sexta-feira, março 17, 2017

Pode um humano tornar-se imortal?
Pode um humanóide superar o infinito que habita um humano?


Sendo tema que muito me motiva e preocupa, não quero, contudo, maçar aqueles meus Leitores a quem o tema pouco ou nada diz. No entanto, se me permitem, vou reincidir, não na primeira pessoa mas dando a palavra a um Leitor -- acho que é bom ouvir opiniões não unânimes e que trazem à reflexão diferentes pontos de vista.

Recebi um comentário que, uma vez mais, me pareceu de tal forma interessante que acho que o melhor que tenho a fazer é puxá-lo para o corpo principal do Um Jeito Manso não vá ficar perdido entre os textos.

Por isso, agradecendo ao João L, tomo a liberdade de aqui partilhar convosco o que ele escreveu. Contudo, um pouco ao arrepio do que ele aqui defende, vou usar fotografias de humanóides, robots com aspecto humano, provavelmente o lado mais lúdico e inócuo do que aí pode vir (ou seja, nada a ver, digo eu, com os riscos de que o Fernando Ribeiro nos falou no outro dia). Obtive as imagens no The Guardian de ontem, 16 de Março.

Seja como for, percebo perfeitamente o ponto de vista que abaixo é evidenciado mas...
(guardo umas quantas perguntas para o fim, depois de terem lido a sólida argumentação do João L.)


Para trazer um toque de azul e verde ao post, o som de Miles Davis: Blue in Green


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Era para comentar o post da inteligência artificial – assunto tão interessante - publicado pela UJM lá mais para trás mas como não o consegui fazer a tempo e horas vai aqui fora de horas:

Transcrevendo umas ideias de Roger Schank, um dos pioneiros do campo da Inteligência Artificial (AI), 

- No brain on Earth is yet close of knowing what brains do …
- A machine that plays chess well does just that; it won´t play worse one day because it drank too much the night before or had a fight with its wife …
- We feed kids food, not knowledge. No computer starts out knowing nothing and gradually improves by interacting with people …
Isto, entre outras ideias, para chegar à seguinte conclusão:

The fact is that the name AI made outsiders to AI imagine goals for AI that AI never had".

Como leigo, acho que a AI passa a ideia de que tenta reproduzir funções executadas pelo cérebro humano ou, até, um cérebro humano. 

Ora, a inteligência é entendida hoje como um processo dinâmico e não como uma “propriedade” do cérebro. 

O cérebro é constituido por dez elevado a onze neurónios (e por um número ainda maior de outras células). 
Este é um número cem vezes superior ao das estrelas na nossa galáxia ou que os grãos de areia nas praias da Costa da Caparica. 
Por sua vez, cada neurónio pode estabelecer mil a dez mil ligações com outros (sinapses). 

Mas a complexidade não está nos números. Está na regulação. Está nas interacções. Cada ligação (sinapse) não tem apenas um on e um off, um desliga e um liga, um mais e um menos, um zero e um 1, como num computador. A maioria das ligações são químicas e não eléctricas (como num computador). Em cada uma das ligações há diversos componentes orgânicos envolvidos (neurotransmissores, receptores, proteinas acopladas a receptores, enzimas e transportadores) o que, segundo alguns cálculos, significa que os número de “switches” no cérebro é maior que o de todas as redes de computadores, routers, hubs … em todo o planeta. 

Tudo o que conhecemos das redes de computadores é uma brincadeira de crianças comparada com o cérebro. 

Cada um dos “switches” pode ser alvo de regulação, isto é pode ser “sintonizado” como nos botões dos rádios antigos a válvulas. Mais um bocadinho, menos um bocadinho. Não é só liga e desliga. Cada “switch” no cérebro pode ser regulado, pode “sentir” o que se passa num local remoto e ajustar a sua acção em função de múltiplos parâmetros que variam constantemente. E pode ser desactivado e substituído e colocado a desempenhar outras funções, quer por parâmetros internos do metabolismo ou externos (incluindo os ciclos circadianos). Inimaginável.

Imagine-se uma máquina dotada de AI a olhar-se ao espelho. Podemos imaginar que se “sentiria” bela, ou velha, ou coisas assim (coisas que não entendemos)? Que ligaria os “mecanismos de recompensa” que quase nos comanda a vida como bola colorida nas mãos de uma criança? Ou que cairia de amores por uma outra máquina? Ou que a máquina dotada de AI perderia “capacidade” com a passagem do tempo, que envelheceria?

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E as perguntas que me ocorrem e que lá em cima referi são: e o que dizer dos cérebros de pessoas com Alzheimer ou que sofreram um AVC extenso? Não funciona melhor um humanóide que, embora podendo não reagir emocionalmente à sua imagem ao espelho, manterá intactas as suas capacidades de execução de tarefas?


