu que acabei com aquilo, já estava fisicamente saturada, já me custava. E foi um processo natural que ela também aceitou bem. Disse-lhe: 'A mãe já não tem mais leitinho nas maminhas. Sabes como vamos fazer? Já és grande, agora vais passar a beber um copinho de leite como os meninos crescidos'. E assim aconteceu, naturalmente.

De todas as minhas amigas, colegas e conhecidas eu fui a única que amamentei até tão tarde. Toda a gente achava um disparate, quase como se fosse uma cedência ao mimo de uma criança. Não quis saber. A minha intuição dizia-me que era benéfico para ela e assim foi.

Na altura, só havia licença de amamentação no primeiro ano da criança.

Com o meu filho, foi diferente. Sempre speedado, com um ritmo sempre difícil de acompanhar. Mamou até aos 4 meses, mas sempre foi um desatino. Quando a minha filha mamava, era um momento tranquilo: aninhava-se em mim e mamava pausadamente. O leite do meu peito sempre foi proporcional às suas necessidades. Com ele sempre foi o oposto: mamava sofregamente, mamava, mamava, com uma força e uma velocidade que não dava para acreditar, parecia que estava sempre esgalgado de fome. Claro que depois engasgava-se. Eu assustava-me imenso, ficava sem conseguir respirar e eu levantava-o, abanava-o. Enquanto isso, o meu peito ficava a esguichar leite enquanto ele tossia, engasgado, o leite a atingi-lo na cara, a entrar-lhe para os olhos e, quando se desengasgava, chorava, incomodado. O meu peito, face a tal sofreguidão, produzia leite até mais não poder, transbordava, encaroçava. Quando chegou aos 4 meses, deixou de querer mamar. Tive um desgosto grande, uma grande preocupação. Custou-me muito que esse elixir, essa garantia de saúde, não pudesse ser-lhe proporcionada. Tentei de tudo, mas ele foi taxativo. Fechava a boca, torcia-se, rabiava, esperneava. O leite acabou por ir secando. Por essa altura, já tinha introduzido a comida sólida no seu regime, e era só disso que ele queria. Não papas, que isso o agoniava, queria era sopa, comida com sabor. Devorava comida normal. Mas, bebé que era, como tinha que beber leite, dava-lhe no biberão. Mas só de eu lhe pôr a tetina na boca, começava com vómitos. Tinha que apanhá-lo a dormir, para lhe dar leite à socapa. Mas criou-se, cresceu, fez-se grande e forte. E mantém-se um bom garfo.

A tendência agora é que a amamentação seja exclusiva até aos seis meses. Acompanhei o processo pelos meus netos.

Mas o facto de haver mais um ou dois meses de amamentação em exclusivo ou de ser claro que o leite materno é uma mais valia e que prolongar-se até aos dois anos pode não ser o disparate que antes parecia, não significa que seja natural, saudável (lato sensu), amamentar uma criança para além dos dois anos, em especial durante o dia. Diria que é um absurdo sem pés na cabeça e duvido que haja mais do que meia dúzia de mulheres que o faça. Duvido muito.  

Dito isto não quero dizer que não faça sentido que as mães (ou os pais, à vez) não devam ter redução de duas horas de horário de trabalho até as crianças terem 6 anos. Chamemos-lhe 'licença de acompanhamento parental'. Isso, sim, faz sentido.

Relembro os meus tempos de jovem mãe, com horário rígido, sem redução após eles terem 1 ano. Eu com uma menina quase bebé, depois grávida e com ela ao colo ou pela mão, depois com um bebé de colo e ela, pequenina, pela mão. Não usava carro nessa altura. Nessa altura o meu marido estava na Marinha, sem flexibilidade para me apoiar mais, e, depois, quando saiu de lá, entrou para uma multinacional que o tirava frequentemente de Lisboa e do País. Não foram tempos fáceis. Mas era o que era e, apesar dos sacrifícios, sobrevivemos. Na boa. 

Mas poderia ter sido melhor. Não tive mais uns quantos filhos por me ser tão difícil (e por não ter suporte ou apoio logístico para as dificuldades do dia a dia). Tivesse eu tido uma vida mais facilitada e não teriam sido dois, teriam sido uns três ou quatro filhos. Se bem que o que eu gostava mesmo era de ter tido uns seis. Mas era impensável, ingerível.

Mas agora que o mundo mudou e que a flexibilização de horários é uma coisa normal, que o regime de trabalho pode ser híbrido, pode -- e deve -- ir-se mais longe.

A demografia em Portugal é uma lástima. Mesmo que os imigrantes nos venham dar uma ajuda no rejuvenescimento populacional, não chega. 

Tudo deve ser feito para incentivar a natalidade e o mínimo que se pode fazer é garantir que os pais possam acompanhar minimamente os seus filhos pequenos, trabalhando menos 2 horas por dia até que atinjam os 6 anos.

Isso e mais medidas: todas são poucas para incentivar os pais a terem mais filhos. Creches gratuitas, horários flexíveis e reduzidos sem redução de ordenado, abono de família generoso e crescente consoante venham mais filhos para a família. E o mais que, razoável e inteligentemente, se saiba pôr em prática.

sábado, maio 17, 2025

Um jardim bem cuidado ou um pedaço de natureza selvagem?

 

Travo lutas antigas. Muitas tenho perdido e, mesmo se ganho, são frequentemente vitórias precárias. Mas nunca me dou por vencida. Uma das mais presentes tem a ver com a forma como se aborda a terra. Eu sou pela natureza. Gosto das ervinhas que nascem, gosto das florzinhas espontâneas, gosto que cresçam, que atraiam insectos. O meu marido é o contrário: para ele isso é mato que tem que ser cortado e não descansa enquanto a roçadora não avança. Diz que temos que poder andar sem termos que nos desviar ou sem nos picarmos. Eu, em contrapartida, não me importo de arrancar à mão o que acho que não tem cabimento.

Mas os meus filhos têm a mente formatada como o pai. Se vêem a buganvília a tombar, linda, como um pesado cortinado carregado de flores, se vêem os jasmins a cobrir os muros ou os arbustos das sebes laterais sem estarem aparados e, pelo contrário, altos e exuberantemente floridos, dizem que o jardim está mal cuidado. O meu marido rejubila quando ouve essas críticas e serve-se desse argumento ao longo de toda a semana, como se tivesse com ele uma claque unida para me convencer.

No campo é a mesma coisa: onde ele vê um matagal que precisa de ser arrasado, eu vejo rosmaninho, alecrim, sálvia, orégãos, tudo espécies que quero preservar. Só não me importo que arranque o tojo ou as silvas mas nem ele nem alguém que se contrate estão para estar a escolher pé a pé de erva antes de passar a máquina.

Portanto, uma luta. E, no entanto, sinto que, se deixarmos que a natureza seja livre, ela vai recompensar-nos, festejando a vida com pujança, cor, liberdade, alegria.

Já contei muitas vezes que a anterior dona desta casa, sempre que passa por cá, fica muito surpreendida com o que as árvores, os arbustos, as flores se têm desenvolvido. Ela tinha jardineiro salvo erro duas vezes por semana (diz que era muito lento...) e ela própria fez cursos de jardinagem creio que em Agronomia, ali à Ajuda. E diz que não percebe porque é que as coisas não se desenvolviam como desataram a desenvolver-se desde que nós cá estamos. O meu marido usa muitas vezes o argumento com um twist: ou seja, diz que, quando para cá viemos, estava tudo aparado e bem arranjado e que agora está tudo ao deus dará. E eu fico feliz pois, para mim, o deus dará é o que se quer, que as coisas sejam tão exuberantes quanto a sua natureza o dite.

Lá na nossa casa in heaven, como já contei tantas vezes, o pequeno bosque que se formou até esquilos atraíu. Por aqui, por enquanto, só gatos, passarada diversa e pequenos e delicados répteis. Nos dois sítios, gostaria de ter um pequeno lago pois sei que mais animais apareceriam e isso enche-me de felicidade. Mas não temos nenhuma nascente pelo que teríamos que estar sempre a abastecê-lo com água da rede e, se isso falhasse, morreria a vida que dependesse dessa água. Não se pode arriscar.

Mas, com estes diferendos sempre presentes aqui em casa, é com alegria que acolho vídeos como o que aqui partilho. Estive a mostrar umas partes ao meu marido que nem sequer queria ver, mas, tendo visto, acha que isto só lhe dá razão: são lugares em que só andando de botas até ao joelho senão fica-se todo picado, não são lugares em que se ande à vontade ou em que se possa colocar uma espreguiçadeira para estar tranquilamente ao sol. Não deve ser bem assim. Há zonas. Vou ter que estudar melhor o conceito. Pelo que aqui se diz, o conceito da 'arca' aplica-se inclusivamente às varandas, aos terraços.

