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domingo, fevereiro 09, 2025

Já se conhece a fonte da juventude...?

 

É um tema complexo. Não se trata apenas de beleza, de cosmética, de vaidade pessoal. É um tema que envolve a vida mas, ao mesmo tempo, a qualidade de vida. E, ao mesmo tempo, a preparação da sociedade para enquadrar uma vida mais duradoura. Uma população proporcionalmente mais idosa, mais tempo sem trabalhar (e a Segurança Social a ter que aguentar) ou, se se trabalhar até mais tarde, encontrar trabalho para os mais novos, mais recursos, mais serviços de apoio a todos os níveis.

É um tema complexo.

Mas é um dos grandes desafios que a ciência enfrenta e que, deveria, em simultâneo, ser um desafio para todas as vertentes de gestão da sociedade.

De qualquer forma, mesmo que não falemos em prolongar a vida em mais 10 ou 20 anos, é agradável a perspectiva de que consigamos ter, tanto quanto possível, uma vida longa e feliz.

Uma alimentação equilibrada e saudável, exercício físico e, surpresa, surpresa, os dentes bem lavados!, parece um cocktail muito promissor. E, depois, haverá os comprimidos que parece estarem bem encaminhados. E depois haverá todo um mundo novo.

Face à forma descabelada e caótica como o mundo tem evoluído, não sei se esse mundo novo será feliz. Mas acredito que, retirando os episódios tristes que sempre acontecerão, talvez se consiga tirar um bom partido do que a ciência nos vai ensinando.

Have we already found the fountain of youth? 
- The Global Story, BBC World Service

Scientists are optimistic that existing drugs that could one day slow or reverse our ageing. 

For centuries, people have pursued the dream of eternal youth. It might seem like the stuff of myth or science fiction, but researchers have been making fascinating progress in understanding what happens in our bodies as we age. There’s optimism that we might soon be able to use drugs to slow down or even reverse how we age, extending the number of years we live healthy, productive lives. What’s more, some of us might be taking these drugs already. 

On today’s episode, Lucy Hockings speaks to Dr Andrew Steele, author of Ageless: The New Science of Getting Older Without Getting Old to find out whether we might drink from the fountain of youth in our lifetime.


quinta-feira, outubro 31, 2024

Será que é desta...?

 

A solução para retardar o envelhecimento estará mesmo a caminho...?

Creio que sim, que está mesmo a caminho. E só gostava era que chegassem a tempo de eu poder usufruir de alguns dos desenvolvimentos que vierem a mostrar-se efectivos, sem efeitos secundários, económicos, para uso geral. Admito que a cosmética venha a beber aí conhecimentos. 

Pelo que parece, o que está a descobrir-se abre caminho não apenas ao retardar do envelhecimento da pele mas também dos órgãos, nomeadamente o coração.

Notícias fantásticas. 

Daqui por não muito tempo a esperança de vida aumentará e creio que, por essa via, a qualidade de vida será incrementada (e as pessoas parecerão mais jovens até mais tarde). Assim a sociedade saiba adaptar-se (o que pode ser um desafio e tanto...). 

Aliás, as investigações em curso nas mais diversas áreas parecem abrir portas a um mundo novo. Sempre assim foi, mas agora, com as investigações em rede, com a partilha de informação disponível em qualquer lugar, a qualquer hora, com as sinergias que se criam, os avanços são mais rápidos, podem ser facilmente potenciados e, talvez por isso, parecem mais significativos.

E, no entanto, vejo estas boas notícias ao mesmo tempo que leio que morreu André Freire, pessoa que ouvia sempre com atenção. Segundo a notícia, foi operado a um ombro, supostamente uma operação pacífica, arranjou uma infecção na sequência da cirurgia e, num ápice, morreu. Fez-me muita impressão. Com tantos avanços científicos, tanta sofisticação e depois acontece uma coisa destas. Li que ainda na segunda-feira tinha estado a lançar um livro, certamente muito longe de pensar que estava a viver um dos seus últimos dias de vida. Por vezes a vida é ingrata, traiçoeira. E isso pode ser assustador.

Li ainda que André Freire foi operado na Luz mas que, face ao quadro, foi transferido para o São Francisco Xavier. 

Quando a coisa dá para o torto a valer, ainda bem que há o SNS. Infelizmente, neste caso, pelo triste desfecho, já não terá sido possível reverter o quadro. 

Lamento muito.

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New skin research could help slow signs of ageing | BBC News

Researchers have made a scientific discovery that could be used to slow the signs of ageing. 

The Human Cell Atlas project has discovered how the human body creates skin from a stem cell, and even reproduced small amounts of skin in a lab. 

As well as combatting ageing, the findings could also be used to produce artificial skin for transplantation and prevent scarring.

sexta-feira, dezembro 29, 2023

Imortais...?

 

Daqui por algum tempo deixará de haver velhos tal como hoje os conhecemos. "É possível voltar atrás no tempo", diz bióloga.

Rostos enrugados, carnes flácidas, peles cansadas, cabelos sem viço... serão coisa do passado. 

Bryan Johnson antes e agora
Poderosos deste mundo, alguns dos quais não apenas almejam a juventude eterna como, também, a vida eterna, financiam investigações que vão de vento em popa. Jeff Bezos é um deles. Bryan Johnson, outro. 

Até que haja produtos testados e aprovados ainda demorará algum tempo. Por enquanto os bilionários vão injectando o sangue fresco dos filhos, fazendo tratamentos experimentais e, certamente, ao olharem-se ao espelho, sentir-se-ão pioneiros ao fazerem recuar o tempo.

Há qualquer coisa de compreensível nesta vontade de fazer parar os efeitos do tempo no nosso corpo. Podendo uma pessoa manter uma pele firme, lisa, iluminada, qual o gozo em deixá-la vergar sob os efeitos da erosão?

Dizem que o caminho da extensão da esperança de vida é para continuar, e claro que é (assim não apareçam vírus ou catástrofes que o interrompam), mas que, com a crescente longevidade, virão novas doenças. É natural.

Jeff Bezos antes e agora
Por muito que gostemos de nos abstrair do lado físico da questão, a verdade é que o corpo é uma máquina e, por muita manutenção preventiva e preditiva que lhe façamos, lá virá o dia em que uma peça, uma pequena peça, um inofensivo órgão, se desgasta e, desgastando-se, desestabiliza o equilíbrio do todo. Também aqui há avanços pois a manutenção reactiva de hoje quase consegue reverter todas as crises mas, por muito que queiramos, milagres, milagres, não os há. Pode haver surpresas, coisas incríveis, mas milagres, travar indefinidamente o tempo, travar o curso da natureza, isso não há.

Vive-se mais e mais e mais anos e isso é bom mas não será isso, ao mesmo tempo, perverso? Não se corre o risco de que, aos poucos, insidiosamente, se vá criando, nas mentes, a ilusão da vida eterna?

Quando um dos meus tios, um que me era particularmente querido e a quem pedi para ser meu padrinho de casamento, irmão mais novo da minha mãe, soube que tinha cancro no pulmão, reagiu com bonomia. Sorrindo, disse que já tinha vivido mais do que muita gente e que tinha tido uma vida boa, que estava tudo bem.

Quando eu soube que havia em Cuba um tratamento muito esperançoso, falei com a embaixada de lá, tratei de saber quais os caminhos para ele lá conseguir ir tratar-se, informei o meu primo, ele falou com o médico, eu transmiti à embaixada as dúvidas processuais. E durante toda essa minha demanda, o meu tio não quis saber, já não estava para se meter em aventuras, em experiências, em viagens, achava que não valia a apena, preferia estar quieto e esperar tranquilamente pela sua hora. E essa hora afinal chegou cedo, bem mais cedo do que se pensaria, pois no dia em que ia a mais uma consulta e em que o meu primo ia tratar com o médico do que eu lhe tinha transmitido, o meu tio, ao sair do carro para ir para o consultório, sentiu-se mal e morreu ali mesmo. Não chegou a sofrer o sofrimento que talvez lhe estivesse guardado nem sentiu as angústias da morte.

