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domingo, julho 13, 2025

Uma conversa entre duas pessoas que admiro, mas em que se fala em algumas coisas pouco agradáveis levadas a cabo por portugueses
... Outros tempos... outros tempos...

 

Apesar de tudo, apesar de ter servido 'buffet' variado -- e, feito por mim, apenas a sopa e a preparação das saladas --, a verdade é que por ir buscar comida aqui, ali e acolá, e se calhar pelo peso da idade ou por outra coisa qualquer, à noite, o sono avançou sobre mim à força toda. 

E os meninos até eram para ter dormido cá. Mas, afinal, um deles, apareceu com covid. Assim de repente, estando ele febril, houve que tomar uma decisão. Mas não foi difícil. O tempo este sábado já não esteve de chuva, do outono da véspera passámos para uma simpática primavera, pelo que esteve bom para almoçarmos ao ar livre. E o resto da tarde, tirando os rapazes do futebol que gostam de se fechar na sala a ver não sei o quê, futebol, vídeos ou cenas, estivemos sempre na rua. Portanto, apesar de o covid já não ser o bicho papão de há cinco anos, se pudermos evitar apanhá-lo melhor. Eu e o meu marido estamos convencidos que ficámos agarrados pelo long covid pois, depois de o termos, nunca mais nos libertámos do peso do sono que parece que continua a apertar connosco muito mais do que antes e muito mais que o razoável. O médico diz que há muita gente com estes sintomas e que se espera que acabe por ir passando.

Mas, meu rico menino, nada lhe tira o apetite. E, estando mais murchito, esteve menos reguila. Fofo, só me apetece dar-lhe beijinhos. Está um rapazinho crescido mas, claro, ainda longe dos primos que estão crescidos, uns homenzões grandes, de voz grossa, ou da mana, alta, uma belezura, ou como o mano que ainda não entrou propriamente na adolescência mas que para lá caminha com ansiedade, com vontade de ser grande, peludo e malandreco como os mais crescidos.

Agora à noite, quando ficámos só os dois, fomos fazer a nossa caminhada nocturna e, no regresso, depois de tratar de uns expedientes, sentei-me aqui e pimba, tiro e queda, adormeci.

Claro que não faço ideia do que se passou no país ou no mundo e, sinceramente, nem vou tentar saber. Não me apetece arranjar argumentos para me tirar desta doce paz de espírito em que me sinto tão bem.

Aqui ao meu lado, deitado no sofá 'dele' (sofá que os netos adoram, há sempre algum deitado no 'lugar do avô'), o meu marido dorme a sono solto. A esta hora já costuma estar na cama mas, desta vez, depois de ter ligado a televisão e posto no 24"Kitchen, adormeceu que foi um regalo. Como não me importo de ir ouvindo falar em noodles, couve chinesa cozida, anis estrelado, empratamentos elegantes e etc., não lhe digo para mudar de canal e deixo-o estar a descansar.

Nos últimos dias tenho acordado sempre mais cedo do que o habitual pois tem havido sempre algum afazer matinal e, como não continuo a não conseguir ir para a cama mais cedo (senão não prego olho), acumulei algum sono atrasado.

Por isso, hoje fico-me por aqui. Li os vossos comentários mas não tenho energia para escrever mais. As minhas desculpas.

Vou antes partilhar uma conversa entre dois comunicadores que, na medida das minhas possibilidades, vou seguindo: o charmosíssimo e empaticíssimo Pedro Bial e o médico que fala claro sobre tudo, Drauzio Varella. A conversa rola gostosa sobre vários assuntos, até que o tema da 'descoberta' do Brasil pelos portugueses e o que eles fizeram aos índios vem à baila. Interessante. Claro que tudo tem que se pôr em perspectiva, situar no tempo e no espaço. Não dá para pensar no que se passou, usando os cânones de agora.

MEDICINA, Amazônia e HISTÓRIAS | Conversa Com Bial | GNT

Em uma conversa profunda, Drauzio fala sobre seu novo livro "O Sentido das Águas: histórias do Rio Negro", uma obra que mergulha nas vivências das comunidades ribeirinhas da Amazônia. Ele também compartilha reflexões sobre a medicina como arte, seu compromisso com o cuidado humano e a importância de ouvir, com empatia, os relatos das pessoas por onde passa.

Desejo-vos um feliz dia de domingo

segunda-feira, dezembro 09, 2024

Revisitar o passado

 

No outro dia, aqui nesta vossa humilde chafarica, verifiquei um número anómalo de visitantes a reler um post já antigo. Fiquei muito admirada. Quando vi o título, percebi. 

Éramos felizes e não o sabíamos...? Voltaremos a sê-lo e ainda não o sabemos...?

Muita gente foi aos motores de busca escrever "éramos felizes e não o sabíamos", expressão que, como sabem, foi usada pelo desbocado Marcelo a propósito dos 8 anos em que trabalhou com António Costa. (Anda a ver se se limpa... mas não se limpa porque não somos desmemoriados nem mentecaptos). Mas, então, os algoritmos mandaram essas pessoas aqui para o Um Jeito Manso.

Nesse post, escrito no fim de Março, eu questionava-me sobre o que estava para vir. A crise Covid era recente, ainda se sabia muito pouco, estávamos todos confinados. Por sorte, temos possibilidade de nos refugiarmos num dos lugares do mundo em que nos sentimos melhor. Estávamos, pois, no campo. Mas trabalhávamos desde manhã muito cedo até às tantas da noite, passávamos os dias inteiros ao telefone ou em frente ao computador e os problemas choviam-nos em cima, em catadupa. Mal tínhamos tempo para almoçar e via-me aflita para conseguir preparar as refeições.

Acresce que nessa altura a minha mãe ainda resistia e dispensar a fisioterapeuta que ia lá a casa e não queria correr o risco de melindrar a senhora que lá ia ajudar com o meu pai pelo que não lhe dizia para se descalçar ou para usar máscara. Achava que era tudo um bocado exagero ou que só acontecia aos outros. Isto enquanto eu acompanhava a aflição de um colega com o pai com uma dor nas costas, depois sem respirar e, por fim, em meia dúzia de dias, a morrer de covid. Contava à minha mãe e ela achava que eram pessoas sem cuidado. Tive que dizer que ia eu telefonar à fisioterapeuta e à outra senhora para ela se encher de coragem e passar a seguir as indicações da DGS. 

Os noticiários abriam e fechavam com os números crescentes de casos e de mortes.

Por isso, naquele post eu relembrava os tempos tranquilos pré Covid e interrogava-me sobre o que estaria para vir.

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Entretanto, ontem, de novo, um número grande de visitantes a lerem um outro post antigo, este de 2019.

Com incansável inteligência e alguma ocasional petulância

E, também aqui, reli com prazer. Lembrava os tempos em que um grupo de directores, praticamente todos da mesma idade, todos muito irreverentes e bem dispostos, todos amigos uns dos outros, curtiam à grande. Curtíamos no sentido de nos divertirmos à séria. Também trabalhávamos (e, sempre tive essa ideia, trabalhávamos articuladamente e bem) mas era um prazer, uma alegria. 

Ao escrever, relembrei alguns episódios que me fazem sempre sorrir. Ainda ontem o meu marido relembrou um episódio, dos mais picantes e salgados a que assisti, e assisti no meu gabinete (que era um ponto de encontro), que me faz rir à grande sempre que dele me lembro. Como o meu marido conhecia bem os dois envolvidos, na altura contei-lhe. E também achou o máximo. Passou para os nossos anais da truculência, da malícia, da malandrice. (Não faz parte do que contei no post referido).

Depois mudei para uma empresa em que eram todos muito betos, na realidade, supé-betos, daqueles que não se acham betos porque acham que os betos são uma classe inferior, nouveau riches, pois eles, pelo contrári,o são sobretudo old money. Mas que, na verdade, são betada da maior, até à medula. Tudo boa gente, educadíssimos, simpatiquíssimos... mas incapazes de uma brejeirice, de um palavrão. Senti-me desterrada. Era só trabalho, trabalho, trabalho... e, caraças, uma seca...

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Convido-vos, pois, a clicar nos links acima. Por vezes, sabe bem revisitar o passado.

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Desejo-vos uma boa semana a começar já por esta segunda-feira

Saúde. Esperança. Alegria

quinta-feira, agosto 08, 2024

A culpa é do raio do long covid... Só pode...

 

Ainda não consegui chegar ao ponto que tanto ambicionei: ter tempo e organização pessoal para me pôr a experimentar coisas, a fazer o que me apetecer, sem ter que interromper por mil e um motivos.

Provavelmente é este regime de fazer caminhadas, geralmente duas por dia, uma curta, para aí meia hora a meio do dia (e está calor para mais), e uma mais longa, quase uma hora, mais ao fim do dia, que anda a cortar demasiado o dia, a interromper o que estou ou vou fazer. 

Claro que me refiro a quando não tenho cá crianças ou a família em geral. Nesses casos só consigo fazer uma caminhada à noite ou perto disso. Mas esses dias estão fora destas considerações pois, obviamente, nessas circunstâncias, não é possível outra coisa que não dedicar-me a eles.