Um deleite ver estas imagens. Tem legendagem em português.

Conheça a jardineira irlandesa que lidera um movimento global de renaturalização | WILD HOPE

No meio do colapso da biodiversidade em todo o mundo, Mary Reynolds, da Irlanda, está a construir um movimento para transformar os jardineiros em guardiões do planeta, devolvendo o nosso próprio pedaço de terra à natureza e restaurando a esperança de que as ações individuais podem criar mudanças duradouras.

À medida que as práticas agrícolas consomem mais terra e contribuem para as perdas de habitat em todo o mundo, Mary sublinha a importância de agir individualmente. Em nenhum lugar isto é mais fácil de fazer do que com a sua própria terra, criando uma ARCA – Atos de Bondade Restaurativa. Mary revela como rapidamente criar uma  e deixar a natureza colher os frutos, algo visto em primeira mão pelos antigos agricultores que se tornaram preservacionistas da natureza, Anita e Will Wheeler, que agora são o lar de uma infinidade de animais nativos que prosperam na sua ARK.

O movimento está a crescer, à medida que Mary alcança uma comunidade global que quer livrar-se das expectativas primitivas que os jardins exigem e trazer mais vida. Está até a criar raízes entre as gerações mais jovens. Uma visita à escola de Loreto, no condado de Wexford, prova como até um pequeno pedaço de terra pode não só restaurar uma comunidade nativa de plantas, mas também tornar-se um refúgio seguro para os alunos. “Pedacinho a pedaço, lá chegaremos” - garante Mary, “faça uma manta de retalhos de esperança”.

segunda-feira, julho 15, 2024

Dias felizes

 

Devo dizer que tenho vivido dias felizes. Com os que me são mais queridos juntos, todos bem dispostos, a conversa a fluir de gosto, todos em volta da mesa, com a casa cheia, com a maluqueira nocturna que me fez rir de gosto, com o madrugar bem mais cedo do que me é habitual, com a alegria de todos... sinceramente, a nível pessoal, não posso querer mais. 

De vez em quando lembro-me do que disseram e dou por mim a rir sozinha. 

Todos têm a sua vida pessoal e profissional (ou escolar), certamente todos terão, de quando em vez, os seus contratempos e preocupações. Mas, como por magia, quando nos encontramos todos, parece que os problemas perdem relevância e a ninguém lembra falar de maçadas.

Estou boa do meu pé. Quase boa. A nível visual está praticamente normal. Claro que, quando olham, ficam um bocado enjoados pois acham-no esquisito. O dedão (e arredores) está a perder a pele. Mas a mim isso não me incomoda nada. Também ainda tem umas manchinhas escuras mas nada de mais. Também já mexo razoavelmente o dedo. Dói-me ainda um pouco mas já não me tira o sono e, na maior parte do tempo, nem me lembro de tal coisa. E da tendinite do ombro que me causou rigidez também já estou quase a cem por cento. Vou eu fazendo uns exercícios e a coisa está a ir ao sítio. Só aqui é que me ponho a falar nisso. Quando estou com a minha turma nem me lembro das chatices que tive nem do que ainda sobra delas. 

Claro que, no meu íntimo, sinto saudades da minha mãe e faz-me muita impressão que tenha sido uma presença tão constante na minha vida e que, como que por artes mágicas, em pouco tempo, se tenha despido de matéria. Era alguém tão presente e agora é apenas memória. E já passaram quase seis meses. Por vezes, parece-me impossível. E no outro dia o meu pai faria anos e, no entanto, ao mesmo tempo, parece que já não existe há imenso tempo, quase como se já não pertencesse à minha vida actual. E não pertence. Mas a verdade é que pertenceu até 2020. 

O tempo tem o seu lado cruel, a vida tem o seu lado de traiçoeira. 

Mas forço-me a manter estes pensamentos no lado adormecido da minha mente. E consigo que isso coexista com a minha alegria em estar viva e rodeada por aqueles que tanto amo.

E depois há as pequenas coisas. Infra-mínimas. Mas que me dão prazer, me motivam, me animam.

Por exemplo: estava com o cabelo comprido que geralmente apanhava em rabo-de-cavalo, muitas vezes dando-lhe uma reviravolta ao alto, para cima. Mas andava com vontade de o transformar. Então hoje, há bocado, fiz assim: estando apanhado num rabo de cavalo alto, como é costume, meti-lhe a tesoura e lá vai disto. Ou seja, agora, depois de cortado, dá para o apanhar na mesma, à tangente mas dá, e, curiosamente, ficou com um escadeado bem curioso. Saiu um monte de cabelo, ficou muito mais leve, e acho que não ficou mau de todo. Ainda lhe dei mais umas duas ou três tesouradas à frente para fazer um degradé mais harmonioso. Já não vou à cabeleireira há anos e fico com pena pois gostava dela e espero que as restantes clientes sejam mais fiéis do que eu. Mas isto de ter a liberdade de fazer coisas assim, na base do 'lá vai disto', faz-me sentir muito bem.

A outra coisa pertence à mesma categoria, a das frioleiras: andava com vontade de usar vestidos compridos mas nada me agradava pois não sou bem o género de intelectual de esquerda daquelas que usam saias compridas, largas e desengraçadas, nem sou exactamente o estilo hippie. Não estava a ver-me como uma maria-pendona. Mas também não queria usar vestidos que parecessem de noite, muito menos de baile de finalistas. Portanto, mantinha-me no classicismo das calças, dos vestidos pelo joelho, e, numa versão mais estival, calções brancos com blusinhas coloridas. Mas finalmente dei o salto. Encontrei o género de que gosto. A minha filha ofereceu-me um, que me assenta de uma forma superconfortável e com o qual gosto mesmo de me ver. E eu comprei os outros. E sinto-me tão bem... Há um que ainda não estreei mas sobre o qual estou com uma boa expectativa: cai como seda, suave, muito leve, é justo em cima mas alarga um pouco para baixo, é super decotado à frente e atrás, de alcinhas finas, e é em cor de coral com pavões gigantes de alto a baixo naqueles tons verdes e azulões. E, para conjugar, tenho um brinco, um único, com uma pena nos mesmos tons. Penso que vai ser exótico e isso agrada-me.

E toda a vida usei brincos discretos. Poderiam ser coloridos e adaptados às toilettes mas nada de exuberâncias. Contudo, andava com vontade de ter brincos ousados, coloridos, incomuns. E descobri-os. Estou mesmo feliz com eles. A ver se amanhã os fotografo para vos mostrar pois acho-os especiais e, sobretudo, os pais da criadora comoveram-me e apetece-me transmitir-lhes o meu carinho.

E ainda mais uma: chapéus. Adoro chapéus. Mas sempre me fiquei por modelos que me parecessem elegantes mas discretos. Provavelmente as pessoas discretas já os achariam algo destacados mas, para mim, estavam aquém do meu gosto intrínseco. Pois vi um que imediatamente chamou a minha atenção. A minha filha, ao vê-lo na loja, disse que todo ele é, em si, um statement. De facto. E não fujo a isso. Mas, ainda assim, receei que fosse demasiado aparatoso. Contudo, acabei por não resistir. Acho-o um espectáculo e sinto-me mesmo feliz quando o ponho. (Não é este. Este aqui ao lado é um que encontrei via google)

Quando era adolescente gostava de modelos originais e de me maquilhar e os meus pais zangavam-se, não queriam que eu desse nas vistas, diziam que não tinha idade para isso. Depois, pela minha profissão, tinha a noção de que não deveria mostrar-me a tender para o radical ou para a desalinhada (até porque era acusada disso). Agora já não tenho que provar nada a ninguém nem tenho que recear as opiniões alheias. Não que me preocupasse com isso mas, enfim, vivia o meu dia a dia integrada numa realidade em que as fugas à regra tendiam a ser mais ou menos vistas como perigosas excentricidades.

Claro que para coroar o bolo só mesmo uma cerejinha a enfeitá-lo: durante a semana fomos, por duas vezes, almoçar a um restaurante veggie. Não me tornei e acho que não me tornarei veggie mas a verdade é que gostámos imenso. Comemos agora muito menos carne, preocupamo-nos cada vez mais com uma alimentação equilibrada e saudável. E o meu filho ofereceu-me um conjunto de alimentos biológicos, saudáveis, e isso agrada-me e atrai-me bastante.

