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sexta-feira, fevereiro 14, 2025

O Musk a reservar para Trump o papel de avôzinho? O Trump a engolir um sapalhão e a fingir que até gosta?
What?
E que reviravolta mundial é esta a que assistimos? Qual o papel da Europa no meio disto tudo?

 

Ando perplexa com o que está a passar-se. Há um lado pragmático em Trump que, por vezes, me parece que faz algum sentido. Mas, ao desprezar as leis, ao ignorar a história e a geografia, ao desprezar todos os que não são mais fortes que ele, ao demonstrar ser um narcisista intragável, é perigoso.

Em tempos trabalhei com equipas de outras nacionalidades. Já o contei: aqueles com quem mais gostei de trabalhar foi com alemães. Por vezes levavam-me ao desespero ao quererem planear tudo ao mais ínfimo detalhe, ao quererem ter planos de contingência para cada pequeno imprevisto, Antes de começarmos a pôr em prática o que quer que fosse, 'perdíamos' tempos infinitos a arquitectar soluções para tudo o que pudesse acontecer. Mas eram rigorosos simpáticos, leais, e, uma vez tudo equacionado, a execução era eficiente, sem espinhas. Não se trabalhava fora de horas. Tudo rodava sobre rodas.

Também gostei imenso de trabalhar com um holandês. Era divertido, brincalhão, viajado, incorporava histórias hilariantes nas conversas. E era inteligente, bon vivant. Também gostei bastante de trabalhar com ele.

Também trabalhei com espanhóis, franceses, israelitas, australianos, japoneses, italianos.

Mas agora quero falar de um americano. Fisicamente parecia um atleta. Devia medir dois metros, tinha um físico incrível, tinha um cabelo liso de um louro acinzentado, uns olhos azuis acinzentados claros. Andava sempre com uma mochila ao ombro mesmo quando isso ainda não era moda. Também se apresentava muitas vezes de ténis quando isso era heresia. Não gostei muito de trabalhar com ele. Havia qualquer coisa de excessivamente pragmático, de rudimentar, de muito básico. Era inteligente, muito, e desempenhava funções muito relevantes. Mas ignorava constrangimentos, ignorava a resistência humana às mudanças de fundo, ignorava os pequenos impedimentos. A ideia dele era atingir um objectivo e não queria saber de mais nada, Não lhe interessava conhecer o tema ao pormenor, muito menos queria perder tempo em levantamentos. E estava-se nas tintas para interagir com a malta que integrava as equipas. Eu era a interlocutora dele e isso para ele bastava. Temas que, para serem escalpelizados levariam horas, eram para ele coisa para um quarto de hora. Mais do que isso era estarmos a envolver-nos nos problemas em vez de nos focarmos nas soluções.

Eu ficava siderada. Claro que perante um problema há 3 alternativas. A 1ª é não fazermos nada, a 2ª é tentarmos resolvê-lo a bem, com o envolvimento e a compreensão de todos. A 3ª é à bruta.

A abordagem dele era a 3ª. Dizia que estávamos a deixar de ganhar o que devíamos por não termos implementado um conjunto de processos e tecnologias. E que, se quiséssemos resolver à 'moda portuguesa', seriam projectos para cerca de 3 anos. Segundo ele, deveríamos ter toda a mudança implementada no máximo em 6 meses. Se as pessoas estrebuchariam, se haveria despedimentos e chatices, desmotivações e coisas do género era para o lado em que ele dormiria melhor.

E nem tinha paciência para ouvir os meus argumentos. Pelo contrário, dizia que era nessas preocupações que os portugueses desperdiçavam a produtividade.

Repare-se que eu percebia a abordagem dele e, numa perspectiva meramente económica, reconhecia a razão dele. 

Só que a minha abordagem, a abordagem portuguesa (e europeia), incorpora preocupações humanistas, queremos o bem estar daqueles com quem trabalhamos ou com quem nos relacionamos, queremos ter a certeza que estamos a fazer a coisa certa e, por isso, fazemos levantamentos, fazemos estudos, avaliamos alternativas. Falamos com as pessoas, marcamos reuniões -- ou seja, segundo ele, perdemos tempo.

O que vejo no Trump e no Musk e nesta rapaziada é isto. É a cultura empresarial, pragmática, economicista. Indiferente ao resto.

E tal como o belo Mark nos aparecia naqueles escritórios forrados a madeira com belos sofás de veludo com jeans, ténis e mochila ao ombro, assim Musk de boné com o filho às cavalitas, enquanto Trump ali está a assistir ao que se passa na sua 'sala oval', sem piar.

Uma questão cultural? 

O fim dos tempos?

O que está a passar-se? 

Há um lado bom dentro de tudo o que está a passar-se? Ou isto é um filme de terror?

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Lawrence: In Oval Office, Elon Musk shows the world Trump ‘is not the boss of me’

Lawrence O’Donnell details the display of the presidential subservience to Elon Musk in the Oval Office as they made baseless claims of waste, fraud and abuse without any evidence and turned their backs on starving children in Sudan.



segunda-feira, julho 08, 2024

França agora e na hora de tomar decisões sobre o futuro

 

Não sei bem o que vai sair daqui mas, para já, os franceses levantaram-se e formaram uma muralha contra a extrema direita.

Espero bem que tudo se componha e recomponha no bom sentido. A Europa quer-se democrata, desenvolvida, civilizada, humanista, tolerante, inclusiva. Por muito que se apregoe, que se grite e se blasfeme ou prometa, estes são os valores que as pessoas de bem (seja lá o que isso quiser dizer...) devem preservar a todo o custo.

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A Marselhesa

segunda-feira, junho 10, 2024

Europeias 2024 -- os quês e os porquês
Análise, partido a partido

 

PS - Com uma AD que deu origem ao actual governo -- um governo desgraçado, que tem revelado uma atitude videirinha, pacóvia, ignorante e chico-esperta --, seria expectável e razoável que o PS conseguisse uma distância mínima de 5% em relação à AD. Mas não conseguiu. 

E não venham dizer-me que o PS ainda está a arrumar a casa, a juntar os cacos (como ontem ouvi, na televisão, um débil mental a dizer). Qual desarrumação? Quais cacos? Acaso o PS estava desarrumado? Acaso alguém tinha partido a louça toda? Estão malucos ou quê? O PS estava a governar e bem, tinha a casa arrumada. Poderia estar ainda muito agarrado a velharias, gente ainda muito saudosa dos maravilhosos tempos que se seguiram à queda da ditadura, gente que continua a sonhar sobretudo nos amanhãs que cantam. Mas, tirando o aspecto da renovação que já era (e ainda é) indispensável, era um partido bem dirigido. António Costa era um líder inquestionável.

A razão residirá, isso sim, muito na forma como este PS de Pedro Nuno Santos se posiciona. Continua a querer ressuscitar a geringonça, continua a querer agradar ao eleitorado mais à esquerda, mesmo quando está mais do que claro que esse eleitorado já praticamente não existe. 