Mas, nos dias em que estamos só os dois, eu gostaria de ter tempo para fazer mil coisas: jardinar, pintar, fazer peças com pedras e conchas, escrever, fotografar, fazer vídeos. Mas não consigo. Ou porque são horas disto ou horas daquilo, parece que não consigo ter disponibilidade ou rendimento. 

Além do mais, continuo com os mecanismos do sono avariado. Falei com um médico sobre isto. Contei-lhe que pode ser impressão minha mas acho que desde que tive Covid o meu sono nunca mais foi o mesmo. Posso dormir lindamente de noite, acordar por mim, tudo na maior. Pois, mal acabo de almoçar, fico perdida de sono. Se me sentar a ler ou a ver o computador, são as passas do algarve para não dormir. Ele disse-me que acredita que é o long covid, que há muitos doentes dele que se queixam do mesmo. Diz que alguns não se queixam disto e outros queixam-se durante uns meses a seguir mas que há outros que, ao fim de um ou dois anos ainda se queixam. É o meu caso. Diz que ainda não sabem como tratar isto.

Caraças.

Mesmo que não durma, não tenho aquela energia necessária para improvisar, para ter vontade para inventar, para arriscar. 

Vejo os vídeos que, quando trabalhava via e que me faziam ter uma imensa vontade de me reformar para ter uma vida assim, e constato que estou a milhas. O meu marido diz que se me deitar cedo, acordo cedo e tenho a manhã toda ao passo que agora tenho apenas uma parte. Não creio que seja isso. 

Vejo esta Elaine e penso que eu que gosto tanto de pintar galos, que pintei carradas de telas cheias de galos, não poderia continuar a improvisar e a diversificar em torno do tema? Podia, não é...?

Elaine Savoie - Painter, Market Gardener

Zsofin Sheehy meets painter Elaine Savoie on her Hornby Island homestead and Studio. An unapologetic iconoclast, Elaine uses her painting practice to question the norms of her Catholic upbringing and human-centred society. The conversation follows Elaine's life of making, raised by the community of island artists and shaped by her process, connection to the land she stewards, and using art as a tool to play and explore oneself. In addition to her creative practice in painting and drawing, Elaine also uses writing and poetry to humorously and fearlessly delve into the intricacies of island life and reflect on her Metis heritage, interweaving themes of personal identity and the complexities of intergenerational processing.  

An artist and farmer born on Hornby Island, Elaine Savoie's upbringing within the early farming settlements of the Savoie family, the Catholic church, and the island's unique natural landscape laid the foundation for her creative journey from a young age. In her nationally recognized Icon series, she seamlessly merges canonical and imagined saints, creatively embodied as roosters, seabirds, and other local creatures. 


Saúde. Alegria.
Dias felizes.

terça-feira, fevereiro 27, 2024

Os 'meus' factos do dia: a importância que os excitados de direita (Maria João Avillez incluída) deram à aparição do Láparo no Algarve e a advertência feita pelo Luís Paixão Martins, na CNN, de que a tracking poll da dita CNN não representa a população votante pelo que os resultados apresentados podem não ser fidedgninos

 

Acordaram-me com um telefonema e já não voltei a adormecer. Com a necessidade de dormir de que sempre padeço, isto é grave. 

Acresce que finalmente vieram cá arranjar um depósito que estava a verter água. Vieram cedo e, claro, foi uma festa a nível canino. O cãobeludo ouve vozes, sente presenças estranhas, e, portanto, ladra, anda pela casa num virote, a avisar-nos do perigo e intrigado por o mandarmos calar em vez de irmos para os abrigos. Não houve sossego.

E se não acontecesse sempre aquilo de que o que pode correr mal, claro que corre sempre mal, teria sido bom. Mas correu mesmo mal e os homens estiveram cá até às nove e tal da noite pois, no fim de subirem e descerem ao telhado, de irem e virem ao sótão, de andarem dentro e fora, a coisa não funcionava. E o cão doido da vida. O meu marido já num desespero com vontade de os ver pelas costas. E eu na mesma. Mas, claro, não podíamos ficar sem água quente.

Com tanto entra e sai deles e tanto ladrar do pobre animal, esqueci-me de baixar o lume do fogão e só dei por ele quando me cheirou a queimado. Arroz queimado. O caldo veio por fora, queimando-se em volta do bico. Penso que foi só a camada inferior do arroz a ficar sacrificada pois, mau grado o intenso pivete a esturro, já o jantámos e estava bom. Como fiz para duas vezes, amanhã, quando formos mais fundo, é que devem ser elas. Mas, optimista que tendo a ser, ainda quero acreditar que, com sorte, o cheiro terá sido sobretudo do caldo queimado, que veio por fora, e não do arrozinho em si. 

De tarde, depois de almoço, estava com sono mas, com as movimentações e o barulho, não deu sequer para fechar os olhos. Mas bem precisava.

Depois dos homens terem saído ainda fomos fazer a caminhada nocturna com o cão de guarda. Um frio que só sentido, um vento antárctico, irrespirável de tão gélido.

Depois é que jantámos. Agora estou cheia de sono. E do cão nem falo: está aqui no chão, estafado, estendido, a dormir a sono solto. Quando é para dormir, costuma sair da sala e vai para os seus aposentos. Hoje não conseguiu, ficou a meio do chão, indiferente a quem entra ou sai da sala.

Não vi televisão senão agora. E pasmo com o relevo que os comentadores estão a dar à aparição do Láparo. Foi ao Algarve, nem sei se a Boliqueime, mostrar o seu sorriso sem lábios, foi lembrar-nos o seu ar malévolo. Um susto. Como se aquela criatura de má memória fosse mobilizadora para alguém. Por exemplo, apanhei um bocado da Maria João Avillez, numa excitação quase desvairada, pegada, imagine-se, com o Bugalho (que, honra lhe seja feita, lhe respondeu à altura), uma coisa que mostra bem a índole inflamada e facciosa das hostes laranjas.

Ouvi, depois, o Paixão Martins dizer que o Passos Coelho talvez mobilize aquela direita que anda indecisa entre o Montenegro e o Ventura. Talvez. Se, com isso, o Láparo conseguir fixar eleitorado laranja em vez de os deixar fugir para o Chega, menos mal.

Gostei foi de ouvir o Paixão Martins passar um atestado de incompetência à CNN por ter uma tracking poll deficiente, que, muito provavelmente, está a distorcer as análises feitas às tendências de voto. Imagino que, a esta hora, os da CNN andem a ver como remediar a situação. A menos que a intenção seja mesmo a de manipular a opinião pública. Já não digo nada.

Tirando isso, pouco ou nada mais tenho a dizer. 

Ainda tenho muita triagem a fazer nos livros que estão na cave, ainda a monte, (e preocupa-me, claro que sim, este acréscimo considerável de volumes pois se antes já tinha a perfeita consciência que nem que viva até aos 200 ou 300 anos conseguirei lê-los a todos, agora ainda mais difícil será -- até porque os livros antes tinham uma letra muito miudinha e uma pessoa a partir para aí dos 150 já deve ter uma certa dificuldade em conseguir entender-se com páginas compactas de letrinhas minúsculas; a menos que, daqui por uns anos, já haja maneira de fazer ligação directa entre as páginas dos livros e o cérebro, sem ter que esforçar a vista).

Para além dos livros mais antigos também terem um papel que agora já me parece um pouco desapropriado, alguns também já estão com a folhagem um pouco desconchavada. Mexo-lhes com mil cuidados mas a pensar que deveria dar-me ao luxo de gastar com eles o tempo necessário para recoser as folhas ou para colar as lombadas. Só que continuo a não conseguir dar vazão a tudo o que tenho em mente. Ou são coisas a mais ou tempo a menos ou, o que talvez seja provável, estou a ficar muito menos produtiva do que era antes.

Uma amiga contou-me que o marido, desde que teve covid, não voltou a ser o mesmo, que se cansa muito, que mal dá um par de passos a mais que o habitual fica logo com os bofes de fora. E ela é médica. Ou seja, pelos vistos ainda não descobriu maneira de o voltar a colocar nos eixos. Também tenho ouvido dizer que a gripe deste ano deixa algumas pessoas podres de sono. Ora eu, a seguir a ter covid, faz agora um ano, fiquei alguns meses pedrada de sono. E a gripe que tive há pouco tempo também me deixou com muito menos energia. Se calhar é isso tudo junto que ainda tenho agarrado a mim. Isso mais os anos que tenho em cima. Caraças.

E depois há este meu biorritmozinho do caneco. Podia escrever aqui durante o dia. Mas não senhor. Continuo a achar que o dia é para trabalhar ou fazer tarefas de outro tipo. Escrever aqui é hobby ou vício nocturno. Faça chuva ou faça sol só começo nisto às tantas. Portanto, só por isso, já era caso para ter sono. Agora imagine-se que, para além disso, há ainda o efeito cumulativo do sono e da quebra de energia pós covid e pós gripe. E já nem falo dos meses de stress agudo que vivi com a situação da minha mãe, o último dos quais totalmente arrasador. Conclusão: durante o dia, por vezes penso que quero falar disto ou daquilo. Depois chego aqui à noite e já estou com a bateria nos mínimos. Parvoíce, isto.