Mas para quem está agarrado à vida, com vontade de viver muito mais anos, com o sonho de continuar a ver ainda por mais alguns anos a evolução da família, com vontade de continuar a ter saúde e a mesma vitalidade, destreza e agilidade que teve a vida toda, a perspectiva de que a incontornável parede está a poucos passos e que todos os caminhos conduzem a esse beco sem saída traduz-se num desgosto imenso, numa tristeza intratável. Nesses casos, a vida longa, em ver se ser vista como uma bênção, acaba, na recta final, por ser uma fonte de ansiedade, temor, pavor, angústia mortífera, negação, infelicidade.

Como referido acima, dizem os artigos sobre as investigações em curso que, com a maior duração da vida, virão novas doenças. É natural. Não apenas as células, quando atingido o fim do prazo de validade, entram em descontrolo, algumas multiplicando-se desordenadamente, entrando por onde não devem, como alguns mecanismos, 'preparados' para um determinado funcionamento, entram em disrupção, em falência, não cumprindo a sua missão, produzindo substâncias indevidas ou deixando de filtrar outras que acabam por funcionar como veneno.

É isto que queremos? É para aí que caminhamos?

Tudo muito ilógico, parece-me. 

O que aconteceu nas nossas sociedades para que tantas loucuras aconteçam? Porque nos esquecemos da nossa condição efémera? Porque desaprendemos a arte de viver e apreciar as coisas simples e o 'agora'? Porque passámos a querer tocar a eternidade? Porque só pensamos no futuro e, ao mesmo tempo, deixamos que o medo do que nele possa acontecer passe a infectar as nossas existências?

Eu não sei. Só sei que não me parece saudável nem me parece que nos traga mais felicidade.

quinta-feira, junho 29, 2023

Crimes de guerra (sem paz), juventude eterna a toque de vodka, agroflorestação em pequena escala e permacultura

 

Antes de ir comer um belo gelado, vinha no carro a espreitar as novidades e a comentá-las. 

Não vou aqui falar das cavalhadas da dupla de vígaros sanguinários Putin & Prigozhin a que agora se junta o mistério da possível evaporação de Surovikin, outro que tal. É daquelas cegadas cheias de improbabilidades tresloucadas, malta que suja as mãos de sangue e, a seguir, as lambe de gosto, malta que se esfaqueia mutuamente, arrancando os fígados ao que cair primeiro para, a seguir, os comer ou dar a comer ao cão.

Até que sejam todos postos com dono, tenho dificuldade em falar sobre o que quer que seja pois é tudo pior do que se possa pensar. 

Os nossos PZPs continuarão a defendê-los e a achar que a culpa de eles serem os assassinos que são somos nós e que bom, bom mesmo, era baixarmos todos os braços para que eles venham por aí, tripudiando, destruindo, roubando, assassinando, violando a seu bel-prazer.

Uma tristeza pegada. Estão bem uns para os outros.

Portanto, não falando disso, porque não encontro palavras para o fazer nem consigo compreender como o mal tão absoluto pode habitar o corpo de algumas pessoas, desloco-me para outros territórios.

A vida é assim, cheia de carreirinhos. Nuns caminham os grandes males do mundo e noutros vão, a passinho bailarino, as minudências e as rêveries.

Portanto, dizia eu, vinha no carro e, fugindo dos facínoras,  fui andando até chegar a Vera Wang, firme e jovem nos seus 74 anos. Certamente já se esticou várias vezes e já levou botulina por todo o lado. Mas, ainda assim, está bem, bastante bem, não desfigurada, normal. Diz que o segredo é não apanhar sol (presumo que compense com suplemento de vitamina D), é dormir 9 horas por dia (se calhar toma um comprimido para o garantir) e bebe 1 copo de vodka todos os dias. 

Como não me importava nada de parecer tão jovem quanto ela mas não me quero fazer esticar nem injectar nem quero tomar comprimidos para dormir ou para substituir o sol, resta-me o vodka. A ver se amanhã começo a caprichar nos cocktails pré-janta. Quiçá um dia rum, outra dia vodka. Mas com qualquer coisa para aliviar a força do álcool, acho eu. Senão não conseguirei chegar acordada, aqui, a esta hora, para escrever estas irrelevantes little coisinhas.

Tirando isso, ando a ver com muita atenção vídeos sobre micro-quintas e permacultura. Gosto. Qualquer coisa me diz que.

Tenho pena que estes vídeos não estejam legendados em português mas, para quem tenha maiores dificuldades, talvez as imagens falem por si.

The Incredible Benefits of Agroforestry on Small Farms | Introduction to Agroforestry

In this video, we visit James from@TapoNothFarm in Aberdeenshire, Scotland. Tap o' Noth is an incredible 8-acre agroforestry permaculture small farm that integrates crops and animals alongside perennial planting. By using inspiration from how this land would be if left fully to Nature, James and his partner Rosa are using that to their advantage to create a place that not only produces food and fuel, but also makes Nature a core part of their whole operation. 

From watching this video you will learn exactly what Agroforestry is, how it benefits farmers, plenty of examples of types of Agroforestry in action and what is needed to help make this amazing method more common in our food system. Agroforestry is a core element of Regenerative Agriculture. 



Traditional Farm Design vs. Permaculture Design: What's the Difference?

In this video, we explore the differences between traditional farm design and permaculture design on a sample land area. You will see that a permaculture design can be a little complex, but this video explains the most important permaculture design elements and the rationale for their implementation. Let me know if you've got any questions. 

Whether you're a farmer, gardener, or just interested in sustainable agriculture, this video will provide you with a basic understanding of traditional farm design and permaculture design and why they matter. 


Um dia bom
Saúde. Bons ares. Paz.

domingo, fevereiro 21, 2021

Björn Andrésen não morreu em Veneza

 

Tenho um amigo cinéfilo. Pelo menos, assim se define. Durante anos consumiu compulsivamente filmes. Agora consome séries. E memoriza argumentos, realizadores, intérpretes. Por vezes pergunta se vi isto ou aquilo e, desmiolada como sou, geralmente não me lembro. Só quando dá detalhes, acabo por reconhecer e, muitas vezes, fico aborrecida comigo pois até tinha gostado... e tinha-se-me varrido. 

Uma vez fiz-lhe aquela pergunta que acho absurda e à qual não consigo responder quando ma fazem: qual o seu filme preferido? Pensei que iria dizer que era impossível escolher, que são muitos os muito bons, os preferidos. Mas não. Para meu espanto, convictamente, respondeu: Morte em Veneza

E, a seguir, em estado de um deslumbramento quase hipnótico, começou a falar da beleza daquele miúdo, na obsessão do homem mais velho pela juventude sedutora do rapaz. Eu disse: Uma beleza tentadora. Ele confirmou: sim, uma beleza tentadora.


Não me esqueço da forma como ele recordou a cena da praia e outras... e de como o seu olhar quase estava alheado da minha presença ao pensar nessas cenas. 

Contou-me que não sabe quantas vezes já viu o filme. 

Também gostei muito do filme. Não li o livro pelo que não sei avaliar se, em palavras, a rendição do homem é tão absoluta e, por vezes, tão patética ou se beleza tentadora do rapaz é tão cativante -- ou se são as figuras de Dirk Bogarde e Björn Andrésen que tornam a história de Thomas Mann tão erotizada, tão bela, tão intemporal. Claro que Visconti e toda a equipa não terão sido de somenos no sucesso do filme mas, seja como for, o rosto de anjo atrevido e o corpo juvenil e apelativo de Björn Andrésen no papel de Tadzio não serão jamais esquecidos.