Além disso, Pedro Nuno Santos funciona na base do eucalipto: à sua volta, nada. E isso foi bem patente na forma como se apresentou agora a cantar vitória. Em vez de aparecer rodeado pela equipa dos deputados eleitos, não senhor, apareceu ele, ele e ele. E num lado a Marta Temido e no outro o Carlos César. Muito mau. Depois de ter corrido com uma mão cheia de deputados notabilíssimos, nem para com os agora eleitos teve o gesto de os levar para o palco.

Da mesma forma como na política nacional não se sabe rodear de figuras de enorme qualidade como Mariana Vieira da Silva ou Fernando Medina ou Duarte Cordeiro (e outros a quem António Costa soube valorizar). Parece apenas dar ouvidos aos geringônticos Alexandra Leitão (e, de certa fora, Mendonça Mendes).

Ao parecer querer livrar-se de todos os que eram figuras de destaque na governação de António Costa e ao parecer não saber compreender a nova realidade, o PS não sabe ir buscar um eleitorado novo nem sabe recuperar a classe média que se deslocou para a sua direita por não se rever neste PS que, com Pedro Nuno Santos, aparece aos olhos do eleitorado como anquilosado e encostado a uma esquerda moribunda.

Ouvi Pedro Nuno Santos anunciar que vão lançar uns novos Estados Gerais. Espero que daí nasçam novas ideias. Espero que percebam que não é com Carlos César e outras peças de museu ou com Alexandra Leitão e outros saudosos da Geringonça que vão conseguir contrariar a tendência descendente que se vem desenhando. De resto, também não sei se a noite eleitoral era o momento ideal para falar nisto. Sendo estas eleições europeias tão relevantes, Pedro Nuno Santos esqueceu-se disso e só falou de política nacional. Muito curto em termos de visão estratégica. O que ali vi foi sobretudo o PS a olhar para o seu umbigo, parece que incapaz de olhar para o que o rodeia e para o contexto europeu.

Espero que consigam mudar (para melhor) pois o País precisa de um bom partido social-democrata.

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AD - Beneficiam da inércia e da deficiente informação dos eleitores tal como beneficiam do colo que a comunicação social lhes dá. Com Portas e Marques Mendes a fazerem campanha activa em horário nobre, ao domingo, em canal aberto (com a conivência da Comissão das Eleições) e com uma profusão de comentadores a manipularem a opinião política, conseguiram aguentar-se. Com o que têm demonstrado desde que formaram Governo, com um eleitorado bem informado e com um PS mais assertivo e inteligente, a AD teria levado uma banhada. Não levou. Mas é o que temos. De qualquer forma, penso que é uma questão de tempo.

Montenegro, na noite eleitoral, também não se lembrou de que se estava a tratar de eleições europeias. Não deve sequer saber quais os problemas europeus. Tudo o que disse me soa a conversa videirinha, saloia, a falar muito e sem acrescentar nada.

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Chega - Felizmente sofreram um trambolhão. Gostava que lhes acontecesse qualquer coisa como a que aconteceu ao PRD, ou seja, que um dia destes o Chega acabasse. Mas não sei, não. André Ventura não acabará, arranjará maneira de andar por aí pois nitidamente tomou-lhe o gosto, é um populista que não vai ser capaz de parar. André Ventura é inteligente, é ubíquo, é uma máquina, e, como sabe lançar sound bites em permanência, a comunicação social não o larga e isso chama os eleitores. Mas, enfim, assim como assim, os eleitores souberam dar-lhe um chega para lá e isso talvez faça André Ventura refrear a sua energia destrutiva.

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Iniciativa Liberal - Subiram e subiram bem. A democracia liberal é um caminho aberto e o eleitorado jovem e com sangue na guelra  bem como uma classe média informada e exigente que se vê abandonada pelos partidos do dito centrão dar-lhe-ão ímpeto para subir ainda mais. A nível europeu, o espaço da democracia liberal será, creio que cada vez mais, o oxigénio de que a democracia precisa para impor, com alguma modernidade e juventude, os seus valores, fazendo uma barreira contra o populismo e contra a direita reaccionária que tanto nos ameaça.

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Bloco de Esquerda - Caiu e caiu bem. O Bloco é um partido que por vezes está bem mas, na maioria das vezes, está mal, sendo frequentemente populista, agarrando-se a causas marginais, assumindo atitudes justicialistas e arvorando-se em dono da verdade.

Na intervenção que tiveram a propósito dos resultados eleitorais, considero patética a sua  alucinação a cantar vitória, a rirem, às palmas, todas contentes como se não tivessem percebido que a sua representação se viu reduzida a metade. De loucos.

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CDU -- Caiu e caiu bem. Continuam agarrados a ortodoxias de antanho, defendem já não se sabe bem o quê, não percebem que já não representam quase ninguém, ignoram tudo o que de novo e relevante se passa à sua volta. A intervenção de João Oliveira e do Raimundo é alienação em estado puro. Marimbaram-se para a política europeia (realidade que, a bem da verdade se diga, lhes passa ao lado), marimbaram-se para os temas mais relevantes da actualidade e sorrindo de gosto, eufóricos, cantaram vitória e reincidiram na única e estafada lenga-lenga que conhecem. Já vão em 4% dos votos, só conseguiram um deputado, e ali estiveram, contentes como se tivessem ganho as eleições. Não sei se isto deve ser visto como uma perturbação do foro psicológico ou cognitivo mas alguma é.

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Livre -- Tenho pena que não Francisco Paupério não tenha sido eleito. O Livre é uma esquerda moderna, ambientalista, humanista, informada. Como tenho vindo a dizer, acho importante que haja uma esquerda inteligente, informada, aberta aos novos temas. Gostava que, em Portugal, o Livre crescesse pois a democracia precisa de partidos assim. E a Europa precisa também de vozes jovens, civilizadas, democráticas, abertas ao futuro.

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Abaixo, as Primeiras impressões

Europeias 2024 -- primeiras impressões

 

A nível nacional:

Continuo triste e apreensiva com as elevadas taxas de abstenção. Não me interessa que seja menos 1 ou 2% ou por aí face às últimas. Mais de 60% das pessoas não se darem ao trabalho de votar.

Continuo triste a apreensiva com a capacidade de análise e com a inércia na reacção dos votantes, ao verificar que, sendo patente a inequívoca falta de qualidade, a todos os níveis, da AD e a estupidez que foi pegarem num comentador arrogante e agressivo (o facto de ter 28 anos até é pormenor) para cabeça de lista, ainda há tanta gente a votar neles.

E, para já, neste momento, só isso é certo.

Face à votação em mobilidade, como o Pedro Magalhães explicou, as sondagens à boca das urnas que serviam para a abertura das notícias este ano não estão calibradas. Portanto, não se consegue garantir a sua fiabilidade dentro dos intervalos que, noutras condições, era seguros.

