terça-feira, outubro 11, 2011

Alguns preferem as mais novas: Paul McCartney e Nancy Shevell, Michael Douglas e Catherine Zeta-Jones, Jorge Luis Borges e Maria Kodama, Camilo José Cela e Marina Castaño, José Saramago e Pilar del Rio, amores de uma vida


E quando são homens mais velhos a casarem com mulheres mais novas? Alguém acha ridículo? Eu não acho mas eu sou aquilo que se sabe, acho graça a tudo e desdenho de poucas coisas.

Vejamos então alguns casos. Em comum terão o estarem de alguma forma ligados às artes. Um músico/cantor, um actor de cinema e três grandes escritores. Mais alguma coisa em comum? Sim - a capacidade de, na fase mais avançada da sua vida, amarem imensamente, como jovens com toda a vida pela frente. Um exemplo.
<>


Paul McCartney escusa de ser apresentado (é o eterno Beatle, é, no mínimo, galáctico e, por exagero, direi que é mais umas mil coisas) e tem 69 anos, embora não pareça nada - e então feliz como estava no domingo, parecia um quarentão bem parecido, franja esvoaçante, brincalhão.

Um casal de noivos feliz, mais ou menos da mesma idade, é o que as imagens nos mostram.

Para ele foi o terceiro casamento, para ela não sei. Nancy Shevell não casou com ele por dinheiro, não senhor. É empresária e filha de um multimilionário norte-americano. Casou com ele por amor, com certeza. Ah, e não é nada da mesma idade... é 18 anos mais nova, é uma moçoila de 51 frescos anos e foi vestida pela enteada, a estilista Stella McCartney.

O amor em qualquer idade, o amor que rejuvenesce os amantes: basta vê-los para remontarmos à juventude, aos amores para sempre.

<>



Michael Douglas é um actor carismático, sexy, uma voz e um olhar maliciosos, irresistíveis e Catherine Zeta-Jones é belíssima, formosíssima, feições perfeitas. Ele tem 69 anos, ela tem 42. Vinte e cinco anos de diferença. Ele apaixonou-se por ela quando a viu na Máscara do Zorro, ela também não lhe resistiu.

Casaram-se, já têm 2 filhos. Ele já teve cancro e ela não arredou pé, apoiou-o, puxou por ele. A seguir foi ela que se foi abaixo e foi a vez dele a apoiar. Já se lhes apontaram affaires mas são meios em que o difícil é não olhar para o lado.

Até ver, um casal feliz.
<>


Jorge Luís Borges nasceu em Buenos Aires em 1899 e Maria Kodama em 1937.  Trinta e oito anos de diferença! Ele deixou-nos em 1986; Maria ainda vive.

Também não deveria meter-me a apresentar Jorge Luís Borges mas direi apenas que foi romancista, poeta, ensaísta, tradutor, crítico, bibliotecário, professor, etc, etc, etc. Foi escritor precoce e foi leitor insaciável, tendo uma paixão por ler enciclopédias, imagine-se.

Com 51 anos cegou. Mas a sua carreira continuou 'de vento em popa', premiado, louvado, traduzido em inúmeros países. Habitava com a mãe que viveu até aos 99 anos.

Com 68 anos casou-se talvez para descansar a mãe que vivia preocupada que o filho ficasse sozinho e cego. Mas o casamento durou apenas 3 anos.

Entretanto, passou a andar sempre acompanhado pela assistente pessoal, a argentina Maria Kodama, filha de um japonês e de uma alemã que tinha conhecido Borges enquanto sua aluna (ah, o fascínio que os grandes mestres exercem nas suas dedicadas alunas). Anos e anos de companhia. Jorge Luís ditava e Maria escrevia. Maria conduzia-o, Maria apoiava-o, Maria sempre presente e Maria sempre odiada pelos argentinos. Maria que o levava para os passeios que Jorge Luís sempre queria fazer, Maria que fotografava o que Jorge Luís não conseguia ver, Maria descrevendo as feições, as salas, as paisagens.

Algum tempo antes de Borges morrer, casaram-se e ela tornou-se a sua herdeira. É presidente da fundação que leva o nome do marido e desdobra-se a divulgar a sua obra, a falar sobre ele. Uma vida inteira dedicada a Jorge Luís Borges.

<>


Camilo José Cela nasceu em Espanha 1916 e morreu em 2002. Foi feito Marquês de Iria Flavia pelo Rei Juan Carlos, escritor e recebeu o Prémio Planeta, o Prémio Cervantes, o Prémio Príncipe das Astúrias da Literatura, Nobel.
Escreveu muito, e para o final da sua vida foi-se tornando polémico, não raramente causando desconforto social.
o
Repararam na bolinha encarnada aqui em cima? Então, os meninos e as meninas agora olhem para o lado, tapem os ouvidos, está bem? E pardon my french. Vou transcrever)
Uma das piadas mais conhecidas a seu respeito refere-se a uma peripécia que se passou com ele enquanto deputado. Estava ele, no Parlamento, cabeceando, quando lhe perguntaram se estava a dormir. Respondeu, D. Camilo, que não senhor, que estava adormecido. O outro, admirado, tentou perceber, 'É a mesma coisa, não?' D. Camilo elucidou que não senhor, que se tratava de coisas muito distintas. 'Não é a mesma coisa estar a dormir e estar adormecido, tal como não é a mesma coisa estar a foder ou estar fodido'.
Nem mais.
Casou-se cedo com Maria do Rosário com quem teve um filho mas divorciou-se mais de quarenta anos depois. Pouco depois, em 1991 casou-se com Marina Castaño, jornalista, jovem. Marina Castaño nasceu em 1957 e está ainda bem viva. Quarenta e um (41!) anos de diferença.
Tiveram uma vida de glamour, de polémica, de divertimento.As fotografias mostram-nos, quase sempre, na maior boa disposição.
 
<>


José Saramago nasceu na Azinhaga em 1922 e morreu em Junho de 2010. Jornalista, tradutor, poeta, ensaísta, contista, dramaturgo, romancista, várias vezes premiado nomeadamente com o prémio Camões, é o nosso Nobel da Literatura.

Começou a escrever cedo mas foi apenas com Levantado do Chão que publicou quase com 60 anos que o seu estilo se definiu. Depois, foi o êxito com o maravilhoso Memorial do Convento. A partir daí foi imparável.

Pilar del Rio, jornalista espanhola, conhecia toda a sua obra, tinha fascínio pela obra e quis conhecer o criador. Isso aconteceu em 1986 e dois anos depois casaram-se. Ele tinha 66 anos e ela tinha 38 anos. Vinte e oito anos de diferença!

Pilar foi sua tradutora, sua companheira, sua devota admiradora, sua mulher, sua namorada e amante.

Em 1995 Saramago escreve o seu livro maior, a sua obra prima, o Ensaio sobre a Cegueira, um dos livros que, até hoje, mais me impressionaram. Foi com um terror visceral que li aquele livro. Em situações limites, as pessoas transformavam-se em bichos em luta pela sobrevivência e eu era uma daquelas pessoas. Embrutecida, eu era uma das pessoas de que ali se relatava o percurso.  É frequente eu fazer paralelismo entre situações dramáticas a que assisto e a extraordinária descrição feita por Saramago.

Não consegui voltar a ler aquele livro que me esmagou. Fiquei marcada. Relembro cenas, jamais as esquecerei. Todas as pessoas deveriam ler este livro.

Depois deste livro, Saramago escusava de ter escrito qualquer outra coisa. Mas escreveu laboriosamente. Embora tenha todos os seus livros, nunca mais li nada dele, com execpção dos Diários de Lanzarote. Não li porque não quero que a marca do Ensaio sobre a Cegueira deixou em mim se esbata.

Viveu pois em Lanzarote e eu compreendi-o. Foi cobarde a actuação do governante que não deixou que um livro seu fosse a concurso, a revolta foi natural. Além disso foi também a maneira de viver equidestante da sua terra e da terra da mulher por quem viveu, com quem viveu um terno e eterno amor. Tantas vezes ele o disse - que amava Pilar, que renasceu com Pilar, que a Pilar devia tudo.