Portanto, apesar de não estar a ir para nova, a verdade é que me sinto cada vez mais disponível para procurar e acolher novidades e para me libertar das poucas peias que já tinha.

E viva a vida.

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Mercedes Sosa, Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento e Gal Costa - Volver a los 17


Uma semana feliz

domingo, março 10, 2024

Dia de não-reflexão... Antes, dia de sentimentos profundos

 

Dia efectivamente mais calmo. E muito bom. Almoçámos juntos num restaurante familiar, muito agradável, com comidinha boa. Comi um prato de que gosto imenso e que já não papava há que tempos: pescadinhas fritas de rabo na boca com arroz de tomate. Que bem me soube. 

Depois fizemos um pequeno passeio a pé que teve que ser encurtado pois desatou  a chover e... imagine-se: tínhamo-nos todos esquecido dos chapéus de chuva no restaurante. Portanto, voltámos lá e seguimos para casa do meu filho.

Os rapazes jogaram futebol na PlayStation e depois futebol a sério no corredor com uma bola mole (sendo que, aqui, já não foram só os rapazes pequenos que se digladiaram com o esférico como pretexto). Entretanto, a minha filha tinha ido comprar cenas com a sobrinha que, quando chegou, vinha radiante: um gloss com sabor a cereja, um gloss que refresca e faz efeito de plump up (ou lá como se chama) nos lábios e, ainda, um rímel transparente. 

E ainda houve lanche: a minha filha tinha levado uns biscoitos e a minha nora fez um delicioso bolo de laranja.

E, da horta, ainda trouxemos couves e brócolos que este domingo já marcharão com bacalhau com batatas. 

Portanto, uma tarde daquelas de que eu estava completamente a precisar. Cheguei a casa muito retemperada, mais leve, a cabeça mais descansada. E a caminhada feita depois, com o dog, ao frio e à chuva, só fez ainda melhor. 

Não reflecti nada a nível de eleições pois a minha decisão está tomada ab initio. Só espero é que a malta vá votar e, já agora, que vote com a cabeça e não com os pés.

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Entretanto, enquanto vejo a votação para o Festival da Canção (em que a Filomena Cautela ou está grávida ou está atrapalhada dos intestinos pois não tira a mão da barriga), vou partilhar um vídeo que vi há pouco e que me agradou bastante. Calma, tranquilidade, amor à natureza.

Feeling deeply

That’s what the world tells us. There's been a movement to watch our thoughts and feelings, making sure that we're positive at all times. We receive messages that we must shift these ‘bad’ feelings and find better ones. But when we do this, we close down and shut off parts of ourselves, suppressing the fullness of our emotions. To feel whole and be whole, we must honour all of it - good and bad.  All emotions are beautiful and create a fullness and wholeness in our experience.  

They are powerful forces that our bodies can use as fuel for action and healing. Our thoughts create reality, not the other way around. So when our reality doesn't look the way we want it to and brings up emotions that are unpleasant to us, that is the message we are being given to start building a bridge between what is and what can be. 

Taking time to be aware of our reactions, thoughts and emotions will bring us into a space of clarity and balance where we can make informed decisions guided and supported by our soul... decisions that will usher in release and healing for ourselves and all of life around us.

Featuring Phoebe Barnard (www.phoebebarnard.com)

Filmed in Mount Vernon, Washington State, USA.

The poem read at the start of this film is called 'The Peace of Wild Things' - by Wendell Berry.


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Um belo dia de domingo

Saúde. Boa sorte. Paz.

terça-feira, fevereiro 13, 2024

Uma Kodak Six-20 'Brownie' C. Uma tarde em família (e uma fotografia, com parte da maltinha carnavalescamente disfarçada, para o atestar). Um cartão algo misterioso. A natureza a renovar-se.

 

A malta jovem combinou juntar-se para jogar basket e perguntaram se não queríamos ir ter com eles. Claro que fomos. Estava um sol tímido mas foi bom estar em família. As crianças estão de férias e os adultos nem todos mas conseguiram organizar-se para que a tarde fosse uma maravilha. 

O meu marido, os meus filhos, os meus netos.
Todos carnavalescamente mascarados.
(Todos, salvo seja... O cão não está disfarçado...)

Depois o lanche foi numa esplanada e é sempre um espanto ver a energia com que se atiram ao que vem para a mesa. 

Depois eles continuaram juntos, umas às compras, outros para o barbeiro, e, finalmente, jantando juntos. Chamaram-nos para já não deu. É que, depois do lanche, nós dois regressámos a casa e eu, como vem sendo hábito, vim arrumar algumas das coisas que tinha trazido de casa da minha mãe. E é muito cansativo pois para nada há um lugar disponível à espera de ser ocupado. Pelo contrário, há que reorganizar, mudar de sítio o que já estava instalado. Não quero ficar com muito bibelot, não quero ficar com a casa atravancada, não quero descaracterizar a minha casa. Mas também não quero colocar as coisas da minha mãe em lugares pouco dignos. Portanto, há aqui um jogo de equilíbrio que não é fácil.

Por exemplo, no outro dia trouxe uma mesinha de apoio redonda, pequenina, com uma gavetinha. Um movelzinho delicado, elegante, em raiz de nogueira. Pareceu-me que ficaria muito bem numa parece do hall em que há um quadro e um candeeiro de pé alto, com uma luz relativamente fraca, amarela, que apoia na iluminação da entrada e da circulação e que está apontado para o quadro. Ou seja, dá uma luz indirecta muito agradável. Portanto, pensei que, ali, uma mesinha mínima ficaria bem. Pois bem. O meu marido que embirra com tudo o que é inútil não descansou enquanto não me convenceu a tirá-la dali. Não só dizia que a mesa não estava ali a fazer nada como ficava despropositada. 

Acabei por pô-la ao lado de um cadeirão, num sítio em que mal se vê. Pelo menos assim não embirra com ela. Mas quase que, para cada coisa, é um exercício de imaginação e equilíbrio.

Depois fomos caminhar, eo muito cansada. Quando o meu filho nos desafiou para nos irmos juntar a eles já não deu.

No meio de um conjunto de papelada -- que me forcei a ver toda para conferir o que poderia deitar fora sem receio de me desfazer de alguma coisa importante --, descobri um cartão de uma empresa de consultoria em marketing e gestão e, no verso, dirigido ao meu pai umas palavras muito lisonjeadoras. 

Como no cartão estava, por extenso, o nome da pessoa que o escreveu, uma consultora, estive a googlar. É uma consultora brasileira, tem agora uma empresa sua no Brasil, tem livros publicados. Fiquei agradada mas intrigada ao ler o que ela escreveu ao meu pai. (No cartão, apaguei o nome do meu pai, a quem ela se dirige, bem como apaguei o nome dela, ao assinar-se, na vertical, de lado). Qual dos dois, o meu pai ou a minha mãe, guardou, e bem escondido, este cartão? Mistério...

No domingo, lá em casa dos meus pais, a minha filha descobriu as máquinas fotográficas do meu pai, em particular uma antiquíssima que eu julgava desaparecida, uma velha Kodak. O estojo já completamente acabado.

O meu pai tirava imensas fotografias. Andava sempre com a sua Kodak. Lembro-me bem de ser bem pequena e de estar a ser fotografada por ele.

Mais tarde, substituiu-a por uma mais moderna. Tenho ideia de que a minha filha também a guardou. Mas hoje não a encontrei. Tenho que procurar melhor.

Tirando isso, antes de almoço apanhei as últimas três laranjas. Doces e sumarentas.

E encantei-me com o jasmim amarelo já a começar a florir. 


E a chuva de finos ramos do chorão, agora nus, começam a querer pintar-se de verde. Um prodígio de delicadeza e beleza.


A Primavera aproxima-se. A vida renasce. A vida reinventa-se. É da natureza. É a lei da vida, dizem. 

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Uma boa terça-feira

Saúde. Alegria e esperança. Paz.

sexta-feira, fevereiro 09, 2024

Eu numa fotografia, eu nas palavras que escrevo, eu nas minhas memórias -- em dia de descobertas e trabalhos pesados

 



Ainda não arrumei grande parte das coisas que vieram em sacos no sábado passado mas, ainda assim, resolvemos lá voltar hoje, só os dois, dar um avanço. 