No entanto, tendo sido alguém tão marcante não tenho ideia de se ter voltado a falar nele. Ainda será vivo? Será ainda um homem com uma beleza invulgar?

Fui saber. E, como tantas vezes quando um jovem é tão idolatrado pela sua beleza na juventude, parece que lhes fica colada ao corpo uma espécie de maldição. Neste caso até parece que os dramas por que passou não terão tido a ver com a profissão mas com a morte súbita de um filho, bebé. Contudo, a carreira cinematográfica, ao que parece, não evoluiu substancialmente. E a beleza... bem... a beleza obviamente foi perdendo aquele viço que a inocência virginal acentuava. Mas é a vida. Só permanecem para sempre jovens e belos os que cedo se desprendem da vida terrena. 

Björn Andrésen tem 66 anos, é actor e músico, tem uma filha e dois netos.


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Desejo-vos um feliz dia de domingo.
Saúde. Ânimo. Paciência.

quarta-feira, janeiro 29, 2020

Billie e Jacob:
uma menina e um menino muito talentosos que mostram que sentem verdadeiro prazer em fazer o que fazem


Não incluí no título o irmão de Billie, Finneas, que também a acompanha no prazer de compor e estar em palco. Contudo, como parece ser introvertido, deixa o palco para a irmã e, se calhar, não se importa que seja ela a receber a maior parte dos aplausos. 

Mas não é só a composição e a interpretação e a alegria que se lhes percebe: é também a mistura, os arranjos, tudo. E os vídeos. Usam tudo o que têm ao dispor para se entregar ao público e fazem-no de uma forma que irradia modernidade -- e digo modernidade por não me ocorrer outra palavra mas o que quero dizer é que dá ideia que ousam, experimentam, e tudo parece ser uma porta aberta para o que virá a seguir. No caso de Billie é ainda o uso que faz do corpo, com as roupas, o cabelo, as unhas, tudo: uma graça, uma aventura, um encanto, uma diversão.

O futuro, se olhado através do que fazem, parece ser um lugar festivo, um lugar que se presta à criatividade e ao prazer de existir. 

Gosto imenso de ver jovens assim: activos, construtivos, ousados.

Billie acabou de fazer 18 anos. Finneas tem 22. Jacob tem 25 anos. E existem para proporcionar bons momentos aos que se dispuserem a isso. Abençoadas criaturas.

Todos eles receberam foram contemplados nos Grammy Awards deste ano da graça de 2020.





Até já

sábado, setembro 23, 2017

As praxes, os condutores de caloiros, o poder, a humilhação, a paródia acéfala e etc





Durante toda a santa semana, em vários locais de Lisboa, deparei-me com grupos de estudantes. Uns importantes, certamente sentindo-se superiores na sua capa e batina, alguns de kilt, conduzindo bandos de caloiros. Estes, uns de tshirt com números, outros todos sujos evidenciando que andaram a rebolar-se na terra, outros de penico na cabeça a fazerem exercícios ridículos.


Quando andei na faculdade não havia praxes. Mesmo que as houvesse, eu não me sujeitaria a elas. Quer como veterana, quer como caloira, números destes incomodam-me. Nem gosto de me armar em superior, ordenando sevícias ou bacoquices -- nem me sujeito a ser mandada como se fosse membro de um rebanho ou envergonhada por quem se inicia no gozo do exercício do poder.

A coisa mais parecida com isso a que me sujeitei, e foi porque achei graça, foi a um julgamento. Quando morei numa residência universitária, havia esta coisa. Numa noite, juntavam-se as veteranas, a direcção da residência e alguns convidados e, uma a uma, cada nova habitante era sujeita a um interrogatório, tendo que responder ou, em alternativa, recebia a pena e tinha que a cumprir, mas a pena era uma coisa divertida. Quando calhou a minha vez, todas em volta e o júri na mesa, o que me calhou foi explicar como se arranja um namorado em menos de 24 horas. Na altura eu tinha um namorado que agradava muito às minhas colegas de residência e a quem eu tratava com algum desprendimento e, ao mesmo tempo, tinha uns quantos pretendentes que, just for the fun of it, eu não me importava que gravitassem à minha volta. E, quando elas me chamavam açambarcadora, eu dizia que não, que eles é que não me largavam mas que, se assim não fosse, eu também não teria dificuldade em arranjar alguém que quisesse namorar comigo. Ora uma coisa é uma pessoa brincar entre amigas e outra é ver-se rodeada por dezena de pessoas, num ambiente de julgamento, e pôr-se a dar uma aula de sedução. Mas dei. No fim aplaudiram. E espero que tenham aprendido alguma coisa.

Foi engraçado. Não foi humilhante.


Agora ver adolescentes de bacio na cabeça, a fazerem palermices, a serem conduzidos pela rua como carneiros... é coisa que me incomoda. Fico a pensar nos adultos que serão. 

Ou isto das praxes não quer dizer nada? Vale tudo porque, de facto, não vale nada? Ou já nada quer dizer alguma coisa? Nada vale alguma coisa?

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A fotografia lá em cima, da autoria de Matthias Schrader e que vi no The Guardian, mostra pastores da Baviera conduzindo os seus rebanhos.

A música é de Ry Cooder, banda sonora de Paris, Texas, filme que vi long ago e que estou, neste momento, a rever, imitando um Leitor a quem agradeço a dica. 

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domingo, setembro 10, 2017

Mulher ao mar...!
[2º de 5 posts]


Nestes dias de início de Setembro, por aqui, já não há muita gente. As tardes são longas, tranquilas, a temperatura amena. Para a tardinha, levanta-se uma aragem forte, arrefece. 

Os jovens que estão de guarda à praia já não têm muito que fazer. Conversam, riem, brincam. Dois rapazes e uma rapariga. Gosto de vê-los. A amizade que parece uni-los torna-lhes, certamente, em prazer aquelas horas de fim de verão.

As brincadeiras por vezes passam das palavras aos actos. Correm, riem, seguram-se. Eles unem-se para a atirar ao mar. Ela luta, resiste. Mas depois, vendo que não conseguirá, despe o casaco e rende-se.








Doces memórias serão guardadas para mais tarde as recordarem. Entre sorrisos. 

Saberão eles que os vi, jovens e felizes, brincando neste início de Setembro? Saberão eles que a sua alegria e os seus risos habitam agora este meu espaço que é o espaço de todos quantos o visitam? 

Gostava que soubessem e que ficassem contentes de se saber aqui, eternamente felizes.

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quinta-feira, julho 28, 2016

Adel, Ali e o filho dos pais que, ao meu lado, tão angustiadamente falavam
- ou os riscos de atentados terroristas nesta desorientada Europa




Esqueço-me frequentemente que o meu corpo tem limites que a minha mente desconhece e o resultado disso é que, volta e meia, tenho umas 'cenas'. Nada de mais, pelo menos até ver (noc, noc, noc - três vezes na madeira) mas há exames, análises, médicos, ou seja, maçadorias adicionais e, sobretudo, recomendações de repouso, repouso, repouso.

Hoje, de tarde, numa dessas incursões, estava eu no balcão da recepção e o sistema informático bloqueado, não conseguiam emitir facturas, aceder às agendas dos médicos, etc. E eu ali à espera. Mas, como estava sem pressa, não me fez confusão. E, sobretudo, às tantas comecei a ouvir a conversa de um casal que, encostado também ao balcão, perto de mim, falava com a que me pareceu ser a chefe do atendimento. Mesmo que não quisesse ouvir, ouvia na mesma dado que falavam com naturalidade. Ao princípio, eu estava distraída, reparando na aflição das pobres coitadas que ligavam e desligavam os computadores, que diziam umas às outras para experimentarem carregar aqui ou ali -- e nada funcionava.