(É certo que Pilar não foi a única mulher da sua vida e acusam-no de ignorar as anteriores mas até nisto eu o compreendo - foi tão imenso este seu amor que ele quis que fosse o único, o primeiro, o último.)

Pilar, uma mulher cheia de garra, assertiva e vibrante, é hoje a Presidenta da Fundação José Saramago. A quem não viu o documentário José e Pilar, recomendo-o vivamente. São momentos de intimidade, de fragilidade, de grande amor. Daqueles tipos de amor que não morrem com a morte dos que amam.

E agora, para terminar, pego no Ensaio sobre a Cegueira e, ao caso, abro numa qualquer página. Transcrevo:

"O cão das lágrimas veio para ela, este sabe sempre quando o necessitam, por isso a mulher do médico se agarrou a ele, não é que não continuasse a amar o marido, não é que não quisesse bem a todos quantos se encontravam ali, mas naquele momento foi tão intensa a sua impressão de solidão, tão insuportável, que lhe pareceu que só poderia ser mitigada na estranha sede com que o cão lhe bebia as lágrimas."


||||||||||||||||||


E agora desça um bocadinho mais para levantar o seu bilhete para o espectáculo ali ao lado, na beira do rio, it´s Summertime.

MÚSICA NO GINJAL: The Bill Evans Trio em Summertime

Estamos na Semana do Jazz - cinco Jazz Bands, cinco! Está tempo de verão, não é? Ok. Então vamos lá.


Então vamos refrescar-nos, vamos para a beira do rio. It´s Summertime com The Bill Evans Trio. Venha comigo. A seguir à Ana Luísa Amaral, actuam eles. Vamos.

segunda-feira, outubro 10, 2011

Madeira: a vitória de Pirro de Alberto João Jardim, a derrota do PS, do PCP e do BE e a vitória justa do CDS, nomedamente do charmoso José Manuel Rodrigues. Mas, já agora, Caríssimo Paulo Portas, ouça lá uma coisinha acerca da 'sua' Assunção Cristas'


Com esta vitória do PSD madeirense, como fez questão de acentuar, o Alberto João, conforme expectável, assitirá impotente à derrocada do seu estilo de governar. Fez e desfez, distribuíu, ameaçou, manipulou, subverteu, omitiu e, apesar de tudo, voltou a ganhar as eleições. Mas sabe o que o espera.

Venceu, pois - e sair-lhe-á cara esta vitória - e fez um patético discurso, sem direito a perguntas. Não tinha os óculos, leu titubeantemente o texto no qual atacou o capitalismo selvagem, o liberalismo radical, atacou o ministro das Finanças e a da Justiça. É a raiva contra incertos que mal disfarça o desespero face ao que se aproxima.

Alberto João no discurso da sua vitória de Pirro: o estertor do jardinismo, um fim triste

Sabe bem que o seu tom terá que baixar quando vier, de rabinho entre as pernas, negociar o apoio de que precisa como de pão para a boca. E assistirá ao fim do jardinismo, cancelando contratos, despedindo pessoas, contando os tostões. Será olhado de lado, será desprezado, porque a memória é curta e os eleitores que o trouxeram até aqui, cobrar-lhe-ão agora aquilo que ele não mais poderá pagar.

Os madeirenses são tão culpados disto, como os portugueses em geral não são culpados da situação a que o país chegou, como os gregos, como povo, não são culpados dos excessos de uns quantos, nem da cegueira confortável de todos quantos deixaram que a situação atingisse o descalabro em que se encontra, como todos os que em toda esta europa desgovernada se vêem atirados para o desemprego, na maior insegurança - no fundo, somos todos vítimas de um regime que ganhou vida própria, desregulado, descomandado, hidra voraz sem religião, moral ou pátria.

Por isso, os madeirenses vão sofrer e muito o lamento, tal como lamento o mau bocado que todos estamos a passar por todo o lado, aflitos, desalentados, sem esperança.

Mas, voltando às eleições - perdeu o PS e muito e imperdoavelmente. Maximiano Martins deve ser um homem esforçado, sério, muito honesto, um homem como deve ser. Mas nisto da política há perversidades. Não basta ser. Numa altura destas, em que os Madeirenses estão assustados, querem ter do lado deles alguém que os defenda, que lute por eles, alguém que tenha uma aparência forte, lutadora.

Maximiano Martins - não basta ser um bom homem

Ora a Maximiano falta-lhe aquele punch, aquele ar de quem disparará sem hesitação, de alguém que levantará a voz de forma a fazer-se ouvir. Perdeu por isso.

Claro que o apoio do Tozé Seguro também não ajudou muito. O Tozé tem ar de ser daqueles senhoritos que, se a coisa dá para o torto, desata a fugir. Pode não ser - mas parece. Ora, para que querem os madeirenses, nesta hora de aperto, um Tozé com ar de choramingas?

O PCP também levou uma tareia e é compreensível. Nem se percebeu o que achavam da trapalhada das contas. Quando falam é para dizer coisas deslocadas, palavras gastas.

O BE desapareceu e lá apareceu o Louçã, um esgar em forma de gente, gasto. Gastou-se com as situações dúbias em que se meteu no fim da era socrática. Devia sair e dar o lugar a outro.

Vitória, vitória a sério, teve-a o CDS. Vitória justíssima.

Paulo Portas: mais sóbrio, mais frontal, mais franco,
usando a inteligência ao serviço de um correcto exercício da Política

Paulo Portas vem sedimentando a sua inteligência, vem ganhando maturidade, vem ganhando segurança e tranquilidade. Aquela sua impetuosidade que o levava tantas vezes à demagogia, aquele seu conservadorismo já tão fora de moda., aquele ar de estadista precoce, vêm dando lugar a uma compreensão e tolerância que, tantas vezes, vem com a exepriência de vida o que, aliado à sua cultura e inteligência, fazem dele um provável primeiro-ministro deste país. Como se recordarão os meus Caros Leitores tenho sido crítica dele e não poucas vezes, mas, na altura, reconheci que fez a melhor campanha para estas legislativas e, agora, parece estar a ter ter um bom desempenho no Governo (acredito que terá o discernimento - que Passos Coelho não tem - de tentar atrair investimento a sério para o País, investimento que crie emprego e não de andar a ver se passa a patacos as jóias da coroa que são as nossas mais nevrálgicas e rentáveis empresas) e, sobretudo, nesta campanha da Madeira foi exemplar.

A sua atitude na condenação aos desmandos do Alberto João foi muito corajosa, franca, directa, inequívoca  A situação política de coligação governamental poderia tê-lo deixado numa apertada saia justa, como costumam dizer os brasileiros. Mas, apesar da delicadeza da situação, soube marcar a fronteira entre a coligação no País e a liberdade de acção na Madeira. Foi lá. Expôs-se. Falou loud and clear.

João Almeida
O menino que, a olhos vistos, se está a fazer homem

E, tal como ele, falaram outras vozes do CDS, de entre as quais destaco um jovem com ar de criança mas que se tem estado a portar como um homem crescido, o João Almeida. Firme e com voz grossa, tem denunciado os excessos e os dislates  Alberto João.

Mas não poderia deixar de referir-me a um outro factor certamente determinante no sentido do voto - o factor José Manuel Rodrigues.

CDS: grisalhos, bonitos, inteligentes, simpáticos - e vencedores, claro está

Ouvi José Manuel Rodrigues uma vez no Expresso da Meia-Noite e fiquei muito bem impressionada. Inteligente, claro, rápido na argumentação, firme e... factor não irrelevante: giraço. É um grisalho com muita pinta (mais um... que o Nuno Melo é outro), quase um George Clooney, bonito, um sorriso cativante. De certeza que as mulheres da Madeira não iam deixar de se manifestar favoravelmente. Um homem assim e todo vivaço, todo lutador, determinado, é uma mais valia em qualquer partido e, por isso, ele foi o justíssimo grande vitorioso da noite.