A minha filha já tinha dito que podia ficar com um serviço de jantar, a minha nora, embora pouco convencida, disse que ainda conseguia acomodar mais um serviço de chá. E eu, não tendo nenhum deles referido um serviço de café que escolhi com a minha mãe quando ainda andava no liceu e de que sempre gostei muito, resolvi que esse viria para mim. O que elas escolheram é da Vista Alegre mas o que eu escolhi é de uma fábrica na Baviera, um desenho e umas cores completamente diferentes. Na altura a minha mãe hesitou pois era muito diferente das louças que ela tinha. Mas consegui convencê-la. Quando o desembalar a ver se fotografo para vos mostrar.

Acondicionar este tipo de louças, especialmente quando serviços completos, é muito trabalhoso e demorado e mais vale estarmos os dois sozinhos pois despachamos muito mais serviço. 

O serviço com que a minha filha ficou, disse-me a minha mãe não há muito tempo, nem chegou a ser estreado. É muito bonito. Já aqui falei nisso pois, quando ela me contou que na parte de baixo do móvel do lado esquerdo havia um segundo Vista Alegre ainda por estrear, fiquei com muita pena. Não sei para que o comprou tendo já um outro e isto para não falar de um outro, da Sociedade das Porcelanas de Coimbra (que viria a ser comprada e absorvida pela Vista Alegre) que, esse, era frequentemente usado. Não sei qual a ideia ao comprá-lo pois era óbvio que não chegaria a ser usado. Não sei se terá pensado que era um investimento. Provavelmente, mais que um investimento, um legado. Acontece que os destinatários já não têm onde guardar mais pratos, mais chávenas, mais copos. Neste caso, em particular, a minha filha diz que vai reformular a arrumação do aparador da sala de jantar para ver se lá o consegue encaixar. 

Mas o que acontece é que, porque me custa desfazer de coisas que a minha mãe adquiriu e conservou com tanto cuidado e agrado, vou trazer tudo. Fica tudo encaixotado num canto da cave e, com sorte, quando os meus netos tiverem a sua casa, virão cá abastecer-se.

No sábado tinha trazido toalhas e mais toalhas de mesa de renda e bordadas que agora tenho que ver onde as vou guardar. Hoje trouxe sacos de lençóis de linho, bordados, lençóis cheios de rendas, a dobra toda em renda, ora em bicos, ora em palas, ora a direito, ou a renda como entremeio, ou com renda e bordados, ou seja, também de toda a espécie e feitio -- predominantemente brancos com rendas e bordados também em branco. Mas vi uns de que me lembrei. A partir de certa altura, não sei bem, talvez tendo eu uns dezassete anos, a minha mãe e as minhas avós resolveram começar a fazer-me o enxoval. E lembro-me de ir a uma senhora que pregava rendas e fazia bordados para escolher para mim e de a minha mãe aproveitar a embalagem e mandar também fazer alguns para ela e lembro-me de ter sugerido que fizesse lençóis brancos com um bordado em cinza claro. Já não me lembrava do efeito mas, na realidade, estão muito bonitos. 

Pelo toque do tecido e pela forma como estão tão imaculadamente dobrados e arrumados tenho a certeza que não foram usados uma única vez. É que no roupeiro do corredor há pilhas de lençóis normais e eram esses que andavam a uso. Uns coloridos, outros com bordado inglês, outros com bordados simples. De alguns ainda me lembro de quando vivia lá. Imagine-se. Mas, portanto, todo aquele afã de fazer rendas, bordados, de escolher o melhor pano, de escolher a pessoa mais perfeccionista para fazer a obra de arte mais perfeita, foi para encher gavetas e prateleiras com coisas que não eram destinadas a ser usadas.

E agora tudo me vem parar a mim que também não uso nada disso. E fico cheia de pena, quase como se parte dos interesses ou ocupações da minha mãe tivessem sido inúteis. Na prática, como se tivesse desperdiçado parte da sua vida com coisas que, em termos muito pragmáticos, não servem para nada. Isso deixa-me triste.

Quando me encher de coragem para arrumá-los a ver se antes os fotografo. Ao menos vêem a luz do dia e podem ser observados por alguém em vez de estarem, em prateleiras no topo de roupeiros, votados ao ostracismo.

Ao tentar avaliar o volume de trabalho que ainda tenho pela frente, espreitei para dentro de alguns roupeiros. É de pesadelo. Coisas infindáveis. Mas num deles, ao tentar perceber o que me parecia um embrulho feito de tecido, fiz uma descoberta que me deixou emocionada. O vestido de casamento da minha mãe. Era estreita e magra como uma modelo. Não sei como cabia naquele vestido, lindo. Parecia-me que estava embrulhado num tecido fino, branco. Afinal, percebi despois, parece ser uma camisa de dormir, também até aos pés. Deve ter sido a que usou na noite de núpcias. Não sei agora onde vou guardá-lo. Se tivesse uma casa gigante com uma divisão a servir de museu, engomá-lo-ia, mandaria fazer uma caixa de vidro e pendurá-lo-ia lá dentro, como se vê nos museus, um lindo vestido em exposição.

E fiz uma outra descoberta extraordinária: numa gaveta da grande escrivaninha, que tem um conteúdo também infinito, por baixo de exames médicos, dentro de um envelope que estava dentro de um saco, ou seja, totalmente camuflado, estavam cartas escritas pelo meu pai quando estava na tropa e namorava a minha mãe. No endereço estava Menina tal e tal (o nome da minha mãe). Não sei se vou gostar de ler ou se vou sentir-me intrusa. Ao pegar no molho, vi que a última estava num envelope feito à mão, quase a desmanchar-se. E tinha escrito 'Por mão própria'. Uma letra muito bonita, mais bonita que a do meu pai (que é bonita). Se bem percebi, datada de mil novecentos e vintes e tais, é uma carta do meu avô materno dirigida à Menina tal e tal, minha avó. Tenho que rever a data pois, se vi bem, a minha avó pouco mais seria que uma criança. Aliás, a minha mãe, se não estou em erro, nasceu quando a minha avó ainda nem tinha dezassete anos. Tê-los-ia quase, estava por dias, mas ainda não feitos. Creio. 

E muitos envelopes com muitas fotografias. Dos meus pais em jovens, dos amigos, de primos, minhas em bebé e até adolescente, dos meus avós. Tantas, tantas fotografias. Eu deveria ter paciência e tempo livre para ler tudo o que tenho encontrado, para organizar as fotografias e todos os achados.

Mas não sei quando será que isso pode acontecer.

Comecei  também já a separar roupa da minha mãe. Fico com muita pena. Há tão pouco tempo ela ainda usava aquelas blusas, aqueles casacos, aquelas echarpes. A vida é efémera, ingrata. Sei que é da natureza, que não há volta. Tantas vezes eu dizia: 'Ninguém cá fica'. Ninguém. Mas quando nos toca a nós, de perto, as coisas ficam muito difíceis.

Ainda no início de Novembro, há três meses apenas, quando a minha mãe resolveu ir para uma residência assistida, estive com ela a escolher a roupa que ia levar. Só levou roupa de inverno porque, segundo dizia, na primavera ou no verão, ela mesma iria a casa para escolher roupa mais fresca. Estava cheia de planos. Foi carregada. Pensava que ia ainda viver muitos anos, queria levar muitas 'mudas', sempre gostou de se arranjar bem e, além disso, tinha lá amigas e isso ainda incentivava mais os seus brios. Ainda assim, nos primeiros dias em que lá esteve e antes de começar abruptamente a decair, ainda queria mais ténis, uns pares de calças de fato de treino para fazer ginástica, mais casaquinhos, mais não sei o quê. Voltei a casa várias vezes para ir procurar o que ela me ia pedindo. Tinha-se esquecido também de levar o casaco de tricot que estava a fazer, lá andei à procura disso e mais de um saco com novelos dessa lã. Em qualquer instante desses dias em que estava a fazer as malas ou a pedir que lhe levasse mais coisas eu adivinhei que, traiçoeiramente, um monstro silencioso estava a devorá-la por dentro. Dois meses e poucos dias depois estava morta. E eu pensar nisto deixa-me ainda perplexa e tristíssima. Quando escrevo ou digo ou penso que a minha mãe está morta ainda me parece mentira. Uma mentira muito cruel.

Sei que, num plano racional, pode dizer-se que a minha mãe sofreu durante pouco tempo e viveu bem, motivada e autónoma, até pouco antes de cair doente e, em pouco tempo, morrer. Mas, num plano emocional, é muito difícil.

