Presumo que, nesta sexta-feira, o meu grupo de amigos apareça com piadas diversas sobre mais um chilique do Ventura. Pode até acontecer que os que são médicos lancem suposições, umas mais benévolas, outras nem tanto. O Ricardo Araújo Pereira já deu o mote, gozando à cara podre e, no Eixo do Mal, o Pedro Marques Lopes falava em gases e a Clara Ferreira Alves falava em histeria ou em paroxismo.
Entretanto, já me chegou o que um médico meu conhecido (super experiente e sempre certeiro nos seus diagnósticos) pensa ser a causa mais provável da maleita do Ventura. Mas ele acha isso com base no que viu e ouviu na Comunicação Social e em explicações que alguns colegas foram avançando. Ou seja, não conhece os resultados dos exames para além do que é público (isto é, que não há nada de cardíaco e que não teve que ficar em observação). Por isso, seria imprudente da minha parte partilhar essa opinião até porque poderia ser lesiva da imagem do Ventura e não que me importe com a imagem do Ventura mas porque gosto de ser justa e objectiva.
Contudo, seja isso que o meu conhecido acha, sejam ataques de pânico, crises agudas de ansiedade, refluxo, gases ou o que for, talvez não seja mau que se retire (da política, de preferência) e faça uma cura. Descanse, pense na vida, se calhar ingresse, de novo, num seminário. O País só terá a ganhar com isso. Como se viu, na ausência de Ventura, o Chega mostra o que é: um saco cheio de coisa nenhuma.
Tirando o acontecimento do duplo chilique do Ventura, posso dizer que nos encontrámos com um casal que não víamos há três anos. Eu quase não a reconhecia: mais nova, mais bonita. Fiquei tão admirada que me saiu: 'Está tão diferente... Fez alguma coisa?'. Ela parece ter ficado admirada e disse que não. Mas alguma coisa foi. Ou está um pouco mais gordinha e o rosto ficou mais 'preenchido' ou estava maquilhada segundo todas aquelas boas práticas em que se escondem as rugas, se disfarçam as rugas e a flacidez ou usou botox. Mas fiquei francamente admirada. Estava a conversar com ela e a tentar perceber o que se passava ali. Até a forma como estava vestida me surpreendeu: arrojada, moderna, impactante. Ele estava normal, praticamente igual. Às vezes, quando menos esperamos, somos surpreendidos.
Mas, enfim, nada de mais.
Importante é que estamos mais perto das eleições e continuo desconfortavelmente hesitante. Esta gente não me inspira. Não vejo rasgo, não vejo visão estratégica e determinação.
Em contrapartida, ao ver o gasolineiro de Braga e as respostas que deu à CNN, fiquei francamente incomodada: é, então, aquele o principal cliente do Montenegro...? Senhores... E fiquei sem dúvidas: se Montenegro continuar a pairar pela nossa vida política, é mesmo relevante que haja uma CPI.
Mas, ainda assim, o nosso País, para além de lindo, é um lugar muito bom para se viver. Que o diga Mako, a jovem japonesa que, depois de ter estado a viver em Portugal, regressou ao país natal e sentiu falta de algumas coisas a que se tinha habituado por cá.
Things I MISS the most about Portugal when I'm back in Japan.
Num dia que para mim é triste, limito-me a transcrevo um artigo de Nowness (porque é importante documentar práticas que parecem em extinção num mundo em que o passado parece esvair-se sem deixar rasto):
Portrait of a Place: O Jogo Dos Pombos
Em Lisboa, o columbófilo Senhor Jorge Cunha continua a antiga prática de treinar e competir com pombos, reflectindo sobre uma rotina inalterada numa cidade em evolução
Como janela para a vida do Senhor Jorge Cunha, um columbófilo de Lisboa, o realizador George Daniell capta uma rotina inalterada pelo tempo para a curta-metragem O Jogo dos Pombos. Na capital portuguesa – uma cidade que está a ser rapidamente engolida pela gentrificação e pelo turismo – Jorge continua uma ocupação histórica que está a desaparecer na modernidade, seguindo diariamente a mesma prática por dedicação ao treino e cuidado dos seus pombos.
Trabalhando num estúdio em Lisboa, junto à casa que Jorge partilha com a sua mulher e ao pombal que alberga os seus pombos, Daniell testemunhou a rotina de Jorge a desenrolar-se como um relógio, acordando cedo para limpar o pombal e voar com os pombos. Fascinados por aprender mais sobre o seu ofício, formaram uma amizade e conectaram-se através da antiga prática da Columbofilia – ou corrida de pombos – que logo se desenvolveu na base do filme.
“Observava o Jorge e os pombos quase todos os dias, cativado pela sua dedicação à rotina. Passado algum tempo, tentei fazer perguntas ao Jorge sobre os pombos no meu português macarrónico. Lisboa é uma cidade que está a ser rapidamente engolida pela gentrificação – ver Jorge a cuidar dos seus pombos é um pouco como voltar atrás no tempo, por isso pareceu-me algo que queria documentar.”
Aprimorando a prática manual que realiza repetidamente, Daniell e o diretor de fotografia Duarte Domingos espelharam o processo analógico de Jorge ao filmarem inteiramente em película de 35 mm e 16 mm. Através das reflexões do Senhor Jorge e da poesia visual dos pássaros em voo, O Jogo Dos Pombos observa um modo de vida tradicional numa cidade em rápida mudança, como um fragmento duradouro do passado de Lisboa que continua no seu presente.
In Lisbon, pigeon fancier Senhor Jorge Cunha continues an ancient practice in a fast-evolving city
Há facies que não enganam e o desta farmacêutica também não. Cuidado com a menina. Está mais que visto que é daquelas de quem é melhor guardar distância. Portanto, ter uma mal educada destas como ministra da Saúde é não apenas um erro de casting por parte de Montenegro como um perigo para a nossa rica saudinha.
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Quanto à vitória de Portugal, antes de ser vitória houve sofrimento e revolta cá em casa.
