quarta-feira, junho 08, 2016

Cresçam como bons revolucionários





No outro dia perguntaram-me há quantos anos trabalhava eu. Nem referi os dois anos e picos em que dei aulas mas, ainda assim, um número obsceno. Comecei mal acabei o curso (que era à antiga, de 5 anos), tinha eu 22, já estão a ver.

A quantidade de anormais ou gente excelente, de lutadores ou capachos, de leva-e-traz ou escorreitos, de acomodados ou visionários, de bajuladores ou verticais, com que me tenho cruzado não vos passa pela cabeça. 

Nas minhas equipas também já tive de tudo.

Os submissos, engraxadores, perfecionistas ou chatos cedo devem perceber que a coisa não corre lá muito bem entre nós. Prefiro os que me mostram outros caminhos, os que ousam, os que não são de vergar (nem erante a minha impaciência ou teimosia).

Quanto a mim, perante os meus chefes, entre servilmente fazer de tudo para pisar o chão que o rei pisa ou andar à espadeirada no terreiro contra ventos e marés opto pela segunda hipótese.

Claro que há que ter inteligência emocional e gerir com inteligência os diferendos, embora sempre de forma frontal e leal. E, se necessário, não temer fracturas. Entre virar costas e seguir de cabeça erguida ou vergar a espinha e anular a opinião ou a vontade, opto pela pimeira. Se há coisa que me chateia é ir à luta, meter-me em trabalhos e, quando espero que alguns que sei que concordam comigo se coloquem do meu lado, os vejo de cabeça baixa, amedontrados, dispostos a ceder só pelo medo de perder. Passo-me, tamanha a decepção.

Contudo, há os de tipo oposto. Já tenho visto malucos que se afogam no seu próprio fel ou que, ainda a contenda não se fez anunciar, já eles estão aos tiros para o ar ou para os pés. Pensam que são uns valentes mas são uns tolos. Esses assim também não têm grande valor (digo eu, claro).

Nas empresas pode parecer que se dão melhor os pajens do rei, os bobos da corte, os cães que provam a comida. Fazem parte da corte que sempre cerca o rei. Mas a vida, ainda que por vezes tarde de mais, é justa: lá chegará o dia em que muda o rei.... e lá caem eles logo de seguida. E, quando chegam a casa e se vêem ao espelho, o que vêem? Ao princípio talvez se alegrem com a imagem de cortesão ou cortesã que o espelho lhes devolve mas, um dia, a lucidez abrirá caminho e será implacável. A partir desse dia, verão no espelho a imagem de uns pobres coitados, apenas invólucro.

Gente assim, quando nas empresas, levam-nas à atrofia e, portanto, também à atrofia da economia e da sociedade.

Têm ainda outras características em comum: sendo fracos com os fortes, são, em geral, fortes com os fracos. Facilmente desprezam os outros, facilmente fecham os olhos perante a injustiça (e dirão, com auto-complacência, que injustiças sempre as houve e que é impossível agradar a gregos e troianos).

Gente assim é perigosa.

Se tiver que optar, ponho-me ao lado dos outros, dos que arriscam, dos que lutam por ideais mesmo que as suas vidas não possam ser referidas como 'casos de sucesso'. Para além do mais, não dispenso a nobreza de carácter.

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Talvez até nem faça grande sentido, neste contexto, o vídeo que agora aqui vou colocar Ou talvez faça, sei lá.

Russell Brand lê a carta que Che Guevara deixou à mulher para que os cinco filhos a lessem quando ele morresse (antevendo, pois, que morrecia cedo): 'cresçam como bons revolucionários'

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As fotografias mostram lugares que, em tempos, foram grandiosos. Também gosto de fotografar a decadência. Li que, mais do que ruína ou desistência, a decadência é sinónimo de resistência. Mas é também a prova da vulnerabilidade, de que a grandiosidade é vã, efémera.

Obtive-as no Bored Panda.
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Lá em cima o First Arabesque, de Claude Debussy, interpretado por Stephen Malinowski.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma quarta-feira muito feliz.

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2 comentários:

Anónimo disse...

todos os que podiam fazer frente ao chefe,logo à tomada do poder, morreram cedo, os outros foram morrendo ou sendo vergados psicologicamente.


47 anos de bufos e subservientes deu para entrar nos genes, daí nada de anormal encontra-los andando por aí.

mas temos melhores genes de cravos


Bob Marley

Rosa Pinto disse...

Percurso mais ou menos semelhante em anos de curso e idade de início de carreira...mas ..mas...queria ter mais uns anos (não de idade)!!!