Bem.

E esta terça-feira vou ter uma agenda bem preenchida pelo que mais vale não ir muito tarde para a caminha.

Tinha aqui um vídeo bom mas fica para outro dia.

sábado, dezembro 16, 2023

Os tempos em que meio mundo se reunia via Zoom ou via Teams

 

Ao ler o comentário da Janita, que muito agradeço, não apenas me comovi como fiquei com alguma vontade de recordar os tempos em que tinha a cabeça sempre tão ocupada que conseguia encaixar as preocupações num canto da cabeça que era compaginável com o que se passava nos outros cantos. Nesses tempos, passei por situações deveras complexas e, embora por vezes a grande custo, sempre consegui continuar a trabalhar, gerindo as emoções com pinças mas também com alguma ponderação e a racionalidade possível.

Com a situação que estou a viver agora, uma situação deveras complexa, sinto que estou, na realidade, a ir-me abaixo. O meu filho no outro dia também me disse isso: que estou a precisar de voltar a trabalhar para não ficar entregue, a tempo inteiro, às preocupações. Não sei. É uma situação que me custa tanto, que me abala tão profundamente nos alicerces, que não sei se o trabalho seria suficiente para não ficar entregue a ela a tempo inteiro. Também é certo que o que se passa agora é o corolário do que vem acontecendo desde há algum tempo e que, pela continuidade em crescendo, sem um dia de tranquilidade, provavelmente me esgotou, me deixou fragilizada. Não sei.

Mas a Janita puxou-me pelo braço e a Ana tentou confortar-me, o que também muito agradeço, e alguns leitores têm-me enviado mails simpáticos (aos quais não tenho respondido, pelo que peço desculpa) e, por isso, hoje decidi que ia aqui falar não do que me traz tão preocupada e triste mas dos tempos em que trabalhava de sol a sol sem tempo para coisa nenhuma e com energia e alegria para ultrapassar todos os contratempos e desgostos.

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Em Março de 2020 todas as empresas que puderam mandar os seus trabalhadores para casa o fizeram. Claro que isto se aplicou sobretudo ao sector de serviços pois quem estava nas fábricas, nos hospitais, nos sectores de água, electricidade, comunicações, manutenção, etc., esses tiveram que se manter em funções, alguns deles com mais trabalho que nunca.

As escolas também recuaram para as trincheiras e os artistas foram apeados. 

Tempos difíceis.

Na altura trabalhava em mais que uma empresa e durante não sei quanto tempo trabalhei horas a fio, debaixo de stress, horas e dias consecutivamente. Estava em casa, no campo, em teletrabalho e não tinha um minuto de descanso.

Pela natureza das minhas funções, tinha que fazer muitas reuniões e via-me forçada a ir de umas para as outras sem intervalo, sem tempo para mudar o chip, frequentemente sem tempo para me preparar para elas. Muitos dos participantes estavam também em casa. Mas havia os que estavam em trânsito e faziam a reunião no carro, outros estavam em instalações operacionais e, para fugirem ao barulho ambiente, enfiavam-se em buracos em que quase não havia rede.

Nessas reuniões, em especial nos primeiros tempos, quando as reuniões por Teams ou por Zoom ainda eram uma novidade, acontecia de tudo. 

Uma das directoras estava em casa com o marido e três filhos. O mais novo tinha quatro ou cinco anos e sistematicamente ia agarrar-se à mãe a dizer que tinha fome. A mãe a querer impor a sua vontade perante os colegas ou a negociar e o filho a mendigar uma côdea de pão. Antes de a coisa se consumar, nós víamo-la a enxotar a criança um bocado à sorrelfa, tapando a câmara do computador. Por fim, já éramos todos a solidarizar-nos com o miúdo e a pedir à nossa colega que fosse arranjar qualquer coisa para o filho comer. Outras vezes ouvíamos o cão a ladrar no jardim. Ou à porta de casa que ficava no alinhamento do sítio onde ela estava. Sei que o pastor-alemão ladrava de uma maneira que impedia a reunião. E, então, nessas ocasiões, geralmente víamos o marido passar por trás dela, vindo não se sabe de onde, e escapar-se com cuidado pela porta, certamente para o cão não entrar. E a reunião prosseguia como se nada se passasse.

Outro, com quatro filhos, corria a casa tentando não os apanhar nas aulas deles e, ao mesmo tempo, instalar-se num sítio em que tivesse boa rede. Punha-se sobretudo no piso de cima, num recanto ao topo das escadas. Contudo, era inevitável que, volta e meia, aparecesse algum dos filhos a subir ou a descer as escadas a correr. De vez em quando perseguiam-se uns aos outros, por vezes em tronco nu. O pai tapava a imagem e desligava o microfone e ia tentar impor limites aos filhos. Mas, por vezes, enervado como ficava, esquecia-se e nós ouvíamo-lo a ameaçar correr com todos à bofetada e os putos a protestarem, a queixarem-se uns dos outros.

Uma das cenas mais engraçadas passava-se de vez em quando com um colega que colocava um fundo falso, uns prédios ou umas estantes, já não me lembro. E, de vez em quando, aparecia a mulher, atrás, meia desfocada, num canto, a espreitar para o ecrã, certamente para ver os interlocutores do marido. E nós víamo-lo, com a mão, em baixo, a sacudi-la, a mandá-la afastar-se. E ela desviava-se um bocado mas depois víamos a cabeça dela esticada e ela, de óculos, a olhar atentamente para nós. Depois ele cortava a câmara e o microfone e, certamente furioso com ela, devia ir despachá-la para outra divisão.

E, ao princípio, um colega já de uma certa idade, pouco dado às tecnologias, via-se aflito para entrar nas reuniões. Então, ia chamar a mulher, por sinal uma conceituada neurologista, identicamente pessoa também já de alguma idade, para o ajudar. Estavam os dois numa pilha de nervos, sem atinarem, ambos com os óculos na ponta do nariz, ela com uma mantinha sobre os ombros. Só que nós os víamos e ouvíamos: carrega aqui, experimenta ali, não é aí, é aqui, não isso também não, porcaria, todos à espera e nós aqui, grande porcaria esta. Acabávamos sempre a ligar-lhe para o telemóvel para tentarmos guiá-lo(s) e dizer-lhe(s) que ele(s) é que não nos via(m) e ouvia(m) mas que nós estávamos a seguir aquela saga em directo. Mesmo o atenderem o telemóvel era um filme pois nunca o tinha ao pé dele, ouviam tocar e não sabiam onde... e nós, por vezes uns dez, a postos, à espera que ele atinasse e conseguisse participar na reunião.

E muito mais poderia contar pois foram tempos épicos em que muita coisa divertida acontecia. Divertida e não divertida... Por exemplo, acompanhávamos a preocupação de um colega que estava sem saber o que se passava com o pai, o senhor com uma dor nas costas, sem se conseguir mexer, um jeito, qualquer coisa, ciática, coisa assim, a mãe sem força para o ajudar, e esse nosso colega por vezes chegava tarde às reuniões pois as coisas em casa dos pais estavam cada vez mais complicadas. Até que estranhou a prostração do pai, já a achar que o senhor podia ter tido um avc, chamou a ambulância e, creio que no dia seguinte, o senhor morreu. Um dos primeiros casos covid. 

Enfim.

Nunca gravei nenhuma reunião mas, mesmo que tivesse gravado, obviamente não poderia partilhá-la. Mas vou partilhar um vídeo que mostra uma reunião também fantástica: desentendidos, mal enquadrados, desorientados.

Reunião caótica do conselho paroquial torna-se viral: 'Você não tem autoridade aqui, Jackie Weaver'


Um bom sábado

Saúde. Coragem. Paz.

sexta-feira, outubro 27, 2023

O fascínio das raízes e dos frutos

 

Há uma qualquer disfunção entre mim e a Covid, seja na forma de doença seja na forma vacinal. A maior parte das pessoas que conheço que têm covid ou levam a vacina passam por ela de fininho. Eu, quando tive, fiquei a dormir e com um sono macaco durante meses. Agora é com a vacina. Ontem à noite uma soneira. Hoje ainda não dormi de dia, até porque não pude, mas tenho estado todo o dia sem gás, sem pilhas, o corpo a pedir-me cama e sono.

Para além disso ,dói-me um bocado o braço onde a dita me foi espetada. Cheguei a pensar que não estava em condições de ir para a piscina dar o corpo ao manifesto. Mas fui e lá me aguentei. Também pensei que não iria aguentar uma caminhada. Mas lá me aguentei. E até me soube bem. Caruma molhada, cogumelos, cheiro a pinheiros molhados, a erva verde. Oxigénio bom.

Resisti a isso. Mas teve consequências: as pilhas esgotaram-se mais um pouco.

Em contrapartida, o meu grupo de amigos esteve muito activo durante o dia: muita picardia, muita brincadeira. Assisti sem ter força para intervir. Como muitos são médicos, há sempre muita diversão em torno disso. Já aquela minha amiga médica que morreu sem ninguém perceber que estava a morrer (já falei aqui nisso algumas vezes pois fez-me muita impressão) passava a vida a enviar anedotas e cartoons sobre médicos, sobre doentes, sobre gaffes médicas, etc.

