sexta-feira, maio 25, 2012

'Nunca se deve gatinhar, quando o impulso é de voar', 'evitar o perigo não é, a longo prazo, mais seguro do que expor-se a ele', 'a vida é uma ousada aventura ou, então, não é nada' - palavras proferidas por quem não via, não ouvia, não falava. A fantástica história de uma mulher de fibra que nunca deixou de voar


Música, por favor

Bach - suite nº 1 para violoncelo, Mischa Maisky

*


Era uma menina que nasceu perfeita, saudável. Contudo, quando tinha 19 meses, adoeceu, talvez uma meningite, talvez escarlatina, difícil agora saber, tanto tempo depois.

Só que, na sequência dessa doença, uma desgraça aconteceu: a menina ficou cega, surda e muda. Incomunicável. Nada chegava até ela, nada chegava dela. Nem imagens, nem sons.



Helen fechada no seu mundo


Tornou-se uma criança difícil. As pessoas da família não percebiam o seu comportamento, as suas reacções, não sabiam como relacionar-se com ela, não sabiam mesmo.

Até que, quando tinha quase 7 anos, depois da mãe ter lido um livro de Dickens em que este relatava um caso de ensino de uma mulher também cega e surda, os pais de Helen contactaram médicos especializados e estes recomendaram uma aluna de 20 anos como professora. Anne Sullivan viria a tornar-se uma companhia, um apoio, até ao fim dos seus dias.



Helen à esquerda, com a sua boneca e com Anne Sullivan

Doll viria a ser a primeira palavra que aprendeu;
um mês depois Anne fê-la sentir a água e ensinou-lhe a palavra água e isso foi, para Helen, uma verdadeira revelação


E, aos poucos, o mundo desta criança que a vida aparentemente tinha votado ao isolamento mais profundo, começou a abrir-se. Essa criança, nascida nos EUA em 1880, era Helen Keller.

Convido-vos a verem agora o pequeno filme, feito muitos anos depois, no qual Anne explica como conseguiu estabelecer comunicação com a menina condenada a viver fechada dentro dela própria. No emocionante final vemos Helen a dizer 'I'm not dumb now' repetindo o que 'ouvia' a Anne.




*** *   *   * ***


Música, de novo, por favor



O Fortuna - Carmina Burana, Carl Orff, orquestra dirigida por Andre Rieu



Mas o que aconteceu depois da comunicação se ter estabelecido, prova bem que ninguém está condenado à partida, ninguém é verdadeiramente vítima das circunstâncias, ninguém deve dar-se por vencido antes do tempo.



Anne Sullivan lê para Helen


Anne ensinou a Helen a ver o mundo, a ler, a comunicar. E Helen estudou, formou-se. Aprendeu a falar.  Embora com dificuldade e com necessidade de intérprete, fazia discursos, dava aulas. Correspondia-se, gostava de escrever - até que os seus dotes literários foram reconhecidos. Escreveu 12 livros e publicou vários artigos.

Tornou-se uma cidadã comprometida com o mundo. Foi sufragista, pacifista. Movia-se por causas. Era socialista e uma socialista activa.



Helen, mulher do mundo e que viria a ser amiga, por exemplo, de Charlie Chaplin, Graham Bell, Mark Twain


Bateu-se pelo controlo da natividade, pelos direitos dos cegos, dos surdos, dos que tinham alguma forma de deficiência.

Formou a Fundação Helen Keller que se dedicava à investigação sobre a cegueira, à nutrição e à saúde em geral.

Mais tarde viria também a formar a American Civil Liberties Union e bateu-se contra o capitalismo que estrangulava o desenvolvimento de grande parte da população, bateu-se pelos direitos humanos onde quer que soubesse que estavam ameaçados. Escreveu numerosos manifestos contra a exploração dos trabalhadores, contra a discriminação. Percorreu cerca de 40 países, inclusivamente o Japão onde era muito querida.



Helen Keller - um exemplo para sempre


Viveu até 1968, até aos 88 anos. A sua vida continuará a ser, para todo o sempre, um extraordinário exemplo da força do querer.


  • Prefiro caminhar com um amigo no escuro, do que sozinha na claridade
  • Embora o mundo esteja cheio de sofrimento, está também cheio de situações em que o sofrimento é ultrapassado.
  • Aquilo que em tempos apreciámos e amámos profundamente, nunca se perde pois tudo o que amámos profundamente fica a fazer parte de nós.
  • As pessoas mais patéticas do mundo são as que têm vista mas não visão.
  • O mais importante na educação é o ensino da tolerância.
  • Aquilo de que eu estou à procura não está aí fora, está dentro de mim.
  • Quando uma porta da felicidade se fecha, outra se abre; mas geralmente ficamos tanto tempo a olhar para a porta fechada, que nem reparamos na que se abriu para nós.
  • A ciência pode ter acabado com a cura para a maior parte dos males; mas não encontrou o remédio para o pior de todos - a apatia dos seres humanos.
  • O optimismo é a fé que nos conduz até conseguimos o que queremos.