Por exemplo, vendo aquelas suas roupas, as suas carteiras, as suas coisas, tudo ainda tão presente em mim, custa-me muito. E custa-me a acreditar. 

Estou a pôr quase tudo em montes em cima da cama dela. E tenho combinado com a senhora que a ajudava nos cuidados ao meu pai -- e que continuou a ir a casa dela no mínimo duas vezes por dia ver se estava tudo bem e que a ajudava nas compras --, que ela vai lá a casa (tem a chave), vê o que eu coloco em cima da cama, escolhe para ela o que quiser, vê se há coisas que se possam dar a quem precisar. E, se houver coisas que ninguém conhecido queira, ela mesma doa ou põe no lixo. Isso para mim é uma grande ajuda pois não tenho que ser eu a desfazer-me das coisas da minha mãe.

Ah, é verdade. Descobri também um rolo grande e grosso, atado com uma fitinha, e com um papel por fora a dizer Diplomas. Só vi o que era cá em casa. Muitos diplomas. Do meu pai, da minha mãe, meus. E, no meio, uma aguarela da autoria do meu tio, irmão da minha mãe. Lembrava-se daquela pintura. Era eu pequenina e achava que aquela pintura era insólita, inesperada, bonita. Depois deixei de vê-la. Agora descobri-a no meio dos diplomas. Estas descobertas enternecem-me.

Enfim. Irei dando notícias.

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Uma boa sexta-feira

Saúde. Força. Paz.

segunda-feira, fevereiro 05, 2024

Um saco cheio de cartas

 


Quando eu deixei de morar em casa dos meus pais, deixei lá ficar, numa gaveta do roupeiro do meu quarto, toda a minha correspondência. Para mim, tudo aquilo era privado. Mesmo que não tivesse nada de especial, era privado, cartas que troquei com amigas e amigos, com namorados, conversas só minhas. Claro que ali só estava o que eu recebia, não o que eu escrevia, mas ali estava muito da minha vida. 

Sempre gostei muito de escrever e, na altura, não havendo blogues, havia a correspondência. Estava sempre à espera de cartas. E escrevia longas cartas, cada carta tinha sempre várias páginas. A bem dizer, isso durou, na prática, até ir de férias para Angola, com dezassete anos acabados de fazer, pois, a seguir a isso, veio a faculdade e, nessa altura, passei a ir a casa dos meus pais apenas ao fim de semana e, como é bom de ver,  as solicitações e os desafios eram tantos que, pelo que me lembro, o hábito de escrever e receber cartas se foi atenuando. Não acabou, acho que não, mas, forçosamente, deve ter sido mais esparso.

Mas, ao sair de casa, sabendo que aquela gaveta estava cheia de cartas, centenas, creio, não quis levá-las pois tenho esta característica: sempre que entro numa nova fase da minha vida, fecho a porta e sigo viagem sem levar nada atrás. 

Por vezes pensava que, estando ali tudo tão disponível e, em especial, tendo aquele quarto passado a ser o quarto da minha mãe quando o meu pai teve o AVC (ele teve que passar a estar numa cama articulada com protecção), era natural que ela não resistisse à tentação de ler todo aquele imenso manancial de informação. Desejei que não o fizesse mas sempre pus o coração ao largo: se lesse, paciência. Nunca lhe falei naquilo nem ela a mim. Aliás, sempre pensei que, mesmo que ela lesse, não ia confessá-lo pelo que, em termos práticos, era como se não tivesse lido.

Há algum tempo, quando estive num almoço em que esteve um meu ex-namorado, ao comentar algumas coisas com a minha mãe, ela disse-me que eu ainda tinha lá em casa toda as cartas que ele me escreveu. Eu disse que sim, que sabia, e 'deixe-as lá estar'.

Neste sábado, lá em casa, ao avaliar por alto o trabalho que temos pela frente e, sobretudo, o que pode ser distribuído entre os meus filhos (e, confesso, estou bem apreensiva pois vejo neles pouca receptividade -- e compreendo as suas razões), lembrei-me dessa gaveta. 

Não tinha ideia que fosse tanta coisa. Trouxe. Um saco cheio, cheio. Está agora aqui, na cave. Não sei quando vou ter tempo e paciência mas acho que deveria minimamente organizar aquilo. 

Hoje, quando fui lá abaixo à procura de uma coisa, lembrei-me de espreitar o saco. Vi um molho de cartas que, de repente, acendeu em mim uma recordação que eu julgava apagada. Um amigo algo especial, um rapaz muito interessante, muito inteligente. Era do Porto, do Liceu D. Manuel. Conheci-o em Lisboa, encontrámo-nos algumas vezes e tenho ideia de que pintou um climinha. Terei que ler as cartas para perceber a dimensão da coisa. Mas, ao pensar nisto, não posso deixar de concluir aquilo que é mais do que óbvio: isso também aconteceu enquanto namorava aquele tal outro, embora, no caso, ainda estivesse no início. Mas é mais uma que só prova aquilo que está mais do que provado, aquele namoro foi mesmo um flop, mas um flop dos gigantes, pois foram vários os interesses que tive enquanto o namorei. Mesmo naquele mês em Angola tive um outro interesse, e esse dos valentes, um que foi um vendaval, um tufão. Porque deixei que o namoro continuasse é daquelas coisas que ainda hoje me intriga. É certo que tentei, algumas vezes, acabá-lo mas continua a ser para mim um mistério o não ter posto um ponto final mal começou, isto porque comecei a namorar sem dar por isso. Criancices, só pode.

Também lá está, no meio do saco das cartas, um outro saco. Fui ver: as cartas desse tal namorado. Foi certamente a minha mãe que lá arrumou assim. Eu sempre fui na base de tudo ao molho e fé em deus, carta recebida ia direitinha para a gaveta, estava lá eu para fazer molhinhos. Abri uma carta só para me certificar que, naquele saco, eram as cartas dele. Eram, claro. Uma caligrafia perfeita. Era das coisas que eu gostava nele, a sua letra. Sendo figura das artes e das letras, reconhecido e incensado, às tantas ainda tenho para ali algum futuro tesouro.

Tenho é também que ver se descubro as cartas de um pen friend que conheci através de um anúncio numa revista. Era africano, dizia que vivia numa zona de guerra, que passava mal. Escrevíamo-nos em francês. Eu gostava muito de lê-lo e andava sempre aflita com medo que lhe acontecesse alguma coisa. Até que deixou de escrever. Naquela altura, sem internet, as pessoas que se perdiam de nós ficavam perdidas para sempre. Tenho que ver se, pelo nome, consigo saber alguma coisa dele. Mas tenho pouca esperança.

Também deve haver muitas cartas da Jill. Conheci-a na Figueirinha, teria eu uns dez ou onze anos, não sei. Ao passo que os meus pais eram jovens, os dela pareciam avós. Eu andava dentro de água como um peixinho. E ela, muito branquinha, não sabia nadar e tinha muito receio. Brincámos muito e, por fim, já ela andava na maior comigo, na água. Foi o meu pai que a ensinou a nadar. Escrevemo-nos durante anos. Eu pasmava com a liberdade dela e com a naturalidade com que falava de coisas que, para nós, na altura, em Portugal, eram tabu. A ver se, pelo nome, consigo saber alguma coisa dela.

Tem graça isto. Eu que pensava que as portas que, ao longo da minha vida, fui fechando estavam mais do que fechadas para todo o sempre, vou agora verificando que, aos poucos, por umas ou por outras razões, parece que, mesmo sem que seja eu a querê-lo, se vão reabrindo. Tem mesmo muita graça, isto.

A vida surpreende-nos.

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Este domingo foi muito feliz. Estivemos juntos, almoçámos juntos, estivemos na praia, houve futebolada no areal. Seis renhidos futebolistas cheios de energia e amor à competição. 

Uma alegria. Adoro estar com eles, adoro vê-los juntos.

No entanto, do nada, quando regressei a casa senti uma grande tristeza. A minha mãe já cá não está. Ainda me parece mentira. Mas é verdade. Até cerca de dois meses antes dela morrer eu pensava que, à parte das doençazecas naturais da idade, ela era saudável e que iria viver ainda por muitos anos. Todos os dias eu falava com ela, em média duas vezes por dia, e, portanto, contava-lhe muitas coisas, conversava sobre os meninos, sobre os meus filhos, sobre o que calhava. Até para a distrair daquilo que eu pensava que eram sintomas de nada que ela, por medo, empolava, eu arranjava sempre mil assuntos para conversar com ela. Na última vez que conversei com ela, ela fraca, fraca, eu a perceber que a sua vida poderia estar por um fio, contei-lhe sobre a operação da Kate Middleton, sobre a estranheza pública sobre aquele longo internamento, contei da operação à próstata do Carlos, contei que o William tinha cancelado os compromissos e que, por isso, agora era a Camilla que andava em funções. E a minha filha gozou com a outra que se refere a ela como a Camela. A minha mãe ainda tentou sorrir. E agora já cá não está. E, de vez em quando, abate-se sobre mim uma grande perplexidade e uma grande tristeza.

