quinta-feira, janeiro 05, 2017

Livros
- que bom lê-los, que bom vê-los, que bom tê-los





Preciso de ter livros por perto. Posso não ter tempo para os ler, posso não ter lugar para os arrumar, posso nem saber como arrumá-los. Mas tenho que os ter ao pé de mim. Tenho que poder vaguear por entre eles e escolher um, outro, outro.

Esta minha sala está dominada pelos livros. A mesa redonda ali ao pé da janela está cheia deles. No outro dia temi que quisessem usá-la para lanchar. Felizmente não. Nesta minha mesa os livros são os utilizadores, são os donos.

Ao meu lado, aqui no sofá, estão três livros. De quando em quando abro um, leio. No móvel ali ao lado, há pilhas deles. Nos móveis estão livros que me parecem antigos. No corredor que leva da sala ao hall, há uma estante. Cheia de livros. Por cima da porta há uma prateleira grande. Cheia de livros. No chão ao lado da estante há uma pilha. Ali mais ao fundo, há uma cesta larga. Cheia de livros. Ao lado da cesta há várias pilhas. Por baixo das janelas há estantes. Várias. Cheias de livros. À minha frente está um móvel baixo. De comprimento tem dois metros e quarenta. Em cima a televisão, molduras com fotografias. Lá dentro, livros. Atrás de mim está uma pequena secretária. Ao lado da secretária, uma estante. Cheia de livros. No canto, junto à janela, há uma estante muito alta e estreita, pregada à parede, feita à medida. Cheia de livros.

No hall há duas estantes. Cheias de livros. Na varanda há uma estante. Cheia de livros.

O que eu gosto de livros transcende o meu gosto por ler, que é imenso. 
Nos livros está todo o conhecimento do mundo, todo o pensamento, todos os sonhos. Os livros escrevem o mundo, inventam outros mundos. O mundo descrito e inventado numa infinita construção. 
Mas gosto também, e muito, do objecto livro, sou sensível ao toque do papel, ao tipo de letra, ao espaçamento da escrita na folha, às margens, ao cuidado na paginação, à capa, à própria dimensão do livro. Ao cheiro. Sou sensível a tudo, num livro. Sou sensível à elegância do objecto livro. E, não sei se por isso ou se por uma outra qualquer razão, tenho também o prazer da posse. Gosto de ter livros.

Não sei se é bom vender livros. Talvez quem venda livros se abstraia do que está a vender e venda livros como quem vende sabonetes (ou presidentes). Eu acho que não gostava de trabalhar numa livraria porque não suportaria perguntas estúpidas ou observações de gente armada em entendida. No máximo suportaria pedidos do tipo 'que livro me aconselha?' e eu olharia para a pessoa e, pela pinta, recomendaria um sendo que, a algumas, recomendaria livros do género 'como tirar a areia da cabeça de um burro' (ou burra). Ou adoraria, a um executivo de tipo 'cheguei, vi e venci', recomendar o último livro da Adília Lopes e dizer 'leve este, é a sua cara'. Ou a uma daquelas feministas empedernidas, daquelas de saia de malha cinzenta e pendona, cabelinho assimétrico, franja pelo alto da testa, sacola ao ombro, recomendar, com ar ternurento, um livro do Valtinho e dizer 'vai ver que vai apaixonar-se por ele, vai ver ainda acaba a querer ser a mamã do filhote que ele tanto quer...'

Também não sei se gostaria de trabalhar numa editora. Não suportaria ter que ler livros maçadores, mal escritos, banais, até que descobrisse, finalmente, uma pepita digna de ser publicada.

Mas não me importava de ter um trabalho que fosse fazer bibliotecas para gente que não soubesse escolher livros. Ou de arrumar livros alheios. Não me importava que me levassem a casa e me pedissem: arranje-me uma estante e livros lá dentro. Carta branca. Eu a imaginar os livros que fossem uma janela para um mundo novo, que os seus donos ficassem apaixonados pela leitura, que se tornassem viciados, sempre desejosos de abrir o livro seguinte.

De vez em quando gosto de ver sites de editoras. Ou da Folio Society ou da Juniper Books. Parece-me uma espécie de arca do tesouro, um mundo fascinante.


Há ali bom gosto. Claro que têm edições mais comerciais ou, no caso da Juniper, admito que, de vez em quando terão que fazer a vontade ao freguês e saem obras que eu, naturalmente, não quereria. Mas é a excepção. Regra geral há originalidade, sobriedade e, até, bom humor.

Todas as fotografias que utilizo aqui provêm da Juniper.

E, se não me levam a mal, junto também um vídeo que mostra o prazer que deve ser trabalhar ali. E como deve ser bom ter uma casa muito grande com espaço para arrumar bem todos os livros... A propósito: lembrem-me, por favor, de fazer o euromilhões. Lembram?


What is Juniper Books?



¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

E agora perceberão, certamente, que, tendo eu a cabeça no mundo dos livros, não me tenha apetecido falar do mau romance entre o Domingues e o Centeno.


¨¨¨¨¨¨

1 comentário:

Anónimo disse...

Um amigo dizia-me aqui há uns tempos, quando ambos visitávamos uma livraria, em Lisboa: “Quanto mais leio, mais gosto de ler. De comprar livros, de os folhear, de os ter em casa, de lhes tocar. De lhes sentir o odor do papel das folhas. Um pouco como as mulheres, quanto mais conheço, mais quero conhecer outras. Pelas mesmas razões, mais coisa, menos coisa.”
Saímos, despedimo-nos e cada um seguiu o seu caminho. Com uns tantos livros nuns sacos. Ali, naquele local, passava muita gente, entre essa muita gente, mulheres. Percebi, pelo olhar que lhes deitou, que já estava noutro registo. Dos livros, para as mulheres.
Dois grandes prazeres que levamos desta vida. Naturalmente, para quem gosta de livros e…de mulheres. Penso eu.
P.Rufino