E as vantagens para um empregador em ter um humanóide a executar tarefas dia e noite e fim de semana, sem férias, sem doenças, sem humores?
NB: Não estou a advogar a vantagem dos robots sobre os humanos. Mas eles estão aí num mundo desregulado e o que não vai faltar é quem os use contra o interesse da humanidade. Aliás, o tema já não é futurologia: é realidade.

E, a seguir à Dina 48, que poderão ver no vídeo abaixo, mostro um outro 'ser' que já sabe fazer expressões faciais adaptadas a cada emoção. Baby steps num caminho que não se sabe bem onde nos vai levar. Pode ser difícil reproduzir a imensidão e a maravilha que é o cérebro humano mas nada nos diz que não vai ser criada uma qualquer outra coisa com capacidade imensa e que conjugue uma variedade de outras características que, no conjunto, se traduzam numa força imparável.

NB: Não gosto de ficção científica. Acho que não li, até hoje, um único livro de ficção científica. Portanto, o que escrevo não resulta de uma efabulação mas de juntar informação disponível que a minha fraca mente vai conseguindo processar.

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À laia de curiosidade, peço que não deixem de ver porque é do além:

Exploring digital immortality | Bruce Duncan & Bina48



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E, como acima se diz, se V., meus Caros Leitores, quiserem tornar-se eternos e criar o vosso avatar, têm aqui como:


Life Naut (eternalize)


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E agora o tal robot emocional
(BBC Earth Lab)


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Caso prefiram outro tipo de realidade e queiram antecipar o combate Cristas vs Leal Coelho nas Autárquicas Lisboa 2017, é descerem para antever as batalhas na lama que aquelas duas sex bombs certamente nos vão proporcionar.

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5 comentários:

João disse...

Também acho UJM: " os robots estão aí num mundo desregulado e o que não vai faltar é quem os use contra o interesse da humanidade". E o que acho mais preocupante é que os robots, ao contrário dos humanos (da maioria deles !!!), não têm dúvidas. Ou, para para dizer isto de outra maneira, de uma maneira que, em minha opinião, mostra o que separa a inteligência artificial de um cérebro: os robots não se baldam e em vez de ir trabalhar vão dar uma volta, ou às compras, ou andar de bicicleta com um sorriso nos lábios a pensar: "ai que prazer não cumprir um dever". Nós somos "imperfeitos", os robots não.

Fernando Ribeiro disse...

Relativamente à valiosa contribuição do seu leitor João L, tenho algumas considerações a fazer, do ponto de vista de um simples curioso, que é o que eu sou.

Ao longo dos anos, tem-se chamado "inteligência artificial" ao que não é, de maneira nenhuma, verdadeira inteligência artificial, mas sim um simulacro ou, chamando os bois pelos nomes, uma fraude. Uma fraude! O facto de um computador ser capaz de ganhar uma partida de xadrez ao Kasparov não faz do computador uma entidade minimamente inteligente. Quando muito, poderemos chamar inteligentes às pessoas que conceberam o programa de xadrez que o computador executou. Também é verdade que nenhum cérebro (humano) consegue perceber o que o próprio cérebro (humano) faz, mas têm-se feito significativos avanços nesse sentido, com a ajuda, inclusive, das redes neuronais artificiais (computacionais).

O leitor João L tem razão quanto ao facto de o número de neurónios e de sinapses existente num cérebro humano ser verdadeiramente astronómico. É verdadeiramente ASTRONÓMICO, sim, senhor. Contudo, a inteligência artificial tem uma vantagem sobre a verdadeira inteligência (orgânica), e esta vantagem chama-se velocidade de processamento.

Um neurónio é uma célula de um tipo especial, que tem por finalidade transmitir e processar informação, desde as terminações nervosas existentes nos órgãos sensoriais até ao sistema nervoso central, dentro deste mesmo sistema nervoso central e deste até às terminações neuromusculares. Um neurónio é composto por três partes, a saber: corpo celular, axónio e dendrites. O corpo celular ou soma tem sobretudo por finalidade manter o neurónio vivo e saudável; é onde se encontra o núcleo da célula, isto é, do neurónio. O axónio é uma fibra muito comprida que tem em vista transmitir a informação de um extremo do neurónio para o outro, fazendo-a avançar no espaço; um feixe de axónios é o que constitui um nervo. As dendrites contêm as sinapses, que são os pontos em que um neurónio comunica com os neurónios vizinhos, passando para estes ou recebendo destes a informação a tratar; existem dendrites em volta do corpo celular de um neurónio e no extremo oposto do seu axónio.