Portanto, com as devidas reservas:

  • A ser verdade que o PS não descola, fico apreensiva por os Socialistas ainda não terem percebido que os tempos são outros. Se já nem os anteriores votantes no BE e na CDU votam neles, a que propósito o PS continua enleado na doutrina gerincôntica? 
Além disso, verifica-se que a nível de votantes, a faixa maioritária é a das pessoas com mais de 55 anos. Ora isto não é bom. Se um partido não sabe perceber e responder aos anseios dos mais novos e dos intermédios, acaba como o PCP... (ie, à medida que os mais velhos forem desaparecendo, o partindo tende para a extinção. Claro que ainda está longe disso mas os sinais já aí estão)
  • Não me espanto com o que se anuncia como a subida da Iniciativa Liberal. A ver vamos.
  • Ficarei bastante contente se se verificar que o balão do Chega desinflou. Mas vou esperar pelos resultados.´
  • Não fico admirada ao verificar que a esquerda-esquerda continua a caminho da extinção. O PCP e o BE bem podem reflectir. 
  • Gostava que o Paupério fosse eleito. Nos tempos que correm, o Livre é a esquerda inteligente e era bom que continuasse a subir e a ser reconhecida.
A nível europeu:
  • Estou deveras apreensiva com o que aconteceu em França. Muito.
  • Aparentemente, é uma tendência geral na Europa, embora talvez não tão acentuada como em França. O que sempre temo, que a democracia "por delicadeza se deixe matar", pode acontecer se não formos capazes de pensar com uma cabeça nova, uma mente aberta.

NOTA: Interessante a análise que o Sérgio Sousa Pinto tem vindo a fazer na CNN.

quarta-feira, março 16, 2022

Raquel Varela é uma putinnete a sair do armário?
Num outro planeta, a humanidade do povo ucraniano e o seu amor pelos animais.
E algumas informações sobre o que se passa pela Ucrânia mártir, sobre como Putin se enredou numa armadilha e como parece difícil desalojá-lo.
E um momento ímpar de coragem e solidariedade que honra a União Europeia

 

No outro dia calhou passar pelo 'O último apaga a luz'. Discutia-se a invasão da Ucrânia pela Rússia e estava a Inês Pedrosa transtornada com o que a Raquel Varela tinha dito. Fiquei admirada. Esperei que a Raquel dissesse qualquer coisa para perceber o que se passava ali. E percebi. A Raquel Varela estava com um discurso a la Putin, na prática culpando os ucranianos pelo que estava a acontecer ou insinuando que tudo não passava de uma cabala ucraniana para desacreditar a Rússia. A Inês Pedrosa ouvia isto em estado de estupor catatónico, quase descomposta tal o descarado desconchavo da outra e eu, do lado de cá, estava igualmente estupefacta.

Nunca nutri simpatia pela dita Raquel, sempre arrogante, sempre naquele deselegante plano de quem se acha acima dos outros. Mas nunca me tinha apercebido da sua costela putineira. Também, confesso, não a acompanho com regularidade até porque, geralmente, quando o tom começa a ferir a minha paciência, mudo de canal. Mas, desta vez, fiquei surpreendida, muito desagradavelmente surpreendida. Uma pessoa inteligente não pensa o que ela pensa. Portanto, ou não é inteligente ou tem o raciocínio perversamente formatado ou está a fazer algum frete (mas, se é isto, um frete a quem? em concreto, a quem?)

Não vou aqui referir a conversa que não há muito tive com alguém com funções relevantes no SIS mas posso dizer que há situações que são tão bizarras que nos deveriam levar a pensar. 

E, pensando, acabamos por colocar as coisas em perspectiva. 

Por exemplo -- e não me refiro agora em concreto à Raquel Varela mas a qualquer situação que, de repente, nos aparece como dificilmente compreensível -- é quase impossível não pensarmos: Há quanto tempo esta pessoa anda a defender, ainda que sub-repticiamente, esses interesses? A troco de quê? O que é que já conseguiu? E a relação é unívoca ou biunívoca: ou seja, limita-se a defender os interesses do Estado X ou da empresa Y (ou o que for) ou passa-lhe também informações?

O que sei, e creio que qualquer pessoa que tenha visto a intervenção de Raquel Varela a favor de Putin o saberá também, é que é muito estranho que alguém em seu pleno juízo assista ao que diariamente assistimos e não sinta compaixão pelo pungente drama dos ucranianos e admiração pela sua sobre-humana coragem -- e que, pelo contrário, se empenhe tão acirradamente a papaguear a narrativa do Kremlin.

Fiz zapping, claro, enojada com o que ali estava a passar-se.

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Nos antípodas, o comovente êxodo dos ucranianos deixando toda a sua vida para trás e que, no meio do medo e das incomensuráveis dificuldades, trazem os seus animais de estimação, poupando-os ao abandono e mais do que certa morte.

Penso que uma pessoa que foge daquela guerra dizimadora tem que ter um grande coração para, apesar do pânico, do desgosto, da preocupação, de um esforço esmagador e do risco de vida, ainda arranjar forças para transportar consigo o cão, o gato, o passarinho. Acho tocante. Aliás, tudo nos ucranianos me espanta e emociona. Deveriam entrar já para a União Europeia, mesmo que apenas a título simbólico (pois sei que o processo tem os seus trâmites). Mas deveriam entrar já pois demonstram, uma vez mais, que são europeus de primeira água: defendem o direito à democracia e à liberdade com unhas e dentes, com a própria vida. 

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A young Ukrainian girl talks to her pet bird as she waits at Kraków train station. Charities and human rights groups say they have seen cases of children going missing in the chaos at border crossings.

Photograph: Miloš Bičanski/We Animals Media


A man holds his small dog on his lap at the reception centre in Medyka. He arrived cold and hungry after fleeing his home with only what he could carry.

Photograph: Miloš Bičanski/We Animals Media


A frightened cat looks up from a camp bed at Kraków train station, where a Ukrainian family has stopped for a much-needed rest after fleeing their home.

Photograph: Miloš Bičanski/We Animals Media


A Ukrainian girl from Kyiv carries her cat through a temporary refugee shelter in Przemyśl, Poland. The shelter was hastily set up in a former shopping centre to provide food and a place to sleep for the thousands of Ukrainian refugees arriving in nearby Medyka.

Photograph: Miloš Bičanski/We Animals Media


Anastasia, a Ukrainian refugee, sits with her dog in Medyka. She fled from an area of Kyiv devastated by Russian bombing and left her mother and brother in Lviv. From there, she travelled to the border with only her dog, and plans to continue on to Germany.

Photograph: Miloš Bičanski/We Animals Media

[Mais imagens no Guardian]

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E pro memoria alguns vídeos que, em minha opinião, são relevantes

Ukrainians in Lviv standing strong against growing Russian aggression - BBC News


Putin Has Fallen Into The 'Dictator Trap', Says Professor Brian Klaas


E, aqui, uma resposta (muito pouco animadora) às minhas dúvidas:

Putin being removed from power is ‘impossible’

Sky News host Chris Smith says the way to stop the Russia-Ukraine war is if the “evil megalomaniac” Vladimir Putin loses power.   

