quarta-feira, abril 02, 2025

O PSD já é mais populista que o Chega?
Já não há gente decente no PSD? O Montenegro e o Hugo Soares dissolveram a decência em todo o PSD?

 

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Estou incomodada com o que está a passar-se. Isto do Conselho de Ministro em pleno Bolhão e todo o desfile pela Rua de Santa Catarina excede os limites. A convocatória de militantes para fazerem uma arruada é mau demais, parece coisa impensável entre gente decente.

Espanta-me que Marcelo não faça nada. O que o PSD está a fazer atenta contra a inteligência e a tolerância dos eleitores.

E liguei a televisão na RTP 1 antes das 20h e tive a pouca sorte de aterrar dentro de um tempo de antena do PSD e assisti a um exercício de propaganda eivado de alto a baixo de falsidades, de manipulações, de provocações. Quando acabou estava agoniada. Um ultraje, tudo aquilo.

A Comissão de Eleições ou o Presidente da República vão assistir a isto sem fazer nada?

Nem o Chega actua assim, com tanto desplante. E, quando fazem perguntas a Montenegro, nem o Ventura responde com tamanha desfaçatez.

Montenegro está pois, a toda a força, a ultrapassar o Ventura em demagogia, em populismo, em indecência. 

Clara Ferreira Alves e a 'manosfera' - a 'percepção' em vez da estatística
-- Isto para não dizer: a ficção em vez da realidade --

 

Li com algum espanto e até alguma pena o artigo da Clara Ferreira Alves no Expresso, "Manosfera, manual de combate". 

Parece que existe uma manosfera. Sempre existiu, sem ter meios de comunicação tecnoinclusivos ou nomenclatura e sociologia a gosto. Welcome to my world.

No mundo em que nasci, o da expansão económica do pós-guerra, e do nascimento das marchas e lutas dos direitos civis, a violência masculina era um dado adquirido. Nascer mulher era não só nascer imiscuída nessa violência e prisioneira dela como nascer forçada a aceitar essa violência. E considerá-la parte do estádio civilizacional da época. Ou seja, normal.

Começava em casa. O pai, ou pater familias, era o único detentor do poder paternal, do poder financeiro e do poder disciplinador, que exercia com maior ou menor benevolência. A mãe era o polícia bom, o pai o polícia mau, chamado a depor no tribunal do casal sempre que havia a ameaça de desobediência ou rebelião. (...)

Na minha família não havia sevícias físicas, mas a violência verbal do pater familias era assustadora. Era uma violência exercida sobre toda e qualquer liberdade residual que uma rapariga ousasse ter. O mundo estava medido e escolhido para ela. O que podia e não podia fazer era designado desde o nascimento, mesmo quando se aceitava que a rapariga estudasse. E “estudar” num curso dito superior não era assim tão comum. Mais comum era fazer o liceu, o secundário, e a seguir arranjar um emprego, talvez de secretariado, uma posição subserviente, ou de qualquer modo um emprego que implicasse saber datilografia. Escrever à máquina. Na pequena burguesia da época, a capacidade era considerada um trunfo. A seguir, a rapariga casava e o marido teria de ser alguém aceite pelas duas famílias. Depois de casar-se, a rapariga seria mãe e colocar-se-ia numa situação financeira de pura dependência em que era norma aceitar as infidelidades conjugais. (...)

Na escola de repetentes, fui confrontada pela primeira vez com abortos, alunas lésbicas, e as “galdérias”, as raparigas que tinham dormido com rapazes. Pairava uma insurreição na escola, e a violência no recreio era bestial. De besta. Dos rapazes sobre as raparigas. Era uma coisa nova, e foi uma educação. Descobri que fora do estreito círculo feminino, oprimido, a relação entre os sexos era eminentemente violenta.(...)

Ao longo da vida, as situações de violência e discriminação que tive de enfrentar ou sofrer, e foram muitas, não cabem aqui. Assisti a muitas mais. Mesmo depois do 25 de Abril, que mudou tudo e não mudou logo tudo, a violência continuava, exercida muitas vezes na clandestinidade. Como os abortos. Como as violações, nunca reportadas. A posição subalterna da mulher era um dado adquirido e sofrida em silêncio. A trabalho igual nunca salário igual. E continua. 

(...)

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Como escrevi acima, tudo o que aqui leio me espanta. Sou contemporânea de Clara Ferreira Alves. E, no entanto, se eu fizer uma resenha do que têm sido os 'meus tempos' e qual a minha experiência, quer como interveniente directa quer como espectadora, seria totalmente diferente.

O ambiente em que vivi nunca foi violento. Nunca testemunhei violências. Não digo que não houvesse violência. Haveria. Mas da mesma forma que não consigo dizer que eram tempos absolutamente tranquilos, todos eles peace and love, também me parece abusivo retratá-los como um farwest.

Em minha casa trabalhava o meu pai e trabalhava a minha mãe. Opinavam e decidiam de igual para igual. Talvez uma parte significativa das mães dos meus amigos não trabalhasse, até porque era um meio relativamente burguês, mas muitas trabalhavam.

Além disso, todas as minhas amigas desde a infantil, à primária prosseguiram para o secundário. E a grande maioria das minhas colegas de liceu seguiram para a universidade. E há várias engenheiras, gestoras (e médicas e professoras e psicólogas, incluindo de germânicas, e uma escultora e sei lá que mais). Todas escolheram o que quiseram. Se há alguma Secretária, desconheço. Não que isso fosse mau - simplesmente não era regra nem imposição nem coisa nenhuma.