É isso e gays: não há quem diga mais anedotas sobre gays do que os gays. 

Mas acho isso saudável. Uma pessoa não se levar demasiado a sério dá saúde. As piores pessoas que, até hoje, conheci são as que se acham o máximo, que desprezam os outros, que não têm nem compaixão nem tolerância nem sentido de humor. Pessoas assim são intragáveis.

E, por falar em saúde: parte da família está constipada. Ou isso (que com tanta evolução já nem sei distinguir uma constipação das outras coisas) ou virose. Ou resfriado. Tanto dá.

Felizmente, até ver, tenho escapado. E deixa cá bater três vezes na madeira senão já sei no que vai dar. Durmo de janela aberta para sentir o frio que chega da rua, em especial de madrugada. Como a persiana fica mal corrida, entra a penumbra e a luz e o frio e os sons da chuva e da noite. E durmo apenas com uma fina mantinha (para além do lençol, claro). O meu marido abomina sentir o ar frio da rua e, por cima da fina mantinha, tem uma grossa mantona e, se necessário for, ainda uma outra. Tudo do lado dele. Eu não aguentaria, morreria assada de calor.

Mas já estamos naquela época do ano em que, quando vou para a cama, lá para as duas ou mais da manhã, me é confortável encostar-me a ele. Aqueço num instante.

E agora está a dar um programa fantástico na RTP 2, Raízes e Frutos. Uma raridade. Quem não viu e puder pôr a andar para trás, sugiro que o faça. Muito bom. Dizem coisas extraordinárias. E simples. E há imagens incríveis. Um fascínio.

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Grandma’s Hands | Kori Withers and Friends | Live Outside | Playing For Change

In celebration of Bill Withers' birthday, we invite you to experience music that will ignite your soul with this amazing, heartfelt Live Outside performance at Mark’s Park by Kori Withers and Friends, in a tribute to her father, performing a rendition of his beloved classic, "Grandma's Hands." Kori’s connection to the song is palpable, carrying the legacy and spirit of her father's music with grace and power.

“Grandma’s Hands” is an ode to Bill Withers’ grandmother, Lula Carter Galloway. This story of gratitude and shared memories is now told in a beautifully illustrated children’s book, painted by multiple award-winning artist R. Gregory Christie and published by Joel Harper’s Freedom Three Publishing in collaboration with the Withers Family’s Mattie Music Group. 

Desejo-vos um dia feliz

Saúde. Amor. Paz.

sábado, outubro 07, 2023

Sexta-feira presencial

 

Lembro-me de um dia, uma sexta-feira de um Março que me parece longínquo, participar numa reunião ao mais alto nível, na maior e mais nobre sala de reuniões. Estávamos todos surpreendidos e muitos sem perceber ainda o que estava a acontecer.

Sendo uma empresa tão grande, dispersa por várias geografias e com muitas instalações a funcionarem vinte quatro horas por dia, todos os dias do ano e operando num sector estratégico e crítico para o país, tínhamos que tomar uma decisão. E tomámo-la. Ali mesmo foi criado um comité de crise, traçadas as linhas gerais, escrito um comunicado com carácter de urgência. 

E ali mesmo combinámos que todos os que tivessem computador portátil pegariam nele e trabalhariam a partir de casa até ordem em contrário e durasse isso o tempo que durasse.

É uma imagem de desolação que guardo desse dia. Naquele escritório, em concreto, toda a gente tinha portátil. Uma pessoa estava cheia de tosse e sentia-se febril. Foi mandada embora de imediato.

E todos pegámos nos computadores e, olhando uns para os outros com espanto e preocupação, despedimo-nos sem saber quando voltaríamos a vê-los.

À maioria deles não voltei a ver.

A partir daí a empresa entrou numa voragem para tentar que todos conseguissem fazer o seu trabalho a partir de casa e para que os que tinham que estar 'presenciais' o fizessem em segurança.

Poucos dias depois, o pai de um colaborador directo morreu de covid. Os casos na empresa sucediam-se. Tínhamos que arranjar maneira de recompor equipas. Foram meses muito difíceis.

De seguida, surgiu-me um convite que não podia recusar, um desafio de loucos. Fui trabalhar para outra empresa. Portanto, deixei de trabalhar com aqueles de quem me tinha despedido em Março.

Durante muito tempo, por segurança, o trabalho foi remoto para quem isso era possível.

Depois passou a híbrido.

Ainda bem que assim é. O normal é que se ajuste a forma de trabalhar. Desde que o trabalho se faça, é bom que haja flexibilidade de parte a parte. 

E é verdade: quando alguém se recusa a trabalhar a partir de casa e defende intransigentemente o trabalho presencial não arredando pé do local físico de trabalho, já parece um pouco estranho. Confirmo que, por exemplo, ao ver um colega que entrava todos os dias quase de madrugada e era o último a sair, eu e toda a gente pensávamos que o fulano só podia ser alguém sem vida própria.

É disso que o episódio de hoje da Porta dos Fundos trata. O que aqui abaixo está escrito e que transcrevi do Canal deles não tem nada a ver.

Sexta-feira presencial

É sexta-feira, o expediente começa às 10h. Mando uma figurinha de "bom dia" no grupo da firma e continuo caminhando pela praia. Vou pro judô, tomo banho, chego ao computador de cabelo molhado às 11h30. Vejo vídeos no Youtube enquanto uma reunião acontece. Opa, meio-dia, hora daquele almoço de 2 horas. Mais uma reunião começa e eu entro no link ainda do restaurante. A partir das 15h, ver séries. 16h? Passar um café. Ok, hora de mandar um e-mail que enrolei tanto pra escrever, já são 16:55, hora de uma parada pra um cigarro porque às 17h encerro meu expediente mais cedo. Mais tarde é meu vôo pra Itália. Muito bom ser um CEO que exige trabalho presencial obrigatório.


Desejo-vos um bom sábado

Saúde. Bom descanso ou bom trabalho ou bom passeio. Paz.

segunda-feira, abril 24, 2023

As vacas e os bois correm para a ouvir cantar

 

Na caminhada da manhã apanhei um ramo de rosmaninho. Coloquei-o num vasinho com água dentro de outro vaso não furado, portanto, como se pusesse as flores dentro de água.

De tarde, estive a transcrever folhas na mesa que está debaixo do jasmim amarelo e da buganvília fúcsia e que tem a dita rosemary, na pseudo-jarra, em cima. O perfume de tudo é uma maravilha mas o perfume da rosa maria sobrepõe-se agradavelmente.

O cabeludo estava deitado aos meus pés. Um pássaro andava por ali a saltitar mas, como era pequeno, o cabeludo tomou-o por inofensivo e, portanto, nem se dignou mexer um pêlo.

Quando o meu marido veio lá de dentro, queixei-me que já me doía o braço, se calhar porque a mesa é alta demais para eu estar a escrever ao computador em cima dela. Para atenuar, sugeri que me preparasse uma bebida boa. Cavalheiro como é (e, certamente, com um certo peso na consciência por ter desistido de me ajudar na minha esforçada empreitada) veio de lá com um copo apetitoso só de olhar: sumo de laranja, um bongo, rum, nêsperas aos bocados e um bombom de gelado de chocolate preto e frutos vermelhos. Estava delicioso mas a única coisa que fez parar a dor no braço foi parar de escrever.

Tirando isso, posso dizer que hoje lavei as forras de almofadas aqui da sala e, por isso, agora que estou sentada no sofá, no meio delas, envolvem-me com um cheirinho fresco a sabão de marselha. 

Poderia ainda dizer que, ao fim deste tempo todo, eu e o meu marido continuamos sempre com vontade de dormir mas isso seria, para vocês, um déjà-lu. Mas, ainda assim digo: levantamo-nos com vontade de continuar a dormir, a seguir ao almoço, se pudermos, encostamo-nos onde calhar e dá-nos o sono e, mal nos sentamos aqui à noite, se não tivermos nada que nos impeça, fechamos os olhos e, passado um bocado, estamos a dormir. Tirando isso, parecemos normais.

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E talvez seja esta indolência que me faz desinteressar-me das tricas-laricas diárias. Ou, então, a covid não me trouxe apenas sono, trouxe-me também um filtro que criva as tretas e só deixa passar coisas como esta aqui abaixo que, sinceramente, acho o máximo. 

As vacas correm para ouvir a senhora a cantar. E canta bem, ela. Agora o que leva os animais a quererem tanto ouvi-la e a a ficarem, encostadas aos muros, para melhor a ouvirem? Bom ouvido? Sensibilidade apurada? Não sei e gostava de saber.

No meio das proezas e riscos da Inteligência Artificial, mudo de rota e deixo-me encantar com coisas assim.


Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Boas vibes. Paz.

terça-feira, março 21, 2023

Primeiros passos

 

No outro dia perguntaram-me o que é que eu estou a fazer. Disse que nada, que quero degustar o prazer de não ter compromissos, que é tão bom pensar que no dia seguinte não vou ter reuniões complicadas, que saber que não vou receber telefonemas problemáticos e um sem fim de temas que devoravam os meus dias é uma maravilhosa sensação de alívio.

E lembro-me sempre daquela ex-colega que encontrei uma vez no Colombo. Eu sentada num restaurante e ouço: 'Olha quem ela é...!'. Olho, admirada, e é ela, toda turista, toda radiante, vindo na minha direcção. Perguntei-lhe como era, ter todo o tempo do mundo. E ela: 'Tão bom...! Se vocês que ainda trabalham soubessem como é bom, ficavam todos infelizes, ainda bem que nem sonham, senão queriam todos deixar logo de trabalhar'

Mas ele insistiu e eu confessei que estava a escrever um livro e que isso é uma sensação muito boa. Pode até vir a ser uma frustração, não conseguir que alguma editora publique o que eu escrever. Mas estou em crer que não. Gosto do que dá luta, gosto de ter o que alcançar a duras custas. Ele disse que sim, que deve ser uma sensação boa, interessou-se.

Claro que dar estes meus novos primeiros passos em cima da covid não ajuda. 

E já acabei o livro. Estou na fase da revisão. Mas, para mim, bom, bom mesmo, é criar, pôr cá fora o que antes não existia. Agora... rever, limar, retocar... para isso já é preciso paciência. Agora imagine-se o que é isto caída de sono. É de cair para o lado.

A minha filha também é de escrever. Escreve, escreve. E, quando está inspirada, diz que é de rajada. Um dia vai ganhar um prémio, um dia vai publicar.

O meu filho não. Pelo menos até ver. E sempre se incomodou com os meus métodos: escrever ou pintar ou o que for tudo de empreitada. Para ele um livro deveria ser escrito em longos e esforçados meses. Disse-me que o Saramago escrevia uma página por dia. E diz-me que os leitores apreciam uma obra bem acabada. Contei ao meu marido que me sugeriu que eu lhe diga que o Camilo escreveu o Amor de Perdição em quinze dias.

Cada um é como é. E tomara eu poder chegar aos calcanhares de qualquer deles mas claro que estou mais para a velocidade do Camilo do que da do Saramago. 

Estou a rever o que escrevi e já desinteressada pois já só me apetece é saltar para o seguinte.

A minha neta disse-me: 'Gostava de ler o teu livro'. E eu disse que sim, poderia ler o início, e ia abrir para estar ao pé dela Mas ela disse que eu lho enviasse por mail. Ah isso não. Expliquei que tem partes para adultos. Deixava-a ler as primeiras páginas para perceber qual a opinião dela mas o livro todo só o meu marido é que pode. A minha filha perguntou se eu não queria que ela lesse. Não. Seria inevitável que viesse com sugestões e eu já não estaria nem aí. Uma coisa é detectar um erro, uma pontuação errada, uma sugestão na base da coisa pouca. Agora sugestões que me obriguem é meter-me outra vez na pele dos personagens, reverter partes do enredo, mudar o DNA de alguém, isso já não quero, já não dá.

Mas hoje que tinha pensado entregar-me a essa tarefa da revisão não consegui. Uma moleza e um sono... Uma amiga trocou mensagens comigo e disse-me que tenho que ter que paciência, que isto é natural, que ela, depois da covid, andou quase dois meses assim, cansada, cheia de sono, a arrastar-se.

Fomos ao fim da tarde fazer compras, nomeadamente adubo para citrinos e outras coisas, e depois passear na praia. Pois, ao chegarmos, enquanto o meu marido tomava banho, antes de jantar, voltei a adormecer profundamente. Mas isto depois de, a seguir ao almoço, pensando ler um livro que a minha filha cá deixou, ter também adormecido. 

Portanto, assim vai. Tenho que voltar a ter a energia habitual para meter pernas a caminho. Assim, como estou, não consigo fazer planos ou ter ritmo. Adormeço pelo meio. Ou, mesmo que não adormeça, pouco mais faço que borregar, preguiçar. 

E, a seguir, mal volte a ter pilhas, tenho que aprender a organizar-me nesta minha nova vida em que também me está a saber bem demais não ter obrigações a cumprir.

segunda-feira, março 20, 2023

Neste feliz Dia do Pai
[E técnicas simples para melhor enfiar a linha no buraco da agulha]

 

Dia de feliz primavera com a família reunida, cozinha a várias mãos, mesa cheia, algazarra, tempo belíssimo para almoçarmos no terraço, todos muito bem dispostos. Uma alegria.

A tarde continuou sereníssima, amena, sol ligeiro, uma temperatura amável. 

Pena é eu agora estar perdida de sono e não conseguir contar mais do que isto. Por exemplo, como o mais crescido está tão mais crescido que já me passa o braço pelo ombro e me diz que está preocupado comigo, eu cada vez mais pequena, qualquer dia uma criança. Ou as tropelias que uns fazem aos outros e que me fazem rir de gosto. 

Como é bom de ver, confirmou-se que amanheceu cedíssimo. Uns acordam os outros e já ninguém consegue dormir. Vêm logo ter comigo, conferir se estou a dormir. Ora, com eles cá, fico sempre com sono leve, acordo ao mínimo ruído. Por isso, antes de aparecerem ao pé de mim já eu estou a antecipar-lhes os movimentos.

Já estamos os dois, eu e o meu marido, bem melhor, quase normais (do pós-Covid, quero eu dizer). Mas a falta de energia ao fim do dia é que ainda não é lá muito normal. De tarde, enquanto uns jogavam ping-pong e os outros ficaram ao sol, o meu marido retirou-se para a sala e dormiu um bocado. Eu não. Por isso, agora, aqui à noite, já me deixei dormir. Diz ele que dormi horas. E agora estou aqui sem conseguir acordar capazmente. Horas não terei dormido, mas um bom bocado não digo que não. Já viram isto...?

Ontem já não consegui responder e agradecer os comentários e hoje estou na mesma. Não levem a mal.

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Há bocado, quando estive a espreitar as sugestões do Youtube, passei adiante das notícias bélicas russas ou das crises bancárias e desandei para as coisas inócuas e tranquilas. Nomeadamente, vi o vídeo que aqui partilho e que me pareceu particularmente útil. Dantes eu tinha umas agulhas que eram fáceis de se lhe enfiar a linha. Não sei o que lhes aconteceu. As que tenho agora são infernais. Acresce que longas temporadas de teletrabalho, maioritariamente frente ao computador, não me fizeram grande coisa à visão. Dantes eu não via muito bem ao longe mas ao pé era uma maravilha. Com o tempo, parece que a coisa funcionou como um sistema de vasos comunicantes: vejo melhor ao longe e pior ao perto. Enfiar a linha na agulha é um castigo.

Este vídeo é muito instrutivo. E é daqueles que é bom para a gente descansar a cabeça e preparar-se ainda melhor para dormir.


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Uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Boa disposição. Paz.

sábado, março 18, 2023

Lucy

 

Tenho a informar que, certamente fruto da sessão de hidroginástica e da meia dúzia de braçadas de ontem, esta sexta-feira dormi até depois das onze da manhã. Nem mais. Acordei e vi as horas para avaliar se ainda era boa hora para dar meia volta e dormir mais uma ou duas horas. Onze e vinte. De penalti, desde que me deitei, às duas e pouco, até às onze e vinte. Se não tivesse visto as horas de certeza que o sono se prolongaria, o corpo pedia-me mais. Levantei-me com sono. 

De tarde, tanto era o sono, fui para o meu cadeirão reclinável, puxei uma mantinha, fechei os olhos e foi imediato, boa noite cinderela. 

Infelizmente o cadeirão está junto à janela de que o urso de guarda fez guarita. Assim, mal passa um carro ou uma pessoa ou mal o cão do lado se mexe, aí está a fera a ladrar como se não houvesse amanhã. Por isso, a sesta, se existiu, foi de minutos. 

E o dia foi completamente improdutivo. Uma ressaca a preceito como se um ontem tivesse sido um dia de excessos. Mal dá para acreditar.

Parece que continua um qualquer bicho dentro de mim a sugar-me a carga da bateria. Ando sem pilha. O olfacto e o sabor estão repostos, a tosse foi-se e só de vez em quando fico com algum pingo ou alguma sensação de estar como que a resfriar-me ou a começar a doer-me a garganta. Coisas breves, episódicas, mal vêm assim se vão. Agora esta falta de energia mantém-se. É uma estupidez sem explicação

Apesar disso, entre uma breve caminhada a meio do dia (na verdade, a seguir a ter tomado o pequeno almoço) e a do fim do dia, fiz mais de dez mil passos. Mas esta última, debaixo de vento e frio, foi feita a pensar no bem que ia saber-me a caminha daí por mais um bocado. E sinto as pálpebras pesadas como se estivesse com défice de sono. Dá para entender...? Não dá.

E o meu marido está na mesma. Continua a levantar-se cedo, mas, de dia, passa largos períodos deitado no sofá (hoje, por exemplo, a rever os penaltis do jogo de ontem e, provavelmente também a dormitar) e agora, depois de se ter deixado dormir há séculos, já foi para a cama.

