E há as flores: efémeras, perfeitas, generosas, belas. Não sei como saem assim da natureza, em puro estado de espanto, magníficas. Há uma tal exuberância no seu desenho elegante, nas suas cores. E, no entanto, elas sabem que durarão pouco - talvez por isso, não escondam a sua natureza; ou, então, talvez secretamente suspeitem de que logo renascerão, de novo intocáveis, de novo maravilhosas.
Qual de nós - humanos, cheios de limitações, de auto-restrições, de vergonhas, de medos, de ressentimentos - se sente tão absolutamente livre para ser tão autêntico como as flores, despudoradas, inconscientes?
É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
Foi para ti que criei as rosas.
Foi para ti que lhes dei perfume.
Para ti rasguei ribeiros
e dei ás romãs a cor do lume.
(...)
crescer como árvore, resistir
ao vento, ao rigor da invernia,
e certa manhã sentir os passos
de abril
ou, quem sabe?, a floração
dos ramos, que pareciam
secos, e de novo estremecem
com o repentino canto da cotovia.
Tu já tinhas um nome, e eu não sei
se eras fonte ou brisa ou mar ou flor.
Nos meus versos chamar-te-ei amor.
....
Os poemas são de Eugénio de Andrade: É urgente o amor, Foi para ti que criei as rosas, parte de O lugar da casa, Madrigal.
E a ironia das flores
"One Perfect Rose" by Dorothy Parker (read by Tom O'Bedlam)
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