“The hope of justice at this time, involving Putin being removed - either internally or externally - looks as impossible as it ever has been,” Mr Smith said.


E, finalmente, um momento único nesta nossa Europa que parece estar a despertar para o que foram os seus princípios fundadores

'You are not alone': Three EU country leaders meet Zelenskiy in Kyiv

The prime ministers of the Czech Republic, Poland and Slovenia arrived in Kyiv in a show of high-level backing for Ukrainian president Volodymyr Zelenskiy, who briefed them on the war with Russia. Polish prime minister Mateusz Morawiecki and deputy prime minister Jarosław Kaczyński, their Czech counterpart Petr Fiala and Slovenia's Janez Janša all spoke after the meeting. Poland's Kaczyński called for a peacekeeping mission in Ukraine. The EU leaders thanked the Ukrainians for defending 'fundamental European values' and sent a message of reassurance, with Fiala saying: 'You are not alone. Our countries stand with you. Europe stands with your country' 
Ukraine will not join Nato, says Zelenskiy, as shelling of Kyiv continues 

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E é isso, querida Susana, desejemos todos muito a Paz, unamo-nos a favor da Paz, não deixemos que a maculem, que a firam, que a matem. Defendamos a Paz.

sábado, março 12, 2022

Ucrânia, terra de gente extraordinária.
Zelenskyy, um inesperado líder europeu, e Vitali Klitschko, um corajoso lutador -- por exemplo

Украина, земля необыкновенных людей.
Зеленский, неожиданный европейский лидер, и Виталий Кличко, мужественный боец ​​-- например

 

No meio desta guerra feroz, inclemente, de uma violência absurda, no meio das chacinas infligidas pelos russos ao povo de cidades ucranianas sitiadas, da tortura da fome e da sede a que Putin está a submeter milhares e milhares de pessoas, apesar das tentativas de homicídio a que os líderes ucranianos têm estado sujeitos, apesar do medo -- medo por eles próprios, pelas famílias e, sobretudo, pelo povo em geral e pelos mais indefesos, em particular --, apesar das dificuldades e dos problemas quotidianos cuja dimensão nem conseguimos imaginar, Zelenskyy, Presidente da Ucrânia e Vitali Klitschko, Presidente da Câmara de Kiev, arranjam maneira de, quase todos os dias, falar aos ucranianos, aos europeus, ao mundo... e aos russos. 

A coragem deste povo é qualquer coisa de extraordinário e de muito comovente. E os seus líderes não apenas honram a valentia dos ucranianos como são um exemplo, um imprevisto e tocante exemplo. 

Ukraine War: 'This is the war, this is the fight' says President Zelenskyy

The Ukrainian President said he understood why the people of Ukraine might be feeling weary - but he tried to galvanise them, saying it was a 'patriotic war'. 

And Volodymyr Zelenskyy appealed to the European Union to do more to help them - calling for more sanctions against Russia, "who must pay every day". 


Mayor of Kyiv Klitschko gives emotive message to Russia and tells Putin 'you will pay'

MAYOR of Kyiv Vitali Klitschko gives an emotive and powerful message to the Russian military and its leader Vladimir Putin. 

The former heavyweight boxer, told Russia's President 'you will pay' for the lives lost of woman and children in attacks on his Ukraine homeland.

Russian forces have been accused of bombing a care home for disabled people in the latest horrific attack on civilians by Vladimir Putin.

quarta-feira, dezembro 07, 2016

Renegociar a dívida
- um desafio à altura da inteligência de António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa




Vou ser lapaliciana: negociar significa dar e receber, ceder e obter. Negociar a dívida não é sinónimo de obter o seu perdão. Negociar a dívida, ainda que de forma incipiente e quase irrelevante, é o que tem vindo a ser feito. Mas não é suficiente.

É preciso encarar de frente a necessidade de renegociar a sério a dívida pública e acho que teríamos todos a ganhar se essa discussão fosse feita com maturidade e de forma desapaixonada. É preciso perceber que encarar este assunto de forma maniqueísta (ou mortaguiana) é um erro crasso. Não somos nós, os coitadinhos, versus os outros, os malvados. É que quem está do outro lado, na ponta final, não é forçosamente um abutre. Podem até ser reformados que, na sua boa fé, contam ter uma boa rentabilidade dos seus fundos de pensões.

Renegociar a dívida de um país não é, pois, coisa para meninas estridentes que -- como dizia, creio, o João Oliveira do PCP -- gostam de espalhar com as patas o que os outros andam a juntar com o bico. É, na verdade, trabalho de sapa, trabalho de fundo, trabalho de análise, trabalho de diplomacia, trabalho de gente adulta.

Com uma Europa descomandada e que facilmente se desengonçará ainda mais do que já está e com um presidente americano que se adivinha um poço de incertezas, com os chineses e os russos já com as hostes a caminho, é bom que quem tem olhinhos de ver perceba que está na hora de pôr os motores a aquecer porque os tempos que aí vêm têm tudo para ser tempos de mudança. António Costa e os seus pesos pesados e Marcelo Rebelo de Sousa terão uma oportunidade única para abrir uma brecha no rançoso status quo europeu e mostrar que há outra forma de estar na democracia. Às vezes basta um bater de asas de borboleta ou um cravo na ponta de uma baioneta.

Os países têm vindo a ser abanados pelos ventos de descontentamento que sopram um pouco por todo o lado. O povo, essa insondável mole humana, tem vindo a mostrar que não quer mais os xaropes que lhe têm vindo a enfiar goela abaixo. Votam à esquerda ou à direita desde que lhe cheire a mudança: pode ser um populista, um palhaço ou um pato. Tudo menos alguém que personifique 'os de sempre'. Pasto fácil para o populismo, este é o terreno que, quem tenha dois dedos de testa e que saiba ver ao longe. tem para pisar e do qual pode tirar vantagem.

Renegociar a dívida*, restituir a dignidade e a racionalidade à economia, voltar a colocar o humanismo no centro da política, apostar no europeismo como motor de coesão e desenvolvimento -- estes são alguns dos passos que António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa deveriam começar a equacionar (com discrição, com sabedoria, com determinação). Inteligência e tacto político não lhes falta. Empatia entre eles e capacidade para estabelecer empatia com os outros também não. Talvez esteja, pois, na hora de começarem a trabalhar a sério -- de olhos postos no futuro.


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Brendel interpreta Schubert, Op. 90/3
Fotografias da National Geographic

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* E calma, isto é o que eu penso numa lógica absolutamente racional, desprovida de simpatias partidárias (até porque a questão da dívida tem sido bandeira do BE e do PCP, partidos sobre os quais não se pode dizer que eu morra de amores por eles)

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quarta-feira, março 23, 2016

Bruxelas e o terrorismo. A Europa e o terrorismo. O mundo dito civilizado e o terrorismo
Está a chegar a hora dos sociólogos, antropólogos, filósofos, politólogos, psicólogos, historiadores, etc.