Mas, depois, como aquilo não desenvolvia -- e ligaram para um técnico de informática que fosse lá com urgência pois já estavam fartas de fazer tentativas com ele do outro lado -- olhei para o lado e vi quem mantinha aquela conversa com a 'patroa' da recepção.


Era um casal talvez com uns quarenta e tais, classe média (a classe média portuguesa que é pouco mais do que remediada). Falavam do filho, agora com 19 anos. Que estava cada vez mais estranho, que não estudava, que dizia que não valia a pena porque depois não há trabalho, que passa os dias fechado no quarto de roda do computador, que ouve músicas muito estranhas (o pai acrescentava: pesadas; e depois contava que o filho lhe tinha perguntado se não havia nenhuma música com a qual se identificasse e que ele tinha respondido que não, e depois virava-se para a senhora da recepção e dizia: está a ver? Tem conversas destas, cada vez mais estranhas). A senhora da recepção fazia um ar compreensivo.


A mãe tinha um rosto de angústia e perplexidade e continuava: que ele se veste de forma cada vez mais estranha, que acha que não é gótico mas que é muito estranho, e aquelas músicas, tão esquisitas que quase dão medo. E que se tem apercebido que ele visita sítios muito estranhos na internet. Que não se interessa por procurar coisas úteis, só coisas estranhas que a deixam preocupada.

A senhora da recepção perguntou se não havia outros casos na família e a mãe do rapaz, num tom de voz mais baixo, disse que o pai há uns anos tinha passado por uma fase muito difícil e que isso tinha marcado muito o filho, e aí o marido encolheu-se nos ombros, quase envergonhado, fez que sim com a cabeça e disse: foi complicado, foi. A mãe continuou: e a avó também tinha problemas de nervos. A senhora da recepção fez um discreto e entendido sorriso: estas coisas são genéticas, muitas vezes são.

A mãe, com o rosto branco e derrotado, continuou: que já o tinham posto numa instituição mas que, quando ele fez 18, lhes disseram que, a partir daí, só se ele quisesse, que não o podiam ter preso. E que o filho não quis.


O pai dizia que já tinham marcado consultas mas que ele nunca ia. E que não sabiam se havia de ser psiquiatria ou psicologia. A senhora da recepção decretou: Psiquiatria - porque ele precisa de medicação. E que a psiquiatra depois é que havia de dizer se devia ter também acompanhamento psicológico. 

Os pais perguntaram, quase a medo, quanto custava. A senhora da recepção perguntou se tinham seguro. Que não. Então explicou-lhes que tinham que pagar na totalidade. 90 euros a primeira consulta, porque é a mais demorada, e 60 (ou 70, não me lembro) as seguintes. Os pais entreolharam-se, preocupados. Depois a mãe perguntou: E tem que vir quantas vezes à consulta? Uma vez por semana? A da recepção disse que não, que até podia ser de 2 em 2 meses, que as de psicologia é que poderiam ser mais mas que isso a psiquiatra é que depois havia de recomendar, que até podia não ser preciso.

Aflitos, disseram: Pois, se for muito a gente não pode. Depois a mãe disse ao pai: Se calhar havíamos mesmo de ver isso do seguro. E o pai disse: Pois, temos que ir ver. Imaginei que deviam estar a pensar que um seguro também não é barato. E não é.

Mas marcaram uma consulta e que iam convencê-lo a ir, porque começavam a sentir medo do que ele pudesse fazer. E lá saíram os dois, esmagados.


Fiquei numa ansiedade. Imagino o sofrimento de ver um filho assim, de não lhe conseguir chegar.

Não sei se no Serviço Nacional de Saúde não haverá psiquiatras e psicólogos que façam um tratamento atempado e de proximidade junto de jovens que começam a derrapar em planos perigosamente inclinados. Se calhar não, ou se calhar não em número suficiente.

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Agora, ao percorrer os jornais online, leio que o autor do acto bárbaro na igreja francesa era um jovem de 19 anos que desde há anos era problemático, tanto que ainda andava com pulseira electrónica, e que quem o acompanhou no acto foi outro jovem talvez ainda mais jovem. Vi a foografia: pouco mais que um menino grande.

Jovens como Adel, perturbados, que se sentem desinseridos -- ou Ali, o outro jovem de 18 anos, que matou tantas pessoas em Munique e que tinha perturbações de foro mental, tendo conhecido o outro jovem que o teria acompanhado no ataque no centro de apoio psiquiátrico e que tinha como ídolo o doido varrido do Breivik -- são verdadeiras bombas-relógio com as quais os pais não sabem lidar e, como se tem visto, nem os pais nem as sociedades.


Adel Kermiche virou-se para o Daesh porque é o que está a dar, a 'onda' mais mediatizada, enquanto Ali andava obcecado com a matança de Breivik, tão mediatizada cinco anos atrás.


Vê-se as fotografias de ambos e o que se vê são putos, adolescentes, jovens a quem, certamente, os pais não conseguem compreender ou amparar.


Claro que no Daesh qualquer destes infelizes jovens caem que nem ginjas na sua estratégia de marketing já que nem têm que os treinar nem influenciar: estão, por eles mesmos, prontos para fazer maluquices a eito e por conta própria.

Por isso, uma vez mais o digo: mais do que andarem por aí a falar em guerras religiosas, a imaginar grandes complots, penso que seria bom que quem manda percebesse o problema grave, endémico e profundo que tem em mãos. O mal maior não está fora das fronteiras da Europa: está dentro. Há um sentimento de desenraizamento e desesperança entre muitos jovens e esses sentimentos, muitas vezes, são maus conselheiros. Em minha opinião, deveria ser planeado, com urgência, acompanhamento sociológico/psicológico/psiquiátrico a todos os jovens identificados como jovens de risco.

Deve também, de uma vez por todas, encarar-se o grave problema do tráfico de armas. Se em França ou no outro dia num comboio foram usadas facas já o rapazinho de Munique, se não estou em erro, tinha um arsenal bélico em seu poder. Adquirido na dark internet, ouvi dizer. Certo. A internet não detectada, sites a que não se acede pelas vias normais. Ok. Mas teve que as pagar e o dinheiro é físico, e sobretudo as armas são físicas, materiais, não são virtuais. Circulam. A toda a hora se houve falar em rixas que acabam em tiroteio. Parece que meio mundo tem armas.


Se estou a ver bem o que se tem estado a passar, nenhum destes atrozes atentados teve na génese o Estado Islâmico. Se bem leio a realidade, tudo se tem passado às mãos de europeus desequilibrados: um adulto jovem desempregado, em processo de divórcio, perturbado, outro que sofreu bullying em miúdo e que vivia fechado na adoração de mitos bélicos, outro que sonhava com guerreiros do deserto que degolam prisioneiros, mais ou menos, tudo nesta base. 

O que a mim me parece, face ao que observo, é que estamos perante uma sociedade que não sabe interpretar a causa dos riscos, uma sociedade que gera líderes fracos como galinhas atarantadas, uma sociedade que explora até à náusea as desgraças sem as saber perceber e sem, sequer, perceber que a invenção de heróis que são uma espécie guerreiros do Daesh é um incentivo para adolescentes que não reconhecem outros 'idolos' que não os que as televisões e os jogos e filmes de guerra idolatram.


Nota: Comecei este texto refeindo uma conversa a que hoje, involuntariamente, assisti e derivei para o tema dos atentados. Contudo, não sei quais os riscos que tanto atormentam os pais que ali, por várias vezes, vi prestes a rebentarem em lágrimas.

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As imagens que usei são algumas das belas obras de street art que se podem ver em Lisboa e que, sabendo sou grande admiradora, Leitor a quem muito agradeço há dias me enviou. Poderão ver tudo aqui.

Lá em cima Benjamin Clementine interpreta The people and I 

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta-feira.