Palavras de Helen Keller, em tempos uma menina que não via, não ouvia, não falava - algumas das muitas palavras que proferiu ao longo da sua vida.

Que não as esqueçamos, que nunca esqueçamos a sua história - e que nos sirvam de exemplo quando nos sentirmos desalentados. Tudo se consegue: com esforço, com persistência, com determinação, com fé em nós próprios.

***

Nem sei se faz muito sentido, agora, convidar-vos a ir até ao meu Ginjal. Por lá o registo é outro: uma zaragata que só visto em volta de um novo poema de João Paulo Cotrim, que acompanha com o Falstaff e, claro, é ainda Verdi. Mas apareçam por lá, gosto de vos ter como companhia.

***

E tenham, meus Caros Leitores, uma excelente sexta feira. 

Enjoy! And smile!

16 comentários:

Isabel disse...

Maravilhoso o seu post.
Duas mulheres extraordinárias.
Importa-se que coloque o pequeno filme no meu blogue? Claro que, referindo de onde o tirei.

Um beijinho
Bom fim-de-semana

Olinda Melo disse...

Querida UJM

Não podia deixar de vir aqui hoje.
Percebi lá do meu painel que no seu post falava de Helen Keller, um exemplo de persistência, de vontade de viver e vencer. E à sua mestra Anne Sullivan todos os encómios possíveis pela sua dedicação a um caso que, à primeira vista, pareceria sem solução.

Quanto à música, dois dos meus autores preferidos, Bach e Carl Off este na recuperação fantástica da música da Idade Média.

Beijos

Olinda

Maria disse...

Amiga:
Hoje não sou capaz de dizer nada.
Já tudo foi dito, sobre estas duas extraordinárias Mulheres.
Comoveram-me muito os discursos das duas.
Das frases de Hellen que lembrou, há uma, que sempre me acompanhou nas horas más: "Aquilo que em tempos apreciámos e amámos profundamente, nunca se perde pois tudo o que amámos profundamente fica a fazer parte de nós." Qualquer dia, vou pedir ao meu marido, para ma escrever na parede da sala. Sempre a achei tão certa!
Parabéns, por este post maravilhoso.
Um abraço muito especial, da
Mary

Anónimo disse...

Comovente! É bom recordar figuras, ou personalidades - extraordinárias - como esta. Hoje, quem sabe, semi-esquecidas. Já nem me recordava!
Mas que Post!
Grato, pois gostei, muito, de o ler.
Bom fim-de-semana! O meu mete casamento de uma sobrinha e logo a seguir, 2ªfeira, à meia-noite, chega-nos o...netito - que não conhecemos a não ser pelo Skype (mais filho ausente e namorada)!
No meio da Crise (Massamá, Gato, Coiso e agora o Relvado) ainda vamos tendo algumas alegrias!
P.Rufino

Alice Alfazema disse...

Magnifica mensagem.
Um abraço

Anónimo disse...

Subscrevo Olinda Melo no respeitante a Carl Off e Bach!Gostaria de dizer algo, mas agoara com algu´ma azáfama aqui por casa não tive tempo.
Uma boa noite!
P.Rufino

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel,

Pode usar o filme à vontade, claro. Viveram bem antes de nós, numa altura em que não havia as facilidades tecnológicas que há hoje, nem os meios de transporte rápidos de hoje, e, apesar de todas as limitações, estas duas mulheres superaram as dificuldades, lutaram e venceram.

Acho que histórias assim devem ser sempre recordadas.

Obrigada pelas suas palavras, Isabel.

Bom fim de semana para si também!

Um Jeito Manso disse...

Olá Olinda!

Muito obrigada pelas suas palavras. Quando se pensa numa situação assim, de incomunicabilidade total, e nas limitações existentes no século XIX e princípio do XX e quando constatamos os notáveis surpreendentes, só podemos ficar pasmados.

Acho que casos assim deveriam ser recordados de vez em quando para nos incentivar a ultrapassar as pequenas dificuldades com que nos deparamos.

Mérito e dedicação, amizade, persistência, determinação - tudo valores indispensáveis para se conseguir a superação de obstáculos.

Também gostei de 'acasalar' estas músicas neste texto.

(Aliás gastei um tempão nisso porque, cada vez mais, as músicas têm limitações à divulgação nos blogues e primeiro que, por vezes, descubra um clip permissivo para a música de que ando à procura, são tempos infinitos).