Claro que não fomos ao ginásio. Constatámos o óbvio: é melhor deixarmos passar mais uns dias.

Caraças para esta falta de energia. 

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E depois do boletim clínico (sorry por abusar da vossa santíssima paciência), vamos ao que interessa. 

Lucy. 13 anos. Um talento increditável.

O cérebro humano, esse vasto universo desconhecido, é extraordinário. Dá ideia que, nos casos em que os recursos não são distribuídos como usualmente, em vez de se perderem, não: são alocados a outras zonas. 

O caso de Lucy (tal como, por exemplo, o de Kodi Lee), é ilustrativo dessa hipótese. 

Lucy também é autista -- autismo severo --, e cega. Ainda quase bebé teve que ser operada a tumores malignos nos olhos. Tem também algum atraso no seu desenvolvimento. E, no entanto, apesar de parecer viver isolada do mundo, tem um dom extraordinário. Toca piano de uma forma absoluta. Todo o seu corpo vibra. Não se consegue dizer se é ela que procura a música para se entregar ou se é a música que a procura a ela para a envolver e conduzir.

O professor de piano, Daniel Bath, descreve o peculiar e difícil método de ensino. Diz também que nunca trabalhou com ninguém tão talentoso quanto ela. Ele toca, ela reproduz. Ela engana-se, ele põe as mãos dela sobre as suas. Ela escolhe o que tocar. Ou Bach ou Chopin. Ou Debussy. Outras vezes jazz. Intercala. E improvisa. 

Vê-se e ouve-se e não se acredita. Muito comovente. 

Mika e Lang Lang, que fazem parte do júri, também se mostram surpreendidos e emocionados.

Para assistir com o coração.

Lucy 
Ao vivo no Royal Festival Hall na  final de "The Piano"


E abaixo um vídeo em que se percebe melhor

The Amber Trust  -- A história de Lucy


Um bom sábado
Saúde. Amor. Paz.

quarta-feira, março 15, 2023

As insignificâncias do meu dia a dia.
E uma casa absolutamente extraordinária.

 

Uns dias é preciso reparar estores, outro dia é preciso reparar tomadas e interruptores. Depois vem alguém entregar alguma coisa. Em qualquer destas circunstâncias é preciso previamente isolar a fera pois não queremos cenas tétricas aqui em casa. 

E depois das intervenções é preciso limpar o que sujaram.

O meu marido queixa-se que não consegue estar sossegado. Quer pintar o telhado do forno ali fora e não consegue ter tempo.

Claro que, pelo meio, é preciso ir às compras, tratar de coisas cá em casa e ir caminhar, passeando o cão.

Hoje, por exemplo, ainda não consegui pegar no livro. 

Dantes fazíamos mil coisas e tínhamos tempo para tudo. Agora não há comparação possível e não temos tempo para nada. É certo que a covid deu cabo de nós (continuamos a meio gás) mas não sei se isso explica tudo.

Tenho ali mais umas little coisinhas para pregar na parede mas ainda nem ousei abordar o assunto. Com a desculpa que não gosta de fazer buracos na parede, dá sempre mais luta do que seria razoável. E agora, sem energia, meio constipado e aborrecido por não conseguir fazer o que quer, assoberbado que anda sempre com cinquenta mil insignificâncias, ainda mais mal disposto fica quando lhe peço para fazer coisas que não quer.

Andamos também a ver se nos inscrevemos em actividades físicas e, depois de morarmos aqui daqui a nada já vai para três anos, só hoje começámos finalmente a desbravar as redondezas. Ficamos surpreendidos quando descobrimos bancos, pizzarias, parques, piscinas, como se tivéssemos interiorizado que estávamos a milhas de tudo. De facto, não estamos. 

Claro que, apesar de ser tudo aqui relativamente perto, temos que andar a reboque do waze pois tudo isto ainda é para nós geografia desconhecida. 

Amanhã vamos ter mais arranjos cá em casa e, mal nos vejamos livres disso, fazer mais umas surtidas e, desejavelmente, já inscrever-nos para não perderemos a embalagem e começarmos com as actividades as soon as possible.

Tirando isso, o que posso contar é que, de vez em quando, vemos personagens surpreendentes. Hoje vimos uma senhora que presumimos chinesa. Digo que presumimos pois poderia ser japonesa, coreana, etc. Na verdade pouco se via do seu rosto. Talvez uns trinta e tal ou quarenta e poucos anos. Pele do rosto muito branca, lábios num rouge intenso e vibrante, chapéu muito chique, óculos muito grandes, escuros. Vestia o que eu diria ser um casaco comprido de bom corte, acima do joelho, num tecido com bom cair em cor de rosa, uma racha lateral de cada lado. Saltos muito altos. Elegantésima. Poderia ter vindo de uma sessão fotográfica para a Vogue. Estava a passear assim. Um pouco atrás ia um senhor, talvez pela mesma idade, mas vestido normalmente, diria que entre o desportivo e o casual. Ia a tomar conta de uma criança de tenra idade. Eu disse ao meu marido que o senhor se calhar era o motorista. O meu marido disse que talvez fosse o guarda costas. Concordei. Pareciam saídos de um filme. 

(Foi daquelas situações em que lamentei não ter lata para pedir muitas excuses e solicitar autorização para fotografar. Adoraria que posassem para mim)

Claro que com tanta actividade e sem ter conseguido descansar durante o dia, estou aqui a lutar para não me encostar para trás e deixar-me dormir. Não sei o que é isto. Durmo, durmo e não me passa o sono. O meu marido está na mesma.

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Mas antes de me render (... a ver se amanhã consigo responder, em particular à Fátima), só um apontamento. Já sabem que, quando aqui me sento à noite, gosto de espreitar as notícias e os vídeos. Geralmente não encontro notícias animadoras mas vídeos vejo sempre bem interessantes.

Quem por aqui me acompanha já sabe também que gosto de arquitectura e decoração. E o algoritmo do YouTube também sabe e, por isso, faz sempre o mimo de me presentear.

Este vídeo tem uma casa que é de uma pessoa ficar maravilhada. Não quer dizer que eu me reveja a 100% em tudo o que aqui mostro mas, mesmo se não faz bem o meu género, aprecio a estética e o sentido de equilíbrio de quem sabe conceber espaços bons para viver. Mas, neste caso em concreto, acho mesmo tudo uma coisa fantástica. A arte, o conforto, a luminosidade, os extraordinários jardins, acho tudo extraordinário.

Esta casa em Nova Delhi é inspirada no artesanato da Índia
| Remarkable Living

A casa do costureiro indiano Tarun Tahiliani é um reflexo caleidoscópico da vasta gama de suas influências criativas, desde móveis antigos a arte interessante e peças decorativas fascinantes que se juntam para criar um banquete para os sentidos.

Um dia bom
Saúde. Boa onda. Paz.

sexta-feira, março 10, 2023

Depois de um ínfimo e muito cansativo passeio, entretenho-me a ver lugares extraordinários sem ter que sair da gruta em que estou a hibernar

 


Tenho, pois, estado nesta fase de hibernação. Eu sei que há uns abençoados a quem o corona deu de mansinho. A mim, pancada forte, com febre, dores e congestionamento foi coisa de curta duração. Mas o cansaço e o sono têm sido dose. E o que prova que isto tem a ver com a raça do corona e não com a vítima é que, apesar de o meu marido ser muito diferente de mim a todos os níveis, eu e ele temos os mesmos sintomas, sem tirar nem pôr. O cansaço e a falta de olfacto e de sabor são iguais.

Hoje calhou ele ter um assunto a tratar no Boulevard de Alvalade. Como também havia um assunto a tratar num banco e porque já estou que nem posso só de pensar que estou hibernada há dias, resolvi ir com ele. 

Pensei que, se ele se demorasse e eu não aguentasse, iria para o carro, ficaria lá à espera.

Quando me vi ao espelho no carro achei-me estranhamente branca. O meu marido também me estranhou, tão branca e olheirenta. Como ele é muito moreno, nunca está branco e olheirento. Eu estou com aspecto de desenterrada.

Bom. Ele lá foi à sua vida.

Ao ver-me sozinha na rua, senti-me meio zonza, o ar muito branco, parado. E eu a levitar. A pairar. 

Vi um supermercado e resolvi ir comprar bananas. Consumimos duas por dia (uma cada um) pelo que dava jeito reaprovisionar. Quando me vi na rua com um saco de plástico transparente com quilo e pouco de bananas não apenas achei que era pouco estético andar a laurear com um saco de bananas na mão como senti que me cansavam.

Voltei atrás, ao carro, para as depositar. Cheguei lá já cansada. Avaliei se teria energia para voltar ao passeio. Resolvi que sim. Devagar, devagarinho.

Entretanto, comecei a sentir-me com sede. À medida que andava  mais cansada e mais sedenta me sentia. Comecei a ver como resolver. Pensei que se fosse comprar uma garrafa de água se calhar depois ficava cansada por transportá-la.

Resolvi entrar antes numa livraria e comprar dois livros de poesia que tinha em atraso.