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quarta-feira, setembro 17, 2014

Quando a guerra é um jogo, um vício


No post abaixo, já cometi a ousadia de provocar um diálogo improvável: J. Rentes de Carvalho e Adélia Prado. Andava com esta em mente. Foi hoje: escolhi as passagens do livro Montedor recentemente publicado e depois abri ao acaso o Solte os cachorros e dei com um texto que me parecia pedir a proximidade do outro. É a atracção das palavras.


Mas isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra.










Quando o meu filho era adolescente jogava no computador. Até eu, ao princípio, gostava de jogar a um que era um miúdo que saltava e encontrava obstáculos, o Prince of Persia, e a outro em que se construíam cidades, SimCity, salvo erro. Quando cresceu mais, fim do secundário talvez, jogava a jogos de estratégia, combates, nem sei bem. Tenho ideia de que um de que ele gostava muito tinha a ver com a II Guerra Mundial. Penso que, por causa experiência adquirida nesses jogos, quando fomos a um museu numa daquelas praias do desembarque na Normandia, ele esteve a pegar nas armas pois já as conhecia todas dos jogos.

Sei que, neste tipo de jogos, jogavam vários ao mesmo tempo, cada um em seu sítio, tinham nomes de código, comunicavam entre si durante os jogos. E tinha um joy stick penso que para simular melhor uma arma. Não gostava nada daquilo, eu, mas, desde sempre os rapazes gostaram de jogar aos polícias e ladrões, cowboys e xerifes, um certo instinto bélico, talvez e, portanto, tolerei. De resto, não tinha como já que parte do dia não estava com ele e, além disso, educar não pode ser apenas proibir já que, na adolescência então, a proibição é mais um desafio do que algo que se aceite bem. 

O meu filho sempre foi muito bom aluno e praticava desportos vários e namorava e tinha muitos amigos e, por isso, isto dos jogos de computador era coisa de importância relativa. 

No entanto, aconteceu uma coisa com um dos seus grandes amigos.

Eles eram quatro grandes amigos. Três entraram para o mesmo curso ao qual se acedia com notas altas e o quarto não conseguiu entrar, foi para outra universidade. Contudo, a um dos dois amigos que estavam com ele, aconteceu uma desgraça. Um dia de manhã, o pai teve um ataque cardíaco fulminante e morreu em casa, ao pé dele. 

Claro que isso transtornou todo o núcleo familiar e, aparentemente, mais a ele que aos outros. Durante esses dias não foi às aulas. Entretinha-se, então, nesses jogos. E a coisa foi ganhando proporções de vício, jogava noite fora. Ou chegava tarde às aulas, com sono, ou não ia. Logicamente quando chegaram os exames, ou não fez ou chumbou. No entanto, não quis preocupar a mãe. No outro semestre a mesma coisa. Jogos e mais jogos, sempre agarrado ao computador a jogar aqueles jogos de estratégia e de guerra. Novos chumbos, novas mentiras.

O meu filho e o outro amigo muito preocupados com ele. Quando iam a sua casa, ficavam ainda mais preocupados pois a mãe, a irmã e a namorada dele continuavam convencidas que ele estava bem no curso, que ele estava a par dos outros dois amigos. Muitas vezes eu insisti com o meu filho para que falasse com a mãe dele, que contasse a verdade para que o rapaz se tratasse. Contudo, sempre acharam que isso seria trair o colega e não contaram.

Elas saíam de manhã para a sua vida e ele dava-lhes a entender que saía a seguir e que ia para as aulas. Enganou-as durante anos, completamente agarrado aos jogos no computador.

Não me lembro dos pormenores mas sei que ele, já quando seria suposto estar a acabar o curso, arranjou coragem para confessar. E acabou por mudar de curso e fazer outro de raiz. Não sei qual a vida dele agora mas tenho ideia de que a coisa terá entrado na normalidade. Teve sorte.

Mas sei de um outro caso que ainda vai a meio do drama.

Uma amiga minha sempre foi perfeccionista em tudo e portanto, por maioria de razão, foi-o também na educação do filho. Enquanto eu, logo que os meus tiveram idade para irem sozinhos para casa, pu-los numa escola oficial, ela não: colocou-os num dos mais exclusivos e caros colégios de Lisboa. O filho tinha que ter  o melhor possível. Depois protegia-o em tudo, telefonava-lhe para saber se já tinha feito os trabalhos, se já tinha estudado, nas férias do rapaz ligava-lhe para saber se já tinha almoçado, se já tinha feito isto, aquilo e o outro. Eu dizia-lhe que desse rédea mais solta ao rapaz mas ela não, que queria que ele estudasse, que ficasse com boas bases, que se aplicasse ao máximo. Apesar de todos esses cuidados e apesar de no colégio terem plano de estudos, não contente, colocou o rapaz ainda a ter explicações para ter a certeza que tinha notas altas para entrar para a faculdade. Queixava-se da fortuna que gastava com o colégio e com as explicações e com livros de estudo complementar que comprava porque lhe diziam que eram úteis. Eu achava aquilo um exagero e tantas vezes lhe dizia que era demais, que tanta protecção poderia não dar bom resultado. Mas era ela e o marido. Sempre os vi a tratarem o rapaz como se fosse um miúdo a precisar de cuidados especiais quando era um rapaz normalíssimo.

Agora diz-me que se lembra amiúde do que eu lhe dizia.

Entrou para o curso pretendido. O pai é que ia levá-lo à faculdade e ligavam para casa depois de almoço a saber se já tinha chegado e se já tinha almoçado. Até que o rapaz começou a soltar a franga e a fazer aquilo que nunca tinha tido oportunidade de fazer quando era puto, a sentir que tinha liberdade de escolha. Mas, desabituado que estava de ter vida social, virou-se para os jogos de computador. Conheceu por essa via ‘amigos’ e, de tarde, enquanto estava em casa sozinho, passou a estar permanentemente ao computador a jogar. Depois também à noite. Vieram os exames e chumbou. Os pais aflitos. Diziam que cortavam a internet e ele dizia que saía de casa. Discussões azedas que deixavam os pais de rastos, sem saberem como agir. Obrigavam-no a desligar o computador à meia-noite e o rapaz começou a tornar-se agressivo. Mais um semestre e novos chumbos. A noite inteira naquilo. De manhã não se conseguia levantar.

Até que a faculdade o impediu de se matricular durante um ano lectivo por ter excedido o número de chumbos sucessivos.

A custo conseguiram levá-lo um psicólogo. Faltava às consultas. Começaram a ir com ele.

Mal se alimenta, mal fala aos pais. Está permanentemente a jogar aqueles jogos de guerra com ‘amigos’ que os pais não fazem ideia quem sejam.

Este ano voltou a poder inscrever-se mas os pais não sabem se está a correr bem ou mal já que mal se falam. A minha amiga já anda a tratar-se também e tem sido uma luta pois faz o almoço para o filho, deixa-lhe a mesa posta, recados para ele beber leite, comer fruta, e o psicólogo não quer que ela continue a ser super protectora - mas ela não consegue pois vê a vida do filho a dirigir-se para um beco do qual ela não vê saída. Tentam, continuam a tentar. Ela vai bater à porta do quarto do filho para ele descansar, para dormir. O pai tenta arranjar-lhe programas, andar de bicicleta, coisas assim. Ele quase não lhes fala, têm dias sem se verem. nos dias melhores, através da porta o rapaz diz que sim, que vai pensar nisso e, claro, não faz nada. Os pais imploram-lhe que pense no futuro, já tem vinte e tal anos, tem que se preparar para vir a ter um modo de vida mas a única coisa na vida que o interessa são aqueles jogos de guerra. Custa-me muito quando ouço estes desabafos sofridos. Os pais investiram tudo no futuro daquele menino e agora vêem-se confrontados com uma preocupação destas e sem saberem o que fazer.

