terça-feira, fevereiro 14, 2012

O meu amigo está longe e, patrão fora, dia santo na loja - a mulher está a tramar alguma...e com a minha colaboração....

 NOTA AOS MEUS LEITORES



Por precaução retirei as fotografias da Kristin Scott Thomas deste post pois uma das que tinha colocado parece ter pertencido a um site referenciado pela Google como portador de vírus.

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Ah, meu amigo, estás longe, ocupado, não vais ler o que vou escrever e isso deixa-me à vontade pois vou poder contar o que se passou hoje, sem correr o risco de leres. Daqui por uns dias, antes de estares de volta, apago este post. Não será por mim que o vais saber.

Como resposta ao teu mail de ontem, escrevi-te simplesmente: "Que ideia a tua, meu amigo. Não estou nada hostil, porque haveria de estar? Tiveste mais um ataque de carência por pensares que alguém à superfície da terra não está em estado de permanente sorriso na tua direcção. Isso já te passa. Mal te vejas rodeado de sorridentes cortesãos, voltas de novo a sentir-te o maior e nem te lembrarás mais do que escreveste. Boa viagem e sucessos."


Sei que, no intervalo de qualquer coisa importante, deitarás uma vista de olhos ao teu blackberry, verás que é apenas um mail meu, nada de crítico e provavelmente apagá-lo-ás, desinteressado. O normal.

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Música, por favor.

Janis Joplin - Woman left lonely

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Pois bem. Mais cedo do que estava à espera, ligou-me a minha amiga, queria saber se dava para ser hoje. Ia despachar a empregada mais cedo e a filha só voltava à hora de jantar, lá para as 9, pelo que o terreno ia ficar livre dentro em pouco. Lá me replanifiquei, consegui sair do trabalho um pouco antes das seis e, como mora ali por perto, decorrido pouco tempo já eu lá estava.

Foi ela que me abriu a porta, já estava sozinha. Lembrei-me do que me disse no sábado, 'nem vais acreditar'. E, de facto, se não visse, não acreditava.
Era outra. Tinha um fato verde muito escuro, meias de rede preta, sapatos altos de veludo. E, na cabeça, um pequeno chapéu de feltro e, mais curioso ainda, o rosto estava coberto por um véu de rede preta. Fiquei de boca aberta, calada, pregada ao chão. Ela ria-se, aquele seu sorriso etéreo, 'Entra, não podemos perder tempo'.

Estava elegante, misteriosa. 'Queres que abra os cortinados?'. Tinha-os corrido. Mas a luz já escasseava, era indiferente. Ficaram corridos, davam um ambiente mais íntimo. Acendi um candeeiro de pé mas já estavam acesos outros dos lados do sofá maior.

'Vou pôr música, não achas melhor?', estava segura, tinha pensado em tudo. Eu é que estava sem acção, não estava à espera de vê-la assim.

Avançou para a aparelhagem, colocou um cd. A Janis Joplin, imagine-se. Depois perguntou-me: 'Queres uma bebida?'. Claro que não quis, não costumo beber fora das refeições. Mas ela arranjou uma para ela 'ajuda a descontrair'.

Ainda tentei que me esclarecesse, 'mas porque queres tu fazer isto?'. Mas ela não estava para conversas, 'deixa, logo te conto, agora anda'.

Confiante, bem disposta, nem parecia a mesma. E então começou a dançar. 'Onde achas melhor que seja?', perguntou-me. E, como eu hesitasse, ela adiantou logo que achava que podia ser ali mesmo, que ali estava quentinho (tinha a lareira acesa o que dava uma bela luminosidade à sala).

E então sorridente, apressou-me, 'Vamos começar, senão atrasamo-nos e ainda somos apanhadas'.  E eu ainda sem saber bem o que devia fazer, por onde começar. E era ela, hoje toda decidida, que assumia o comando, 'Despe-te, ainda estás com o casaco vestido, com o casaco não dá jeito nenhum... acho eu...'

Lá tirei o casaco e ela 'tira também os sapatos, não deve dar jeito nenhum estares de sapatos'. Tirei, ainda estava com os meus saltos de agulha, desapropriados para as circunstâncias. 

E então, sentou-se à minha frente num sofá e, olhando-me nos olhos, ordenou convicta: 'Vá, começa.'

Mas eu é que ainda não estava in the mood. Nunca tinha feito isto, não sabia como me iria sair. Mas ela encorajou-me, 'Vá, não hesites, não penses, começa'. E eu, então, comecei.

E comecei a tomar-lhe o gosto. Aproximei-me, olhei-a bem de frente e não parei. 'Tira o chapéu, quero ver bem os olhos', disse-lhe e ela assim fez. 'E tira os sapatos e essas meias' e ela assim fez e soergeu-se a olhar para mim. 'Assim mesmo, deixa-te estar', disse-lhe eu.

Comecei a ganhar o gosto, entusiasmei-me, afinal gostava disto. E tive uma ideia, 'levanta-te e segura o cabelo' 
Mas depois tive outra ideia: 'despe essa roupa, anda ver se tens um vestido decotado, simples'. Fomos até ao quarto e ajudei-a a escolher, ajeitei o decote, ficava linda. 'Arranja aí uns ganchos, apanha mesmo o cabelo', ajudei-a, sempre gostei de ser cabeleireira.