Mas, sendo uma família de guarda-redes, naturalmente ficámos todos contentes com a fantástica exibição do grande Diogo Costa.
A propósito da parvoeira e da chico-espertice do so-called choque fiscal da AD (na verdade, meros trocos em cima do que o PS tinha feito) e sobre a qual o PS está a fazer outra parvoíce ao não deixar o PSD fazer o que quer, e a propósito também da deriva absurda da AD ao pretender dar uma escandalosa borla fiscal a quem tenha até 35 anos (ganhem o que ganharem), fiz um pedido ao ChatGPT.
Abaixo, transcrevo o que ele me devolveu. Não validei os números pelo que se alguém quiser fazer uma análise idêntica para fins concretos e de responsabilidade deverá conferi-los, recorrendo a fontes oficiais.
O que aqui tenho está em inglês pois parece-me que, ao ter que consultar fontes oficiais (OCDE, UE, etc., como vi que 'ele' consultou) há menos risco de erros de o ChatGPT se baralhar por deficiente tradução/interpretação.
Quando os saloios da AD acham que vão atrair ou reter pessoas que estão a viver fora ou que, estando cá, equacionem emigrar, seria bom que, antes, fizessem uma análise global.
Por exemplo:
Trabalhando cá, como é que o salário médio português compara com alguns dos principais países que acolhem a nossa emigração?
Como são os impostos cá e lá? É que uma família que se mude tem que pensar como fica quando tiver 36 anos.
Com que salário anual se atinge a taxa máxima de IRS?
Como é o PIB e o crescimento nesses países? (Isto é, são países ricos? Há crescimento económico?)
Qual o imposto sobre capitais (Juros de depósitos a prazo ou de títulos de dívida pública, etc) nesses países?
(Por mera curiosidade, como comparam os impostos sobre os resultados das empresas, vulgo IRC?)
Eis as respostas que o ChatGPT me forneceu (e que, repito, não me dei ao trabalho de validar)
Portugal
Average Annual Salary: €22,628
Income Tax Rates: 14.5% to 48%
Maximum Rate Applied At: €80,882
GDP per Capita: €22,440
Average Annual GDP Growth Rate: 2.2%
Capital Gains Tax: 28% for individuals, 25% for companies
Corporate Tax Rate (IRC): 21%
Analysis: Portugal has a lower average salary and a high top tax rate, impacting those with incomes above €80,882. Despite lower living costs, disposable income is limited, affecting the overall quality of life.
Ah pois...
Vejamos, agora, os países para os quais os portugueses mais emigram ou emigraram.
Spain
Average Annual Salary: €28,375
Income Tax Rates: 19% to 47%
Maximum Rate Applied At: €300,000
GDP per Capita: €29,700
Average Annual GDP Growth Rate: 2.4%
Capital Gains Tax: 19% to 23%
Corporate Tax Rate: 25%
Analysis: Spain offers higher salaries with a top tax rate impacting those earning above €300,000. With moderate living costs and good public services, the balance between income and taxes is favorable, enhancing the quality of life.
France
Average Annual Salary: €39,300
Income Tax Rates: 0% to 45%
Maximum Rate Applied At: €160,336
GDP per Capita: €38,500
Average Annual GDP Growth Rate: 1.3%
Capital Gains Tax: 30%
Corporate Tax Rate: 25%
Analysis: France provides high salaries with the top tax rate starting at €160,336. Despite high living costs, comprehensive social services and public benefits contribute to a high quality of life.
Analysis: Germany has the highest average salary among the listed countries, with the top tax rate affecting incomes above €274,613. High disposable incomes and efficient public services result in a high standard of living.
United Kingdom
Average Annual Salary: €37,600
Income Tax Rates: 20% to 45%
Maximum Rate Applied At: €174,500 (£150,000)
GDP per Capita: €44,300
Average Annual GDP Growth Rate: 1.4%
Capital Gains Tax: 10% or 20% (18% or 28% for property)
Corporate Tax Rate: 25%
Analysis: The UK offers high salaries with the top tax rate starting at €174,500. High living costs, particularly in London, are offset by good public services and infrastructure, maintaining a high quality of life.
Summary
Portugal and Spain: Moderate quality of life with progressive tax systems and lower income levels. Spain offers a better balance due to a higher threshold for the top tax rate.
France and Germany: High quality of life with robust social services. Germany's higher salary and tax threshold provide more disposable income.
UK: High quality of life with high incomes and living costs. The UK offers a balanced approach with higher tax thresholds and comprehensive services.
Penso que está claro, não está?
Portugal tem salários bem mais baixos do que os países que tradicionalmente mais portugueses atraem, é um país bem menos rico, carrega nos impostos sobre rendimentos das pessoas que é um disparate e um abuso.
Portanto, é nisto que os governantes (sejam eles quem forem) têm que se concentrar: estimular fortemente o crescimento económico, incentivar fortemente a subida de salários, reduzir a taxação de IRS da classe média, taxando mais apenas os verdadeiramente ricos (vide valores acima) com vista a libertar liquidez para as famílias.
Em contrapartida, (a serem verdadeiros os números acima), bem pode taxar mais as empresas, em especial as que têm lucros mais elevados pois, aparentemente, Portugal, entre estes países, é quem taxa menos.
Mas há outros índices a ter em atenção, nomeadamente o Índice de Felicidade. E mais uma vez transcrevo a resposta que obtive e, de novo, a serem verdadeiros os valores que o Chat me devolveu, dá que pensar:
Based on the latest World Happiness Report, here are the happiness index scores for Portugal, Spain, France, Germany, and the United Kingdom:
Portugal: 5.9
Spain: 6.5
France: 6.7
Germany: 6.9
United Kingdom: 6.8
These scores provide a comparative measure of subjective well-being across these countries, reflecting factors such as GDP per capita, social support, healthy life expectancy, freedom to make life choices, generosity, and perceptions of corruption.