O dia todo a trabalhar, não acompanhei as notícias. De manhã tinha sabido que havia drama em Bruxelas mas não sabia exactamente a extensão. À hora de almoço já ouvi falar em mortos e em muitos feridos. Agora estou a ver apontamentos de reportagem e alguns comentários.


Não sou especialista em nada, muito menos em crises deste género. Ouço que isto é uma guerra que está em curso, que há que combater ferozmente os terroristas, que, uma vez mais, falharam os serviços de informação. E tudo estará certo.

Mas a mim uma coisa me faz espécie: não há terroristas com mais de 40 anos? Só putos? Estamos a falar maioritariamente de jovens já nascidos e criados nos subúrbios das cidades ocidentais? Filhos de pais desenraizados? Jovens sem ideais e que procuram uma causa por que lutar?

Não sei. Estou a perguntar por mera ignorância.

A mim, leiga, leiga, mil vezes leiga, parece-me que há neles a motivação e os meios e que é, sobretudo por aí, que há que travar o combate.

Nos últimos anos, os economistas, os gestores e os advogados têm sido a força de elite que tem comandado o mundo: em regra, é gente culturalmente ignorante, desconhecedora de quase tudo o que não seja EBIT, NOPLAT, ROI, ROCE (e por aí vai) e o que é preciso fazer para que os indicadores de criação de riqueza para os accionistas sejam maximizados.

À volta dos núcleos onde se fazem todas as ginásticas para que o capital saia incólume, orbitam as pessoas a quem é preciso sonegar direitos de trabalho, a quem é preciso precarizar os vínculos laborais e, logo, sociais. 

Na periferia dos parques de edifícios onde se instalam as sedes das grandes empresas há bairros sociais habitados por hordas de jovens sem nada que fazer, que passam parte do dia na ociosidade, uns com os outros. Vejo-os por vezes, em grupos encostados aos prédios ou sentados no passeio à porta de casa, capuz da cabeça, conversando, dias a fio. Sem estudarem, sem trabalharem, sem nada fazerem, quais serão as suas motivações?
Lembro-me agora de uma experiência cujo relato li há dias. Colocaram um conjunto de pessoas fechadas num local, sem terem nada que fazer. Contudo poderiam aplicar a si próprias choques eléctricos. Para saberem qual a sensação, estes eram-lhes aplicados choques antes de começar a experiência. Conheciam, pois, a dor. Pois bem, grande parte das pessoas, ao fim de algum tempo, não suportando o tédio, aplicavam a si próprias choques eléctricos. Recomendo a leitura pois talvez explique algumas coisas.
O tédio recorrente a que os jovens se entregam acontece em Portugal, especialmente nas grandes cidades, e, certamente, em todas as grandes cidades europeias.

Durante anos, os executivos têm troçado de quem tem cursos ditos inúteis, aqueles cursos onde se aprende a pensar, a conhecer as civilizações, as culturas, os hábitos, a história, as religiões. Têm sido os profissionais destas áreas que mais têm sentido na pele o peso da crise económica (e civilizacional) que atravessamos. Não sabem gerir empresas, não contribuem para a criação de valor para os accionistas, logo pouco mais são do que parasitas - e, se o não querem ser, pois que trabalhem em caixas de supermercados, em call centers ou onde quiserem desde que não chateiem.
- E isto tem sido, mais coisa menos coisa, o pensamento dominante nas nossas brilhantes sociedades.
Sabemos também como a direita liberal que tem vindo a governar grande parte dos países da Europa (e os EUA, especialmente antes de Obama) é avessa ao Estado Social. Investir na inclusão, em programas de ensino e ocupação, investir na cultura e no conhecimento, é visto por esses crânios como um desperdício de dinheiro. Os mercados dispensam essas frescuras.


E, portanto, sem acompanhamento, entregues a si próprios e sem que ninguém os compreenda e tente integrá-los, tem vindo a desenvolver-se -- nestes meios suburbanos em que há jovens oriundos de famílias desenraizadas onde o desemprego e a pobreza imperam --  um caldo de insatisfação, de disponibilidade para a rebelião, para a vingança, para o crime, para a ficção seja sob que forma for. Ou para o simples combate ao tédio.

Junte-se a isso a cegueira da ganância que leva a que, sobre este clima de medo e insegurança, reinem, imperiais e intocáveis, a indústria do armamento e comércio do petróleo.

Diria eu, na minha ingenuidade, que uma luta objectiva contra estas sérias e difusas ameaças terroristas deveria dar primazia à suspensão do fornecimento de armas e da aquisição de petróleo (e de obras de arte, já agora). E, em simultâneo, constituir núcleos de saber polivalente para saber interpretar todos quantos são potenciais candidatos a ingressarem movimentos terroristas, e com dois objectivos: uns ao serviço dos sistemas de informações e outros para ajudar na inclusão, mas na inclusão a sério, daqueles que hoje são menos que nada nas sociedades ditas desenvolvidas.
E nem estou a falar nas centenas de milhares de refugiados que são acantonados em parques sem quaisquer condições de vida e tratados abaixo de cão. Daqui só pode nascer a revolta.
Uma sociedade decrépita, com uma demografia anémica, com uma economia de rastos, deveria ser capaz de aproveitar esta oportunidade para se rejuvenescer e enriquecer com tanta gente caída do céu, gente nova, com conhecimentos novos, oriundos de outras culturas. Pelo contrário, sem líderes, sem verdadeiros políticos, com o poder nas mãos de burocratas e de medíocres, estamos como estamos.

Condenar os crimes não chega, é preciso perceber o que está na raiz do pensamento dos criminosos. E eu, quando vejo as fotografias deles, o que vejo são putos. E o que sinto é que é preciso ver mais longe, mais fundo, e deixar que as pessoas que sabem pensar e que conhecem a história, os hábitos, as religiões, o funcionamento da mente, sejam chamadas a ajudar o mundo civilizado que tão entregue tem estado a gente incivilizada.

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Termino com poesia

Há vídeo novo do Cine Povero

De Jorge de Sena :: Carta a Meus Filhos sobre os Fuzilamentos de Goya / Dito por Mário Viegas



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As fotografias são da autoria de  Hidenobu Suzuki e mostram a Primavera no Japão

Glenn Gould interpreta, de J.S.Bach: Concerto No.5 in F-minor for Harpsichord and Strings (BWV 1056)

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma quarta-feira muito feliz.

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terça-feira, setembro 22, 2015

A crise europeia dos refugiados (e a situação da Síria) - uma explicação em meia dúzia de minutos. Vale a pena ver, ouvir e pensar.


Sem mais, aqui deixo um curto vídeo traduzido em que, de forma simples, se fala de algumas razões que levam à crise brutal a que se assiste, com milhares de refugiados a tentarem desesperadamente entrar na Europa, das motivações de quem se encontra nestas desesperadas situações com pouco mais do que uma mochila, os filhos ao colo e um telefone, das implicações da integração desta gente nos nossos países, dos riscos, dos benefícios, dos deveres cívicos, morais, de solidariedade  - e, até, de razões económicas que justificam uma actuação inteligente e inclusiva.