Obrigada. Um beijinho, Olinda.

Isabel disse...

Muito obrigada.
Depois vou usá-lo.

Um Jeito Manso disse...

Olá Mary,

Consegue-se imaginar uma mulher que não ouvia, não via, a andar a fazer conferências, a batalhar por causas já tão evoluídas, a escrever livros, a viajar por 40 países? Que fantástica mulher.

E consegue-se imaginar uma outra mulher a ter que lidar com uma criança incomunicável e a ela se dedicar de tal maneira que se produziu um milagre tão assombroso?

Fico mesmo impressionada com isto.

Tivéssemos todos estas características e o mundo poderia ser tão diferente, não é?

Obrigada pelas suas palavras (mas eu também gostei muito de fazer este post, escolher as fotografias, escolher as frases, fiz com muito carinho).

Um beijinho, Mary!

Um Jeito Manso disse...

Olá, P. Rufino,

Com essas azáfamas todas, se calhar já nem lê a minha resposta. Mas, se ler, quero dizer-lhe que desejo à sua sobrinha que seja muito feliz e que vou ficar aqui a torcer para que um dia vá conhecer S. Salvador do Mundo e sinta a relatividade das pequenas coisas e a grandiosidade das grandes coisas.

E vou ficar aqui a torcer para que o vosso reencontro com o seu filho, a sua nora e o seu neto seja uma alegria imensa. E vou ficar aqui à espera que me conte, depois, a sensação de ter o menino ao seu colo e, também, qual a sensação de ver a cara do seu filho a olhar para o pai com o filho ao colo. São momentos únicos, aprecie-os muito bem, com vagar, em câmara lenta.

Enquanto eles cá estiverem não se mace com o Relvas e restante rapaziada, reserve-se todo para os momentos de carinho com o seu filho e com os novos membros da família.

E amanhã que seja um dia muito bom.

Um Jeito Manso disse...

Olá Alice rodeada de Alfazema,

Muito obrigada pelas suas palavras. Geralmente o que escrevo, escrevo de gosto mas há temas que me enternecem ou me prendem mais que outros.

Este foi dos que escrevi com carinho.

Um abraço, Alice!

Anónimo disse...

Um doce muito obrigado com imensa ternura pelas suas amáveis palavras, estimada cara UJM!
P.Rufino
PS: Acabo de regressar do casamento. Simples, como nesta altura se impunha, como nos foi dito e a acabar "cedo" para dar espaço aos noivos e aos convidados. Achei bem. E cá estou a ler, com prazer, o seu Blogue!

Um Jeito Manso disse...

Olá P. Rufino,

Há uns anos, já alguns, fomos a um casamento na zona de Coimbra. Chegámos antes de almoço a casa do noivo, de quem éramos convidados, e deparámos com um copo de água que os pais do noivo ofereciam. De lá fomos para o casamento. A seguir foi o copo de água que era, portanto, como se fosse o almoço. Era um salão imenso, com imensa gente. E os pratos vinham uns atrás de outros. Havia baile no meio (porque as mesas estavam dispostas num enorme U) mas a comida continuava. Eu apenas petiscava e já não podia mais. Saímos de lá à noite e as pessoas continuavam a comer mas era com cada pratada...!. Nunca tinha visto uma coisa assim e depois não voltei a ver.

Os casamentos a que eu estava habituada e acho preferível são momentos mais contidos, com alegria e comes e bebes mas nada de excessivo.

Tomara que a sua sobrinha seja feliz que isso é que interessa. Por pouco o seu filho não chegava a tempo do casamento da prima...

Mas vê as fotografias...

Está quase cá... vocês devem estar na maior expectativa e alegria, faço ideia.

Que sejam dias muitos felizes...!

Maria Adélia disse...

Emocionante este filme da Helen Keller, nunca é demais recordar estes exemplos de mulheres Fortes e Persistentes.

Muito Obrigada pela partilha UJM.
Continuo a visitá-la todos os dias embora não comente.

Abraço forte

Um Jeito Manso disse...

Olá Maria Adélia,

Fico sempre muito tocada quando recebo palavras de leitores que não costumam manifestar-se. Vejo pelas estatísticas que os leitores são algumas centenas mas não lhes conheço a 'voz', não sei se são leitores regulares, se vieram cá parar acidentalmente.

Por isso, saber que há pessoas que estão aí, 'caladinhas', a ler as palavras que escrevo, é uma coisa que me comove.

Não me agradeça, Maria Adélia, eu é que lhe agradeço a visita regular e as suas palavras de hoje.

Muito obrigada e receba um abraço com estima.