Quando leio que há muitos jovens ocidentais que aderem ao Estado Islâmico e que adoram, têm treinos, matam, penso que devem ser jovens assim, que antes deveriam ter como único objectivo de vida fazer jogos de guerra, passar para os níveis seguintes, níveis mais difíceis, com mais obstáculos, com mais variáveis em jogo.


Lembro-me dos jogos que via há uns anos atrás quando o meu filho jogava: eram incrivelmente realistas. Não tinham aspecto de desenhos. Não, pareciam pessoas, sangravam, caíam, cansavam-se. Os jogadores perseguiam inimigos, agrediam-nos, disparavam contra eles. 

Acredito que jovens viciados em jogos, desvinculados emocionalmente de amigos e família, cujos elos de ligação são apenas com ‘companheiros ‘ de jogos de guerra, que não têm outro objectivo na vida que não passar para o nível seguinte, experimentar jogos novos, uma guerra como esta, que mete treinos militares, decapitações, vídeos nas redes sociais, deve ser do mais apelativo que há. 

Li no Expresso que um jovem, que antes foi estudante universitário e que aderiu ao Estado Islâmico, diz que o que mais gosta de lá fazer é treinar e matar.


O Príncipe Harry
a jogar um video game
no Camp Bastion no Afeganistão



Li há pouco um artigo (que agora já não encontro) que falava também nisto e que tinha um link para um artigo no qual o Príncipe Harry também dizia, todo contente, que sim, na missão no Afeganistão em que tinha participado, tinha disparado e tinha matado, que era como jogar Play Station, bastava carregar num botão. 

Por vezes ao fim de semana, quando estamos no campo e a televisão só apanha os 4 canais generalistas, pasmo com os filmes que dão a uma hora em que devem estar muitos miúdos a ver televisão: perseguições, tiros a torto e a direito, agressões, uma violência fortuita.

Assim se vai banalizando a guerra, desde a infância: filmes, jogos, tudo à mão de semear, gratuito ou quase, na prática quase sem controlo por parte dos pais.

E ninguém pode dizer que está livre disto ou que, na sua família, nunca nada disto acontecerá. 

Esta sociedade - em que tudo se subverteu, em que parece que toda a gente perdeu o pé e perdeu o norte, em que tudo está acessível, a toda a hora, para toda a gente, de forma desregulada (desregulada por parte da sociedade, da família, do Estado) - acaba por gerar buracos negros, inesperados monstros, perplexidades, medos sem remissão.


Será que um dia ainda voltaremos a ser capazes de controlar a nossa própria vida? Será que um dia o mundo voltará a ser um lugar menos perigoso?


I need another place. Will there be peace? I need another world. 


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A música é Another World na interpretação de Antony and the Johnsons


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Relembro: se descerem até ao post seguinte poderão encontrar um saboroso desencontro amoroso que, afinal, não é mais do que um feliz encontro literário.

É a língua portuguesa d'aquém e d'além mar em diálogo e as palavras em festa.


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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa quarta-feira. 
Saúde, sorte e boa disposição é o que vos desejo.



domingo, janeiro 26, 2014

Quem conhecia a selvajaria, a estupidez, a aberração, o despropósito, a bestial violência das praxes académicas (da Lusófona e de todas as outras universidades) porque se calou? Porque as tolerou? Porque as sancionou? - Depois de ter visto a reportagem da RTP e de ver o vídeo que aqui mostro, da TVI, confesso que estou muito chocada. Que jovens são estes? O que têm na cabeça, senhores?!


Fotografia obtida AQUI,
junto a um texto bastante interessante.
Apesar de tudo
há jovens que revelam ter dois dedos de testa
Já no outro dia aqui falei

Com a morte horrível de seis estudantes no Meco, que ainda não se sabe como aconteceu (pelo que não é sobre caso em particular que aqui falo), começou a vir à superfície uma realidade brutal, selvagem, jovens a humilharem jovens, comportamentos de seitas, hierarquias, controlo de uns por outros, castigos. Uma realidade que destrói a ideia que gostamos de formar sobre os jovens. 


Pensamos que neles reside o futuro, que quererão mais liberdade, mais justiça, mais generosidade. Pensamos que lutarão pela melhoria das condições de vida de todos, que prezarão os afectos, o respeito, a dignidade.

E depois somos confrontados com o horror de os ver a torturarem outros, a infligirem sofrimento, medo, e o que se vê ali é desumanidade, é desprezo pela condição humana dos outros. E é uma linguagem ordinária, rasteira, indecente, alarvemente homofóbica. Uma vergonha. De jovens assim pode vir a nascer uma sociedade mais livre, mais feliz?

Os jovens que organizam estas praxes hediondas e os que não as denunciam na polícia envergonham a sociedade (e envergonham a família e, certamente, envergonhar-se-ão a si próprios mais tarde se um dia crescerem e se tornarem adultos decentes).

Para os que não viram, aqui deixo o link para uma reportagem muito elucidativa. É da TVI e é divulgada pelo Público.

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Nota: Sobre este assunto de que já tinha falado antes (conforme link acima), volto a falar aqui.


quinta-feira, janeiro 23, 2014

A estupidez das praxes académicas violentas, humilhantes, arriscadas; a estupidez dos veteranos que as impõem aos caloiros; a estupidez dos caloiros que se sujeitam: a estupidez das escolas que as permitem; a estupidez da sociedade que as toleram. Isto a propósito do drama do Meco que vitimou seis elementos do Conselho Oficial da Praxe Académica da Lusófona e do qual o respectivo Dux saíu fisicamente ileso (mas, com certeza, psicologicamente marcado para o resto da vida). E nem quero pensar na dor das famílias. Tudo muito horroroso.


  • No post já aqui abaixo poderão ler um artigo brilhante escrito por uma mulher, Concha Caballera, um artigo que parece premonitório e que, lendo-o, percebemos como tem sido fácil a um punhado de humanóides (como lhes chama Hélia Correia), auxiliados por um bando de homens de mão, destruir uma construção laboriosamente concebida e alimentada ao longo de 30 anos. Não deixem de o ler, é o que vos peço.
  • Depois desse, tenho ainda um texto em que mostro como não é feito nenhum o défice de 2013 ficar abaixo de 5.5%. Todos os crimes que têm estado a ser cometidos contra nós eram em nome de um défice de 3% (e mostro-vos qual era o primeiro objectivo do acordo com a Troika). Será que não vai sendo tempo de nos rirmos na cara destes embusteiros? De os impedirmos de nos continuarem a intrujar?

Mas isso é depois deste texto aqui.

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Há assuntos sobre os quais falo com muitas reservas. Sempre que os assuntos envolvem mortes, doenças, sofrimento, em especial de jovens ou crianças, eu resguardo-me. No princípio do mês já toquei ao de leve nisto mas num acto de esforço imenso. Há uma dor que merece respeito e em que qualquer palavra em vão pode ser sal em cima de uma ferida aberta. Depois são momentos, acho eu, em que o silêncio é essencial. E eu temo não encontrar as palavras certas para revestir de silêncio aquilo que penso.

Na véspera de Natal, estávamos a jantar quando, sendo assunto recente, o drama do Meco veio à baila.

Um dos presentes disse: coisas de praxes, ritos iniciáticos, porcarias dessas, e correu mal. Na altura não se falava nisso e, achei que sendo estudantes, e indo calmos conforme os viram, ou seja, não aos tombos de alguma bebedeira maluca, não fazia sentido irem para a beira de água numa de praxes e só sete, as praxes costumam envolver mais gente e exposição pública, não uma coisa no Meco com aquelas ondas enormes, um sítio em que a areia afunda junto à linha de rebentação e, ainda por cima, perto da uma da manhã.

Achei mais que tivesse sido coisa de jovens que gostam de conversar até tarde, depois ir passear pela praia, peace and love, sem se darem conta do mau tempo e dos avisos, aquela coisa de são jovens, não pensam, qualquer coisa do género. Mas ele persistiu, Podem crer, foi isso, não são inéditos esses ritos iniciáticos a meio da noite na praia e as praxes têm porcarias dessas.