'Agora vem, apoia-te aí nessa mesa. Olha bem para mim. Não, assim não, olha antes para o lado'. E ela olhou para o lado, com aqueles seus grandes olhos inocentes.
Fotografei-a de vários ângulos, a luz iluminava o rosto de uma forma suave e ela sorria, aquele seu sorriso irreal. 'achas que está a ficar bem?', perguntou com ar de quem sabia que estava óptima.

E ela própria já dava ideias, circulava a fazer poses, ágil, desenvolta. 'Olha, agora aqui' e encostou-se a uma porta, soltou o cabelo, deixou descair o vestido para que o ombro ficasse todo de fora, passou as costas da mão pelos lábios para ficar mais natural.

Uma maravilha, as fotografias estavam a ficar uma maravilha e eu mal podia esperar para vir para casa, passar para o computador, ver como ficaram.

No fim ainda lhe pedi que se despenteasse, que pusesse um ar pensativo, que queria um grande plano e ela, disposta, coquette, assim o fez. Mas ao ver agora a fotografia, noto que uma sombra, ainda que talvez ligeira, já parecia toldar-lhe o olhar.

À saída, voltei à carga, 'Mas oh menina, conta lá para que é isto'. E ela, sorriso ainda malandro, tão diferente do ar bem comportado de dona de casa exemplar, 'Um dia destes conto-te mas, vá lá...eu conto um bocadinho: quero oferecer a uma pessoa' e eu a tentar que ela dissesse mais.

Mas não, de repente voltou a ser a outra, compenetrada, que a filha estava a chegar dentro de pouco tempo e que jantava sempre à pressa para sair logo depois, que o marido ainda não lhe tinha ligado, que devia andar muito ocupado, que anda tão cansado, que nem se devia lembrar de telefonar e que também não gostava que ela lhe ligasse, tomara que se deitasse a horas - e era já uma mulher habituada a tantas noites de solidão que falava. Mas acrescentou, com o ar mais natural do mundo: 'Ah, a propósito, não lhe contes nada, estás a ouvir...? Aliás, não contes a ninguém.'

Claro, sei guardar um segredo.

Aquele ar inocente, de quem peca sempre na maior candura, sempre me intrigou, sempre me cativou. Mas talvez seja por ser assim que a tenho por minha amiga. Consegue, desta forma, não ser uma insuportável chata.

E aqui estou agora, a ver as fotografias, satisfeita com o meu trabalho (afinal gosto de fazer retratos, pensava que não gostava de poses, que apenas gostava de andar de volta das pessoas, a apanhá-las em movimento, naturais). E estou muito intrigada com o que andará ela, a bela modelo, a fazer. Tenho que tentar descobrir pois intuo que vou ter uma bela surpresa...!


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E tenham, meus Caros, uma bela terça feira!

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[Para os que não têm acompanhado esta história: o primeiro capítulo foi este, pelo meio houve uns dois ou três e o último foi este. A mulher fotografada é, como é sabido, Kristin Scott Thomas e o 'marido' é Patrick Dempsey]
  

3 comentários:

Maria disse...

Jeitinho amiga:
Estou a ficar viciada com esta história.
Qual será a dela? Esperta e bonita, ele vai aprender uma lição qualquer.
Será que vai deixar as fotos, num sítio onde ele as encontre facilmente? Não me parece. Ela é demasiado sofisticada. Será mais subtil. Numa carteira, deixada por acaso, num qualquer lugar? Uhm.... Não sei, não.
Fico à espera para saber. Torço por ela.
Beijinhos
Maria

Pôr do Sol disse...

Claro, a cumplicidade feminina, eu percebi que a sua amiga, tinha em mente uma festa com um belo presente.

Embora me tivesse dito que nenhum deles fazia anos por estes dias, cheirou-me a surpresa no regresso da China.

A sua amiga é mulher inteligente e interessante,mas ele(que tambem já não tem 30 anos) acomodou-se e habituou-se a que ela não saia do seu "posto".

Vai ser ela com um portefolio, de belas e sugestivas fotos a meter-lhe olhos adentro aquilo que ainda é e tem para dar, já que ele não tem tempo(?)......

Cara jeitinho manso, gosto deste exercicio, e a culpa é sua, mas aguardo com entusiasmo a SUA versão.

Tenha uma boa noite e boas inspirações

Um Jeito Manso disse...

Maris e Pôr do Sol,

Interrompi, por dois dias, esta narrativa e vamos ver se consigo voltar a pegar-lhe. Acho que sim, que vou conseguir, quem sabe ainda hoje ou amanhã mas, neste exacto momento em que estou a escrever isto, tenho um tal cansaço e sono que me parece que não vou ter energia ou imaginação para lhe pegar.

Por isso, não se admirem se demorar.

Mas eu conheço-me. Sou muito primária, reajo com grande intensidade mas, talvez por isso, rapidamente ultrapasso os abanões.

Um beijinho e obrigada pelo vosso apoio.