The European Refugee Crisis and Syria Explained


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domingo, setembro 20, 2015

Uma Europa manietada por acéfalos*




Falava-se de centenas, depois de milhares, pouco depois passámos para as dezenas e centenas de milhares e agora já se fala que cerca de dois milhões e meio de refugiados estão às portas da Europa, preparando-se para entrar; e, mais: que, se os conflitos que grassam como uma peste nos países de onde eles fogem persistirem, poder-se-á falar de doze milhões de pessoas.

Hoje, numa reportagem (fantásticas as reportagens da RTP), um homem dizia que, porque no barco vinham cerca de mais 20 pessoas do que os que cabiam, nove homens se tinham atirado ao mar para que os outros sobrevivessem. Ouvi isto e fiquei quase paralisada. Tudo isto tem uma grandeza que vai para além das escalas que eu conhecia.

Todos os dias há naufrágios, mortos, crianças ao colo dos pais percorrendo caminhos, de noite, comboios transbordantes de gente que dorme de qualquer maneira, campos onde gente se amontoa como animais para abate, hordas de famílias inteiras apenas com uma mochila nas mãos. Uma invasão de gente que, fugindo da morte, tudo enfrentará. No outro dia, ouvi uma mulher dizer, numa outra reportagem, que lhe levassem ao menos a filha que ela, caso não pudesse acompanhá-la, voltaria para a Síria (certamente, para morrer na Síria). Ouve-se isto e percebe-se a dimensão sobre-humana da coragem desta gente.

E, enquanto isto, nas caricatas instâncias europeias, agendam-se cimeiras com semanas de antecedência, porque é tudo gente com agendas muito preenchidas: cimeiras em que se reúnem os ministros das pastas respectivas em cada país.

Neste caso não é de finanças que se trata, é de segurança (acham eles). De Portugal foi, então, uma senhora que mal consegue falar quando está assarapantada e que parece que ainda não percebeu bem qual o seu papel no meio do filme onde se meteu. Ora, se não consegue dar conta do recado com cabos ou sargentos da GNR, imagine-se o que terá ela ido fazer numa cimeira onde se foi discutir o que fazer com esta vaga imensa de gente desenraizada, cansada, tudo fazendo para sobreviver?

Se todos os outros ministros dos outros países forem do calibre desta Anabela Rodrigues estamos conversados. Como a dita cimeira não deu em nada, agora parece que vai haver uma outra mas subindo na hierarquia. Ora alguém consegue ver que da intervenção do láparo possa nascer algum contributo que se aproveite? Zero. Presumo que não vá para lá tentar habilidades verbais, trampolinices infantis e outras afoitezas com que costuma brindar os seus concidadãos. Por isso, na melhor das hipóteses ficará calado. E não é só ele: pense-se no galarucho do Hollande e nos outros todos que por lá se atrapalham uns aos outros.

Está a acontecer agora o que aconteceu com a crise financeira: nessa altura, uma avalancha a desabar sobre os países e os atrasados mentais que se alaparam por tudo o que é lugar de poder a fazerem avançar os contabilistas para a travar. Os países a caírem que nem tordos às mãos dos especuladores financeiros e os chernes e outros totós de cabeça à nora sem conseguirem fazer o que quer que fosse. Lá apareceu, então, o Draghi que, do mal o menos, pôr a impressora a trabalhar e vá de despejar dinheiro para cima dos países. Claro que, como politicamente a desregulação se manteve inalterável, o dinheiro está a servir para a Alemanha e os outros mais fortes sacarem o seu dos países endividados e para os endividados continuarem a endividar-se alegremente.

Contudo, agora é pior, esta crise é bem pior. Agora, a ineficiência daquelas cabeças ocas traduz-se nas tragédias diárias a que estamos a assistir e que tendem a agravar-se.

Nos países de origem daquela pobre gente nada acontece para se atalhar o problema na raiz: a brutalidade animalesca continua à solta na Síria e em todos esses países cuja instabilidade foi alimentada por estes mesmos totós. E, portanto, o êxodo continua, intensifica-se.

E estes atrasados mentais, em vez de se entenderem e perceberem o problema brutal de que estamos em presença, arranjam soluções para mil ou duas mil pessoas aqui e ali, uns fazem barreiras, outros favorecem a acção de voluntários - ou seja, na prática, brincam aos escuteirinhos.

Não sei como vai isto acabar. Não sei mesmo. 

E, sobretudo, não lavemos as mãos: quem elege aqueles inúteis somos nós, quem permite que a Europa esteja como está, sem liderança, sem alma, sem tino, somos nós.

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*Acéfalo, significando que não tem cabeça, é um adjectivo. Acéfalos, como substantivo, refere-se a uma certa classe de moluscos, de reduzida cabeça. Portanto, parece-me bem assim: substantivo.

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sexta-feira, setembro 04, 2015

"Choro, logo sou bom"...? Não, Maçães, tu nunca és bom. Não percas tempo com isto, ó Maçães. Mantém-te entretido no twitter com coisas mais à medida da tua fraca cabeça. E desaparece-me da vista, se faz favor, vai brincar para outro lado, onde não envergonhes os portugueses. Ou, então, olha para o que aqui compilei para tu veres, ó Maçães, Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.


E agora já vêem o que se está a passar?



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Maçães partilha artigo que desvaloriza emoção com foto de criança morta



O secretário de Estado Bruno Maçães, dos Assuntos Europeus, partilhou hoje no Twitter um texto da revista britânica Spectator que trata como "pornografia moral" a difusão viral da foto de uma criança síria que surgiu morta numa praia turca.


Com o título "Choro, logo sou bom", Maçães partilha no seu Twitter um tweet com o link de um artigo de Brendan O'Neill intitulado "Partilhar uma foto de uma criança síria morta não é compaixão, é narcisismo".

No artigo, O'Neill desvaloriza a autenticidade de quem mostrou emoção com o caso partilhando de forma viral a fotografia - que hoje fez cobriu as capas dos jornais pelo mundo inteiro.

(Daqui)
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"Os meus filhos escorregaram-me das mãos", diz o pai de Aylan e Galip. 



Família síria tinha feito pedido de asilo ao Canadá, que fora rejeitado. Mas saiu da Turquia numa tentativa desesperada de chegar ao outro lado do Atlântico.


A Europa era só um ponto de passagem, mas Aylan e Galip Kurdi, de três e cinco anos, nunca vão chegar ao destino. Os dois meninos curdos morreram ontem, quarta-feira, com a mãe, num naufrágio no mar Egeu, quanto tentavam chegar à Grécia. A imagem do corpo de Aylan na areia de uma praia da Turquia tornou-se o símbolo mais recente da crise dos refugiados da Europa. Mas o destino era o Canadá, do outro lado do Atlântico, onde os esperava uma tia.

