Hoje não vou escrever muito pois estou um pouco exausta. Esta sexta-feira foi um dia muito especial para mim.
Acontece que, em vez de poder focar-me completamente na preparação para o evento em que ia participar durante o dia, de manhã tive uma série de assuntos para tratar. E depois a pessoa com quem tinha que falar não estava, a secretária disse que ela logo ligava, e eu pedi que fosse, no máximo dos máximos até às onze pois, a seguir iria ficaria indisponível... e o tempo passava e nada de telefonema e, a seguir a esse telefonema, teria que fazer um outro e ainda mandar o mail... e nada, nada, nada. Uns nervos. Tudo isto foi acontecer no pequeno intervalo de tempo que eu hoje tinha livre e que tinha destinado a outra coisa.
Não sei se acontece convosco mas as coisas podem acontecer ao longo de meses e não acontecem. Mas, quando acontecem, parece que acontece tudo ao mesmo tempo.
E, estava eu a correr de um lado para o outro e a preparar-me para ir enviar o mail, recebo uma mensagem em que as pessoas com quem eu ia diziam que já estavam estacionadas à minha espera. Mas diziam que estavam num sítio que eu desconhecia.
Saí para a rua e nada delas. Liguei. Disseram-me o nome da rua em que estavam. Rua desconhecida para mim. Ou seja, tinham ido parar a outro sítio. O meu marido, gozão como é, já tinha antevisto: 'Vão perder-se'. Pois.
Mas lá nos achámos.
E foi um dia muito bom. Um dia escreverei sobre isso. Foi daquelas coisas cuja descrição daria uma novela. Mas não quero escrever a quente, prefiro que as coisas assentem dentro de mim.
Só que não sei se para os vossos lados também esteve assim. Presumo que sim. Um forno. Ao sol não se aguentava. Muito, muito calor.
Mas, tirando esse pormaior, o que posso dizer é que esta sexta-feira foi daqueles dias que jamais esquecerei -- pelo menos enquanto tiver os neurónios em bom estado.
Felizmente houve quem fizesse a reportagem e, portanto, para além da memória terei esse testemunho de que tudo aconteceu de verdade.
Fico-me por aqui até porque agora, desabituada que estou de acordar cedo e com despertador, quando isso acontece durmo muito pouco, acordo antes de tempo. Acresce que, ainda por cima, cometi o mesmo estúpido erro de sempre: sabendo que tenho menos horas para dormir, levo-me a mim própria mais cedo para a cama. Ou seja, ainda sem sono. Portanto, uma espertina do caraças.
Agora, ao escrever a data lá em cima, no título da mensagem, reparei que por uma diferença de dez dias, por pouco não tinha também comemorado o dia porventura mais decisivo da minha vida.
Na quinta-feira o dia foi mais longo que o habitual e, em vez de poder desforrar-me dormindo até mais tarde, não senhor. Esta sexta-feira estava a dormir no meu segundo sono, e quem diz segundo diz terceiro, a sonhar descansadamente, quando ouvi o som que durante tanto tempo me despertou. O meu sonho ainda fez por assimilar o ruído, como se fizesse parte do argumento, mas logo abri os olhos e percebi que era realidade.
O dia tinha que começar cedo. Não teria que ser tão cedo mas, como sou inflexivelmente pontual, gosto de antecipar possíveis contratempos. Além disso queria ter a certeza que, sendo das primeiras a chegar, teria o serviço cumprido de certeza a tempo e horas.
Afinal, não me serviu de nada. Não ficou pronto. Impediu-me de repor o sono e obrigou-me a telefonemas e manobras complicadas e... tudo para nada. Não sou de me stressar mas, mesmo assim, irrito-me.
Há uma coisa nesta deriva em que anda o mundo que me faz muita espécie. Há tecnologias para tudo e para mais algumas coisas, tudo em tempo real, tudo online, tudo à distância de um clique. E depois, vá lá a gente perceber porquê, grande parte das coisas que antes eram fáceis, nas calminhas, agora são uma medonha trabalheira. Há apps para tudo, cada vez mais tudo converge na realidade virtual, mas depois as apps pedem códigos e depois os códigos não funcionam e, quando depois de mil esforços, lá se consegue pôr a funcionar, são as instruções que não são claras, é a rede ali que não é boa. Há sempre qualquer coisa que atrapalha. Um mundo que se vai estreitando.