+++++

Mas, já agora, uma chamada de atenção a Paulo Portas. Vi no sábado o programa do Herman na RTP1 e, por isso, assisti à intervenção da Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente, Ordenamento do Território, Assunção Cristas. Tem frescura, é simpática, alegre, vê-se que é voluntariosa, vê-se que está cheia de boas intenções. Deve ser uma pessoa leal, determinada, trabalhadora.

Segundo li no Expresso da semana passada, Paulo Portas refere-se a ela como 'a minha Assunção'. Gosta dela, aposta nela, trouxe-a até aqui.

Mas, por favor... Conta ela que ligou ao marido dizendo que tinha sido convidada para ministra e logo de quatro coisas e que ele disse logo, 'Não hesites. É giro'. E quando Herman lhe pergunta como é ser ministra ela sorri, orgulhosa, e diz 'É giro'. E como é ser ministra da Agricultura, coisa com a qual não tinha antes qualquer ligação? Assunção responde, risonha, 'É giro. Chego às reuniões e digo logo que não sei nada daquilo, que estou ali para aprender com eles. É uma área gira, vê-se as coisas a crescerem'.

E que lá no Ministério são muitos, dado que tem muitas áreas e que 'é muito giro, juntamo-nos pessoas de muitas áreas diferentes, e é muito giro'.

E que, quando vai às reuniões, para pouparem na gasolina, vão todos no mesmo carro, até esgotarem a lotação do carro e quando chegam aos locais, as pessoas estão à espera de ver um carro batedor e afinal chega ela ao lado do motorista, os outros no banco de trás, ficam todos muito admirados e é giro'.

Assunção Cristas no Herman 2011:
Uma jovem contente por estar a fazer uma coisa muito gira

E eu até acho que, para uma jovem vinda da faculdade, da área do direito, e estando na política há tão pouco tempo, tudo isto seja uma aventura gira, uma experiência gira.

Mas, pergunto eu, ó meu caro Paulo Portas, será que numa altura destas, de descalabro e indefinição, com a crise tão brava que aí está, com tanto que é preciso fazer, decidir com ponderação e conhecimento de causa, será que é boa ideia pegar numa jovem inexperiente, que não sabe nada de nada das áreas pelas quais é responsável, e pô-la à frente de tão vasta e nevrálgica área?

Não creio. Eu, pelo menos, fico de pé (muiiiiito) atrás, com esta sua escolha. É que o que é preciso nesta altura não tem nada de giro e não sei se a 'sua' Assunção já o percebeu.

Por isso, agora que a escolha está feita e que há que seguir em frente e fazer com que dê certo, aconselho-o, meu Caro, a fazer algum coaching junto dela. Ao menos que, quando estiver em público, ela tente mostrar que não está nisto sobretudo por ser giro.

domingo, outubro 09, 2011

O meu 'Ginjal e Lisboa, a love affair', faz hoje um ano


O meu segundo blogue a nascer foi o Ginjal e Lisboa, a love affair. Faz hoje um ano.

Nasceu do meu grande amor por Lisboa, pelo Tejo, pela fotografia, pela poesia, por escrever. É um local mais recatado que o Um Jeito Manso. No Ginjal eu recolho-me para escolher poemas, mas escrever pequenos textos que os poemas me suscitam, para vos dar a ouvir músicas de que gosto, para vos mostrar as fotografias que faço junto ao Tejo, seja do lado do Ginjal, seja de Lisboa.

Quando passeio junto ao Tejo, de um ou outro lado do rio, mas especialmente do lado do Ginjal que é de onde se vê melhor Lisboa, a Magnífica, sinto-me sempre invadida por uma leveza que dificilmente poderei transmitir em palavras. Talvez seja da frescura que vem do rio, talvez seja da grandeza do espaço, talvez seja da beleza extraordinária que posso testemunhar. Mas, apesar de saber que o meu testemunho será sempre fraco face à imensa beleza a que assisto, é quase uma tentativa de vos passar esse estado de espírito que me leva a alimentar com desvelo o meu segundo e-filho, o Ginjal e Lisboa, a love affair.

É também para vós. Ou melhor, é sobretudo para vocês, meus queridos Leitores, meus Amigos.

Lisboa, o Tejo, veleiros, o azul, o branco, a luz, a beleza superlativa
vistos do Ginjal ontem de manhã


É com What a wonderful world que vos convido a festejar. Sing with me.


(Nota: A vela acesa na mão a balouçar de um lado para o outro não é necessária, pleeeeeeease....)



PS: Já agora cheguem-se também à volta da fotografia de hoje do meu Street Photo and Co.. Logo perceberão porquê. Ah, que bom, la joie de vivre.
.

sexta-feira, outubro 07, 2011

José Castelo Branco e Lady Betty Grafstein, Duquesa de Alba e Alfonso Díez, Marguerite Duras e Yann Andréas - três heterodoxias extremas


José Castelo Branco, nascido em Moçambique em 1962, veio para Portugal quase criança, trabalhou como modelo e, mais tarde, foi Tatiana Romanova, drag queen no Trumps. Casou-se, teve um filho, divorciou-se. A sexualidade ambígua, o corpo torneado, as feições exóticas e um temperamento extrovertido levaram-no a festas sociais onde conheceu artistas plásticas, de quem acabou por se tornar quase agente e, daí, até se tornar marchand foi um passo.

Por essas andanças, foi conhecendo cada vez mais pessoas, foi entrando no mundo do dinheiro. Há cerca de 15 anos casou-se com a riquísima Betty Grafstein, dona de uma empresa de diamantes e design de jóias, a Grafstein Diamond Company que herdou do marido, um judeu americano já falecido. A firma é gerida pelo filho que, naturalmente, não vibra com o casamento da mãe. Lady Betty é muitos anos mais velha que José Castelo Branco mas não se conhece ao certo a sua idade. Residem entre Sintra e Nova Iorque.

Parece que agora meteu na cabeça ser artista, fez um disco, quer participar em espectáculos e à-vontade, graça e sensualidade são coisas que não lhe faltam. Faltar-lhe-á talento vocal mas isso, para ele, é pormenor e, se calhar, para o género, também é irrelevante. A Tatiana Romanova ainda lhe está na massa do sangue.

As festas em que ambos participam, os reality shows em que ele tem sido estrela dominante, o aspecto de ambos, feitos e refeitos em muitas plásticas, tornam-nos um casal mediático e objecto fácil de ridicularização generalizada.

Ele parece cada vez mais mulher, a última cirurgia que se lhe conhece, segundo ele, foi para fazer umas pommes. Diz que, quando a mulher morrer vai 'para um convento de bichas'. O aspecto dela também a torna alvo fácil de piadas. Tantas plásticas já deve ter feito que o rosto parece ter cristalizado num sorriso patético.


Agora estão ambos envolvidos em mais um filme: José Castelo Branco terá participado em orgias sado-masoquistas em hotéis de luxo, com a Senhora Dona Lady assistindo. Ela diz que não, que mal pode andar.

E toda a gente goza, dizendo que ele é um oportunista, que aquilo é um casamento interesseiro.

Pois eu acredito que sim, tal como todos os casamentos, cada um à sua maneira. Cada um que se casa pensa que vai para melhor. E cada um valoriza os factores à sua maneira (afecto, estabilidade emocional, estabilidade financeira, luxo, apenas amizade).

Ele, que gosta de luxo e de boa vida, beneficiará com o casamento mas acredito que sente carinho por ela. Mas ela tem, certamente, ao lado dele, um suplemento de juventude, de alegria, de vontade de ser bonita, de se arranjar. Com quem, se não com José Castelo Branco, ela circularia em festas animadas, com cantorias, roupas bonitas, maquilhagens, certamente toda a gente a dizer-lhe que está óptima, fantástica? E que mal tem isso, se ela se sentir feliz assim?

<> <> <>

 
Cayetana de Alba, conhecida por Duquesa de Alba, possui mais títulos do que qualquer outro nobre: é cinco vezes duquesa, dezoito vezes marquesa, vinte vezes condessa, viscondessa, condessa-duquesa e catorze vezes Grande de España.