O pedido de asilo tinha sido rejeitado, mas a família saiu da Turquia numa tentativa desesperada de chegar ao outro lado do Atlântico. Só o pai, Abdullah, sobreviveu. E tudo o que quer agora é voltar a casa, em Kobane, para enterrar a família.

O pai de Aylan e Galip à saída da casa mortuária
onde estão os corpos dos filhos
"Os meus filhos escorregaram-me das mãos", disse Abdullah à agência noticiosa turca Dogan. "Tínhamos coletes salva-vidas, mas o barco virou-se subitamente, porque as pessoas se levantaram. Segurei a mão da minha mulher, mas os meus filhos escorregaram-me das mãos", explicou o pai de Aylan e Galip. Segundo o The Guardian, o comandante do barco entrou em pânico devido à força das ondas e saltou da embarcação para o mar, deixando Abdullah no comando. 

Depois de o barco virar, o sírio ainda conseguiu segurar nos braços a mulher e os filhos, que já estavam mortos.


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"Não queremos ir para a Europa. Só queremos que parem a guerra na Síria"



Refugiado sírio de 13 anos tem uma mensagem para os europeus.


Kinan Masalmeh tem 13 anos e é refugiado. Chegou à Europa com a sua irmã e, quando foi interpelado pela Al Jazeera sobre a mensagem que tinha para os europeus, não hesitou. "A minha mensagem é: ajudem a Síria. Os sírios precisam de ajuda agora", disse. "Nós não queremos vir para a Europa. Só queremos que parem a guerra na Síria".

(Daqui)
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Licença para matar


Ainda a leveza da consciência europeia


Em 2011, a Alemanha exportou 5,4 milhões de euros em armamento, dos quais 2,3 mil milhões para países do chamado terceiro-mundo (Infografia: Der Spiegel)


«Duas opções restam à indústria de armas alemã, com os seus 80.000 empregos: ou se reduz, com a diminuição da procura, ou desenvolve novos mercados. Mas acontece que esses mercados são em regiões do mundo onde os ditadores estão em guerra uns com os outros, regimes religiosos financiam terroristas ou autocratas usam a violência para suprimir os seus próprios povos. Os mercados em maior crescimento estão no Médio Oriente e nas economias emergentes do Sudoeste Asiático ou da América do Sul.»

[Fonte: Der Spiegel, 3 de dezembro de 2012]

O resultado de tal estratégia de desenvolvimento de novos mercados é o que está à vista.


(Daqui. E, se me permitem, vejam também aqui - pois nos factos aqui referidos está, em parte, o fundo da questão)

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NB

E quem diz Maçães diz qualquer um dos outros que têm contribuído para que a Europa seja o bordel que é hoje, contribuindo para espalhar o mal por esse mundo fora.
(Maçães é apenas uma caricatura maior, uma coisa ao nível do absurdo, e ilustra bem o que são as criaturas ineptas que opinam, decidem, empatam, atrapalham e dão cabo da Europa e da vida de muita gente por esse mundo fora)
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A imagem que encabeça este post tal como a que o fecha fazem parte de uma série na qual artistas de todo o mundo reagem à dolorosa imagem de Aylan Kurdin, o menino morto na praia que não me sai da cabeça, um menino que saíu de casa todo arranjadinho para ir em busca de um futuro melhor. 

Estas imagens podem ser vistas no Bored Panda.




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sábado, agosto 29, 2015

De que fogem estas hordas de imigrantes, de refugiados, de invasores esfaimados e aflitos que um dia poderemos ter à nossa porta?


Há dias em que tenho uma em mente mas que me custa tanto que faço de tudo para a evitar. Sei que não conseguirei o tom adequado, sei que posso parecer fútil, leviana, sei que há coisas para as quais não há palavras. Por isso, este é o quarto post de hoje e já andei pelo sex-appeal, pelo humor, pela poesia, pelo amor - tudo para resolver se fujo ao assunto ou se tento abordá-lo. E aqui estou a hesitar. Não sei como mostrar o que penso sem correr o risco de, emocionada que estou, me mostrar lamechas; também não quero parecer panfletária. Ou vulgar.

E, no entanto, já falei algumas vezes disto. Vou falando. Mas acho que me fico sempre pela rama.

Centenas de milhares de pessoas de todas as idades, condições sociais e raças e de ambos os sexos têm vindo a deixar as suas casas e, correndo todos os riscos e sofrendo todos os horrores possíveis e imaginários, põem-se a caminho, morrendo, deixando familiares mortos para trás, em busca de um mundo em que possam viver com dignidade e esperança. Para isso, entregando todas as suas economias e pertences, colocam-se nas mãos de contrabandistas e bandidos e, procurando a Europa - que julgam ser um bom destino - metem-se dentro de barcos ou camiões onde muitos nem respirar podem, ou põem-se a caminho, crianças e velhos ao colo. Imagens que não parecem deste mundo chegam-nos a casa dia após dia, uma sucessão infindável de horrores. O sofrimento daquela gente parece não ter fim. Todos os dias mais dezenas ou centenas de mortos. Afogados, asfixiados. E as estradas cheias, cheias de gente. E comboios pejados de gente assustada, suja, exausta. E acampamentos a deitar por fora. E muros que se erguem. E arame farpado que dilacera os corpos e as almas. 

Andou a civilização a fazer-se, o mundo a desenvolver-se, a ciência e a tecnologia a superarem-se para que tantas centenas de milhares de pessoas passem por isto, como animais fugindo do fogo, como cães esfomeados percorrendo as ruas.

A cambada que ajudou a desestabilizar os países de onde esta gente foge não é agora capaz de ir para lá garantir um mínimo de ordem de modo a que as pessoas não tenham que fugir espavoridas, deixando as raízes para trás, correndo riscos de vida, pondo a vida dos filhos em risco. Ficam-se pelas palavras balofas e de circunstância. Quando foi para decidir ou apoiar as guerras ou os movimentos que provocaram isto, souberam tomar decisões. Agora que o inferno está lá instalado, lavam as mãos e entretêm o mundo com pífias considerações. Um asco de gente.

Não é com conversa que alguma coisa se fará: é indo para lá. Já lá deveriam estar tropas, Capacetes Azuis, não sei - gente que ajude a pôr cobro ao desatino e à crueldade sem rei nem roque que por lá impera.

Não sou capaz de dizer mais que isto porque me faltam as palavras e porque o peito se me enche de angústia. Vou, pois, ficar-me apenas pelas imagens.


De que foge esta gente?



Un drama con rostro

En la imagen, una mujer mira cómo la policía bloquea a un grupo de refugiados que hacen la ruta Macedonia-Grecia. El primero de estos países declaró el Estado de Emergencia el 20 de agosto, abrumado por el número de inmigrantes que llegaban a su país, y movilizó a su Ejército para que vigilara la frontera.


(ROBERT ATANASOVSKI (AFP))


Jugarse la vida

En la imagen, un inmigrante escondido debajo de un tren intenta colarse en él para dirigirse a Serbia, en la estación de Gevgelija (Macedonia). En los últimos días, más de 120 cadáveres de inmigrantes han sido descubiertos en vehículos que se dirigían a Europa y en los que los refugiados viajaban escondidos.


