quinta-feira, junho 23, 2022

Transportes públicos tendencialmente gratuitos, parklets convidativos e inovadores nas ruas

 

Confirmar que as mulheres não gemem quando estão a ter um orgasmo tem piada. A pornografia e as fantasias pirosas põem as mulheres a gemer como umas infelizes quando a realidade dos factos é outra. Uma vez mais foi através do ecléctico PdC que fui confirmar que pode haver estremeções, gritos, pulsação acelerada, rubor, etc, mas, que se saiba, não há gemidos (The female orgasm: lots of throbbing and quivering – but no moaning)

Mas se achei graça à informação e se o tema tem mais do que se lhe diga, a verdade é que não é sobre o orgasmo feminino que hoje me apetece escrever. 

Hoje estou outra vez numa de planeta. Cresci em tempos que, no que se refere a recursos, pareciam ser de abundância e deslumbramento. A ninguém parecia ocorrer que um dia os combustíveis fósseis ou a água poderiam ser bens escassos. Por outro lado, havia o plástico para todos os fins: usar sacos, garrafas, pratos, toalhas, talheres e tudo o mais em plástico parecia ser um hábito inócuo e para todo o sempre.

E todas as famílias terem um carro, dois carros, um carro para cada membro da família também parecia uma coisa normal. Quem não tinha dinheiro para os comprar, recorria a empréstimo. O dinheiro parecia também infinito e os bancos emprestavam-no como se não houvesse amanhã ou não houvesse risco de não o reaverem.

Foram anos disto, de uma vida vivida despreocupadamente quanto à finitude dos recursos. 

Até que vieram crises de toda a espécie. É como se, de repente, estivesse patente aos olhos de todos o quanto tudo é efémero.

Já não há petróleo infinito, já não há dinheiro infinito, já não há água infinita, já não há ar respirável para todo o sempre. Nem o clima está mais o mesmo. Enquanto o fogo devora florestas nuns cantos do mundo, sem água, a terra seca e aflita, noutros as terras afogam-se numa água imensa, levando tudo à sua passagem. E, noutros cantos, rebenta a terra em convulsões e noutros alguns homens viram diabos sem freio e matam e destroem como se quisessem precipitar o fim dos tempos.

Sabemos, pois, que temos que mudar. Assim não haverá sobrevivência possível. 

Contudo,  como dizia o outro lá para os lados do gattopardo, ainda estamos naquela de mudarmos muita coisa para que tudo continue na mesma. 

Mudar a sério, mesmo a sério, mudarmos de hábitos, pensarmos no dever de mantermos o planeta vivo e de assegurarmos a continuidade da nossa espécie, isso requer uma consciencialização bem mais profunda e políticas públicas vigorosas. Nada de perder tempo com a espuma das coisas. A urgência deve impelir-nos para a substância.

Nada pode ser visto isoladamente. Não basta plantar árvores e pouco mais. Nem basta baixar os impostos nos carros eléctricos. Nem basta encarecer os sacos de plástico. Tem que haver muitas medidas, bem articuladas, bem comunicadas e bem assimiladas, tem que se perceber que mudar os paradigmas dura anos.

Por exemplo, é essencial que, em geral, as pessoas, na sua vivência diária não tenham que fazer quilómetros para cá e para lá. Concentrar tudo o que é trabalho nas grandes cidades em locais em que não há residências ou são muito caras, obrigando as pessoas a viver longe, deve ser mitigado quer por políticas de teletrabalho ou descentralizando serviços sempre que possível. Ter creches públicas gratuitas ou muito em conta perto dos núcleos residenciais parece-me também da máxima importância. Ter transportes públicos tendencialmente gratuitos ou, pelo menos, gratuitos nos locais onde vivem populações desfavorecidas bem como nos principais eixos de viação, parece-me importante. Ter passes válidos por um mês ou bilhetes de utilização alargada a preços simbólicos durante alguns meses do ano, permitindo a quem o queira conhecer o país ou, pelo menos, as terras mais próximas, parece-me também importante.



Qualquer destas medidas irá permitir reduzir os gastos mensais permanentes, reduzir a utilização de carros particulares e/ou de utilização individual, reduzir a poluição, desenvolver a pequena economia local, melhorar a qualidade de vida em geral.

O caso de Boston merece ser conhecido, estudado, replicado. 'Free public transport works': a Q&A with Boston mayor Michelle Wu'.

Michelle Wu prometeu:


E está a cumprir:

E depois há aqueles salutares hábitos de conviver, de conhecer vizinhos, de curtir a vida ao ar livre.

A ideia dos parklets é daquelas que me cativa e que gostaria de ver amplamente espalhada por cá.  

Reduzindo o número de carros nas ruas (tendo mais transportes públicos, mais garagens e parques públicos) poder-se-á reduzir os lugares de estacionamento. E, onde estavam carros, podem passar a estar pequenos espaços de convívio, de descanso, de desfrute. São espaços públicos, não comerciais. 

Escolhi, para ilustrar, alguns exemplos com que polvilhei o texto. Seria interessante que as autarquias, talvez com a sponsorização de empresas ou de mecenas em geral, lançassem concursos de ideias criativas, esteticamente interessantes, funcionalmente apelativas para parklets um pouco por todo o lado. Ou que as escolas pudessem contribuir com projectos irreverentes. Ou que as comunidades se organizassem para os fazer de forma colectiva.

[Isso e hortas ou jardins comunitários, pequenas bibliotecas públicas geridas em regime de voluntariado, etc -- tudo o que sirva para restituir aos locais o hábito da vizinhança, do convívio, do contacto com a natureza ou com a cultura, do respeito pelos outros e pelos locais públicos.].

Um exemplo:

Denver Parklet Design Competition


Desejo-vos um dia bom
Saúde. Harmonia. Paz.

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