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Desejo-vos uma boa semana a começar já por esta segunda-feira

Saúde. Força. Paz.

segunda-feira, janeiro 22, 2024

Em dia de sol e família
acabo na companhia da Sharon Stone e de Rothko

 

A família tenta que eu não fique tão exclusivamente focada no problema que nos toca a todos. Não há quem não tente pôr-me racionalidade na cabeça. Compreendo-os mas há coisas que não resultam apenas da nossa vontade. O meu marido, para além disso, quase me empurra à força para a psicóloga. Mas eu, nesta fase, não tenho disponibilidade de qualquer espécie pelo que não vou já agendar nada; mas acredito que, mais tarde, talvez agende umas sessões.

Mas não estou passada de todo pelo que, pelos meus próprios meios, estou a tentar continuar a viver com a normalidade possível. 

[A minha filha disse que quando, no final do ano (ou no início deste?) fiz o balanço de 2023 só falei das coisas negativas, esquecendo-me de todos os bons momentos, do muito que escrevi, de todas as muitas vezes em que estivemos juntos, etc. Disse-me também que nem pareço eu pois eu, tal como era, não reagiria como estou a reagir. E o meu filho, no outro dia, disse-me que não posso esquecer-me que tenho filhos e netos. E disse-me que parece que envelheci trinta anos. E eu, ouvindo-os, reconheço que têm razão em tudo o que dizem.]

Então, fomos todos almoçar fora, passeámos à beira rio, os meninos estiveram e brincaram juntos e eu senti-me feliz. Claro que há sempre aquela sombra, aquela preocupação, aquela angústia que me aperta as entranhas. Mas vê-los contentes, conversadores, estando com eles e deixando-me contagiar pela alegria buliçosa das crianças, sinto-me melhor e, de vez em quando, consigo mesmo abstrair-me do que se passa.

É que, por muito que nos custe assistir, de perto, diria até que por dentro, a uma situação como aquela que atravessamos, a vida continua. 

E os meus netos são bem a prova viva disso. E são também, só por si, um motivo de felicidade absoluta, tal como o são os meus filhos.

Portanto, apesar dos pesares, este domingo foi um dia feliz, luminoso.

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E agora, para que não venham outra vez dizer que parece que não sou capaz de falar de outra coisa, deixem que partilhe convosco dois vídeos muito interessantes. Pode até parecer heresia juntar a Sharon Stone e o Rothko mas eu sou herege. Nada a fazer.

[Os textos abaixo são traduções google dos textos que acompanham os vídeos]

Sharon Stone, artista

Quando era estudante universitária, Sharon Stone viveu a vida de uma artista faminta, vendendo as suas pinturas por US$ 25 cada. Hoje, a atriz nomeada para um Oscar voltou ao seu amor pela pintura, com as suas obras a ser vendidas na casa das dezenas de milhares. Já teve duas exposições em galerias nos EUA, com uma terceira prestes a ser inaugurada em Berlim. O correspondente Lee Cowan visita Stone no seu estúdio em Los Angeles e observa-a a criar um novo trabalho.


Mark Rothko -- visita privada à exposição na Fundação Louis Vuitton

As obras abstratas… Sim, mas não só. Mark Rothko defendeu-se afirmando que a sua pintura estava viva. Demonstração aqui na Fondation Vuitton, com esta magistral exposição, a maior do mundo dedicada a ele. 115 obras-primas em formatos absolutamente monumentais que estão disponíveis nos 4 andares da instituição parisiense. Diante desta paleta XXL, é difícil não nos sentirmos absorvidos por essas cores difusas, quase hipnóticas, que exercem sobre nós esse misterioso poder de fascínio. À distância, massas perfeitamente equilibradas, com geometria difusa. De perto, um nevoeiro difuso que nos absorve. Dê um passo para trás. A obra não é mais o que você via no início. Nosso olhar muda, decifra, sente.
Exposição Mark Rothko  --  Fundação Louis Vuitton, Paris  -- Até 2 de abril de 2024
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As fotografias foram feitas no domingo no Parque das Nações

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Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Ânimo. Paz.

quinta-feira, dezembro 21, 2023

Um pouco de oxigénio

 

Um dia que vos conte o que se passa, e posso já dizer que é algo de inesperado, insólito e muito perturbador, talvez compreendam que a situação pela qual estou a passar justifica o abalo a que fui sujeita e o quão atarantada e triste tenho andado.

A família está a atravessar o mesmo mas talvez porque o meu vínculo é o mais forte e porque a estreita ligação me tornou também o objecto de todas as queixas, medos e desabafos, os outros encaram todo este processo com uma racionalidade e aceitação que não se comparam com as minhas. E quase me forçam a distrair-me e a não estar sempre a pensar no mesmo, temem que me afunde. 

Obviamente, não quero afundar-me. Acho que vou conseguir racionalizar e superar tudo o que se passa e tudo o que ainda está por vir. Mas não me é fácil. À medida que vou sabendo mais coisas, vou reprocessando a informação dos últimos tempos e vou tentando interpretar tudo o que vivi à luz dos novos factos. Nada disto me é fácil. E tem sido uma tal sucessão de acontecimentos que nem me dá tempo a processar. A família quer que eu deixe de estar sempre a pensar no mesmo, deixe de estar a querer perceber tudo senão fico pirada pois entre a preocupação e a incompreensão pelo que se passa pouca disponibilidade mental me sobra.

Mas hoje de tarde, depois de virmos de lá, eu sempre trémula por dentro, inquieta, com medo, a minha filha falou em irmos ao CCB para fazermos uma compra que estava em falta. Soube-me muito bem. Distraí-me, ri-me, comi um gelado, soube-me maravilhosamente. Por momentos, lembrei-me que estava ali na boa e ela lá e, sem querer, fiquei com os olhos cheios de lágrimas. Mas consegui ultrapassar. Aqueles momentos ali foram, na realidade, um pouco do oxigénio de que, se calhar, sem o saber, eu estava necessitada.

Quando eu e o meu marido chegámos a casa, já eram quase nove da noite, fui ao supermercado comprar bacalhau, batatas, cenouras, feijão-verde, grão para a ceia de natal. Para o dia o meu filho encomnedou coisas que devem ser boas e ofereceu-se para ser ele a cozinhá-las. Custa-me. Gosto de cozinhar e, para além disso, detesto dar trabalho. Mas, sinceramente, ando sem qualquer vontade e cabeça para me atirar a culinárias. 

Mas não posso esquecer-me, não posso mesmo, que, no meio de toda esta crise, é natal e penso que tenho a obrigação de fazer de tudo para que, apesar das complexas circunstâncias, o espírito natalício esteja vivo e que todos, em especial as crianças, tenham uns momentos de aconchego familiar.

Quando chegámos a casa, fomos arrumar as coisas e depois dar um passeio com o urso felpudinho. Enquanto andávamos, fomos conversando. Como sou extrovertida falo de tudo o que penso o que faz com que o meu marido tente impedir-me de fazê-lo por achar que não me faz bem falar tanto no que me intriga e atormenta. 

Tenho esperança de conseguir ultrapassar as minhas dúvidas e receios e angústias. Dizem-me que devo deixar-me disso, ou seja, de pensar tanto, de querer compreender tudo, e, simplesmente, aceitar. Tenho esperança de lá chegar.

Hoje, apesar da constatação da complexidade da situação, apesar dos mil receios e do desgosto das coisas estarem a acontecer desta maneira, acho que estou a sentir-me um pouco mais calma. Hoje ainda não tomei nenhum ansiolítico. Se calhar foi do bocadinho no CCB, se calhar foi de ter vindo a tentar interiorizar que contra factos não há argumentos, se calhar vem de pensar que a vida continua e tem que continuar, até para não preocupar as crianças. 

