terça-feira, outubro 11, 2011

Alguns preferem as mais novas: Paul McCartney e Nancy Shevell, Michael Douglas e Catherine Zeta-Jones, Jorge Luis Borges e Maria Kodama, Camilo José Cela e Marina Castaño, José Saramago e Pilar del Rio, amores de uma vida


E quando são homens mais velhos a casarem com mulheres mais novas? Alguém acha ridículo? Eu não acho mas eu sou aquilo que se sabe, acho graça a tudo e desdenho de poucas coisas.

Vejamos então alguns casos. Em comum terão o estarem de alguma forma ligados às artes. Um músico/cantor, um actor de cinema e três grandes escritores. Mais alguma coisa em comum? Sim - a capacidade de, na fase mais avançada da sua vida, amarem imensamente, como jovens com toda a vida pela frente. Um exemplo.
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Paul McCartney escusa de ser apresentado (é o eterno Beatle, é, no mínimo, galáctico e, por exagero, direi que é mais umas mil coisas) e tem 69 anos, embora não pareça nada - e então feliz como estava no domingo, parecia um quarentão bem parecido, franja esvoaçante, brincalhão.

Um casal de noivos feliz, mais ou menos da mesma idade, é o que as imagens nos mostram.

Para ele foi o terceiro casamento, para ela não sei. Nancy Shevell não casou com ele por dinheiro, não senhor. É empresária e filha de um multimilionário norte-americano. Casou com ele por amor, com certeza. Ah, e não é nada da mesma idade... é 18 anos mais nova, é uma moçoila de 51 frescos anos e foi vestida pela enteada, a estilista Stella McCartney.

O amor em qualquer idade, o amor que rejuvenesce os amantes: basta vê-los para remontarmos à juventude, aos amores para sempre.

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Michael Douglas é um actor carismático, sexy, uma voz e um olhar maliciosos, irresistíveis e Catherine Zeta-Jones é belíssima, formosíssima, feições perfeitas. Ele tem 69 anos, ela tem 42. Vinte e cinco anos de diferença. Ele apaixonou-se por ela quando a viu na Máscara do Zorro, ela também não lhe resistiu.

Casaram-se, já têm 2 filhos. Ele já teve cancro e ela não arredou pé, apoiou-o, puxou por ele. A seguir foi ela que se foi abaixo e foi a vez dele a apoiar. Já se lhes apontaram affaires mas são meios em que o difícil é não olhar para o lado.

Até ver, um casal feliz.
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Jorge Luís Borges nasceu em Buenos Aires em 1899 e Maria Kodama em 1937.  Trinta e oito anos de diferença! Ele deixou-nos em 1986; Maria ainda vive.

Também não deveria meter-me a apresentar Jorge Luís Borges mas direi apenas que foi romancista, poeta, ensaísta, tradutor, crítico, bibliotecário, professor, etc, etc, etc. Foi escritor precoce e foi leitor insaciável, tendo uma paixão por ler enciclopédias, imagine-se.

Com 51 anos cegou. Mas a sua carreira continuou 'de vento em popa', premiado, louvado, traduzido em inúmeros países. Habitava com a mãe que viveu até aos 99 anos.

Com 68 anos casou-se talvez para descansar a mãe que vivia preocupada que o filho ficasse sozinho e cego. Mas o casamento durou apenas 3 anos.

Entretanto, passou a andar sempre acompanhado pela assistente pessoal, a argentina Maria Kodama, filha de um japonês e de uma alemã que tinha conhecido Borges enquanto sua aluna (ah, o fascínio que os grandes mestres exercem nas suas dedicadas alunas). Anos e anos de companhia. Jorge Luís ditava e Maria escrevia. Maria conduzia-o, Maria apoiava-o, Maria sempre presente e Maria sempre odiada pelos argentinos. Maria que o levava para os passeios que Jorge Luís sempre queria fazer, Maria que fotografava o que Jorge Luís não conseguia ver, Maria descrevendo as feições, as salas, as paisagens.

Algum tempo antes de Borges morrer, casaram-se e ela tornou-se a sua herdeira. É presidente da fundação que leva o nome do marido e desdobra-se a divulgar a sua obra, a falar sobre ele. Uma vida inteira dedicada a Jorge Luís Borges.