De notar que o valor mais elevado é obtido pela Finlândia que tem 7,8
Ou seja, também aqui, Portugal está abaixo dos países que acolhem grande parte dos nossos emigrantes. E este indicador é daqueles que, por ter um âmbito muito abrangente, mais diz sobre a qualidade de vida num país.
Podia elencar outros indicadores que traduzem a qualidade de vida (quer a real quer a percepcionada) mas isto é um blog, não pretende, de forma alguma, dar-se ares de compêndio...
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Em gestão há uma metodologia que se designa por Balanced Scorecards. As empresas identificam objectivos que pretendem atingir (transpondo para a realidade nacional, suponhamos que, em Portugal, se pretendia ter um índice de felicidade de 7 no prazo de 3 anos, um salário médio equivalente a 80% da média dos salários médios dos países acima referidos no prazo também de 3 anos, uma taxa média de IRS para salários até 150.000€ anuais equivalente à média dos referidos países também no prazo de 3 anos, etc., etc, etc...). Então, para cada objectivo, traçar-se-iam iniciativas para lá chegar, e métodos para as monitorizar bem como indicadores para ir avaliando periodicamente a sua prossecução.
Claro que, ao detalhar iniciativas, iremos ter iniciativas múltiplas seja ao nível da formação académica e profissional, seja ao nível das medidas sociais para incentivar a renovação demográfica, medidas para proporcionar estímulos lúdicos que ajudem a percepcionar uma melhor qualidade de vida, etc.
Ou seja, de forma integrada, monitorizável e mensurável, seria possível pôr o país a caminhar rumo aos mesmos objectivos, de forma convergente, inteligente, inequívoca.
Deixaria de ser uma realidade ao gosto de cada comentador, cuja avaliação é na base das bocas. Pelo contrário, passaríamos a trabalhar num registo de seriedade intelectual, de objectividade.
E teríamos a certeza que o que estaríamos a fazer não seriam medidas avulsas, de utilidade duvidosa, injustas, absurdas.
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Sobre o (grave) problema do SNS e da Saúde em geral, a ver se falo no assunto amanhã ou, senão, um dia destes. Contudo, vou já adiantando que a resolução do (grave) problema em causa não é tema para médicos.
Devo dizer que não sei se é porque nesta fase da minha vida não me apetece continuar a dar para peditórios para os quais já muito dei ou se é porque tenho andado com outras preocupações e isso retira-me energia. O que sei é que estou a ver o caldinho das eleições na Madeira e estou sem grande ímpeto para me pronunciar.
O PS levou uma tareia que não é brincadeira e seria interessante perceber porquê, e o Chega continua a somar e a seguir. Duas situações que dão que pensar e que preocupam.
Subiu o tal JPP que não percebo bem ao que anda. Se calhar as pessoas reveem-se nele.
A coligação PSD/CDS ganhou as eleições e não há dúvida sobre isso. Mas perdeu a maioria -- e parece que o Albuquerque disse que se demitia se isso acontecesse. E agora o dito cujo dá uma pirueta em cima da frase, arrebita-se em equilíbrio sobre um calcanhar e diz que não foi bem isso e que claro que vai governar. Pimbas. Isso, contudo, é daquelas que me deixe bege. Nem branca, nem castanha, nem preta, nem rouge, nem blue nem verde, muito menos amarela. Bege. Desta raça, destes little albuquerques, está o mundo cheio. Desonram a palavra. Mas é a palavra deles que desonram e não as palavras em geral. Portanto, que lhe faça bom proveito.
Vejo na televisão o Montenegro com aquele seu sorrisinho de manhoso que estraga tudo o que diz. Só sabe encher sacos de vento. Também por ali vi uma escaganifada galinha careca e um saco de enxúndia com carinha de grão de bico. Não sei o que por ali andam a fazer. É certo que a Madeira faz parte de Portugal e, portanto, em especial numa noite eleitoral, qualquer bicho careta pode muito bem andar por onde lhe apetecer A minha dúvida só tem a ver com o facto de ser gente sem valor acrescentado em lado nenhum e, por isso, não se percebe qual é a deles. Mas não tenho nada a ver com isso.
Tirando isso, noto apenas que longe vão os tempos em que nestes noites tínhamos sempre o momento de stand up do Alberto João. A gargalhada estava garantida. Agora nem isso.
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Esteve um belo dia de verão. O Outono vai sweet, golden e bem bom.
Fizemos uma caminhada grande na parte da manhã e uma outra mais curta ao fim do dia, já praticamente de noite.
Sobre o meu dia, posso dizer que não joguei padel. Fiquei outra vez a assistir. Mas talvez tenha alguma vontade de me dar uma hipótese. O meu marido gosta mas só joga com os filhos e com os netos. Talvez eu devesse habilitar-me a também ser parceira dele. Vamos ver. Tenho sempre algum receio dos meus joelhos. Mas talvez deva experimentar pois, às tantas, estou com receios infundados.
Quanto à minha mãe, é um dia de cada vez. Recupera e melhor recuperaria se desse ouvidos aos outros. Como quer agir como agia quando era nova e saudável, e como acha que tem o direito a tomar as suas decisões (e tem-no, sem dúvida, e é isso que faz), o percurso não é linear nem sempre muito compreensível. Mas, enfim, é o que é. Quando nos diz que 'sim, está bem' ou 'pois, está bem' a única coisa de que posso ter a certeza é que bem podemos insistir que ela vai é fazer o que lhe der na gana, e só nos diz que sim para não estarmos a chateá-la. Tenho é que aprender a viver com esta realidade.
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Tirando isso, ao espreitar o youtube, vi um vídeo sobre uma israelita que resolveu deixar Israel e vir para Portugal. Partilho esse vídeo sobretudo porque tem belas imagens do meu País. Tentei colocar a legendagem automática e não me pareceu famosa. Mas, quem não se entenda com o inglês, poderá tentá-lo.