(BORIS GRDANOSKI (AP))


Miles de niños entre los refugiados

Inmigrantes sirios duermen en un parque de Belgrado, Serbia. Son más de 10.000 los refugiados que han cruzado con sus bebés y niños pequeños la frontera de Serbia en los últimos días.


(MARKO DROBNJAKOVIC (AP))

Estado de emergencia

La policía macedonia trata de bloquear a los inmigrantes que intentan entrar en su país. Alrededor de 39.000 personas, la mayoría de origen sirio, han sido registradas a su paso por Macedonia en el último mes. La cantidad abrumó al Gobierno macedonio, que declaró el Estado de emergencia.


(VLATKO PERKOVSKI (AP))


El miedo como compañero de viaje

Reacción de un inmigrante que sostiene a un niño mientras es detenido por las autoridades de Macedonia. Alemania espera este año la llegada de 800.000 refugiados a Europa, “el mayor reto al que se enfrenta nuestro país desde la unificación”, advirtió Sigmar Gabriel, líder socialdemócrata, partido en coalición con los conservadores de Ángela Merkel.


(DARKO VOJINOVIC (AP))


Un hogar en cualquier lugar

Rashina viene de Kobani, Siria. Tiene cuatro años y ha bajado por medio mundo para llegar hasta Europa. En la imagen, descansa en una cama improvisada mientras espera un tren en la frontera macedonia que les lleve a otros puntos de Europa en busca de un lugar donde establecerse.


(OGNEN TEOFILOVSKI (REUTERS))



Fogem de situações como estas, na Síria 




Uma criança síria (Hudea, 4 anos) teria levantado as mãos ao confundir uma câmara fotográfica com uma arma.

(Foto: Osman Sargili)


Homem sírio chora enquanto segura o corpo de seu filho perto de Dar El Shifa hospital em Aleppo , Síria. O menino foi morto pelo exército sírio.

(Foto: Manu Brabo)


Uma mulher ferida, ainda em choque, deixa o hospital Dar El Shifa em Aleppo, Síria em 20 de setembro de 2012, após um bombardeio da artilharia das forças do governo sírio na cidade, no norte da Síria.

(Foto: Manu Brabo)


Uma mulher chamada Aida chora enquanto se recupera de ferimentos graves após o exército sírio bombardear sua casa em Idlib, norte da Síria em 10 de março de 2012. O marido de Aida e seus dois filhos foram mortos no ataque.

(Foto: Rodrigo Abd)


Um menino chamado Ahmed lamenta a morte do pai (Abdulaziz Abu Ahmed Khrer, que foi morto por um atirador de elite do exército sírio) durante seu funeral em Ibid, norte da Síria.

(Foto: Rodrigo Abd)
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A favor da Síria, pela mão atenta e amorosa de Banksy


[Graffiti artist Banksy has reworked his Young Girl piece for the With Syria campaign, to mark three years since the crisis began. The campaign is a coalition of 115 humanitarian and human rights groups from 24 countries, including Save the Children, Oxfam and Amnesty International. According to the coalition their aim is to ensure this is the last anniversary of the Syrian crisis. At the Zaatari camp in Jordan 100 young refugees lit candle and released red balloons, inspired by Banksy to carry messages of hope to Syrians. Report by Genelle Aldred.]

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Obtive as primeiras fotografias, as que têm legenda em espanhol, no El País.
Obtive as últimas fotografias, da Síria, na Obvious

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Por indicação do Leitor ECD em comentário aqui abaixo fui ler e, de tal forma, me revejo no que ali está escrito que me permito transcrever o artigo quase na íntegra.

Os campos, novamente


ANTÓNIO GUERREIRO in Público


Os campos, sob a forma de centros e lugares de retenção, voltaram à Europa e disseminaram-se por toda a fronteira do Sul da União Europeia. São espaços geridos pela polícia, subtraídos à ordem jurídica normal, que funcionam como diques para reter o enorme caudal dos “fluxos migratórios”. A situação está fora de controlo e assemelha-se àquela “explosão” que se deu no coração do continente europeu entre as duas guerras mundiais, assim descrita por Hannah Arendt em O Imperialismo, num capítulo em que a filósofa analisa o declínio do Estado-nação e o fim dos direitos do homem: “[As guerras civis] desencadearam a emigração de grupos que, menos felizes do que os seus predecessores das guerras de religião, não foram acolhidos em nenhum sítio. Tendo fugido da sua pátria, viram-se sem pátria; tendo abandonado o seu Estado, tornaram-se apátridas; tendo sido privados dos direitos que a sua humanidade lhes conferia, ficaram desprovidos de direitos”. E num artigo de 1943, We Refugees, escrito para um jornal judeu de língua inglesa, Arendt terminava em tom de exaltação, como se tivesse acabado de identificar um novo sujeito da história: “Os refugiados representam a vanguarda dos seus povos”. Mas o refugiado que Arendt definiu a partir do modelo do apátrida — produto de uma dissociação entre as fronteiras administrativas do Estado e a realidade política dos homens — implicava, como o nome indica, a ideia de refúgio, tanto geográfico como jurídico: os refugiados judeus que, no início da Segunda Guerra Mundial, conseguiram embarcar para a América tinham um destino que os orientava à partida e contavam com a vontade política de uma protecção. Os actuais “migrantes” que se lançam ao mar para alcançarem o território europeu são, pura e simplesmente, “deslocados”, fogem da guerra e da miséria, na esperança de conseguirem encontrar um lugar, uma direcção, um sentido. Verdadeiros refugiados na Europa, no sentido jurídico da Convenção de Genebra de 1951, são uma ínfima parte deste fluxo de forçados migrantes que, mal entram em território europeu, são ainda menos do que párias: são uma massa incontrolada de indesejáveis estrangeiros, assaltantes contra os quais a fortaleza europeia não consegue erguer muros eficazes nem fazer valer as suas armas de dissuasão. À nossa frente, está a passar-se algo que não queremos olhar: o regresso a formas de brutalização e barbárie, a instauração de espaços anómicos onde, novamente, “tudo é possível”. Sem conseguirmos vislumbrar soluções para o problema, desistimos também de uma vigilância capaz de nos lançar este alerta: os campos que regressaram à Europa, em grande número e por todo o lado, muito embora não sejam regidos pelo regime de excepção que presidiu à tanatopolítica — à política da morte — dos regimes totalitários, não nos dão garantias de que nenhum descarrilamento terá lugar e nenhuma inclinação criminosa latente poderá seguir o seu curso. Não podemos hoje ignorar que há uma lógica terrível imanente ao campo como figura: ele acaba por desenvolver uma zona cinzenta onde todas as situações-limite, à margem de todos os direitos, se tornam possíveis.  (...)

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Permitam que vos informe que a seguir há mais três posts, leves, levezinhos
(uma tentativa de aliviar a consciência)

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, um bom sábado.

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