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Um dia feliz para todos

Saúde. Ânimo. Paz.

segunda-feira, dezembro 11, 2023

Contar segredos a estranhos

 

Para aqui não falar do que me traz apreensiva tenho agora, sempre, que omitir uma parte significativa do meu dia. Por isso, digo apenas que, como sempre, não foi fácil e, talvez por isso, quando cheguei a casa, sentei-me no cadeirão relax ao lado da janela, tapei-me com a mantinha aveludada, macia e quentinha, e, de tal forma me sentia esgotada que, provavelmente, ao fim de dois minutos estava a dormir. Dormi com certeza quase uma hora. E custou-me a acordar. 

Mas a caminhada da manhã e a que foi feita à noite foram boas. Contudo, a da manhã foi feita debaixo de um céu cinzento e um ar pesado de tão húmido, e a da noite, bem, foi de noite... No entanto, se me faz falta o sol, caminhar à noite também é bom. As árvores nocturnas são lindas, as casas iluminadas são íntimas, olhar as pessoas a cozinhar, outras em confortáveis salas a ver televisão, observar algumas belas peças decorativas, apesar de uma cusquice, é aliciante. E os jardins à noite estão cheios de mistérios e os cães dão o sinal e enfurecem-se à nossa passagem.

Este domingo não cozinhei. O programa de festas não me deixou grande margem para culinárias, nem pelos horários nem pela disposição. Por isso, passámos pela casa das pizzas em forno de lenha e já está. Menos mal.

Claro que, com tudo isto, nos últimos tempos perdi completamente o élan da escrita. Falta-me inspiração, motivação, energia. Ponho-me com o computador à frente e não me apetece. Escrever pressupõe uma entrega absoluta, implica que nos desliguemos da vida real. Só funciona se a via para a inspiração estiver aberta, desimpedida. E não tenho conseguido. Mas a vontade há-de voltar, sei que sim. E terei que repensar bem a abordagem. Tinha pensado tentar de uma maneira mas, do que tenho visto, não me parece ser a mais eficaz. No entanto, é uma questão de me dedicar. Tendo disponibilidade, de tempo e de cabeça, hei-de conseguir penetrar no hermético mundo editorial. 

Entretanto, ao ser-me sugerido o vídeo que abaixo partilho, lembrei-me do que se passou connosco, com o nosso Sebastião.

Uma vez, uns amigos deveras afoitos, resolveram passar por cima dos meus pruridos e das reservas do meu marido, e oferecer aos meus filhos um hamster. Não sei se o presente foi paa um e se o outro também o adoptou ou se foi, à partida, para os dois. Tanto faz. 

Que me lembre, havia uma gaiola com um baloiço e uma roda. Sebastião. 

Não achei graça mas os miúdos estavam felizes. 

Cheirava mal que se fartava, não sei se a urina, se as fezes. Eu tinha medo de lhe mexer. Sobrava para o meu marido, claro. Lá levava ele o Sebastião na sua gaiola para a varanda e, contrariado, lá fazia a necessária higienização.

Mas era o que era. A bem da alegria das crianças, lá nos ocupávamos do animal.

Até que, um belo dia, o bicho amanheceu morto. Esticado, De barriga para cima, perna aberta, esticado. Ainda pensámos que estivesse apenas inconsciente. Tentámos reanimá-lo. Mas tinha-se passado para o além.

Nem me aproximei, sempre tive uma relação complicada com a morte.

Na altura, no prédio em que vivíamos havia uma conduta centralizada para o lixo. Ao pé dos elevadores, havia uma tampa na parede da qual partia uma rampa que ia dar a um mega contentor onde ia parar todo o lixo do prédio. Na altura ainda não se reciclava nem se separavam os lixos. 

E foi por aí que o meu marido despachou o Sebastião. Para desgosto de todos, lá se foi o Sebastião.

No fim de semana seguinte encontrámo-nos com esses novos amigos. E relatámos o triste acontecimento. 'Não estava morto! Estava a hibernar!', exclamaram.

Contaram que o deles também tinha hibernado. Ficámos estarrecidos. Mas já não havia nada a fazer.

Nessa altura não havia internet nem o hábito de pesquisar sobre tudo. Parecia morto, não reagia: estava morto. E, afinal, não estava. E ficou, na família, como uma das grandes patifarias que cometemos.

Não posso dizer que seja um segredo pois todos nós falamos deste nosso mau passo,

Aqui abaixo fala-se de segredos e é sempre surpreendente ver como as pessoas que a Thoraya aborda, pessoas desconhecidas, têm sempre coisas inesperadas para dizer. Já aqui o referi várias vezes: parece que, muitas vezes, é mais fácil confiar em desconhecidos e contar-lhes os mais íntimos segredos do que entregar a intimidade a amigos. Os vídeos de Thoraya são a prova disso. E este meu blog também.

Estranhos leem um segredo e deixam um outro segredo


Desejo-vos uma boa semana a começar já por esta segunda-feira

Saúde. Esperança. Paz.

segunda-feira, setembro 18, 2023

Histórias de uma Colecção

 

Acordei de madrugada com a chuva e depois custei a readormecer. Mas, apesar de alguma dificuldade, lá consegui.

Quando acordei de manhã já não chovia. 

Começámos o dia ao ar livre. A caminhada foi boa. Cheirinho a terra molhada, chão fofo pela caruma amolecida. O cão doido com os cheiros, a parar de centímetro a centímetro.

Depois de anos esforçados, agora temos sempre a vontade de ficar a borregar em casa, sossegados.

Mas a minha filha perguntou no outro dia se não estamos a ficar mongas e essa pergunta deixou-me a pensar. Contei ao meu marido. Ficou arreliado. Não gosta de ser confrontado com umas certas verdades. O meu filho também está sempre a perguntar quando é que saímos, também acha que não devemos enclausurar-nos.

E, portanto, de certa forma sensibilizados com as censuras e apelos deles, resolvemos dar-lhes ouvidos e deixar de ficar aqui a ronronar no conforto e quentinho do ninho. 

Tendo a minha filha alertado para que esta segunda feira já seria o último dia da exposição Histórias de uma Colecção na Fundação Gulbenkian, resolvemos inverter a ordem dos factores a alguns compromissos familiares para não deixarmos a visita para a última. E, portanto, este domingo lá fomos. 

Soube-me que nem ginjas. E almoçámos por lá e comprei uns livros que são um mimo. Estou mesmo contente com os meus livros. A ver se amanhã mostro. E até comprei, imagine-se, dois ímanes para a parede lateral do frigorífico. 

E a exposição é extraordinária. Adorei, adorei, adorei. Muito boa.

E ao fim do dia voltámos a fazer outra caminhada. Uma energia mesmo boa. 

Deixo aqui algumas fotografias da exposição. Mas, acreditem, ao vivo é outra coisa e a amostra que aqui deixo não é seguramente a melhor. 

Se conseguirem, aproveitem. Vale mesmo a pena.


Para nos acompanhar na visita, Maria João Pires interpreta Clair de Lune, Debussy




















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Desejo-vos uma bela semana a começar já nesta segunda feira

Saúde. Ânimo. Paz.

terça-feira, julho 04, 2023

Pesadelos e situações assustadoras da vida real.
[E, para não acreditar no que se vê, os difíceis caminhos nas montanhas nómadas do Irão]

 

Já aqui contei que, por vezes, acordo a rir à gargalhada. E, mesmo acordada, continuo a rir, divertida com a situação em que me vi envolvida.

Mas depois há os pesadelos. E os pesadelos mais recorrentes são aqueles em que tenho que ir ter a algum lado e já estou atrasada e vou carregada e levo comigo os miúdos. E os miúdos distraem-se, ficam para trás, querem colo. E eu, cansada, com sacos e mochilas, não consigo pegar neles e transportá-los. Acresce que na maior parte das vezes não encontro o carro, não faço ideia da rua em que o deixei, dou voltas e voltas, já quase sem conseguir dar passo e não encontro o raio do carro. Mas o pior é que, muitas vezes, tenho que andar por estradas esburacadas, estreitas, ravinas, tenho que saltar de um rochedo para outro e sofro imenso, porque sofre horrores com vertigens e porque, naquela situação, tenho pavor a perder algum miúdo, como medo de não conseguir fazê-los atravessar aqueles quase intransponíveis obstáculos.

Felizmente, quando estou nessa aflição, acordo. Vou à casa de banho para ver se acordo e percebo que é um sonho, tentando depois adormecer já sem aquele sobressalto dentro de mim.