Este sábado foi dia de almoço de pré Natal. Depois de gripes, viroses, covides, vómitos, diarreias e tudo o que esta saison tem trazido a novos e velhos, eis que todos parecem estar bem. Claro que ainda há rescaldos (tosses, narizes para assoar, etc) mas já todos se declaram bem.
E uns tinham dito que estavam com vontade de sushi e outros de comida indiana e, portanto, hoje a mesa foi posta com take aways.
De manhã fomos, de novo, caminhar para a praia e às onze e meia estava a encomendar comida aqui e ali. Depois foi buscar e desandar rapidamente para casa, entrar a correr e acender luzinhas all over e eis que já estava toda a gente a chegar.
A mesa foi montada com os comes na sala de jantar mas ficou como bancada de self service pois refeiçoámos na rua, no terraço.
E estava um sol tão branco que o toldo teve que ser aberto e o chapéu de sol teve que ser montado. E uma temperatura amena.
A seguir jogaram ao stop online e divertiram-se, e dali seguiram para acompanhar e assistir a um dos meninos que tinha jogo de futebol. Também lá fomos ter mas mais tarde pois ficámos a arrumar a casa.
Tive vontade de gritar por ele mas os outros meninos aconselharam-me a manter-me calada pois, segundo eles, seria um pouco constrangedor para o futebolista ter a avozinha a gritar da bancada. Acatei.
A seguir foram todos para casa do futebolista excepto nós dois que fomos passear com o cão para o parque; e de lá viemos para onde estamos agora: in heaven.
Mas, como sou gulosa, antes ainda nos fomos meter no meio do trânsito lisboeta, em pleno último fim de semana antes do natal, para comer um geladão à maneira. Adoro um bom gelado em qualquer altura do ano mas tenho que admitir que, não sei porquê, prefiro o inverno. Não sei se é uma questão de contraste de temperaturas se é uma questão de mística. Estou é cada vez mais exigente. Há agora imensas geladarias mainstream que têm gelados amarelos, azuis turquesa, rosa pink e toda a espécie de artificialidades e banalidades. Não consigo. No outro dia estava completamente de desejos por um. Entrei em três geladarias perto da praia e não consegui escolher um sabor. Tudo aquilo se adivinhava excessivamente doce, excessivamente mole, excessivamente banal. Outro dia, estávamos a passear com a minha mãe na baixa e aconteceu o mesmo. Os gelados pareciam iguais aos outros. Fui ver duas e saí assim como entrei.
Aqui, in heaven, ainda não circulámos no exterior pois chegámos já de noite. Mas, pelo menos, não entrou água dentro de casa. Temos sempre receio que, com a força da chuva ou do vento, alguma telha se desalinhe e seja para a desgraça. Felizmente não.
Curiosamente a casa não estava muito fria. O termos mudado as portas e as janelas revelou-se uma decisão muito acertada. O isolamento térmico agora é outra coisa. Dantes, quando chegávamos, estava um gelo, o ar estava irrespirável de frio e húmido. Agora é tranquilo. E agora está o ar condicionado ligado aqui nesta sala e também é outra loiça. E o aparelho está ali num cantinho, não chateia nada. Bati-me contra isto durante umas duas décadas. Achava que iam ferir de morte a estética da casa. Nada. Um conforto incrível e a gente quase não dá por eles. Está este aqui, está outro mais potente na sala de jantar e estar e outro na cozinha. Deixámos de ter frio dentro de casa. Às vezes reconheço que o meu fundamentalismo estético prejudica o conforto e, quando finalmente cedo, constato que afinal a estética não saiu tão beliscada quanto eu temia.
Este domingo veremos como estão as coisas lá fora. Se calhar há cogumelos do tamanho de árvores, há esquilos às dúzias e raposas sedutoras refasteladas em sumptuosos mantos de musgo aveludado. Logo vos conto.
Entretanto, partilho um vídeo curioso. Uma jovem fala de como Portugal é um país bom para expatriados e nómadas digitais poderem viver. Mostra alguns dos melhores locais que, segundo ela, são bons e em conta.
Best Places to Live in Portugal for Expats and Digital Nomads
Portugal is one of the best places to live in the world for expats and digital nomads, but which city should you choose? Find out in this video about the Top 10 Best Places to Live in Portugal.
Gosto muito do meu país. Gosto dos lugares, das paisagens. Acho que o meu país tem sítios lindíssimos. Gosto dos portugueses. Claro que, como em todo o lado, há gente de toda a espécie. Há os miseráveis e os ignorantes. Há os corruptos e os arrogantes. Os palermas e os parvos. Mas há muito boa gente, gente tolerante, gente generosa, gente talentosa, interessante. E há a língua portuguesa, tão bonita, tão rica.
Em muitos lugares do país há agora muita gente de fora. Se, por exemplo, estivermos na linha de praia, há uma multidão de jovens que falam outras línguas, muitos surfistas, muita gente descontraída que fica à beira mar a conversar até a noite chegar. Se estivermos na linha de restaurantes e esplanadas, estão cheias. Ouvem-se todas as línguas, as pessoas estão já um pouco bronzeadas e geralmente sorriem, de bem com a vida. E por todo o lado se ouve a língua portuguesa nas suas múltiplas variantes, dos brasis, das áfricas. Uma riqueza extraordinária. O país agora é aberto, alegre, inclusivo, luminoso.
Já lá vai o tempo em que os portugueses eram gente ensimesmada, gente que vivia fechada em casa espreitando atrás do cortinado, gente sempre pronta para a censura castradora, sempre pronta para a maledicência, pronta para rejeitar a diferença.
Ainda há alguns assim. Os que são dessa raça podem correr mundo e assentar arraiais noutras paragens que continuarão a ser assim, soturnos, fatalistas, maledicentes, sempre prontos para cortar na casaca dos outros. Gente maldosa, cinzenta.
Mas são uma minoria. Agora, por onde se passa, já se vê gente aberta à vida, aos dias que passam, à música e à claridade, já se vê gente que aparenta alguma confiança nos dias futuros.