Teve, no entanto, uma infância triste. Cedo ficou orfã de mãe. Depois, com o pai, exilaram-se em Inglaterra durante a Guerra Civil espanhola; mais tarde, sofreu na pele a 2ª guerra mundial.

Quando voltou a Espanha casou-se, num casamento divulgadíssimo, de luxo. Desse primeiro casamento nasceram os seis filhos.

Depois de enviuvar, em 1978, Cayetana voltou a casar-se com um ex-sacerdote onze anos mais novo que ela, causando na altura bastante escândalo. Mas foi um casamento feliz, o relacionamento entre ele e os filhos dela foi tranquilo, muito bem aceite por todos. Mas em 2001 Cayetana, Duquesa de Alba voltou a enviuvar.

E em 2008 começou a prenunciar-se o namoro entre ela e Alfonso Díez, vinte e cinco anos mais novo, ex-funcionário da Segurança Social. E agora, como amplamente divulgado, no dia 5 de outubro casaram-se.


Mais uma vez, há especulações, há boatos, fofoca, mas o que eu vejo é um casal feliz.

Claro que o rosto da Duquesa - que parece desfigurado provavelmente devido a excesso de plásticas ou enchimentos labiais a botox - se presta a piadolas.

Mas convém que se saiba que é uma mulher muito interessante, ligada às artes, foi modelo, musa e mecenas de pintores, apoia e dança o flamengo e é grande aficcionada de touradas. Ela própria pintava. Possui uma valiosíssima colecção de pintura de que fazem parte, é apenas a título de exemplo, Chagall, Renoir, Picasso.

E, ao ver as fotografias do casamento, com Doña Cayetana feliz, sorridente, um vestido mimoso e elegante, um bouquet tão bonito nas mãos, dançando flamengo, alegre, plena de graça e vitalidade, o marido batendo palmas, olhar carinhoso, o que vejo é um casal que vive a sua vida da melhor forma. Haverá algum mal nisso? Não vejo.
<><><>


Marguerite Donnadieu, cujo non de plume é Marguerite Duras (1914 - 1996) foi escritora, dramaturga e cineasta. Nasceu na Indochina francesa, depois dos pais terem ido para lá na sequência de uma campanha que houve em França aliciando os franceses a irem para trabalhar para esse território longínquo.

Contudo o pai adoeceu e morreu, era Marguerite ainda muito novinha. A mãe, que era professora, insistiu em ficar lá com os três filhos. Investiu os haveres numa propriedade remota no Camboja, mas o investimento correu mal e viveram em situação de pobreza.

Foi por essa altura que Marguerida, jovem adolescente, se enamorou por um chinês adulto tendo vivido um apaixonado romance. Deste amor, nasceram várias histórias (algumas relatando situações contraditórias, de alguma ambiguidade, mas sempre francamente sensuais) das quais a mais conhecida é O Amante, Prix Goncourt 1984, também passado a cinema, um filme muito interessante, carregado de um erotismo poético, digamos assim.

Aos 17 anos voltou a França para tirar o curso de Matemática mas desistiu, cursando antes Ciências Políticas e Direito. Adere ao Partido Comunista (de onde, mais tarde, viria a ser explulsa) e enceta uma activa vida política. Casa com um activista, que é deportado. Mais tarde divorciar-se-ão.

Marguerite começa a ter problemas de alcoolismo mas consegue manter-se intelectualmente activa. Entre livros, teatros, filmes, alguns relacionamentos, Marguerite conjuga estas actividades com problemas recorrentes com o alcool. Numa dessas crises, em 1980, telefona a um jovem admirador, que tinha tido contacto com a sua obra quando ainda estudante de filosofia, e que ela tinha conhecido uns meses antes. É Yann Lemée a quem ela tratará por Yann Andreas e que nos últimos cinco anos lhe tinha escrito inúmeras cartas, fascinado pelos seus livros, por ela.


Começa então uma relação de amizade, amor, dedicação, cuidado e carinho. Yann tem menos 38 anos que Marguerite e adora-a.

Durante dezasseis anos cuida dela, apoia-a, inspira-a. Talvez mais que uma relação meramente amorosa, é também, ou sobretudo, uma relação literária.

Yann começou também a escrever mas o reconhecimento apenas veio mais tarde, com o livro em que fala do amor que viveram. Chama-se 'C'est amour là' e foi também adaptado a cinema.


Pego agora nesse livro e leio-vos as primeiras palavras.

"Gostaria de vos falar disso: desses dezasseis anos entre o Verão de 80 e o dia 3 de março de 1996. Desses anos vividos com ela.

Só consigo dizer ela.

Continuo a ter dificuldade em dizer a palavra. Não consigo dizer o nome dela. Só escrevê-lo. Nunca consegui tratá-la por tu. Por vezes ela teria gostado. Que eu a tratasse por 'tu', que a chamasse pelo seu nome. Não me saía da boca, não conseguia. Desenvencilhava-me para não ter que pronunciar essa palavra. Para ela era um sofrimento, eu sabia-o, via-o, e contudo não conseguia fazer de outra maneira. Acho que aconteceu duas ou três vezes, tratei-a por 'tu' por distracção. E vejo o seu sorriso. A infância. Uma alegria perfeita. Por eu me ter permitido chegar a essa proximidade. "

Depois, perto do fim do livro, já depois de Marguerite ter partido, escreve:

"Estou só na cidade, de manhã, à tarde, à noite. À tarde e pela noite dentro, por vezes, tenho pena de estar assim, de não ir no automóvel preto ao longo do Sena, tenho pena de não ouvir o meu nome chamado por si, Yann onde está você, Yann, é preciso ir às compras ao mercado de Buci, Yann já não posso mais consigo, fique, não se vá embora, não fique triste quando eu morrer. Não acredito por um só momento em todas essas histórias da eternidade. (...) Sim, por vezes, a certas horas do dia e da noite, tenho esta saudade. Como uma tristeza que passa. Como um desgosto que volta a certas horas. Imprevisível. E depois escrevo-lhe."

<><><>

quinta-feira, outubro 06, 2011

MÚSICA NO GINJAL - Sarah Vaughan and the Scat Blues


Encerra-se hoje esta primeira semana de Blues e compreenderão, meus Caros, que a feche com chave de ouro. Sarah Vaughan usa a voz como um instrumento, num scat. Mulher forte, de talentos múltiplos, uma vida cheia, ela está hoje na Música no Ginjal.


Pode, pois, fazer-me companhia até ali à beira do rio? Posso dar-lhe o braço? A seguir à poesia da Maria do Rosário Pedreira, chegará ela, a Divina. Vamos?
.

Nem 5 de Outubro, nem Angela Merkel, nem António José Seguro, muito menos Miguel Relvas e, então, sobre um possível segundo plano de resgate nem pensar - hoje vou falar de ortodoxias e da minha prima


Festejou-se o 5 de Outubro mas confesso que nem dei por ele. Também não devo ter perdido grande coisa. Cavaco Silva deve ter feito mais um daqueles discursos que não aquecem nem arrefecem, na assistência devem ter estado os do costume, agora com o Tozé Seguro no meio dos importantes, com aquele seu ar de menino velho muito compenetrado para não fazer má figura e para parecer tão importante como os outros importantes.

Um maçador este Tozé, armado em grande estadista, que seca.

E nem deve ter faltado o supra-sumo da importância nacional, o ilustre Miguel Relvas.


>>>>>>  Se perdi alguma coisa de jeito, os meus amigos importam-se de me avisar?

Tive, pois, um dia preenchido, dia de verão fora de tempo, um calor abrasador. Manhã de caminhada à beira da praia, de tarde casa cheia, uma azáfama que só visto, e só à noite me sentei aqui, para o meu turno da noite, sem grande paciência para notícias, debates.


Liguei a televisão e vi uma grande festa em torno de afirmações de Angela Merkel mas depois vi essas afirmações e afinal tudo não passou de uma frase anémica.

Angela - nem ela percebe tanto alarido por ter dito uma banalidade:
'que até Portugal está a recuperar a confiança dos mercados'

Depois parece que se iniciou um jogo de apostas a ver se vai ser preciso ou não novo plano de resgate, uns a dizerem que sim, outros a dizerem que não vêem porquê. Entretenham-se.