E depois, para o que tem que ser físico, horas para marcar qualquer porcaria, horas para ser atendido, horas no trânsito. E, para uma coisa de nada, tudo tem que vir da central e vem através de uma transportadora, e os da transportadora ficam presos no trânsito e as peças não chegam a tempo e horas e ninguém sabe quando chegam porque é tudo contratado, subcontratado, sub-subcontratado e ninguém é responsável pela totalidade do processo.
E uma pessoa fica pendurada, sem saber de nada, e ligamos e o telefona toca, toca, toca e ouvimos música, recomendações e o diabo a sete e, quando por fim aparece uma alma, essa alma também não sabe de nada e também lamenta e também compreende, mas também não pode fazer nada porque agora é assim.
Tudo isto me cansa de uma maneira... Nestas alturas só me apetece hibernar.
No interstício, num destes compassos de espera, resolvi ir ao supermercado. Quando fui pagar não percebi. Não tinha comprado nada que se visse e, no entanto, a conta era upa-upa. Olhei para o ticket. Os ovos, o arroz, o pão tudo a preços absurdos. Não há justificação económica razoável para aumentos que levam os preços nestes básicos para cerca do dobro.
E agora, enquanto escrevo, vejo o Expresso da Meia-Noite.
Chego à conclusão que este pacote de medidas para a habitação foi feito em circuito fechado. sem envolver os representantes das partes envolvidas.
[Pode acontecer que o Leitor Ccastanho e o Leitor Corvo Negro tenham razão, que tudo isto não passe de uma manobra de diversão ou uma forma de testar os agentes e de auscultar a sociedade. Pode ser. Mas, seja como for, foi um mau passo.]
Continuo a achar que, se houver eleições, dificilmente haverá melhor candidato que o Costa e partido com melhor programa que o PS. Mas...
Mas isso não chega. Têm que se esmerar, têm que trabalhar mais e melhor, tem que arranjar maneira de ter gente sénior e experiente a trabalhar, a avaliar impactos, a medir consequências, a conseguir ver por outras perspectivas. Se continuar neste registo de maltinha trainee, só miudagem a dar tiros nos pés, não conseguirá ir longe.
Provavelmente este pacote agora foi obra da catraia promovida a Ministra da Habitação mais da catraia que aqui está na SIC Notícias, Maria Begonha de seu nome, a dizer generalidades e/ou infantilidades, se calhar também da outra catraia que andou a dizer que a Decathlon podia fornecer tendas para as pessoas acamparem em cima da ponte até se resolver os problemas da habitação. Só pode.
O PS esteve muito mal, muito, muito mal, no dossier da habitação.
Penso que, para se limparem, deveriam entregar o assunto a um ministro capaz, com uma equipa capaz, gente experiente, inteligente, com mundo, com uma visão holística das coisas. Enquanto um tema tão relevante estiver entregue a miudagem sem noção do que é a confiança e do que é necessário para a obter e para a conservar, vamos estar mal.
E eu estou cansada.
Hoje de tarde, vi que um dos mails que tinha recebido era de uma certa marca, anunciando os últimos descontos. Fui ver a roupa de mulher. Descontos de 70%. Coisas bem bonitas a preços bem bons. Comecei a seleccionar. O carrinho a compor-se. Depois pensei: Para quê? Apaguei tudo. Não vou comprar coisas de que não preciso.
Toda a minha vida está em reset. Quero mudar tudo. Até o cabelo já foi. No outro dia voltei à cabeleireira a que não ia há cerca de três anos. Levei uma fotografia que a minha filha me tinha enviado, de alguém que tinha um corte compatível com a minha trunfa e com o que queria. Cheguei lá e disse: Qualquer coisa como isto. A meio, o chão já pejado de cabelo, olhei-me ao espelho e interceptei-a: ainda assim, não será que ainda poderia ir mais? Cortar é aquilo de que ela mais gosta. Mas vi que ela própria temia a ousadia do corte. Incentivei-a: Força.
Saí de lá outra.
E muito mais teria a dizer. Tudo coisas assim, irrelevantes, coisas desta minha vidinha. Mas ando com tanto sono, tanto, tão improdutiva, tão a precisar de passar dias a dormir...
Depois do Expresso da Meia-Noite pus-me a espreitar vídeos. Descansa-me ver imagens boas, gente boa, animais bons, natureza, gente e animais em harmonia.
Este aqui abaixo é um doçura. A forma como o gorila recebe a mulher de Damian Aspinall é uma coisa extraordinária. Quanta ternura.