Há ainda gente com rendimentos muito baixos, é verdade, e que, com certeza, não pode ter acesso ao que de bom a vida tem para oferecer. Mas onde não há? Em lado nenhum. Imaginar que há é querer viver dentro de uma utopia. Para além disso, em Portugal há apoios sociais e há a educação e há uma atenção crescente à necessidade de não deixar ninguém para trás. Haveremos de ser ainda melhores. E não é com palavras de ordem e parangonas que as coisas se mudam. É com acções concretas e uma forte consciência social.
Pode dizer-se mal de tudo, claro. Há quem o faça. Os populistas são assim. Ouça-se o líder do Chega e comprove-se: segundo ele, Portugal é uma desgraça, os portugueses uns desgraçados. E eu olho para ele e acho que desgraça é haver portugueses assim, como ele.
Há ainda muito a fazer, muito. Alguém diz que não? Alguém de bom senso acredita que Portugal é perfeito? Claro que não. O que é preciso é que ninguém baixe os braços, que ninguém de bem vire as costas aos que ficam. A partirem, que partam apenas os que não sabem honrar a história, a língua e a garra dos portugueses de gema.
O que temos pela frente é um percurso. Ainda não há cinquenta anos que vivemos em democracia. Durante décadas o país viveu tolhido, amarrado à força à pobreza, à ignorância. Éramos um país fechado sobre si próprio. E isso deixas marcas profundas.
Leva tempo a construir mentalidades novas, a abrir as mentes de forma colectiva, a abrir-se ao mundo.
Eu estudei em Portugal, perto de casa. Não me ocorreu ir para longe quando podia estar perto. Mas uma prima mais nova já foi estudar para uma universidade a centenas de quilómetros de casa. E a filha de uma outra prima já foi estudar para um outro país, um país longínquo. Os meus pais nunca me deixaram fazer o interrail porque eu queria ir com um namorado e eles acharam que nem pensar ir por aí, à aventura, com um namorado. E casei-me aos vinte porque não me passou pela cabeça ir viver com ele sem me casar. Com os meus filhos foi tudo diferente. Viveram juntos sem se casarem, passearam, fizeram o que quiseram. Não sei como será com os meus netos. Da minha parte, quero que sejam felizes, que realizem os seus sonhos -- mas que amem sempre, de paixão, o nosso país, que sejam sempre solidários com os seus concidadãos, que sintam sempre orgulho em serem portugueses.
Não é um sentimento abstracto. É bem concreto, bem real. É um amor verdadeiro, completo que, em cada pequeno acto, deve ser materializado. É daqueles amores que se quer físico, demonstrado. Quem ama o seu país sente-se também amado. É como com as pessoas. Amor verdadeiro é amor partilhado, é amor tolerante, é amor que se quer construir e para o qual se quer que depois de um dia venha o outro dia. Quando assim não é, então não é amor.
Há pouco apareceu-me um vídeo que mostra o meu País pelo olhar de um não-português, muitas vezes em imagens aéreas que, obviamente, não são alcançadas por quem anda com os pés no chão. Conheço aqueles lugares mas sob uma outra perspectiva. Gostei de ver. Que país tão bonito.
A seguir, com alguma edição, vi como um casal também não-português vê o nosso país. Vi muitos lugares que conheço e percebo o encantamento de quem os vê pela primeira vez. País mais lindo, o meu querido Portugal.
Partilho-os convosco. Mostram o país visual. Claro que há depois o país vivido, o país do dia a dia, tantas vezes tão difícil. Mas esse não é agora o tema. Só espero é que gostem tanto do nosso país como eu.
Os melhores locais para visitar em Portugal segundo Ryan Shirley
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Portugal - The Europe We Didn’t Know Existed!
Portugal has been on every "top travel destination" blog for years. Over a 2-week road trip we explored the beautiful castles, incredible history, and rugged coastline, from Lisbon to Sintra down to the world-renowned Algarve beaches and caves, and then all the way up to the rolling vineyards of the Douro Valley wine region in this fascinating slice of Europe.
Bem. Agora que já declinei a palavra ignorância em versão ted cruz, recuo no tempo, àquele magnífico e longinquo tempo em que gozei umas maravilhosas e longas férias no miolo do meu país. Chovia e os campos estavam verdes e os rios corriam airosos enquanto a água jorrava dos montes, saltitando nos regatos que ladeiam as estradas. O meu marido disse: 'Parece que estamos noutro sítio'. Por vezes sou lenta: 'Noutro como?'. E ele: 'No Minho'. Olhei melhor: sim, idílico, verdinho e lindo como o Minho. Mas também concluí que se calhar o que se pode concluir não é isso, é que não é só o Minho que é idílico, verdinho e lindo.
Muito por ali ardeu. Há encostas todas ardidas. Deve ter sido uma aflição, um susto de morte. Mas tudo renasce e, ao lado de troncos ardidos, há agora rebentos verdes de dar gosto.
E então, no adeus até à próxima, quando vínhamos no descair de regresso a casa, fomos à procura da Livraria. Como o IP3 está em obras, saímos pelo desvio. E quando chegámos lá não dava para 'entrar'. E quando estávamos a ver onde é que se podia parar o carro ou onde é que havia um desvio para lá ir ver, já estávamos noutro lugar. Pensei que o culpado -- sim, porque nestas coisas tem sempre que haver um culpado -- tinha sido o meu marido. 'Se calhar passaste o sítio para se virar para lá'. Ele: 'Viste alguma saída?'. De facto, não. Não desisti: 'Mas se calhar havia sítio para parar o carro'. E ele: 'Viste algum?'. Pois, de facto também não. Mas alguma coisa tinha que haver. Se aquele era um lugar a visitar, como não haver maneira de vê-lo? O meu marido, já deserto de se ver livre das minhas incursões, continuou. E já noutra aldeia. E eu: 'Desculpa lá. Não pode ser. Volta para trás. Quero visitar e alguma maneira há-de haver'. Embora contrariado, lá me fez a vontade. Disse: 'Só vejo uma possibilidade, onde diz pescas'. 'Então vamos lá ver''. Em boa hora. Lá ele levou o carro por uma estradinha inclinada. E aí vimos o carreiro, rente ao rio, rente à encosta. E tão bonito, tão bonito.