Estou cansada de política (tanta incerteza), da economia (tão débil), das finanças (tão exauridas). Estou numa fase em que tanta crise já me cansa.

Apetece-me distrair-me deste presente pesado que nos puxa para baixo.

Por isso, enquanto não começa o 5 para a Meia Noite estou com um magazine sobre cinema e vou laboriosamente cumprindo as minhas tarefas diárias. Já está uma fotografia nova no Street Photo, uma muito carinhos, já há Blues a sério na Música no Ginjal, já está um poema, hoje da Sophia, mais uma fotografia minha que tenta ilustrar o poema, um pequeno texto meu inspirado no poema, também no Ginjal, já fiz uma pequena ronda pelos casas da vizinhança, e agora, já passando da meia-noite, chego aqui a este meu último reduto.

Estou aqui a pensar sobre o que hei-de falar e, estando a lembrar-me de uma senhora que hoje vi e que fotografei, está a ocorrer-me falar de ortodoxias.

Hoje, esta fantástica senhora nada ortodoxa - adorei

Nas empresas uma das coisas que mais se tem que combater são as chamadas ortodoxias.

É aquilo que toda a gente segue sem questionar porquê, admitindo que é assim porque é assim e ponto final. Descobri-las é o cabo dos trabalhos porque são coisas tão interiorizadas que, às tantas, nem se dá por elas. Dou com coisas destas a torto e a direito e, quando se pensa que já se desmontou ou analisou tudo o que havia para analisar, somos surpreendidos com mais um monte delas.

É a fotocópia que se tira para mandar para não sei quem e vamos ver, quem recebe, arquiva e não sabe para quê; é a pasta do correio que se deixa num determinado sítio e quando se pergunta porquê, toda a gente reconhece que não dá jeito nenhum mas que sempre foi ali; é o fornecedor a quem se compra porque não há mais nenhum e vai-se ver e isso era há 10 anos e agora há mais 1.000. Acontece permanentemente.

Mas não é só nas empresas. É por todo o lado.

Uma teia de preceitos, preconceitos, suposições, medos, regras, que nos envolve de forma tão interiorizada que nem damos por isso. Mas não nos enganemos, estamos envoltos em ortodoxias.

Vivemos com medos, com medo do que os amigos pensem, com medo do que os vizinhos digam, com vergonha do que a família possa censurar. Provavelemente eles não estão nem aí para isso ou, se estiverem, problema o deles. Mas, quantas vezes, nos inibimos de vestir o que nos apetece, de apanhar o cabelo como nos apetece, de sair com quem nos apetece, de chegar a casa com quem nos apetece?

Escondemo-nos dos outros, escondemo-nos de nós.


E se há pessoas que conseguem mais facilmente identificá-las, avaliá-las e, se for caso disso, libertar-se delas, outras há, talvez as mais conservadoras ou acomodadas que, sem se darem conta, vivem em função das ortodoxias.

<>

Tenho uma prima que sempre teve uma mente livre. Foi estudar para longe de casa, por aí ficou a trabalhar e a viver. Namorou, desnamorou, arranjou um trabalho, mudou de trabalho, arranjou poiso, mudou de poiso, tudo como quis, sem dar explicações a ninguém. À distância os meus tios iam-se preocupando mas, como era à distância, a preocupação deles não a preocupava a ela.

Uma vez souberam que namorava com um rapaz com uma boa profissão, de boas famílias e a minha tia dizia-me ‘tomara que assente, que fique por aqui, com a despreocupação dela, nem dá por que o tempo vai passando e que qualquer dia já é tarde para pensar em filhos’. E parecia que sim que ia tudo dar certo. Ia passar férias a casa dele, iam de férias juntos, um rapaz muito simpático, dizia a minha tia. Durou ainda uns anos, este namoro, e a minha tia dizia, ‘não se percebe porque é que não se casam, já estão nos trintas, fazem vida de casados’

Até que um dia se soube que tinham terminado. Mas ela na boa. Profissionalmente sempre muito bem, comprou uma casa muito boa, vivia sozinha, ia de férias com amigos, sempre feliz e contente. E os meus tios desiludidos, ‘com esta idade e não consegue acertar-se e parece que continua sem pressa nenhuma’. A minha avó também, ‘gostava de ainda ver bisnetos do lado daquela neta’ e, ‘afinal porque é que ela acabou com o outro, alguém percebeu?’. Mas ninguém percebia (e ela, sem querer saber destas dúvidas para nada, também não se deu ao trabalho de esclarecer).

Algum tempo depois, novo motivo de preocupação, a minha tia apreensiva ‘parece que agora namora com um divorciado, muito mais velho que ela, já com quarenta e tais’, preocupação, preocupação. E recomendavam uns aos outros, ´É melhor nem dizer à avó que isto qualquer dia acaba e escusa de se estar a preocupar' e a minha tia a ficar mesmo preocupada, 'Agora uma coisa destas, aquela rapariga não tem juízo, mas o que é que ela pensa fazer da vida dela?’.

Escusado será dizer que gosto imenso desta minha prima e que, ao longo de toda esta saga, sempre disse que não via qualquer motivo de preocupação, que a sabíamos feliz e realizada e que isso era a única coisa importante. Quanto ao resto, não conseguia nem pronunciar-me pois ela, tal como todas as pessoas, deveria era viver a vida da melhor forma.

Mas a maior novidade estava ainda para vir. Um dia, num fim de semana, a minha mãe chegou-se ao pé de mim com cara de caso: ‘a tua prima está grávida’. ‘E então? Qual o drama?’. A minha mãe, como se eu não estivesse a ver a real dimensão do problema: ‘Então?! É do tal divorciado, daquel mais velho que ela. E não estão casados e parece que nem tencionam casar. E agora, já viste?, como é que se diz uma coisa destas à tua avó?’.


Esclareci, ‘Mas não se vão casar porque se separaram entretanto ou simplesmente porque não se querem casar?’ E a minha mãe, ‘parece que ele quer, ela é que não, diz que gosta de ter a independência dela, só visto...; e agora os teus tios nem sabem como hão-de dizer à avó, estão a pensar dizer primeiro que eles estão a pensar casar-se e, algum tempo depois, contam-lhe que aconteceu um percalço e que ela vai casar grávida, qualquer coisa assim’.

Transmiti que estava contente com um novo bebé na família, que não via mal nenhum nas opções dela, que até me parecia uma opção interessante e que achava que deveriam deixar-se de pruridos e contar, tout court, à minha avó da gravidez dela e que, aliás, até achava que devia ser ela a fazer esse anúncio e ponto final. Tanta conversa e tanta ralação por uma coisa que devia ser apenas um motivo de alegria.

Todos estes medos e preocupações com a minha avó, com o resto da família, com amigos e vizinhos se restringiam aos meus tios, aos meus pais. A minha prima nem aí e o irmão, meu primo, idem.

Depois dos meus tios trocarem muitas impressões com os meus pais e sopesarem bem se deveriam ir eles preparando o terreno junto da minha avó e qual a abordagem mais soft, resolveram partilhar a preocupação com a minha prima. Como seria de esperar, ela transmitiu-lhes que se deixassem disso que ela vinha cá e falava com a avó.

Assim fez. Os meus tios nervosos, à espera da temível reacção. Ela na boa, ‘avó, tenho uma novidade, estou grávida’ ; e a minha avó, ‘ah sim? olha que bom... que já não era sem tempo’.

Tanto medo, tanta preocupação, para nada.

E nasceu o bebé, lindo. Já está um menininho giríssimo, na escola, todo inteligente e bem disposto. E a minha prima continua a viver na casa dela, ele na casa dele, todos os dias depois do trabalho se juntam na casa de um ou de outro, jantam juntos, e à noite cada um dorme na sua casa. De vez em quando pernoitam na casa um do outro, ao fim de semana estão juntos, nas férias vão juntos. Sempre que os vejo, continuam felizes como namorados. Continua a perceber-se que ele é mais velho mas isso ainda faz com que seja um casal mais charmoso, ela toda moderna e gira, ele muito alto, magro e grisalho.

