quarta-feira, julho 24, 2013

Pedro Mexia escreve no Expresso sobre Rogério Casanova, ou melhor, sobre 'Trabalhos de Casa - 2008-2012': diz que o considera um expoente e mais não sei o quê. Com isto, em minha opinião, Mexia revela que é generoso e que nem sempre o que escreve é para ser levado a sério.


Há pouco tempo, a propósito de entrevistas de Pedro Mexia e Rogério Casanova ao mesmo escritor, Geoff Dyer, escrevi aqui sobre as assinaláveis diferenças de estilo entre ambos. 

Claro que ser eu a aventurar-me por estes terrenos é ousadia, aquela ousadia que caracteriza os ignorantes. Mas sinto-me à vontade para o fazer porque escrevo não na qualidade de entendida na matéria, que o não sou, mas na qualidade de consumidora. É para mim e para outros pagantes como eu que ambos escrevem. De certa forma, eu sou cliente deles. E, como cliente, posso dizer o que acho do que eles (indirectamente) me vendem.

Sou apreciadora da escrita de Pedro Mexia - já aqui o disse várias vezes. 


Crítica de Pedro Mexia sobre o último livro de Rogério Casanova


Escreve bem, escreve sobre temas interessantes e, quando faz crítica literária, se calha escrever sobre livros que já li, reconheço-me nas suas opiniões e, se ainda não li, fico com vontade de ler. Escreve de forma acessível, apelativa, embora não ceda às facilidades da escrita literato-populista (se assim me posso expressar). Também gosto de o ouvir no Governo Sombra: é sensato, equilibrado, objectivo, fala como um homem feito, e, apesar do ambiente o poder proporcionar, não cede ao apelo do humor fácil e rasteiro.

Já era leitora assídua do que escrevia quer no Estado Civil, quer no A Lei Seca, numa altura em que nem estava muito consciente de que, ao fazê-lo, estava a tomar contacto com a blogosfera, realidade que me era, então, estranha. Aí, Pedro Mexia escrevia num registo mais pessoal, frequentemente intimista, embora tão escancaradamente nos expusesse as suas entranhas que nós, leitores, guardávamos aquele silêncio cheio de pudor com que geralmente contemplamos a exposição da vulnerabilidade dos outros.

Se antes não o acompanhava no Público, porque não leio jornais diários, agora que está no Expresso, passei a acompanhar semanalmente a sua crónica de abertura do Caderno Actual e as suas críticas literárias.

E é sobre a crítica desta semana que quero falar. Pedro Mexia fala do livro de Rogério Casanova, 'Trabalhos de Casa - 2008-2012', dá-lhe 5 estrelas e, de forma laudatória, é assim que intitula o texto: 'Um expoente'. 


Não sei como é que eu lá tinha chegado mas houve uma altura em que lia o blogue A Pastoral Portuguesa, de Casanova. Achava-lhe uma certa piada, escrevia bem. Mas depois desatava a falar de futebol, textos extensos sobre jogadas ou jogadores ou, mais obsessivamente, sobre o Sporting e comecei a maçar-me. Pus de lado.


Crítica no Expresso de Pedro Mexia sobre livro de Rogério Casanova



Se ele escrevia no Expresso, como Mexia refere, não me lembro. Dou por ele, sim, na revista Ler

E o que tenho a dizer é que, aí, os seus extensos artigos são por vezes difíceis de ler até ao fim. Por vezes é favor: quase sempre. Falo por mim, claro. Há-de haver quem os ache na dose certa. Eu não acho. Casanova gosta de desfiar referências, acha-se piada e é viciado em name dropping (embora, do alto da sua auto-indulgência ele certamente ache que não, que até se refreia face à sua enciclopédica erudição bibliográfica).

Peguei agora na última Ler para confirmar, uma vez mais, a minha opinião. Escreve bem, não nego. Mas o problema é que se entusiasma com a sua própria escrita e com as suas próprias opiniões e o texto começa a enlear-se nele próprio. Acaba por ser um texto longo, maçador e em que quase se perde o fio à meada. Acaba por quase nem se perceber o propósito do que está a escrever. São textos em que o leitor não tem espaço para a sua própria respiração, em que nem conseguimos empatizar nem com o autor da crítica, nem com o autor criticado, por ali vamos, arrastados naquela torrente de referências, de palavras.

Dirão os entendidos que o meu mal é justamente não ser entendida, uma mulherzinha básica. Seja. Não tenho pretensões a ser o que não sou. Mas, repito: é a pessoas como eu que os jornais e as revistas se destinam. Nem todos os destinatários serão gente ilustre e ilustrada, gente paciente, condescendente. Muitos serão como eu. Lêem um bocado e, se a coisa interessa, vão até ao fim; se a coisa parece um exercício onanista ou narcísico ou exibicionista, a leitura fica por aí.

Por isso, que Pedro Mexia o ache um expoente e o louve da forma como o faz no Expresso desta semana, acho um pouco extraordinário: interpreto-o como um acto de generosidade. 


Refere Pedro Mexia, entre outros tributos devidos, o de James Wood. Ele lá saberá porque assim o considera. No entanto, eu não o consigo perceber. Ler, por exemplo, A mecânica da Ficção de James Wood não pode ser uma experiência mais distinta do que ler Casanova. Onde James Wood é contido, seco, directo, objectivo, Casanova faz um espalhafato, mostra que sabe nadar, esbraceja aparatosamente, atira-se para fora de pé, faz de tudo para chamar a atenção sobre si próprio, quase nos levando a esquecer o tema que o levou a escrever.




Curioso é que sendo assim, histriónico e narcísico, se apresente depois com pseudónimo e infotografável. Às tantas ainda é algum outro, alguém que bem conhecemos e que nem imaginamos que seja o dito Casanova. Mas tanto faz. Que seja quem é.


Resumindo: desta vez não me revi no que Pedro Mexia escreveu e se, por um lado, interpreto que o fez por simpatia, uma simpatia entre colegas de profissão, já por outro me deixa de pé atrás. Tinha-o por um crítico isento, exigente e vejo que nem sempre o será já que, nomeadamente, tenho muitas dúvidas que, desta vez, o tenha sido ou, então, que tenha sido sincero.

Claro que isto sou eu a falar - e eu digo o que penso.

*

(A ver se ainda cá volto hoje)


2 comentários:

AGP disse...

Adorei. Concordo. Sinto uma certa desilusão com o Pedro Mexia, neste caso.

João Vargas disse...

O Casanova é o Mexia versão Romain Gary portuguesa.