Não sei porque é isto. Se calhar é pelos anos em que, sendo os meus filhos pequenos, e estando a trabalhar, frequentemente em reuniões que duravam horas, dirigidas por homens completamente insensíveis em relação ao facto de eu ser mãe e querer estar em casa a horas decentes, eu ver o tempo a passar, numa aflição, fazendo contas às horas a que ia chegar a casa.  E depois, quando finalmente me via livre do trabalho, enfiava-me no trânsito e, numa agonia, via que não andava e eu, que queria tanto estar cedo em casa, por vezes não o conseguia.

Penso que tenha sido que fico gravado na minha carne e me faz ainda ter pesadelos. Isso misturado com as vertigens de que padeço e com a preocupação agora com os netos, quando estamos em espaços públicos com muita gente, sempre a contá-los a ver se ainda estão todos, não vá algum perder-se.

E agora, depois de um dia de intenso labor, quase de sol a sol, ao ver o extraordinário vídeo abaixo, penso que isto, sim, é pesadelo a sério...

Não sei como conseguem. Sem dúvida vêem paisagens únicas, sem dúvida testam os seus limites até à vertigem, sem dúvida desafiam a atracção dos abismos. Mas, depois, no fim, aparecem estradas e vê-se um carro. Ora se se chega lá pelas vias convencionais, porque andam eles assim, ali, arriscando a vida deles e das crianças que os acompanham?

Acredito que haja explicação. Mas eu não sei qual é. Vejam e digam-me o que vos parece.

A difficult path in the nomadic mountains of Iran


Um dia bom
Saúde. Serenidade. Paz.

segunda-feira, abril 17, 2023

Um domingo feliz

 

A minha mãe, sabendo que quando a maltinha está junta, é para durar, preferiu ficar a descansar temendo ter que enfrentar muitas horas seguidas de confusão. Mas os que veranearam por terras do White Lotus (segunda temporada) e redondezas regressaram no sábado à noite e a turminha que veraneou por outras bandas também tinha o domingo livre. E nós cá estamos sempre de braços abertos para os recebermos.

Por isso, foi com toda a alegria do mundo que cá os tive hoje em casa e os vi a brincar e a rir, todos desfrutando o calor de uma tarde que parecia de férias e verão.

Há pouco, quando aqui me sentei, vi o vídeo abaixo e fiquei a pensar que deve ser doloroso querer estar radiante com o nascimento de um filho e, estranhamente, sentir tristeza, incapacidade de amar e de estar feliz.

Por sorte, não me aconteceu isso. Talvez tenha a ver com a envolvência. Se uma mãe recente se sentir sozinha, sobrecarregada, cansada, acredito que sinta algum desamparo e abandono e talvez isso impeça a fruição do prazer de ter um filho. 

A mim, o mais perto disto que me aconteceu foi quando nasceu o meu filho. A minha filha ainda não tinha três anos e o meu marido estava a trabalhar há pouco tempo numa multinacional, tendo geralmente projectos com prazos apertados e responsabilidades alargadas. Nem havia licença de parentalidade.

O parto do meu filho, tal como o da minha filha, foi com fórceps. Por isso, eu tinha sido cortada e cosida. O meu filho era muito grande e sempre foi especialmente irrequieto. Mesmo na barriga, dava cambalhotas com tamanha força que me deixava incomodada, como se revolvesse todas as minhas vísceras.

Quando nasceu, mexia-se muito, nunca usou chucha, se eu tentava que se habituasse agoniava-se, e mamava sofregamente, engasgando-se. E, depois, de noite, chorava tanto que não me deixava dormir. Eu dava-lhe de mamar de duas em duas horas e, às tantas, estava tão cansada que não sabia se já lhe tinha dado de mamar ou se era isso que tinha que fazer. Por vezes, para ver se ele se calava, punha-o na minha cama mas tanto se mexia e tanto chorava e esperneava que, por vezes, bolsava-se todo, ficando a cama toda molhada e mal cheirosa. O meu marido, cansado que andava, por vezes chegado do norte às tantas da noite, conseguia dormir. Mas eu quase não dormia.

E de dia tinha que tratar dele e da minha filha que, obviamente, requeria todos os cuidados devidos a uma criança que nem três anos tinha e que, para agravar, era super vagarosa a comer. Eu preocupava-me muito com a comida dela, queria que ela comesse tudo o que era de lei e ela precisava de uma hora para comer devagarinho tudo o que estava no prato. E tinha que lhe dar à boca e distrai-la (coisa que hoje reconheço que era um disparate mas, na altura, eu temia que, se ela não comesse tudo aquilo, ficasse subnutrida). Isto com o outro a gritar por todo o lado, sempre com fome, sempre a querer colo e brincadeira.

Quando cheguei da clínica, os meus pais eram para lá ter ficado a ajudar. Mas a minha avó materna teve um problema qualquer de coração e foi internada, Por isso, a minha mãe entendeu que devia ir para junto da mãe. 

E eu, sem quase conseguir dar passo, quase sem me conseguir sentar, com o leite a subir (que é do pior que há), com o peito a encaroçar-se, quase febril, uma menina pequena a chorar porque queria o porta-bebés para a boneca, um bebé recém-nascido que não parava de chorar e que se agoniava com a chupeta, e vendo os meus pais a dizerem que não podiam ficar a ajudar-me, senti-me seriamente desamparada. Hoje o pai tem dias (ou melhor, tem pelo menos um mês) para ajudar nesta fase crítica. Mas, na altura, isso não existia.

Na altura não tínhamos empregada. E na altura ainda não havia fraldas descartáveis. E poucos supermercados havia. Não sei como conseguia ir às compras com o bebé no carrinho e uma menina pela mão, e eu quase sem me conseguir mexer. 

Mas consegui. Fiz das tripas coração, que remédio.

Uma outra vez de que me lembro pois foi mesmo muito má (e de que aqui já falei) foi quando andava a arranjar uns dentes e, para não perturbar muito a minha rotina de ir buscar um e outro e ir com eles para casa (sem carro), pedi para juntar duas ou três sessões, já não me lembro.

O dentista, familiar, desaconselhou. Mas era-me tão difícil ir do trabalho para a Avenida de Roma, de lá para a minha sogra, da minha sogra, com o bebé ao colo e nos transportes públicos, para a escola da minha filha e de lá, com os dois para casa, que lá me fez a vontade.

Anestesia para além da dose, portanto.

A meio do caminho senti-me meio zonza mas não havia telemóveis e não tinha como, na rua, pedir ajuda ao meu marido. Sobretudo, não podia deixar a minha filha à espera. Portanto, com dificuldade, lá consegui ir buscar um e outro e, com ambos, chegar a casa. Mas já ia feita num oito. Agoniada, uma dor de cabeça que não via nada. Pus o bebé na caminha dele e tentei que a minha filha brincasse. E deitei-me pois não me aguentava de pé. Não a descalcei. Então ela andava com os sapatos em cima da cama e eu sentia a cama a encher-se de areia. E foi para dentro da cama do bebé. Eu via aquilo e não conseguia impedir. E ele chorava como se não houvesse amanhã. E eu impotente, incapaz de cuidar deles. De vez em quando ia à casa de banho vomitar e de lá vinha fazendo um tremendo esforço para não desmaiar.

O meu marido chegou tarde e encontrou aquele panorama.

Mas foi um episódio. Foram fases. Apesar das dificuldades e do cansaço, sempre me senti muito feliz com eles. E arranjava maneira de os fotografar, encantada com eles, sentindo-me bem aventurada, abençoada por ser mãe de duas crianças tão amadas, cantava para eles, arranjava maneira de lhes dar atenção, de brincar com eles. 

São agora adultos, bem resolvidos, bonitos, bem dispostos, mãe e pai de família, com filhos felizes, cada vez mais crescidos. E eu, vendo-os assim, vendo a descendência toda reunida, penso que todos os momentos que vivi desde que os comecei a sentir dentro de mim até aos dias de hoje valeram completamente a pena. Tudo valerá sempre a pena. São momentos sempre abençoados e pelos quais me sentirei sempre infinitamente agradecida.

Mas, por ser assim, mais percebo a angústia de quem sente ou sentiu depressão pós-parto. São sofrimentos que deixam marcas para o resto da vida. Ainda por cima, no caso abaixo, ela não sabia que tinha uma depressão pós parto, pensava apenas que era uma mãe desnaturada, indigna de ser mãe. Sofria porque não conseguia estar feliz e estabelecer uma ligação com a bebé e sofria porque se recriminava por isso.

Não sabíamos

[Com legendas em português]

Jenny Jackson fala da sua experiência e da sua conversa com a sua filha


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Pintura de Berthe Morisot

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Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Alegria. Paz.