Para esta minha prima não existem ortodoxias, vive livre e feliz. E os meus tios, que se estavam a deixar enredar na mais banal das ortodoxias, constaram que afinal andaram a preocupar-se à toa.

A partir daí toda a família se deixou de parvoíces e toda a gente já refere com à vontade a escolha de vida da minha prima. Já não há nada a esconder.

<>

Moral da história? A do costume. Respeitando os sentimentos dos outros, cuidando para que não se faça mal a ninguém, analisando se não se está a fazer coisas que comprometam o futuro, vivamos de acordo com a nossa consciência e paremos de nos preocupar com a consciência dos outros.


É absurdo andarmos tolhidos e privarmo-nos do que gostamos ou gostariamos com receio da opinião dos outros. Sabemos lá nós qual a opinião dos outros. E mesmo que não concordem connosco... e depois?

Num curso daqueles comportamentais, o psicólogo que o ministrava ensinou-nos uma coisa que passei a ter presente especialmente quando estou com medo de qualquer coisa: ‘O que é o pior que pode acontecer?’ E postas assim as coisas, geralmente que o pior que pode acontecer é uma treta que não assusta ninguém ou então é qualquer coisa para a qual facilmente se arranja uma solução.


Resumindo: Abaixo as ortodoxias! Abaixo os medos! Sejamos felizes e o resto que se dane.

<>

PS: O post saíu enorme, não foi...? Isto é uma coisa... Começo a escrever e perco a noção, vou escrevendo como se estivesse aqui a conversar consigo. Dei-lhe uma seca, não...? Sorry...Vou ver se me modero mais. Prometo que vou tentar, está bem?

Mas, olhe, já agora, desça mais um bocadinho para ir comigo até ao Ginjal, vamos espreitar 4 monstros.

MÚSICA NO GINJAL - BB King, Eric Clapton, Buddy Guy e Jim Vaughn em Rock me baby!




Uma festa, meus amigos, um prazer, uma alegria. Quando quatro músicos de excepção se juntam, a arte fica potenciada, a energia fica palpável no ar. Venham, juntem-se à multidão em festa. 4 monstros sagrados, BB King, Eric Clapton, Buddy Guy e Jim Vaughn em Rock me baby!



Venham até ali comigo. Depois da poesia de Sophia, há mais uma noite de Blues no Ginjal. Vamos?

quarta-feira, outubro 05, 2011

Ainda sobre o tema do amor homossexual - M Butterfly de David Cronenberg, uma história de grande amor


Depois de ter escrito o post lá mais abaixo por sugestão do artigo do Expresso sobre Artur Pizarro, lembrei-me deste filme de Cronenberg, uma história clássica, trágica, bela, e, ao que parece, verídica.

A qualidade deste clip não é fantástica mas vale pela música, pelo Jeremy Irons, pelo argumento, pela realização, por tudo.

Se na altura não o viram, recomendo-o vivamente, tentem encontrá-lo, é belíssimo.



MÚSICA NO GINJAL - Wes Mackey in Seattle Peace Concerts

Os blues melódicos e envolventes de Wes Mackey no Ginjal Peace Concerts, ladies and gentlemen!


Venham comigo até ali, à outra rua, no Ginjal temos hoje, a seguir ao Manuel Alegre - Wes Mackey!

terça-feira, outubro 04, 2011

Quando ao fim do dia caminho junto ao rio, imagino que é Ana de Amsterdam que, indiferente a todos, se cruza comigo, com todos


Quando saio do trabalho, depois de estar todo o dia fechada numa torre de vidro sem janelas que abram, anseio por ir caminhar, de preferência junto ao rio.

Algumas vezes vou andar (e fotografar, claro!) para a zona das Docas ou para a zona de Belém ou mais à frente ou por ali.

Tal como eu, dezenas de pessoas por ali passam a andar, a correr, a andar de bicicleta, a pescar, a conversar, a namorar.

Há pessoas que andam com a roupa de trabalho, executivos muitas vezes ainda em importantes conversas ao telefone, elegantes executivas ainda de saltos altos, gente com roupa desportiva, há de tudo, novos, velhos, gordos, magros, gente sozinha, aos pares, em grupo.

Os homens, quando correm, geralmente correm sozinhos. Não se distraem, parece que vão a cumprir um objectivo, devem controlar velocidades, minutos e quilómetros com a precisão da casa decimal, passadas largas, controladas. Vão junto ao rio, não se desviam, velozes, quase uma obrigação que querem cumprir com distinção.

As mulheres, pelo contrário, quando correm, correm aos pares ou em grupos, muitas vezes grupos de três e vão conversando, rindo. Por vezes vão a ouvir música mas distraem-se, desviam-se dos transeuntes, vão pelo meio da estrada, incertas, descontraídas, se for preciso quase param para dar passagem a alguém. Vão por prazer, para desfrutar o local, o momento.

Mas há uma mulher que por ali vejo que é diferente de todas as outras. Vai equipada a preceito, tem umas pernas musculadas, corre de forma mecânica ainda que não veloz, mas é enérgica, um relógio em deslocação, uma deusa ex machina, cruza-se com a multidão sem a ver, indiferente e violenta na sua corrida precisa, a cabeça hirta, o cabelo mal cedendo à deslocação. Os seios não balançam como o das outras mulheres que correm, são seios contidos e imobilizados. É um bicho cego e possante, os braços musculados e em tensão, dobrados e quase imóveis, corre, corre, corre, é uma mulher a correr junto ao rio. Não se desvia de crianças, de bicicletas, é uma automotora sem condutor, não ouve música, não olha para ninguém, não quer companhia, vai numa incansável luta contra os seus demónios interiores, corre, corre, apenas quer gastar-se toda ali, em corrida, junto ao rio, violentamente, corre, corre, passada certa, violenta. E cruzo-me com ela uma e outra vez e eu vejo-a, imparável, imperturbábel, insensível ao cansaço, ao calor, aos outros, e ela não me vê, não vê ninguém. Uma mulher diferente, uma mulher que precisa de ali deixar toda a sua força.

Na minha cabeça ela é, desde o primeiro instante em que a vi, há alguns meses,  Ana de Amsterdam.

(Quando li o que Ana Cássia Rebelo publicou no domingo, dia 2 de Outubro, sob op título 'Rio', resolvi vir aqui escrever isto. Mas ainda hesitei. Escrevo hoje)

Esta é a fotografia que um dia destes lhe tirei.

Mulher, lebre, gazela, touro, deusa, menina atormentada  - assim imagino eu Ana de Amsterdam


[Nota 1: Claro que retirarei de imediato a fotografia caso a pessoa que aqui aparece tal mo solicite, tal como o farei em relação a qualquer das minhas outras fotografias.]

[Nota 2: E não acaba aqui. Desçam até ao piso de baixo, que ali a conversa anda em torno de homossexualidade e do atraso de vida de muita gente]


Onde se refere a entrevista de Artur Pizarro ao Expresso na qual fala da sua homossexualidade e onde eu aproveito a boleia para dizer de minha justiça


Na revista Única do Expresso de sábado passado li uma interessante entrevista do pianista Artur Pizarro. Conhecemos a obra e não conhecemos a pessoa e, ao sabermos algumas coisas, ficamos surpreendidos. Sabemo-los cosmopolitas, viajados, reconhecidos, sorridentes, virtuosos e nem nos lembramos que são pessoas tal como nós.

Vi, pelas fotografias, que está bem mais magro do que o tinha visto há algum tempo e, de facto, confirmou que fez dieta, faz exercício, que está bem melhor assim, parece outro.


Sabia que tinha sido aluno de Sequeira da Costa mas não sabia das tensões entre eles nem que este se tinha tornado padrasto dele. 

Nada disto acrescenta ou retira valor à mestria das suas actuações mas somos assim, todos um pouco voyeurs, parece que teremos mais estima pelos artistas se partilharmos um pouco da vida deles.