E aqui abaixo outras imagens incríveis: Attenborough observa de perto como uma mãe orangotango manipula instrumentos como um humano. Imagens que me impressionam. Imagens que penso que posso dizer que são belas. Como ela aí anda com o filho ao colo...
Estava eu a ter uma reunião, a porta da sala para o jardim aberta e o dog de guarda deitado, do lado de dentro, a dormir uma bela sesta.
De repente, ouvi-o a ladrar ferozmente. Como sempre, quando pressente perigo, não me abandona. Fica a ladrar para fora mas do lado de dentro. Mas, logo que viu quem era, saiu a correr, aos saltos, feliz da vida. Quem entra pelo lado da frente, se vier silenciosamente, não se ouve do lado das traseiras. Por isso, ferrado como ele estava, só deu por eles quando se acercaram.
Claro que depois já não os largou.
Entretanto, chegou o meu marido. Mas para os sons do meu marido, talvez porque são mais expectáveis, já ele está mais atento. Vai logo a correr para o jardim e, mal o meu marido entra, deita-se no chão para que ele lhe faça festas. Mas hoje deve ter-se atrasado um pouco pois, disse o meu marido, ficou no alinhamento de um pilar e não o viu. Mas o meu marido viu-o vir a correr e estacar, espantado, olhando em todas as direcções, admirado por não ver o dono.
Ao fim da tarde, já livres do trabalho e antes da hora da janta, fomos em grupo fazer uma caminhada. Habituado a passear geralmente apenas com os donos, o urso cabeludo veio saltitante e contente, feliz da vida.
Com os calores crescentes, alterámos a programação da rega. Na parte da frente, começa às nove da noite e vem vindo, por aí, em volta da casa, até que chega ao último ponto, do lado de trás, já mais tarde. Com esta novidade, o urso felpudo entra em órbita, tal a alegria. Persegue o jacto, anda em volta, e, claro está, molha-se de alto a baixo.
Tínhamos já acabado de jantar, um dos meninos foi atrás do urso. Veio a rir à gargalhada, numa risota espantada. Atrás, vinha a felpuda fera. Tinha reduzido de volume, parecia outro, um pinto pingão. Muda de fisionomia, fica mesmo cómico.
Depois, quando foi para tirarmos as fotografias de grupo, foi quase sempre o primeiro a vir a correr para o sofá onde nos sentámos todos, os rapazes a fazerem caretas, nós a rirmos. Não houve uma que ficasse totalmente bem: ou era o alf preto e cabeludo a saltar por cima de nós ou os rapazes a fazerem caras malucas. Recebi depois, por whatsapp, a melhor. Todos mais ou menos bem. E eu, no meio da confusão e da gargalhada geral, a rir, de pernas meio abertas, estragando a fotografia.
Quando se foram, ele foi atrás, despedir-se. Quando chegou a casa, finalmente sem outros motivos de distracção, atirou-se à comida. Comeu, comeu, depois arrotou, lambeu-se e veio até aqui à porta desta sala. Olhou para mim e, de súbito, deixou-se cair e aqui dorme a sono solto.
É um companheiro. Uma ternura. Um amigo. Um protector. Irrequieto e traquinas, faz buracos na terra e vem para casa sujar o chão, deu cabo dos meus brincos de princesa, já partiu bocados da sebe. Mas vem encostar-se a mim, deixa-se abraçar, gosta de festas. E gosta de todas as pessoas da família como se fizessem parte do rebanho que defende contra tudo e contra todos. É o nosso grande amigo, é uma presença afectuosa, um sopro de alegria que ilumina as nossas vidas.
Os cães são a nossa conexão com o paraíso. Eles não conhecem o mal, o ciúme ou o descontentamento.
Sentarmo-nos com um cão na encosta de uma colina numa tarde gloriosa é estar de volta ao Éden, onde não fazer nada não era chato. Era paz.
– Milan Kundera
As histórias estão mais cheias de exemplos da fidelidade dos cães do que dos amigos.
– Alexandre Papa
O único amigo absolutamente altruísta que o homem pode ter em este mundo egoísta, aquele que nunca o abandona, aquele que nunca se mostra ingrato ou traiçoeiro é seu cachorro.
- George Graham
Se você acha que é uma pessoa com alguma influência, tente dar ordens ao cachorro de outra pessoa.
- Sabedoria de cowboy
Você acha que os cães não estarão no céu? Digo-lhe, eles estarão lá muito antes de qualquer um de nós.