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Camilo José Cela nasceu em Espanha 1916 e morreu em 2002. Foi feito Marquês de Iria Flavia pelo Rei Juan Carlos, escritor e recebeu o Prémio Planeta, o Prémio Cervantes, o Prémio Príncipe das Astúrias da Literatura, Nobel.
Escreveu muito, e para o final da sua vida foi-se tornando polémico, não raramente causando desconforto social.
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Repararam na bolinha encarnada aqui em cima? Então, os meninos e as meninas agora olhem para o lado, tapem os ouvidos, está bem? E pardon my french. Vou transcrever)
Uma das piadas mais conhecidas a seu respeito refere-se a uma peripécia que se passou com ele enquanto deputado. Estava ele, no Parlamento, cabeceando, quando lhe perguntaram se estava a dormir. Respondeu, D. Camilo, que não senhor, que estava adormecido. O outro, admirado, tentou perceber, 'É a mesma coisa, não?' D. Camilo elucidou que não senhor, que se tratava de coisas muito distintas. 'Não é a mesma coisa estar a dormir e estar adormecido, tal como não é a mesma coisa estar a foder ou estar fodido'.
Nem mais.
Casou-se cedo com Maria do Rosário com quem teve um filho mas divorciou-se mais de quarenta anos depois. Pouco depois, em 1991 casou-se com Marina Castaño, jornalista, jovem. Marina Castaño nasceu em 1957 e está ainda bem viva. Quarenta e um (41!) anos de diferença.
Tiveram uma vida de glamour, de polémica, de divertimento.As fotografias mostram-nos, quase sempre, na maior boa disposição.
 
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José Saramago nasceu na Azinhaga em 1922 e morreu em Junho de 2010. Jornalista, tradutor, poeta, ensaísta, contista, dramaturgo, romancista, várias vezes premiado nomeadamente com o prémio Camões, é o nosso Nobel da Literatura.

Começou a escrever cedo mas foi apenas com Levantado do Chão que publicou quase com 60 anos que o seu estilo se definiu. Depois, foi o êxito com o maravilhoso Memorial do Convento. A partir daí foi imparável.

Pilar del Rio, jornalista espanhola, conhecia toda a sua obra, tinha fascínio pela obra e quis conhecer o criador. Isso aconteceu em 1986 e dois anos depois casaram-se. Ele tinha 66 anos e ela tinha 38 anos. Vinte e oito anos de diferença!

Pilar foi sua tradutora, sua companheira, sua devota admiradora, sua mulher, sua namorada e amante.

Em 1995 Saramago escreve o seu livro maior, a sua obra prima, o Ensaio sobre a Cegueira, um dos livros que, até hoje, mais me impressionaram. Foi com um terror visceral que li aquele livro. Em situações limites, as pessoas transformavam-se em bichos em luta pela sobrevivência e eu era uma daquelas pessoas. Embrutecida, eu era uma das pessoas de que ali se relatava o percurso.  É frequente eu fazer paralelismo entre situações dramáticas a que assisto e a extraordinária descrição feita por Saramago.

Não consegui voltar a ler aquele livro que me esmagou. Fiquei marcada. Relembro cenas, jamais as esquecerei. Todas as pessoas deveriam ler este livro.

Depois deste livro, Saramago escusava de ter escrito qualquer outra coisa. Mas escreveu laboriosamente. Embora tenha todos os seus livros, nunca mais li nada dele, com execpção dos Diários de Lanzarote. Não li porque não quero que a marca do Ensaio sobre a Cegueira deixou em mim se esbata.

Viveu pois em Lanzarote e eu compreendi-o. Foi cobarde a actuação do governante que não deixou que um livro seu fosse a concurso, a revolta foi natural. Além disso foi também a maneira de viver equidestante da sua terra e da terra da mulher por quem viveu, com quem viveu um terno e eterno amor. Tantas vezes ele o disse - que amava Pilar, que renasceu com Pilar, que a Pilar devia tudo.

(É certo que Pilar não foi a única mulher da sua vida e acusam-no de ignorar as anteriores mas até nisto eu o compreendo - foi tão imenso este seu amor que ele quis que fosse o único, o primeiro, o último.)

Pilar, uma mulher cheia de garra, assertiva e vibrante, é hoje a Presidenta da Fundação José Saramago. A quem não viu o documentário José e Pilar, recomendo-o vivamente. São momentos de intimidade, de fragilidade, de grande amor. Daqueles tipos de amor que não morrem com a morte dos que amam.

E agora, para terminar, pego no Ensaio sobre a Cegueira e, ao caso, abro numa qualquer página. Transcrevo:

"O cão das lágrimas veio para ela, este sabe sempre quando o necessitam, por isso a mulher do médico se agarrou a ele, não é que não continuasse a amar o marido, não é que não quisesse bem a todos quantos se encontravam ali, mas naquele momento foi tão intensa a sua impressão de solidão, tão insuportável, que lhe pareceu que só poderia ser mitigada na estranha sede com que o cão lhe bebia as lágrimas."


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E agora desça um bocadinho mais para levantar o seu bilhete para o espectáculo ali ao lado, na beira do rio, it´s Summertime.

8 comentários:

packard disse...

Se os gajos estão a cair da tripeça a malta até pisca o olho, desculpando por entre sorrisos o facto de a senhora dona se estar a fazer ao cacau. Se as tipas sairam de uma tumba do alto império, aqui d'el-rei q há um cavalheiro, malandro, a tentar viver à conta da múmia. Enfim, é a vida e os seus estereótipos.

Um Jeito Manso disse...

Packard,

Com essa sua maneira de expor as coisas deixa-me sempre a rir.

Mas porque achará meio mundo que tudo isto se resume a 'estar a fazer ao cacau'...?