Mas o que me deixou admirada foi ele ter dito que viveu, em negação e desespero, a descoberta da sua homossexualidade e que a mãe deixou de lhe falar quando o soube. Agora isso está ultrapassado e desde há alguns anos está casado com o seu parceiro de mais de uma década, a mãe foi ao casamento mas, pelo que ele diz, percebe-se que há ainda ali uns aspectozinhos a acertar.

Permito-me comentar este aspecto tão pessoal porque consta da entrevista que concedeu. Caso contrário, seria coisa que nem me ocorreria referir.

Cada pessoa apenas pode falar por si e, por isso, longe de mim censurar a mãe dele ou todas as mães que reagem com susto e contrariedade ao saberem que um filho é homossexual. Há questões culturais que, provavelmente, se sobrepõem à racionalidade.

Se algum dos meus filhos fosse homossexual – e eu acho que descobriria isso ainda antes deles próprios o descobrirem – presumo que ficaria preocupada mas preocupada sobretudo por antever que iriam ter a vida mais dificultada do que se o não fossem; e acho que tudo faria para os apoiar e ajudar. Mas sei lá, só perante as situações é que a gente pode saber.

Comecei a falar muito cedo e muito cedo comecei a ser afectuosa, alegre. Mais tarde, na adolescência, tornar-me-ia um pouco mais tímida e reservada, mas na minha infância era daquelas crianças faladoras, alegres, com quem toda a gente se metia e que sorria e falava com toda a gente.

Logo muito pequena tive um grande amigo, que manteria como grande e especial amigo até aos meus 10 anos. Ele era 1 ano mais velho que eu e era o meu oposto, tímido, reservado. Mas gostávamos muito um do outro e corríamos the extra mile para brincar um com o outro.

Uma das recordações que tenho muito clara é de como eu gostava de lhe dar beijinhos e de andar de mão dada com ele, dizendo que era o meu ‘rapaixonado’. Toda a gente me corrigia mas eu achava que a palavra ficava incompleta se lhe tirasse o r inicial. Já mais crescidinha, condescendi mas sempre com a interior sensação de estar a descalçar a palavra. As pessoas riam-se de me ver assim, menininha pequenina e já dengosa e, na brincadeira, perguntavam-me ‘O que é o Gu?’ e eu respondia confiante, ‘É o meu rapaixonado’ e abraçava-me a ele, que ficava envergonhado com as minhas públicas demonstrações de amor. Mas para mim era uma atracção natural.


Na infantil e na primária, adorava fazer-lhe ciúmes com outros meninos que gostavam de mim, via que ele sofria e mais ainda eu fazia (coisas já de mulher) mas, depois, era para o pé dele que eu ia e era com ele que eu brincava depois das aulas (a minha avó, em casa de quem eu ficava até ir para a minha casa, morava ao pé dele).

Mais tarde, separámo-nos porque fomos para escolas diferentes e aí, de novo, eu voltei a apaixonar-me por um outro menino. E depois por um outro, naquela natural volubilidade da adolescência.

Até que, ainda novinha, comecei a namorar mais a sério, e, depois, um pouco mais tarde, mudei de namorado e casei-me.

Quero com isto dizer que sempre me senti atraída pelo sexo oposto e sempre o assumi e demonstrei com naturalidade. A minha afectuosidade sempre foi expressa e retribuída abertamente, sem medos, sem vergonhas, às claras.

Mas não é por minha opção que sou heterossexual, nem foi por educação, nem foi pressão da sociedade. Nasci assim. E de uma coisa eu estou certa: se por uma qualquer inversão de factos, fosse suposto eu negar ou esconder ou mesmo disfarçar a minha orientação sexual, ficaria absolutamente incomodada e infeliz. Não consigo imaginar-me a fingir-me atraída por mulheres ou a simular algum relacionamento íntimo com mulheres. Seria uma violência extrema sobre a minha natureza. Extrema e injustificável.

Por isso, também não concebo que alguém tenha que esconder ou negar a sua homossexualidade. É igualmente violento e injustificável. Nem concebo que se descrimine, censure, evite, rejeite alguém, seja por que for ou para o que for, por ser homossexual.

Ellen Degeneres e Portia de Rossi

Acho uma coisa do além as pessoas que tentam fazer-se passar por heterossexuais, namorando ou mesmo casando com pessoas do sexo oposto, quando a sua natureza os puxa para pessoas do mesmo sexo. Que vida vivem essas pessoas? Porquê? A troco de quê?

Deve ser massacrante forçar a própria natureza, deve ser um suplício andar a esconder, andar com medo que descubram. Para quê?

Porque não assumir transparentemente, viver a vida normalmente? É que a vida é tão curta para ser desperdiçada por motivos tão estúpidos.

Haverá pessoas que espreitem de lado, que comentem… e daí?

O que é preferível? Eu acho que mais vale enfrentar de cabeça erguida e sem receios alguns eventuais olhares de soslaio do que viver uma vida atormentada.

E também acredito noutra coisa: imagino que não seja pelo facto de se ser homo ou heterossexual que o relógio biológico funcione de maneira diferente. Imagino eu que uma mulher ou um homem senter o instinto de ter um filho seja qual for a sua orientação sexual. E, vivendo num ambiente familiar de afecto, não vejo por que não terem filhos. Devo dizer que, no entanto, me faz um pouco de impressão pensar numa criança criada por dois homens mas isso é porque acho que o colo aconchegante de uma mãe não tem comparação com o colo de um pai mas, enfim, isso já é uma impressão minha. Se um casal masculino se sente capaz disso, com jeito, com dedicação, afectuosidade, também não vejo porque não hão de poder ter filhos. Quantos casais heterossexuais há que são completamente disfuncionais, secos, incapazes de disponibilidade ou de afecto? Isso é que é mau para se criar uma criança. E, além do mais, haverá sempre o colinho doce e fofo das avós.


Elton John, David Furnish e o filho de ambos
 E o resto que se dane.

Se ao fim de séculos de civilização ainda há pessoas que não sabem que a natureza tem destas coisas, problema o delas.

Eu acho que há várias coisas importantes nesta vida mas, de entre elas, uma se destaca: desde que estejamos dentro da lei, que não estejamos a comprometer negativamente o futuro, e desde que não estejamos a fazer mal a alguém, deveremos tentar ser felizes. Uma pessoa feliz não apenas não desperdiça o bem escasso que é o seu tempo de vida como ainda torna felizes os que estão à sua volta.

Por isso, meus queridos amigos, seja qual for a vossa orientação sexual, assumam-na e sejam felizes!




[Não fiquem por aqui, meus Caros, desçam um pouco mais para recolherem o vosso ingresso na Música no Ginjal, ok?]


MÚSICA NO GINJAL: Lurrie Bell in I'm ready

Hoje prossegue a semana dedicada aos Blues e, of course, não poderíamos deixar de ter um representante dos Chicago Blues.

Are you ready?!?! Are you ready?!?!?


Venham comigo, meus amigos, vamos até ali ao lado, ao Ginjal. Depois da poesia de José Luís Peixoto, Mr. Lurrie Bell is saying 'I'm ready'!

segunda-feira, outubro 03, 2011

Poesia, apesar de tudo - diz António Guerreiro no Expresso. Pedro Tamen, Rui Caeiro, Alice Vieira confirmam-no. E eu agradeço a todos os poetas as palavras que me alimentam.


Já aqui vos falei várias vezes no meu grande amor pela poesia. Dela costumo dizer que é a síntese perfeita de todas as coisas. Costumo também fazer o paralelismo entre poesia e matemática, na sua pureza, na sua redução ao essencial e rigoroso. Não será por acaso que encontraremos entre os matemáticos e os físicos grandes apreciadores de poesia.

No suplemento Actual do Expresso deste sábado, António Guerreiro escreve 'Poesia, apesar de tudo' - 'Ao mesmo tempo que parece definhar sob a ameaça da falta de leitores e das regras editoriais, a poesia insiste e resiste, alheia às circunstâncias pragmáticas'. Neste artigo António Guerreiro refere dissertações que, ao longo dos tempos, se têm produzido sobre o tema da poesia, analisa as políticas editoriais e constata a falta de interesse que os distribuidores e livreiros dedicam aos livros de poesia.