Em situações normais, deslizaria pelas estantes, tentada por dúzias de livros. Hoje não. Peguei nos dois pequenos livros, paguei-os e saí, cansada e desidratada. 

Depois vi uma loja de roupa e, na montra, uma blusinha clara em tons róseos e rebuçados. Resolvi entrar. Mas estava com calor, sem energia, abúlica. Pensei que nem pensar em prová-la. Queria era sentar-me e beber um litro de água.

Felizmente ligou-me o meu marido e senti-me como se estivesse a ser salva. Lá regressei ao carro.

Viemos para casa, cansados, cheios de sono. Os dois.

Quando chegámos, nem me mexi. O meu marido entrou em casa para buscar o urso felpudo.

E lá me convenci a fazer um esforço adicional. Fomos os dois dar um pequeno passeio higiénico com o fofo dog de guarda. Coisa pouca, em câmara lenta.

Claro que, antes, tínhamos parado na Frutalmeidas para trazer os incontornáveis pastéis de massa tenra.

Em casa fizemos uma salada e comemo-la com pastéis. Mas estávamos de tal maneira que apenas comemos um, cada um.

E já mal abríamos os olhos. Cansados, perdidos de sono. Uma coisa inexplicável. Não é falta de fôlego, não é falta de ar. É apenas falta de energia. Total falta de energia. 

Há bocado estava aqui a querer ler uma coisa. E outra vez só a deixar-me dormir. É de loucos. 

Resolvi, então, virar-me para o YouTube. O mesmo castigo. Dou por mim de olhos fechados. 

Pareço eu que fiz uma maratona e, portanto, que tenho razão para estar nisto. Mas qual quê...? Qual maratona? Isto deve é ser alguma variante do corona que nos come as pilhas todas. Só pode.

Não conseguindo, pois, fazer passeios por mim, passeio antes por aqui. Lugares fantásticos. A arte e a técnica humanas podem ser quase mágicas. No meio, um lugar português, a incrível Casa do Penedo. A boa arquitectura, mesmo quando popular, mesmo quando ancestral, e, em especial quando é ousada e desafiadora, é do melhor que há. 

Bom passeio!


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Fotografias macro de flores, daqui
Khatia Buniatishvili interpreta, de Rachmaninov, Variation 18 de "Rhapsody on a Theme of Paganini"
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Uma boa sexta-feira
Saúde. Energia. Paz.

domingo, março 05, 2023

Assinalar o 3º aniversário Covid em grande estilo
[Digo assinalar porque me parece que festejar não é lá muito bem o caso...]

 


E, portanto, na semana em que se assinalam os três anos de Covid em Portugal, para marcar a data em grande estilo, quando já começava a convencer-me que a minha genética para sempre me levaria por entre os pingos da chuva, fui caçada pelo corona.

Nada de extraordinário. Tinha dormido com ele, tinha convivido de perto com ele durante dois dias... como não...?

A dúvida é como é que o meu marido o apanhou... No supermercado? 

Mas não interessa. O que interessa é como é que, depois de três anos de informação e alertas, fomos atingidos connosco na maior descontração.

Na segunda-feira o meu marido falou que andava com pingo. Nada de mal.  Nem ele nem eu ligámos. 

De tarde estava com dores de garganta. Estávamos a passar perto de uma farmácia pelo que ele parou e foi comprar um spray. Tranquilo. Continuámos na levezinha.

Na terça-feira disse que achava que estava a constipar-se. Espirrava, tossia, doía-lhe a garganta e... tudo ainda na boazinha. À tarde achou que era melhor comprar uns comprimidos para estes sintomas gripais. Começou a tomar.

Para mim era uma carraspana das antigas. Para ele também.

À noite pediu-me para eu ir buscar o termómetro porque se sentia febril mas estava cansado para o ir buscar. Achei aquilo estranhíssimo. Nem protestei, fui logo buscar. E aí já comecei a desconfiar. Cansado? Tão cansado que me pedia para eu ir buscar o termómetro...? Quando constatámos que estava com febre alta e quando o vi com os olhos muito encarnados fui logo buscar um teste. Óbvio. Imediato. 

Positivo.

Por isso, na quarta-feira fui à farmácia comprar-lhe medicamentos conforme contei aqui.

Mas, portanto, teste positivo na terça à noite. Já dormimos separados. 

Os seus sintomas acentuaram-se: cansado, cansado. E tosse. E febril. Mas, sobretudo, cansado. 

Quando ia levar-lhe a comida ou ia buscar roupa para mim, volta e meia esquecia-me da máscara. Ele corria comigo, aborrecido com a minha falta de cuidado.

Na quarta-feira mantinha-me bem. Na quinta também. Mas à noite estava com um frio um pouco suspeito. Mas as temperaturas têm estado baixas, as casas frias. Portanto, nada de mais. Não tinha quaisquer sintomas. Continuei a alimentar a esperança de que, pelo tipo de sangue, por não me faltar apanhar sol (dizem que a vitamina D é importante), por qualquer outra coisa e, também, por ter sido vacinada com a dose de reforço e a da gripe em meados de novembro, talvez escapasse.

Mas m sexta acordei com algumas dores meio atípicas: nos pulsos, nas costas, nas pernas, na cabeça. Mas desapareciam assim como apareciam. Fiquei a tentar perceber o que se passava. Levantei-me, sem vontade de me levantar, e sentia-me esquisita. Cansada, cansada. Percebi que estava doente. Fui fazer o teste... e, claro, branco é, galinha o põe. Positiva.

Passei o dia deitada. Tive febre, dores de garganta, dores um pouco por todo o lado. cansada, sem energia, sono.

A noite passada dormi que me fartei. Foi o meu marido que me foi acordar pois devia estar preocupado. Acho que nem sonhei nem mudei de posição. 

Este sábado não tive febre mas continuo cansada, congestionada, dorida, sem qualquer apetite (o que não é mau). 

Temos monitorizado o oxigénio, o que é importante. Temos feito repouso e bebido líquidos.

O meu marido está melhor, já se mexe, já não se sente tão apanhado.

Ontem pensei que não ia conseguir escrever aqui nada. Estava KO de todo. Mas, ao ver o De Ornelas a fugir com o colectivo e eclesiástico rabo à seringa arranjei energia para o zurzir, a ele e aos que o rodeiam e apoiam. 

E agora que aqui estou, meio azamboada, a ver a Semifinal do Festival da Canção, cheia de peças de roupa, congestionada como se estivesse com uma gripe das antigas, com dores nas costas, com os olhos a modos que a arder, sem comer nada desde a saladinha do almoço, pensei o mesmo: hoje não vai dar.

Mas isto já se sabe: a força do vício é tramada. Neste caso o vício de escrever.

E, portanto, por hoje nada mais que isto. Sei que abuso da vossa paciência pois ninguém merece ter que gramar com o boletim clínico de outro. Mas não tenho energia para falar da ridícula moda de alguns intérpretes que se apresentaram com naperons na tola ou véus colados à cara ou de alguns outros, masculinos, vestidos de matrafonas como se o Festival fosse um franchising do Carnaval de Torres Vedras.

E não quero que me achem maledicente pois até gostei de algumas canções. Por exemplo, gostei da 7, da 8 e da 10. Mas não consigo dissertar sobre isso. Passaram à Final e isso é que importa.

Só mais uma palavra. Estando já medicados, ficámos na dúvida se deveríamos ligar para a Saúde 24, sobretudo para uma estatística mais actualizada. Ligámos. E fiquei muito agradavelmente surpreendida pela atenção, pelo cuidado. E há pouco ligaram para fazer o acompanhamento. E com mais recomendações. Serviço público de qualidade.

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Esculturas de Su Blackwell feitas com livros em segunda mão 

na companhia dos bem dispostos Voodoo Marmalade com Tormento,  10ª canção da semifinal.

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Um bom dia de domingo 

Saúde. Boa disposição. Paz.

sexta-feira, fevereiro 24, 2023

Será que a tecnologia usada nas vacinas Covid pode curar o cancro?

 

Desde que me lembro, ouço falar em investigações, em ensaios promissores, em avanços significativos, em descobertas animadoras.

E, de facto, muito se tem avançado. Há imensos casos de cura completa e definitiva, há outros casos em que já se trata como uma doença crónica.

Contudo, os tratamentos, em muitos casos, são incómodos, quase incapacitantes, e os exames são um sofrimento sobretudo pelo receio de más notícias que, tantas vezes, são sentidas como sentenças. 

Ainda há dias soube que uma pessoa que conheci pujante, todo ele seguro de si, morreu em pouco tempo. Uma outra pessoa que me é muito próxima, depois de pensar que o pior tinha sido ultrapassado descobriu que, afinal, não foi e está agora a passar pelos tormentos da quimioterapia. E a angústia não é apenas o mal-estar dos tratamentos mas, sobretudo, o receio de tudo o que ainda pode estar por vir.