As fotografias que vêm a seguir ao meu fofo (fotografias feitas noutros dias, uma aqui, outra perto da praia, outras in heaven), são da autoria de Steve McCurry. A penúltima, adorável, foi feita em Portugal. As citações provêm também do post ao qual fanei o título: Our Link to Paradise
Nada pode ser tomado como garantido. Nada, nada, nada.
Amores eternos soçobram ao fim de algum tempo. Paixões que se julga fortificadas por unirem almas que quase parecem gémeas esbatem-se e acabam reduzidas a nada. Empregos maravilhosos acabam sem que as pessoas tenham nisso qualquer responsabilidade. Pessoas saudáveis descobrem que afinal, sem o saberem, estão doentes. Gente que se acha o máximo, tratando os outros com mal disfarçada sobranceria, acaba, de um dia para o outro, por ser alvo de desprezo ou chacota. Qualquer de nós já testemunhou ou viveu situações destas. Por isso, quem se sinta titular perpétuo de privilégios, sejam de que natureza forem, está apenas a candidatar-se a um balde de água fria que o deixe desolado até à quinta casa. Mais vale a gente sentir-se agradecida pelo que tem e, a cada momento, estar mentalizado para a probabilidade de, um dia, ter que voltar à casa de partida e, passo a passo, voltar a conquistar tudo (a casa, o trabalho, o amor, a saúde, o respeito alheio, a dignidade)
Muitas quedas, doenças e desgostos podem quase anular uma pessoa e imagino o brutal esforço que é necessário para que se reergam, refaçam, reinventem. Imagino também que, se isso acontecer sem apoio ou companhia, seja muito mais difícil. Por isso, é importante que estejamos despertos para perceber quem, junto a nós, precisa de ajuda. Contudo sei também que muitas vezes quem o precisa não o pede: para não preocupar os outros, para não assumir a sua própria vulnerabilidade, com receio de inspirar pena ou repulsa. Reconhecer que se tem um problema e que se precisa de ajuda é fundamental e requer, muitas vezes, uma grande coragem.
O vídeo que abaixo partilho mostra-nos Paul, um jornalista desempregado, sem casa. A sua bonomia e a esperança que o anima são comoventes.
Paul is a journalist. Since losing his job, he has hitchhiked over 36 000km in 15 months across South Africa, looking for work. In a country described as one of the most dangerous in peacetime and with unemployment of well over 30%, his efforts have been in vain. But his journey has taught him many lessons about the kindness of ordinary people.
"We all have problems, we all have challenges. But we all have the ability to do some good." - Paul
Talvez o título 'On the road' devesse ser traduzido não por 'Na rua' mas, talvez, simplesmente, por 'Na estrada' ou 'A caminho', em especial pelo seu incansável caminhar, não menos do que uma média de cerca de oitenta quilómetros por dia ao longo de quinze meses. Comecei por intitular o post por 'sem nada' mas também não é verdade que Paul não tenha nada. Tem. Tem um sorriso cativante, tem força anímica para continuar a tentar ter uma vida mais segura, tem ainda o gosto pela leitura e pelos outros, tem esperança. Por isso, talvez tenha o que é necessário para continuar a procurar uma vida melhor. Fica, pois, simplesmente, 'na rua'
E entrei naquela fase de despedidas do ano que me leva a expressar desejos para o ano que vem.
Por exemplo, gostava de dizer que penso que deveremos sentir compaixão pelos que, sem que alguma vez lhes tenhamos feito algum mal, nos insultam, nos tratam desrespeitosamente. Mas só até ao ponto em que o que nos fazem de mal não nos afecte. A partir daí, há que ter a coragem de lhes dar um claro 'chega para lá', em especial quando o mal já roça a violência, mesmo que apenas psicológica. Em contrapartida, é bom que demonstremos a nossa estima pelos que nos querem bem. O afecto é um dos motores da estabilidade emocional e a sua demonstração, mesmo que não efusiva, é a base na qual assenta a harmonia entre as pessoas. Claro que há muitas pessoas que vivem sozinhas, sem contacto com família ou com amigos, e estão bem assim. Talvez alguns deles tenham amigos virtuais e, de vez em quando, descarreguem as suas frustrações insultando 'conhecidos' por quem alimentam ódios de estimação. Para esses também deveremos, creio eu, reservar alguma compreensão. A vida é curta. Saborearemos melhor o privilégio que nos é dado por vivermos se o fizermos em paz, connosco e com os outros.