E conclui que, apesar de tudo, e apesar das fracas tiragens e apesar do fraco interesse comercial, a poesia se impõe hoje, como sempre e para sempre.

Eu não sei se os poetas têm dificuldade em ver os seus livros publicados mas a verdade é que eu vejo a secção de poesia das livrarias, nomeadamente na Fnac, razoavelmente apetrechada. E há várias editoras novas que lançam interessantes livros de poesia, e vejo a D. Quixote com uma muito consistente colecção de poesia, vejo antologias, vejo traduções - ou seja, não vejo o desinteresse comercial de que António Guerreiro fala. No entanto, presumo que ele se refira a edições esgotadas e não reeditadas mas, mesmo aí, noto algum ressurgimento.

No entanto, tenho para mim que a poesia nunca será um objecto mainstream, não vale a pena idealizar tiragens de milhares, exibições nos escaparates de topo. Acho que a poesia será sempre um objecto raro, para amantes, amantes exigentes.

A poesia é a essência pura (tal como a essência nos perfumes), é o traço límpido e perfeito (tal como ambicionam os arquitectos), é a fórmula simultaneamente perfeita e imensa (tal como é, por exemplo, a equação E=mc2, a equação base da teoria da relatividade), é o acorde soprado pelos deuses (tal como os compositores ambicionam), o sabor delicioso e raro mesmo que apenas subentendido (pelo qual lutam os grandes chefs), o movimento extenso e etéreo (pelo qual os bailarinos tanto se esforçam).

A poesia é o intangível tornado possível através das palavras perfeitas. É a emoção destilada, é a lágrima imprevista, o arrepio interior, o sorriso verdadeiro, o pensamento substantivo e limpo, o som, a luz, o sabor, traduzidos em irredutíveis palavras.

Descarna-se a ideia, decanta-se o sentimento, filtram-se os efeitos. E fica a pureza. Uma sombra geométrica. Um som tangente à emoção. Um pensamento límpido.

Enquanto existirem amantes exigentes existirá poesia e amantes exigentes sempre os haverá.

Não é uma opção. Ama-se a poesia porque não se pode deixar de amar.

Procura-se com avidez a poesia, porque cansados de mensagens falaciosas, discursos demagógicos, ruído ambiente de vária ordem, confusão e verborreia, se sente a necesssidade da pureza mais absoluta, a singeleza da verdade sem máscaras.

António Guerreiro (que, por acaso, na sua coluna 'Ao pé da letra' também escreve um interessante artigo sobre a 'comercialização mediática' em que Valter Hugo Mãe anda a ser frito desde que, no palco do festival de Paraty, deixou a assistência em lágrimas lendo um textozeco melodramático, com aquela sua voz que tem algo de provinciano desterrado na cidade), tem conhecimentos teóricos e técnicos para suportar a sua tese de uma forma mais sustentada.

Eu, leiga, posso apenas corroborar através da minha intuição, da minha paixão. Poesia, sim, sempre - apesar de tudo.

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||


E agora, tal como António Guerreiro ilustra o seu texto com uma pintura de Marc Chagall, 'Le poète allongé', permitam-me que também eu ilustre o meu com fotografias minhas e excertos de alguns poemas que vou escolher a partir do que as imagens me sugerem.

Quero com isto apenas mostrar como para uma situação, porventura complexa (mas sabemo-lo lá, é apenas uma fotografia), há palavras que descem sobre ela vestindo-a na perfeição. Ou melhor, imaginemos que pomos a imagem ao espelho e que o espelho nos devolve não a imagem reflexa mas as palavras exactas que a descrevem.

É um exercício, apenas isso. Subjectivo.


(Também escolhi esta fotografia para ilustrar ontem o Soneto da Separação
 de Vinicius de Moraes no meu outro blogue, o Ginjal)

Descai a folha sob o peso da tarde
despejou a fonte a sua última lágrima
Estou sentado a que beira e que rio
contemplo? que sorriso desmaia na boa
que tive?

(excerto de poema de Pedro Tamen in Memória Indescritível)



Um sinaleiro invisível manda parar o trânsito
há uma pausa brutal no bulício da cidade.

Grande é a importância que me dás.
Por momentos tudo vais trocar pelas minhas mãos.

Devagar a tua língua
vivifica o que
resta de mim

(excertos de dois poemas de Rui Caeiro in O quarto azul)




Às vezes uma palavra bastava
para que eu soubesse que virias ao meu encontro

mas depois chegaram imprevistas tempestades
que desenharam estranhas perdições
no mapa dos teus dedos

e as palavras que ninguém quis
silenciaram a festa do meu corpo


(excerto de poema de Alice Vieira in O que dói às aves)



Poesia, pois. Eternamente. e-ternamente.

<>

Nota: Meus amigos, já sabem que agora, de 2ª a 6ª temos Música no Ginjal. Por isso, acompanhem-me até ao post abaixo, sim? Gostaria de vos levar até Ms Bessie Smith.)

domingo, outubro 02, 2011

MÚSICA NO GINJAL - Bessie Smith em St. Louis Blues


Senhores e senhoras: abre-se hoje novo ciclo, esta semana temos Blues na 'Música no Ginjal'.

A abrir, claro está, só poderíamos ter Bessie Smith. Mulher forte, antes do seu tempo, viveu a vida que quis e cantou-a com a sua bela e forte voz arrastada, quente, com uma densidade material, plena de texturas.


Neste quente mês de Outubro, mês das cores de fogo, convido-vos a virem comigo. Convém que tenham à mão uma bebida que o ambiente o aconselha (e apenas não vos desafio a acenderem um cigarro porque já  que me deixei disso).

So, ladies and gentlemen, come with me, after Mr. Vinicius poem, it's Blues time!

'Quantas pessoas caminham na minha direcção?' - 'Anda', responde HISTÓRIAS DE NÓS


Já aqui vos falei do blogue Histórias de Nós. É recente e tem a particularidade de ser escrito por uma pessoa que tem prodigiosa imaginação, tanta que lança o repto aos seus leitores de lhe deixarem uma palavra, um tópico, uma imagem que ela, a partir daí, compõe uma história.

Logo que ela lançou a ideia, sugeri que imaginasse a história por trás de um leque antigo, que descobri numa loja de velharias e de aqui mostrei a fotografia, com as suas tabuinhas de madeira decoradas com poemas a fina caligrafia.

A resposta não se fez esperar, como também aqui vos dei conta.

Tenho acompanhado o seu blogue e vejo que a ideia tem vingado. Tentei-me a deixar novo desafio. Desta vez sugeri como tópico a parte inicial de um poema de Maria do Rosário Pedreira:

Quantas pessoas caminham na minha direcção?
Quantas me descobrem por entre a multidão e pousam os seus olhos inteiros nos meus olhos?

Pois a inspirada autora de Histórias de Nós já publicou o que estas palavras lhe sugeriram - uma pequena e sensível história a que deu o nome Anda que li com gosto muito.

Convido-vos a irem ver com os vossos próprios olhos.

sábado, outubro 01, 2011

Iva Lamarão e Anne Hathaway gémeas separadas à nascença?


A cientista, modelo e apresentadora Iva Lamarão, supostamente nascida em Ovar, mana gémea de Anne Hathaway


Anne Hathway, supostamente nascida em Nova Iorque, a mana monozigótica da nossa Ivita

Gisele Bündchen no anúncio de lingerie HOPE, mas num que tem qualidade

Vejam as diferenças este que aqui vos mostro e o deste ano, no post abaixo, que tanta polémica está a gerar. Este é sexy e bonito enquanto o seguinte, aquele de que as feministas (e as pessoas inteligentes em geral) não gostam é absurdo, ridículo e destituído de charme.

E, se andarem um pouco mais, apresento-vos Don Draper. Belíssimo.

Gisele Bündchen e o polémico anúncio de lingerie HOPE

O Governo de Dilma solicitou a suspensão deste anúncio por ser sexista. De facto, o anúncio é mesmo estúpido.

My friday date - meet Don Draper


Jon Hamm