Quando um dos meus tios esteve doente eu li, li, tentei perceber quais as perspectivas para o caso dele, se havia ensaios em algum país. Na altura, li sobre tratamentos promissores em Cuba. Ele não se entusiasmou, achou que já não iria a tempo e que, além disso, que já não tinha capacidade física para viajar até lá. Cheguei a andar a informar-me na Embaixada, o meu primo falou com o médico dele que ficou também de se informar. Infelizmente o meu tio tinha razão. Morreu poucos dias depois com uma embolia.

Mas mantenho a curiosidade. De cada vez que passo por notícias vou espreitando. Sou leiga, leiga, leiga. Leio como uma leiga. Não percebo muito do que leio. Mas interesso-me.

E, do que tenho visto recentemente, o que me parece mais animador é isto que aqui hoje partilho. 

Para ler:

‘This will happen before 2030’: how the science behind Covid vaccines might help to fight cancer

Transcrevo o início do artigo:

O sucesso dos medicamentos baseados em mRNA no combate ao coronavírus está a inspirar cientistas a criar vacinas semelhantes para melanoma e outros tumores.

Em dezembro de 2022, a empresa de biotecnologia americana Moderna, uma empresa que emergiu de uma relativa obscuridade para se tornar um nome familiar durante a pandemia, publicou os resultados de um ensaio clínico que repercutiu no mundo da pesquisa do cancro.

Conduzido em parceria com a empresa farmacêutica MSD, demonstrou que uma vacina contra o cancro de RNA mensageiro (mRNA), usada em combinação com imunoterapia, poderia oferecer benefícios significativos a pacientes com melanoma avançado que receberam cirurgia para remover seus tumores. Após um ano de tratamento, o estudo de fase IIb descobriu que a combinação reduziu o risco de recorrência do cancro ou morte em 44%.


(...)

E abaixo em vídeo. 

Não está traduzido, infelizmente, mas ainda assim acho que vale a pena aqui deixar esta informação:

Could COVID vaccine technology cure cancer? | DW News

O cancro está entre as principais causas de morte no mundo. Mas agora, graças a uma tecnologia de ponta para a vacina COVID, podemos estar mais perto de parar o cancro. A BioNTech da Alemanha está a lançar neste outono um ensaio no Reino Unido com vacinas personalizadas contra o cancro neste outono.

Tomara. Tomara. Tomara.

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E, por falar em esperança,


Paz na Ucrânia

Paz. Paz mas a paz que nasce da liberdade, da dignidade, do direito a viver num país independente, autónomo, autodeterminado. 

A paz que apenas será possível quando a Rússia tirar as patas e as mãos ensanguentadas da valente e gloriosa Ucrânia. 

E que todos os cidadãos decentes, democratas e solidários, se mantenham firmes no apoio à Ucrânia e na condenação da Rússia de Putin.

Glória à Ucrânia

Slava Ukraini

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Um dia bom

Saúde. Esperança. Paz.

domingo, novembro 20, 2022

Em dia de vacinas, na companhia dos grandiosos símbolos históricos 'Mecanismo. Folha de Gengibre. Passarinho'

 

É sábado e, afinal, continuo sem conseguir dar uma para a caixa. Aliás, ainda pior um pouco que ontem. 

No entanto, a culpa não é do dia. Pelo contrário, o dia foi bom, tranquilo, nada a lamentar.

Mas não dormi bem. As preocupações e revelações da véspera fizeram-me acordar a meio da noite, deixando-me algum tempo sem conseguir dormir. 

Depois, estando de novo já a dormir, acordei com um sonho. Já era de manhã, seis e meia da manhã. Uma vez mais, acordei a rir à gargalhada. O meu marido, que já estava acordado, admirou-se. Acontece que eu estava numa daquelas de quando nem consigo falar. Ria, ria, ria. Quase sufocava a rir. Levantei-me, fui à casa de banho, e fui e vim a rir. Quando regressei à cama fiz um esforço para lhe contar. Mas não consegui, ria, ria, ria.

Quando fomos fazer uma caminhada, de novo tentei contar-lhe mas voltei a rir até mais não poder. Ele sorri ao de leve. Já nada o espanta. 

Vou contar-vos, porque a escrever é mais fácil, mas peço que não levem a mal. A sério: sem ofensa. Foi um sonho. Vou contar tal como me lembro. Foi assim:

Estava com um grupo de amigas e resolvemos ir lanchar. Uma disse que tinha ouvido falar num sítio. Fomos. Era num primeiro andar, parecia uma casa de habitação transformada. Havia uma mesa grande com uma toalha encarnada e com bugigangas em cima. Fomos ver. Nem percebi o que era aquilo. Uma senhora disse: é uma quermesse. Olhei e vi pratinhos ínfimos de barro, mas toscos, sem história, bocadinhos de vidro, tretazinhas sem qualquer estética e que não vi como servirem para alguma coisa. Cada coiseca com um papelinho com o preço. Começou a dar-me vontade de rir. Depois olhei para as paredes e vi símbolos pintados em faixas encarnadas. Reparei que havia símbolos que se repetiam. Junto a cada símbolo uma letra. Perguntei: 'São símbolos?' Disseram que sim com ar de quem nem percebia a dúvida. Perguntei: 'Mas que símbolos são?' E então uma senhora com ar de sargentona disse-me, muito compenetrada: 'Mecanismo. Folha de gengibre. Passarinho.'. Ouvi sem querer acreditar, a tentar conter o riso. Uma que estava comigo, não percebeu bem: 'Folha de cálculo?'. E a outra, agastada, quase ofendida: 'Não! Folha de gengibre!'.

E eu já mal conter o riso. Quando tenho vontade de rir e quero conter-me, fico quase a explodir, a gargalhada pronta a desbragar-se. Depois, olhando bem, em volta, ocorreu-me: 'Mas isto aqui é o PCP?'. E a sargentona: 'Claro, havia de ser o quê? Não conhece os símbolos?' E eu, quase a rebentar a rir: 'Mas têm significado?'. E ela, séria, institucional: 'Têm valor histórico'. Toma e embrulha. 
E eu cada vez mais aflita para não me desatar a rir.

Então uma das minhas amigas chamou-nos à varanda. Havia música na rua. Um homem baixo, encorpado, careca, os pelos do peito grisalhos, de calções curtos de futebol, tshirt de alças, decotada, e com uma coisa no corpo de tipo catavento, dançava desengonçadamente, de forma destrambelhada e cómica. Dizia: 'Como saí do partido, agora para usar o mecanismo só cá fora, na rua'. E eu, perdida de riso com os movimentos de baiana desasada dele, parecia uma bicha maluca mas com corpo e traje de campista, com o dito mecanismo a mexer-se em cima da cabeça e em volta do corpo, quase como uma hélice ou umas asas mal amanhadas. Não me contive, desatei a rir, a rir. E a pensar: 'Como será que dançam usando o símbolo da folha de gengibre? Ou o do passarinho?'. 

Só maluquices, bem sei. Os meus sonhos têm o seu quê de surreal, acho que já aqui o confessei. E fazem-me rir perdidamente. Tenho passado o dia todo a rir, lembrando-me da sargentona a falar com orgulho dos símbolos históricos do partido: 'Mecanismo. Folha de gengibre. Passarinho'. 

Juro, estou a escrever e a rir. Fazer o quê? Falta-me um parafuso, provavelmente.

Resultado: primeiro que voltasse a adormecer foi uma chatice, desatava a rir a toda a hora. Depois, certamente muito pouco depois, estando a dormir, tocou o despertador. Portanto, a noite não foi o repositório de descanso de que estava necessitada.

A seguir ao almoço fomos levar a vacina. As vacinas. Covid e gripe. Muita gente mas a fluir. O acto em si, normal, tranquilo. 

E depois, mais ao fim da tarde, fomos dar o nosso passeio higiénico com o urso cabeludo. Também tranquilo.

O pior foi que, ao chegar a casa, vínhamos os dois meio KO. Eu adormeci no sofá, mas profundamente. Ele não sei. Jantámos meio mongas, espapaçados. Foi o resto do almoço, ele é que aqueceu, que pôs a mesa. 

Depois arrastámo-nos, de volta, até à sala. Ambos quase a dormir, com frio. Fomo-nos encasacar. Agora já não estou a congelar mas está a pesar-me tudo, sobretudo a cabeça, nem sei se é a querer doer, se é a querer que me deite.

Nas outras vezes que as levámos não nos deu pancada alguma. Agora, não que seja grave mas é uma moleza em cima do corpo que nem vos digo nem vos conto. E dói-me cada braço, no lugar da picada. A jovem enfermeira disse para pormos gelo. Mas, com o frio com que, apesar de tudo, ainda estou, nem pensar em despir-me para me pôr de braço ao léu com gelo em cima. Disse também que tomássemos paracetamol se tivéssemos sintomas. Mas dá-me ideia que, da forma como estou, se tomo um paracetamol, durmo, de seguida, até segunda feira. Não sei se isto é efeito secundário da vacina ou se é do mecanismo, folha de gengibre, passarinho, mas de alguma coisa é.

Vou, pois, ver se consigo arrastar-me até aos meus aposentos. O que me vale é que a cama, a esta hora, já deve estar bem quentinha. 

Fui.

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Mas antes: desejo-vos um bom dia de domingo

Saúde. Boa disposição. Paz.