A regra também não era casar, ter filhos e ficar na dependência do marido. Não conheço uma única que tivesse ficado na dependência do marido. E a minha melhor amiga engravidou antes de casar e eu e todas as minhas outras amigas não engravidámos porque tivemos mais cuidado.

O liceu em que andei era misto mas as aulas e os recreios não eram mistas. Contudo, no meu 3º ano, actual 7º, tal como aconteceu com Clara Ferreira Alves, criaram turmas piloto. Mas o piloto traduzia-se em serem mistas. Os melhores alunos, femininos e masculinos, na mesma turma, a turma A. A partir daí o liceu passou a ter um encanto suplementar. Nunca, nunca, nunca, houve qualquer episódio de violência masculina sobre as raparigas. Pelo contrário, eram os tempos da pré-adolescência e depois da adolescência, em que nos encantávamos uns com os outros. Havia sempre alguém que fazia anos e fazia festas em que se dançava, íamos ao cinema, só miúdos, no verão íamos à praia, um grande grupo supostamente vigiados pela mãe e pela tida de uma das minhas amigas.

Depois do 25 de Abril, na faculdade, nunca, nunca, nunca assisti a nenhum episódio de violência de rapazes sobre raparigas. Zero. Eram tempos de maravilhosa liberdade, de afecto, de descoberta.

Comecei a trabalhar aos 20 anos, dando aulas. Quer a nível de alunos e alunas quer a nível do corpo docente, nunca assisti a qualquer violência masculina. Nunca.

Tinha ainda 22 quando me mudei para o ambiente empresarial, indo trabalhar para uma das maiores empresas do País, uma empresa em que a larga, muito larga, a larguíssima maioria dos funcionários, incluindo os dirigentes, eram homens. No transporte para lá, eu era a única mulher. Durante anos só lidava com homens. Nunca fui alvo de violência, desconsideração, desrespeito. Nunca. Sempre ganhei o mesmo que os meus colegas homens. Progredi profissionalmente e em pouco tempo integrei o corpo de dirigentes. Durante muitos anos era a única mulher nas reuniões de gestão. Nunca me senti inferior, inibida ou prejudicada. 

Com o tempo começaram a aparecer mais mulheres em todas as funções, sempre a par e par com os homens. 

Nunca soube de violações mas assisti a vários momentos de assédio e todos eles foram de mulheres sobre homens. E, identicamente, nunca assisti a casos de assédio de homens mais 'poderosos' sobre mulheres em situação de 'inferioridade hierárquica' mas, pelo contrário, a mulheres que faziam de tudo para terem um caso com o doutor, o engenheiro, o director. 

Por isso, se não posso dizer que o artigo de Clara Ferreira Alves é pura ficção ou um disparate sem pés nem cabeça, o que posso dizer é que tendo eu trabalhado sempre em empresas muito grandes, frequentado meios muito diversos e sendo uma pessoa razoavelmente informada, o testemunho que posso partilhar é o oposto.

Sei que há casos, certamente mais do que deviam, até porque deviam ser zero, de violência de homens sobre mulheres -- mas estatisticamente são marginais. E claro que ainda há muitos grunhos, machistas, marialvas, abusadores. Mas são uma minoria. Os que há não chegam para tornar a sociedade, no seu todo, um antro de homens violentos, estúpidos, assediadores, prepotentes.

Uma das coisas que sempre achei nocivas para a sociedade no seu todo é a atitude das mulheres que se colocam no patamar em que Clara Ferreira Alves se põe: a de vítima, de ser inferior ou inferiorizado perante os homens. Em toda a minha vida pessoal e profissional nunca, nunca, nunca me apresentei assim ou me coloquei nessa posição. Nem tal me passou pela cabeça. E tendo chefiado durante quase toda a minha profissional grandes equipas, inicialmente predominantemente masculinas mas progressivamente cada vez mais totalmente mistas, nunca nenhuma pessoa das minhas equipas me acusou de privilegiar uns ou outros em função do sexo. 

O artigo da Clara Ferreira Alves deixou-me, pois, algo incomodada. E a única explicação que tenho para o que ela escreveu é que ela está a deixar-se tomar pela grave e, pelos vistos, contagiosa doença das percepções.

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Desejo-vos uma boa quarta-feira

terça-feira, abril 01, 2025

Jardinar. Pintar com flores.

 

O dia teria sido todo muito bom (festejando o aniversário de um carneiro muito querido) se não tivéssemos depois, no regresso a casa, apanhado um trânsito que, tal a demora, acabou por se misturar com o normal congestionamento de fim de tarde. Anos e anos metidos em filas de trânsito tornaram-nos alérgicos a isso. 

Eu ainda tentei adoptar a estratégia que seguia naquelas alturas: se não posso fazer mais nada senão deixar-me estar e seguir ao ritmo a que vai o resto do rebanho, já o meu marido vinha numa impaciência crescente...

E, depois de termos estado a almoçar numa esplanada (coberta) num belo dia de verão, quando chegámos a casa o céu estava quase coberto e pingava.

Parece que a chuva vai estar de volta e, se não for uma chuvada pegada e se não arrefecer estupidamente, posso até não me importar muito. 

Afinal. está tudo viçoso que dá gosto. Há florzinhas por todo o lado, ervinhas e mais ervinhas, tudo rebenta numa grande alegria, uma primavera pujante.

Por exemplo, as florzinhas amarelas (Euryops pectinatus?) estão floridas e rebentam por todo o lado. O alecrim floresce em força, as glicínias pendem em lindos cachos lilases. E por entre a relva há florzinhas do campo que eu teimo em que aí fiquem.

Jardinar é pintar? Ou é apenas cuidar? Amar? 

O vídeo abaixo enternece-me. 

Art Of Gardening: A Painter's Garden With Anne Ngan