Monumento natural que marca a paisagem das margens do Mondego junto a Penacova, a Livraria do Mondego é um monumento que o tempo esculpiu ao longo de mais de 400 milhões de anos.
Depois de ter recebido o Alva, seu afluente da margem esquerda, o Mondego estrangula-se ao atravessar o contraforte de Entre Penedos e surgem as altas assentadas de quartzíticos dispostos quase verticalmente, como se de livros numa estante se tratasse, o que de resto deu origem à designação popular de Livraria do Mondego.
Constituída por quartzíticos do Ordovícico, a Livraria do Mondego foi, por Galopim de Carvalho, classificada como um Geomonumento ao Nível do Afloramento, constituindo-se, pelas caraterísticas geológicas que encerra e pela graciosidade escultórica que o tempo lhe incutiu, como um dos mais singulares monumentos naturais de Portugal. (...)
Quanto às pescas, fiquei a saber que há pesca sem morte. O meu marido disse: 'Fazem um buraco no peixe e depois arrependem-se e atiram-no ao rio. Deve ir em bom estado'. Mas agora que escrevo penso que, se calhar, não é pesca com anzol. Se calhar, é com camaroeiro ou coisa assim.
Mas, voltando à livraria. Não sei se imaginam a paz que é andar, sem vivalma nas redondezas -- por inacreditável que possa parecer éramos mesmo só nós -- só passarinhos a cantarem, os sons do rio, e aquelas rochas tão bonitas, os reflexos nas águas, tudo tão tranquilo e lindo. Fomos pelo carreiro, subimos até lá acima à estrada, uma vista deslumbrante. Algumas vertigens, confesso. Não há protecção, assusta. Mas tão bonito.
E parecem mesmo livros, empilhados, arrumados numa estante. As rochas têm vida, são também divindades. Não quero saber que achem que sou maluca. Cada um tem as suas crenças e a mim dá-me para as estas. Observam-nos em silêncio e eu acho que protegem aqueles que as respeitam.
E, por bibliotecas e livros, li um texto que me encheu de alegria. Afinal há uma explicação para a minha panca: conhecer os limites da minha ignorância.
O grande leitor é aquele que compra livros sabendo de antemão que não os vai ler, mas cujo interesse e a relevância reconhece. Isso é muito mais importante do que propriamente ter o gosto de ler os livros todos. De resto, um dos tópicos de todos os escritores é contra os filisteus que entram lá em casa e perguntam: “Ena, tantos livros! Já leu isto tudo?!” Não há ninguém que não se enfureça com essa pergunta, porque, na verdade, a biblioteca não é para ler tudo, é para ela existir. O livro na verdade não existe, o que existe é a biblioteca. Um livro nunca está sozinho. E ter muitos livros em casa é muito melhor que não ter, porque mesmo que a pessoa não os leia, fica a saber a quantidade de coisas que não conhece. Em vez de lamentarmos todos os grandes clássicos que nunca vamos ler, devemos perceber é que, no fundo, nós lemos para ter conhecimento daquilo que não conhecemos, para conhecer os limites da nossa ignorância. Ora, isso também se consegue não lendo livro nenhum, mas é preciso conviver com eles.
Será talvez por preguiça ou comodismo que não vão conhecer-se lugares lindos que, facilmente, se podem ver indo e vindo no mesmo dia. Isto, bem entendido, para quem tem meios de locomoção e condições para o fazer.
Faço esta observação porque tendo a escrever como se todas as pessoas que me lêem tivessem condições idênticas às minhas. Mas basta a gente andar pelo interior do país para perceber que uma coisa é viver numa cidade grande, onde, mal ou bem, se pode fazer quase tudo o que se quer e outra é viver numa aldeia ou numa pequena vila em que as possibilidades de tudo são, a todos os níveis, bem mais escassas.
Acabei de vir de lá e já estou com vontade de lá voltar. Não é a primeira vez que passeamos por aquelas bandas. Mas o país é tão micro maravilhoso que a gente pode estar por ali perto e ficar sem conhecer lugares lindos mesmo ali ao lado.
Quando começo a escrever penso que tenho que me conter, dosear nos adjectivos. Penso que quem não vê as coisas com um olhar inocente como o meu, é bem capaz de achar que exagero, que não é nada assim como o descrevo, transbordante de belezura. Mas, mal começo, já estou a contar tal como a minha cabeça processa o que vê, uma torrente de encantamento.
Atrás do comboiozinho feito de troncos de madeira, a escada que leva ao Cantinho do Alfredo
Esta segunda-feira, mal acordei fiz o que faço quase todos os dias: fui ver a rua, banhar o olhar nas águas do rio. Mas desta vez o rio era outro. Chovia e estava frio, não consegui ir para a varanda. Fiquei à porta do quarto e, com a máquina, ia aproximando a imagem até onde a minha visão míope não alcançava. Os patos que voavam e desciam para continuarem deslizando, aproveitando a corrente, os ramos nus e argênteos das árvores, os pássaros que atravessam os ares soltando gritos que se perdem entre as ramagens -- e eu, quase em êxtase, longe de tudo, apenas e toda ali. Eis senão vi uma coisa estranha, clara, por vezes quase parecia que era luminosa, uma coisa que vinha à superfície, ondulando sob e sobre a água. De vez em quando levantava a cabeça, quase como um periscópio branco e orgânico. Quis fotografar e quase não consegui. Estava distante, as águas corriam, a coisa serpenteava e a chuva ainda menos ajudava. Impossível de focar. Pensei que estava a ver o monstro de Loch Ness mas em ponto pequeno, talvez uma cria do dito. Agora estive a ver as tentativas de fotografia e o melhor que consegui foi isto que aqui abaixo vos mostro. E reparo agora como a coisa é comprida. E diga, sem souber, de que se trata. Uma lampreia?