A informação entre neurónios faz-se, como já disse, através das sinapses, que quase sempre comunicam entre si pela libertação de compostos químicos, chamados mediadores. Esta comunicação não é elétrica, mas sim química. Nos axónios, a informação consiste em impulsos do campo elétrico que se vão propagando de um extremo ao outro dos mesmos; esta propagação do campo elétrico obriga a uma polarização elétrica das paredes do axónio e obriga a uma subsequente despolarização, depois de um impulso passar; enquanto uma despolarização não se completar, um axónio fica incapaz de transmitir nova informação.

Dadas as limitações apontadas, a velocidade de transmissão e de processamento de informação num sistema nervoso como o humano (incluindo dentro do próprio cérebro) é lentíssima. Ela é inferior a 1 m/s (360 km/h), quando os axónios não estão envolvidos por uma bainha de mielina, e da ordem de 2 m/s (720 km/h), quando os axónios estão envolvidos por mielina.

Os computadores são dispositivos eletrónicos em que a velocidade de propagação da informação é muito próxima da velocidade da luz, cerca de 300.000 km/s. É claro que a velocidade de processamento de um computador não é esta, nem pouco mais ou menos. Mas qualquer processador moderno é regulado por um "relógio" que vibra a muito mais do que mil milhões de vezes por segundo, ou seja 1 GHz (1 gigahertz). Qualquer smartphone, por mais barato que seja, tem um "relógio" de 1,2 GHz ou mesmo de 1,4 GHz. Quer tudo isto dizer que o mais banal e mais barato smartphone do mercado tem uma velocidade de processamento que é muitas ordens de grandeza superior à do cérebro do seu proprietário!

Fernando Ribeiro disse...

Bom, vamos abreviar, que isto está a ficar um relambório que nunca mais acaba e eu tenho mais que fazer. Dada a sua enorme vantagem em termos de velocidade (e ainda não usamos a fotónica em vez da eletrónica, mas pouco falta) uma rede neuronal artificial poderá não precisar de ter um número tão grande de "neurónios" e de "sinapses" como um cérebro humano, para poder ter uma capacidade de processamento equivalente, bastando usar uma e outra vez os mesmos "neurónios" e as mesmas "sinapses" (mas com "pesos" diferentes de cada vez, claro). Tudo dependerá do uso que se lhes der, isto é, do software. É claro que existe ainda um longuíssimo caminho a percorrer e muitíssimos anos a decorrer até que se consiga (espero que não) uma inteligência artificial que se possa comparar à inteligência real. Seja como for, têm sido feitos avanços muito significativos nesse sentido. Há alguns anos fiquei assustadíssimo quando alguém disse que tinha construído uma rede neuronal tão inteligente como um caracol. Sinceramente, não acredito que a tenha construído, mas se continuarmos assim, ela vai ser construída com certeza. E a seguir à inteligência do caracol, virá o quê?

João disse...

(com as devidas desculpas a UJM pelo abuso)

Caro Fernando Ribeiro, já vi que tenho aqui companheiro para umas belas discussões mas, sem querer abusar da hospitalidade da UJM, deixo-lhe esta provocação: a complexidade num ninho de (lentas) formigas é bem maior que numa corrida de (rápidos) carros de fórmula 1. São as interacções e a regulação que alavancam (para usar uma palavra da moda) a complexidade.

Fernando Ribeiro disse...

Caro João L., não me deixa provocação nenhuma, porque estou totalmente de acordo. São precisamente as interações e a regulação existentes nas redes neuronais computacionais que lhes dão o seu poder, incluindo o poder de aprenderem, a partir, está claro, de um certo "conhecimento" inicial que lhes é dado. Os exemplos fornecidos dos carros que já circulam sozinhos (experimentalmente, por enquanto) em algumas cidades dos Estados Unidos, ou do reconhecimento de padrões em imagens que a Google e o Facebook estão a desenvolver com resultados que já são extraordinários, são uma demonstração do que pode vir aí. A velocidade dos circuitos eletrónicos (e dos circuitos fotónicos num futuro próximo) pode permitir ultrapassar as limitações que tais redes não podem deixar de ter, através da reafetação dos seus recursos uma e outra vez, para uma e outra tarefa, a uma velocidade alucinante. Note-se que estamos a falar de redes neuronais, que já têm milhares e milhares de núcleos e um número incomparavelmente maior de interligações, mas que mesmo assim são infinitamente menos poderosas do que o cérebro. Já não são para aqui chamados os computadores que têm uma arquitetura tradicional, dita de von Neumann, com um processador central, bancos de memória e periféricos à volta. O computador que estou a usar neste momento já é pré-histórico.