Achei aquilo tão improvável que pensei que ele estava a ficcionar e continuei na minha, a achar que tinha sido um acidente em que não havia ninguém a culpar e em que o sobrevivente, para sua infelicidade, iria carregar toda a vida a memória da noite horrível em que tinha perdido seis amigos.

Mas eis que aos poucos as notícias vão deixando saber pormenores: que sim, que era um fim de semana em que a comissão de praxes ia organizar as praxes para o próximo ano, que o sobrevivente era o chamado Dux (e eu nunca tinha ouvido a expressão, não fazia ideia de que toda uma estranha organização rodeia essa estupidez das praxes) e, que quando os familiares chegaram a casa que os jovens tinham alugado, já estava tudo arrumado e as coisas de cada um estavam guardadas nos respectivos sacos que tinham o nome de cada um, que os jovens todos - excepto o sobrevivente - tinham deixado o telemóvel em casa como se tivessem a intenção de ir à água, que uns dias depois alguém ligou para a senhora que se ocupa da limpeza da casa a perguntar por uma colher de pau em tamanho gigante que tinha ficado esquecida atrás da porta e com a qual tinham sido vistos a dançar no dia do acidente – pormenores que não parecem fazer grande sentido.

Ouvi agora que o assunto passou a estar em segredo de justiça e vai ser investigado pela Judiciária.

E depois, claro, com a imprensa toda em cima do assunto, já é difícil saber o que é mesmo verdade ou um diz-que-diz-que, mas leio que haverá um pacto de silêncio entre os estudantes porque há mesmo qualquer coisa de ritualizado e há também uma hierarquia nisto das praxes e eu fico perplexa, perturbada. Tantos mundos paralelos e estranhos que eu desconheço. 

Todos os anos me cruzo amiúde por altura do início do ano lectivo com grupos de estudantes, elas com as caras pintadas, penteados divertidos, eles também pintalgados, todos sorridentes e bem dispostos, em grupos ruidosos. Andam pelas ruas, invadem os centros comerciais.

É coisa que no meu tempo não havia e, se houvesse, teria sido coisa à qual me teria furtado. Tudo o que sejam estes movimentos de grupo, de comportamentos homogéneos e expectáveis, uma coisa de tipo rebanho, me causa repulsa. Já o disse aqui mil vezes: sinto-me intrinsecamente livre pelo que nunca fui e acho que nunca serei  filiada em coisa nenhuma, nem participo em cenas em que tenha que alinhar ordeiramente com outras pessoas (missas, comícios, jantares de curso, etc).

Por isso, voltando ao tema, não me imaginaria nunca a participar em peripécias nem como praxada nem como praxadora. Por natureza, isso causa-me um incómodo visceral e, por princípio, outro tanto incómodo me causa.





Felizmente, quando chegou a vez dos meus filhos, ela viu-se envolvida numa coisa como a que descrevi e lembro-me que apareceu em casa toda animada com totós, rosetas coradas, sardenta, toda ela relatando cenas engraçadas. E acho que tinham andado a passear assim e, do que me lembro, umas brincadeiras quaisquer num jardim e pouco mais. Sempre gostou de festas e divertimentos com amigos pelo que encarei como uma coisa natural. Do meu filho não tenho ideia de nada disso, é rapaz para se ter posto completamente à margem. E nenhum deles teve essa treta do traje académico até porque, felizmente, nenhum deles é dado a fardamentos (ele, então,  nem na escola infantil aceitou vestir bibe, tamanha era a rejeição que tiveram que abrir uma excepção para ele).

No entanto, se com os meus se passou o que vos contei, para minha estranheza, é cada vez mais frequente encontrar jovens de capa e batina ao longo de todo o ano por todo o lado, ou seja, já não é coisa que se circunscreva ao início do ano lectivo. 

Não é também raro, desde há alguns anos, ouvir-se falar de excessos absurdos ligados a praxes. Sabe-se, de vez em quando, de praxes que envolvem humilhações, maus tratos. Quando isso se sabe, alguém manda instaurar um processo e a coisa fica por aí.

O que intriga nisto é o que será que vai na cabeça destes jovens que aceitam ser humilhados e fisicamente mal tratados? E que estupidez e deformação mental é a dos jovens que se armam em chefes dessas tretas e, de forma organizada, se sentem com poder para poder sacrificar outros?

E, sendo isso assim mesmo, não deveriam os órgãos directivos das escolas onde isso se passa proibir e punir os jovens envolvidos em práticas que vão para além do mero divertimento?

É que uma coisa é organizar brincadeiras, festas, convívios, onde os mais jovens sejam integrados numa nova comunidade e outra, muito diferente, é, de forma pensada e, até, ensaiada, conceberem práticas arriscadas, punitivas, que envolvem dor, medo, vergonha por parte dos que deveriam ser integrados em festa?

Devo dizer que a actual mentalidade de parte dos jovens é algo que escapa à minha compreensão.

Conheço muitos que nem se recensearam pois acham que a política, em geral, é uma porcaria com a qual não querem ter nada a ver. Não querem mudar o que acham ser o status quo: querem, simplesmente, permanecer fora dele.

Como referi num dia em que estava no Porto, no fim de Outubro, em dia de manifestação, o passeio junto e em frente e a entrada do Coliseu estavam apinhados com jovens de capa e batina e, na manifestação, praticamente nenhum jovem (e seguramente nenhum de capa e batina). Não querem saber.

De forma geral, são desinteressados em relação ao que se passa, acham que é sempre mais do mesmo, jogadas espúrias, coisas a que se sentem alheios. Preocupam-se com arranjar trabalho, sabem que grande parte dos amigos e colegas foram para fora ou estão a pensar ir, sabem que os que cá estão ou não têm trabalho ou têm trabalho precário, mal pago, e que outros andam sempre ganzados ou cocaínados. E gostam sobretudo de conviver, de estar uns com os outros, conversar, estarem juntos. E isto é do que eu ouço à minha volta. E depois há os que andam pelos bares e discotecas até caírem para o lado. E já para não falar num outro vasto grupo que são os intelectualmente indigentes, que não estudam nem nunca estudaram, que não sabem nada de nada, que mal sabem falar e em que a maior ambição que têm é fazer presenças ou participar nas casas dos segredos.

Francamente, o que eu às vezes também sinto é que é melhor nem pensar nisto para não ficar ainda mais preocupada. É que não sei qual o futuro de um país em que o panorama com a juventude é o que descrevi e em que o governo faz de tudo para incentivar ainda mais estas práticas e estas mentalidades.

Que intervenção cívica ou que atitude crítica é de esperar de jovens que humilham outros ou que, passivamente, se deixam seviciar, que desconhecem o que se passa na sociedade, que se encontram totalmente alheados da política, que não lêem, que não se interessam por outra coisa que não a sua própria vida ou, na melhor das hipóteses, o convívio com amigos?

Raios partam isto. Como foi que deixámos que isto chegasse a este ponto?


NB: Para ler mais sobre este assunto e ver um vídeo sobre o assunto, por favor clique aqui.
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A primeira e a última fotografia provêm daqui. Em relação às outras não descobri a proveniência.

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Relembro: a seguir há mais dois posts, o primeiro com um texto fantástico de Concha Caballero que acho que não devem perder e, mais abaixo, um que mostra mais um dos embustes em curso. Somos dóceis e fáceis de enganar é o que é.

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Já estou com muito sono, mal me aguento. Não vou reler o que escrevi pelo que vos peço que me perdoem se o texto estiver cheio de gralhas.


Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta feira!


sexta-feira, janeiro 17, 2014

Peter Pan pede Wendy Darling em casamento - mas, para surpresa de todos, não era uma deixa, era mesmo vida real. O romântico Sandor Sturb de joelho em terra pediu a mão e a encantada Lilly-Jane Young disse que sim. A assistência irrompeu num emocionado aplauso.


No post abaixo mostro-vos um poema que me cai como uma luva e mostro-vos também alguns dos meus caminhos in heaven, caminhos construídos pedra a pedra ladeados por árvores plantadas, regadas e podadas uma a uma por mim. Parte de mim está ali tal como parte de mim está no que aqui escrevo. Divido-me. Multiplico-me. Os Poetas percebem-me.

Mas isso é a seguir.

Aqui, agora, mostro-vos uma surpreendente declaração de amor. 


O filme abaixo fala por si mas, caso queiram ler toda a notícia, cliquem, por favor, para verem o artigo completo tal como um Leitor me enviou.

Neste mundo inclemente ainda há momentos de inocência e romantismo, de festa, de alegria.

Não é de 'curtes', de 'amizades coloridas', de 'cenas', de 'estar', de coisas assim. Não. Aqui fala-se de amor, de comprometimento, de um voto de confiança num futuro a construir, no porvir. Será da juventude, será de um inusitado espírito romanesco. Seja. Mas é bonito de se ver.



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quarta-feira, outubro 24, 2012

Porque é que toda a gente ali anda tão feliz...?! - À laia de explicação, mostro-vos a biblioteca municipal para que vejam um dos muitos motivos. Como não se ser feliz num sítio assim? OBA, a biblioteca de Amsterdam, uma biblioteca 'with a view'


Pois é, meus Caros, é um facto: o que é bom acaba depressa. Mas foi bom, bom mesmo. Foram quatro dias que valeram por muitos quatro. Depois de no final da semana passada, depois de dois dias de trabalho fora de casa, com viagens para cima e para baixo, eis que no dia seguinte, sábado, logo de madrugada, mas tão de madrugada senhores, sem ter tido tempo de dormir nada de jeito, estafada, parti para outra.

Se no domingo à noite, quando, por um bocadinho, deitei a mão a um computador que não o meu para vos enviar um alôzinho e vos disse que descanso era coisa que eu não estava a ter, era bem verdade. Quatro dias valem por muitos quatro quando cada minuto é aproveitado ao máximo. Ou seja, o contrário de 'não descansar' não é, neste caso, trabalhar: é apenas cansar, cansar mesmo. Agora que já aqui estou de volta ao meu computador, o cansaço quase me passou. Acontece isso quando é um cansaço apenas físico, um cansaço positivo, provocado pelo excesso de momentos bons. Apenas persiste algum incómodo nos pés e um ligeiro retrocesso da recuperação pós cirúrgica, retrocesso que espero que seja passageiro. Segundo o médico podem passar uns seis meses até que a recuperação esteja totalmente concluída e, no meu caso, vai em três meses e meio e ainda nem comecei a fisioterapia. Portanto, quatro dias de caminhada intensa não seria propriamente aquilo de que o meu organismo estaria à espera. Mas poderiam lá quatro dias valer apenas quatro dias...? Claro que não.

Mas agora já estou sentada. Depois de ter chegado a casa já desfiz as malas, já fiz e estendi uma máquina de roupa, já fiz uma panela de sopa e já assei no forno uns peitos de frango com maçã para o jantar de amanhã (que isto de se ser simultaneamente dona de casa e uma esforçada assalariada e, ainda, querer intercalar com momentos de lazer não é pêra doce). 

Já passei as fotografias para o computador, centenas, muitas centenas, e já li os comentários e mails, que muito sinceramente agradeço.

Hoje, uma vez mais, vou cometer a indelicadeza de não responder, facto pelo qual, de novo, me penitencio.

Amanhã volto à minha vida normal e, logo amanhã que me apetecia era ficar a dormir até mais tarde, tenho que me levantar ainda mais cedo do que de costume e, ao fim do dia, presumo que apenas voltarei a casa de noite. E, agora a seguir, depois de escrever isto, quero ver se consigo, nem que de raspão, passar os olhos pelas fotografias para ver quais as que vos hei-de mostrar amanhã ou depois. Ou seja, para o fazer, vou demorar ainda um bom bocado mais e, para ver se me deito um bocado, que amanhã o dia vai ser longo, não vou poder trocar umas palavrinhas com os meus Leitores que, tão, simpaticamente, me deixaram comentários ou escreveram mails. Aceitem, por favor, as minhas desculpas. Estes últimos tempos têm sido muito atípicos.

Entretanto, para vos aguçar o apetite, vou já aqui colocar umas fotografias relativas ao fim da manhã de sábado, umas que, antes de começar a escrever isto, fui já bisbilhotar.

Dizia eu, no domingo, quando vos escrevi um texto a que parece ter dado o vento, levando cedilhas e acentos, que, por aquelas bandas, não se vê gente ensimesmada, gente soturna, cinzenta. Pelo contrário, toda a gente conversa na maior boa disposição, toda a gente ri, uma alegria que dá gosto.

Durante estes quatro dias tentei perceber porque estavam todos tão felizes.

A primeira resposta chegou logo nessa manhã de sábado. 




Tinham-me falado nesta biblioteca. Moderna, materiais fantásticos, não há barulho, um luxo, uma simplicidade, uma maravilha - disseram-me. 

Fomos ver. De facto. Ampla, muito, muito espaçosa, muito, muito luminosa, arejada, desempoeirada, novos e velhos, crianças e adultos, toda a gente usufrui como se usufruísse da sua própria casa.




As pessoas procuram o que querem, pegam no que querem, instalam-se onde lhes apetece, ajeitam os seus próprios recantos.

Música, revistas, livros, objectos de design, pequenas exposições, tudo ali está para ser desfrutado.




E muitas peças em exposição, muito artesanato urbano, tapeçarias, peças diferentes de tudo o que se conhece, tudo parece ter uma vida própria, tudo e todos parecem ter pleno direito ao seu próprio espaço.




E muitos jovens na maior informalidade, mas todos muito aplicados. São recantos, salas, e ali estão eles, fazendo trabalhos, conversando, escrevendo. Os espaços têm décors variados, uns são verdadeiras salas de estudo, outros são compartimentos mais isolados, outros são secretárias aos pares, tudo muito variável, e, geralmente, no meio de arte moderna ou objectos inovadores.




E depois há umas cabines extraordinárias, uma espécie de cápsulas multiusos, parecem pequenos escritórios unipessoais, e dentro de cada um, no maior sossego, uma pessoa trabalha como se estivesse fora daquele contexto. 



E há a vista maravilhosa que se tem dali, e há sofás, cadeiras que as pessoas levam para o recanto de onde têm a melhor vista, ou onde se sentem melhor. É a liberdade total, é a descontração total, é o ambiente mais propício à aprendizagem, à leitura, ao descanso. 




E se alguém quer almoçar ou lanchar ali mesmo, porque não poderia fazê-lo? É só escolher o melhor sítio.




E, meus Caros, todas, mas todas as pessoas que por ali andam, parecem ter as feições suavizadas, um ar tranquilo, e não se vê pressa, stress, agressividade, tristeza. Não se vê.

Mas, vejam bem, olhem bem estas imagens: não vos parece natural que andem todos tão felizes?

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Estou, neste momento, a ouvir as desgraçadas notícias sobre uma nova (e mais do que expectável) derrapagem nas receitas fiscais e sobre vários outros relatos que revelam a gestão desgraçada que este incompetente governo anda a fazer da coisa pública. Mas nada de desanimar, está bem? Temos é que lutar para que venhamos a ter gente decente à frente do País, para que o nosso País volte a ser um lugar decente para nele vivermos, nós, pessoas decentes.

E o que vos desejo, para já, meus Caros leitores, é que tenham uma bela quarta feira. 
Saúde e boa disposição!