Mas hoje quero contar-vos a visita que fizemos ao Lorvão. Estando nós instalados sobre um braço de rio na Barragem da Aguieira e tendo tão pouco tempo, circunscrevemo-nos aos lugares mais ou menos em redor, que são vários e todos lindos.
Um deles foi o Lorvão. Parece um daqueles lugares mágicos, envoltos em esquecimento, em neblina e em beleza. É certo que o dia chuvoso ajudou à imagem mas estou em crer que, mesmo em dias de sol e calor, a beleza se mantém.
Dado o adiantado da hora, não vou deter-me no Mosteiro que é imponente, austero e que, para falar francamente, me pareceu triste e meio abandonado, com um senhor com cara de poucos amigos a enunciar que poderia fazer uma visita. Uma vez mais fiquei com pena. O País tem obras extraordinárias e tantas delas são pouco conhecidas, mal divulgadas.
Mas do que quero falar é do Cantinho do Alfredo. Instalado numa sala do mosteiro aberta ao exterior, ali está o Mestre Alfredo, artesão de Lorvão, fazendo as suas peças em xisto e madeira que representam a memória do lugar.
Segundo ele, muito do que as freiras fizeram, casas no exterior do mosteiro, está hoje ao abandono. E ele, com a ajuda de fotografias ou da sua memória ou da memória local ou dos conhecimentos do historiador da terra vai tentando reproduzir. E com que pormenor e cuidado o faz e com que entrega delas fala. Tem também peças para vender e eu trouxe uma casinha de xisto.
Mas a graça maior de tudo aquilo é que as peças têm vida, a água corre, a nora move-se, as luzes acendem-se. Mostrou e explicou cada peça, com orgulho no seu trabalho e na beleza da sua terra e, ao mesmo tempo, mostrando preocupação pelo abandono das coisas, pela terra com pouca vida, com receio de que tudo se perca.
E, lá dentro, mostrou-nos também a terrível roda dos enjeitados, mostrando como funcionava. Tempos de miséria. Olhei sentindo tristeza por todas as mães que ali foram entregar os seus bebés por não terem como criá-los.
No fim, perguntei se me autorizava a fotografá-lo e logo se dispôs a isso. Não tem mail para eu lhe enviar as fotografias ou o link para esta minha humilde homenagem mas talvez lhe escreva um postal a dizer-lhe que gostei muito de conhecê-lo.
Há pouco tempo, um colega apareceu-me no gabinete e perguntou: Quer ver como era quando era nova? e deu uma gargalhada. Não percebi. Ele, rindo-se, acrescentou: E o Paulinho? Um menino. Chamou-me, então, que fosse ao seu gabinete. Foi à estante e, de uma pilha de revistas, escolheu uma. Era uma revista que, no tempo do papel, se fazia no Grupo. Agora ainda se faz mas, como é bom de ver, já é tudo para ver no computador, uma tremenda falta de graça. Mas, então, folheou a revista e mostrou-me: Olhe para si. E eu vi-me. Teria, naquela altura, seguramente menos uns dezassete ou dezoito anos do que tenho hoje. Pesaria cinquenta e poucos quilos e usava o cabelo bem curto, quase uma Jean Seberg. Na primeira fotografia, de grupo, estamos todos junto ao autocarro que nos levaria para um fim de semana de aventura. Tínhamos todos ar de jovens, ríamos sem saber ao que íamos. Eu estava com uns jeans, uns ténis, uma blusinha justa, decotada, sem mangas. Numa outra fotografia já tenho outra blusa, estou sentada num chão atapetado de erva, encostada a uma árvore, ao lado de outros colegas. Combinávamos uma estratégia e, pelo ar atento de todos, levávamos aquilo muito a sério. Numa outra estou com eles a fazer uma jangada e noutra já vou em cima dela com alguns deles, todos com um colete que identificava a equipa. Não apareço naquela corda oscilante, suspensa por cima do rio, onde apanhei um dos grandes sustos da minha vida, e é pena que não tivessem registado esse grande momento. Nem há fotografias das provas de orientação diurna, muito menos do festival que foi a orientação nocturna.
Nessas fotografias mal consegui localizar o colega que estava agora a mostrar a revista. Ele ajudou-me: Então não reconhece aqui o menino? Não mesmo. Agora tem o cabelo completamente branco enquanto naquela altura não apenas tinha metade do volume que tem hoje como tinha o cabelo todo preto.
Com quem ele se divertiu mais, e eu também, foi com o Paulo, grande director da 'casa', então quase um puto, tal o ar de menino, tal o cabelinho à beto e o outfit de rapazola. Olhe aqui o nosso grande Paulinho...! E riu à gargalhada. Eu também.
Nunca mais tinha conseguido localizar onde tinha sido esse épico evento de team building. Nem ele nem o Paulinho se lembravam. Um dizia: Seria Canas de Senhorim? Pelo menos o hotel acho que era. Outro dizia: Não sei. Penela? Ou Penalva? Não nos lembrávamos.
Pois bem. Sem querer, agora vim parar a esses lugares. Hoje, à hora de almoço, estive no Panorâmico onde, numa das vezes, tínhamos almoçado. E hoje reconheci o lugar onde fizemos as jangadas e as águas em que remámos como se tivéssemos que chegar mesmo a um certo destino. Os homens são muito competitivos e eu vi-me e desejei-me para os acompanhar para que não os fizesse perder o lugar na competição. Eles próprios, quando andávamos por montes e vales a correr, a escorregar e a trepar, quando me viam a perder a força, me davam a mão e puxavam por mim.
Tinha de memória que tinham sido lugares lindos mas, na altura, o convívio, a palhaçada, a diversão e a ocupação permanente não deixavam grande espaço para o desfrute das belezas naturais.
Hoje não, hoje estive dedicada não à aventura e à competição mas ao encantamento. E se me encantei. Quanta beleza. A água corre, sala e canta por aqui. Para além de nós, hoje, quatro franceses. E, mais à frente, dentro de água, um pescador. Pensei na felicidade que deve ser estar assim, ali, em paz, sem pressa, sem ruído, entre verdes e sombras quase douradas na água, esperando o peixe. Um luxo. O verdadeiro luxo é isto, o contacto directo e silencioso com a natureza. Luxo e felicidade.
Maravilhada, fotografei sem parar. Andei pelos caminhos de pedra, junto às levadas de água, pelas margens do rio. Tudo tão lindo. Pudesse eu e convidava-vos a todos a virem até aqui visitar estes lugares que parecem de um outro tempo, de um outro planeta que não aquele, citadino, que habito durante a semana. Tudo tão puro e límpido e intocável, tudo tão tranquilo e belo.
Os pássaros cantam no maior chilreio e os patos deslizam pela água e, de vez em quando, vêm dar uma volta a pé, sem se importarem com a presença humana. E a sua plumagem tem umas cores que parecem perfeitas demais para não terem sido desenhadas e pintadas por alguém. Mas certamente o grande deus que é o acaso e o tempo que aperfeiçoa todas as coisas explicam o que por aqui se pode ver.
E até os cogumelos, senhores, até os cogumelos em alegre ajuntamento, estão solares, atrevidos, serzinhos brincalhões de dentinhos de fora.
Chove enquanto escrevo. Chove muito. A chuva foi este domingo uma constante. Agora ouço também o vento. Tão bom andar por aqui com este tempo abençoado. Era bom que pudesse ficar mais uns dias. Mas não dá. Fica para a próxima.
Ainda tenho outros lugares bonitos para vos mostrar, mormente, o espaço do Senhor Alfredo, mas agora já não consigo, tenho que apagar a luz. Fica, talvez, para amanhã.
Envio daqui os meus votos para que Luis Sepúlveda tenha consigo a imagem de Greta Garbo para que o proteja. Era dele a história de que não há muito aqui falei. Mas se não for a Greta Garbo pois que qualquer outra santo ou santo da sua afeição zele por ele.
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Se ainda não conhecem Santa Comba Dão, não deixem de visitá-la ao vivo ou, se não puderem, aqui
Quando penso que não sou preconceituosa, sou confrontada com o meu absurdo preconceito. Sou preconceituosa, sim, e da pior espécie, da espécie que ignora que o é.
Até hoje nunca tinha sentido qualquer vontade de visitar Santa Comba. Mas nem eu nem o meu marido. Era como se, sem ser necessário verbalizá-lo, achássemos que o espírito do velho das botas -- o supremo beato da voz de cana rachada, o sinistro parceiro da D. Maria, criadora de galinhas em S. Bento, santo patrono da PIDE e apascentador de visõezinhas cinzentas e pequeninas, grande fomentador do permanente atraso de vida, do crónico sentimento de culpa e do medo da liberdade, fascistazeco de trazer por casa -- vivesse ainda por entre casas sombrias e para sempre tocadas pelo venenosa baba do dito.
Passámos, pois, sempre ao largo.
Mas ontem, estando a passar perto, sugeri: vamos lá espreitar.
E em boa hora o fizemos. Que surpresa. Uma preciosidade, uma beleza, uma pérola florida, chilreante de água.
Por aqui tem chovido que deus a dá. Por isso, ontem, descuidadamente sem chapéu de chuva, a meio do passeio a pé, tivemos que correr para o carro. Mas o que vimos, fez-me sentir pena.
Porque é que nunca eu tinha ouvido dizer que esta terra é tão bonita? Mas bonita, bonita mesmo. Será que, tal como eu, há mais gente presa a preconceitos, sem vontade de ir conhecer? Ou será que quem lá vive ou conhece o segredo da sua graça, se envergonha de mostrar orgulho? É que parece uma heresia daquelas de que qualquer pagão ou santo se deveria arrepender. Morar aqui deve ser um privilégio. O som da água, dos passarinhos, a tranquilidade do lugar só pode ser uma benção. Quanto ao espírito ruim do velho das botas pois que se dane ou descanse em paz, tanto faz. Já era. Saltemos a pés juntos em cima da lembrança dele, sempre que tal se nos ocorra, para que nenhum outro vírus da mesma estirpe volte a atentar o nosso juízo. E abençoemos a beleza desta terra que não tem culpa nenhuma de quem lá nasceu.
De resto, parece que não foi bem em Santa Comba Dão mas no Vimieiro, outro lugar abençoado de que daqui a nada já falo, que o sinistro rato de sacristia nasceu. Mas tanto dá. Era o que faltava que um rato merdoso pudesse destruir a beleza do lugar que o viu nasceu. Não pode.
Portanto, viva Santa Comba Dão.
A terminar e num àparte. Quando estava a andar e a fotografar, reparei como dois prédios estavam tão inacreditavelmente juntos. Quase que de um, estendendo o braço, se poderia tocar no outro. Apontei e fotografei. O meu marido disse 'a senhora não deve ter achado graça nenhuma a que a tivesses fotografado'. Fiquei espantada. Míope como sou não tinha visto senhora nenhuma mas fiquei arreliada comigo mesmo. Coitada da senhora, estava na sua vida e passa uma qualquer na rua e fotografa-a. Contudo, à noite, ao ver a fotografia, verifiquei que a senhora sorriu para mim. Tivesse eu reparado nisso e tê-la-ia cumprimentado. Coloco aqui a fotografia ou, melhor, a ampliação da parte da fotografia em que se vê a senhora (como a ideia foi fotografar os dois prédios encostadas, a senhora, na fotografia original, é quase um pormenor no infinito) como forma de retribuir o seu simpático sorriso. Muito obrigada.