Eu não acho. (Claro que há casos como ela Nicole, loura platinada, salvo erro, que casou com um milionário de 90 anos e que a partir daí só queria ribalta - ela, claro). Nestes casos, por exemplo, eu, do que vejo de fora, julgo ver amor.

E acho que, havendo amor, o factor idade torna-se irrelevante.

Mas é isso mesmo. A condescendência social vai toda no sentido do homem. As mulheres são tendencialmente olhadas com menoridade: ou são felhas e, totós, se deixam levar na conversa por uns oportunistas mais novos ou, se casam com mais velhos, são umas oportunistas a quererem 'fazer-se ao cacau'.

Enfim, um longo caminho a percorrer.

Um Jeito Manso disse...

Helena,

Tal como escrevi lá em baixo, vou transcrever as suas palavras para as comentar, aqui neste post para dar oportunidade a que mais pessoas as leiam.

Disse-me a Helena:

"A história do Saramago conta-se num instante. Conheci-o no Diário de Notícias onde saneou 25 colegas que de um dia para o outro ficaram sem subsistência.
Viveu 19 anos com a escritora Isabel da Nobrega, a quem dedicou quatro dos seus livros, e que lhe deu mundo e amor.
E quando casa com Pilar del Rio, reedita as suas obras e elimina as dedicatórias feitas à Isabel.
Pode ser um Nobel da Literatura. Mas jamais levaria tal prémio pela grandeza da sua alma.
Não consigo deixar de ser sensível ao caracter, à qualidade como ser humano.
Nunca mais depois disto o li do mesmo modo!"


Pois, de facto ele branqueou a história e é normal nos apontamentos biográficos aparecer a referência à primeira mulher, Ilda Reis, mãe de Violante, e não se ver nada da Isabel da Nóbrega.

É daquelas coisas que deixa perplexo quem vê esta rasura biográfica.

Mas, tal como referi, penso que Saramago quis guardar-se todo para Pilar como se mais ninguém tivesse existido. E estou em crer que não renegou Ilda Reis por ser mãe da sua filha.

Quanto ao que ele fez naquele período revolucionário, foi um excesso de que ele próprio não se orgulhava anos decorridos. Acontece os escritores terem manchas negras no seu passado, tantos o têm, Günter Grass, por exemplo, mas tantos, até D. Camilo, foram colaboracionistas ou isto ou aquilo. Fases que se ultrapassam.

Mas fica a evolução, no caso do Saramago, em direcção à pacificação de alma, à tolerância.

Fica sobretudo a obra.

Mas, enfim, é a minha opinião.

Tita disse...

Acompanhei estas histórias de amor, respeito-as a todas e permito-me lembrar-lhe outra, cujos protagonistas tive o privilégio de conhecer pessoalmente e ter-lhes lido nos olhos o amor que os unia, apesar dos 35 anos que os separavam - ou que os juntavam. Estou a falar do Luciano Pavarotti e da Nicoletta Mantovani. Estive com eles em Modena, ali por 1997, num concerto exclusivo e numa recepção que se lhe seguiu. Eles tinham acabado de assumir a relação e estavam super apaixonados: ao olhá-lho, ela, na altura com 20'e tantos anos, parecia que olhava para Deus. Ele, nos seus early sessentas e na imponência do seu volume descomunal, metia-a debaixo do braço com um sorriso dulcíssimo e uma ternura que, quem presenciou, nunca mais esquece. De vez em quando, um beijinho na testa e um sorriso agradecido, completavam o quadro que eu gostaria de ter artes para pintar.
Eram um homem e uma mulher que se amavam e que se desejavam e não tinham colados na testa o carimbo dos 35 anos que se obtinham se se subtraíssem as respectivas idades.
Um xi.

Um Jeito Manso disse...

Tita,

Gostei tanto de ler essa sua história que complementa tão bem as que eu aqui descrevi. Não sabia desse caso de amor, senão tê-lo-ia incluido aqui.

A admiração, a devoção, o amor esbatem diferenças e eu concordo consigo: quando é amor o que une duas pessoas, isso é uma coisa tão evidente que é pura maldade (ou invejinha) atribuir obscuros e venais motivos à união.

Deve ter sido fantástico esse concerto a que teve o privilégio de assistir. Eu acho que momentos desses marcam indelevelmente quem tem a sorte de os viver.

Obrigada por partilhar comigo e com os amigos que por aqui passeiam todos os dias esse momento e a sua tão convicente opinião.

Um beijinho, Tita.

-pirata-vermelho- disse...

Daqui a pouco asfixia-se aqui com tanto amor falado.
Qu'eu saiba, é sentido e fodido - não há amor propalado! É propaganda...

Helena Sacadura Cabral disse...

Tita
O problema foi "depois" com a herança...
Filhos, ex-mulher ofendida e madrasta foi uma salgalhada dos demónios.
Mas o amor tem sempre um reverso. Que fazer, senão aceita-lo?!

Um Jeito Manso disse...

Oh Pirata!

Isso é lá coisa que se diga...!?

Você tem com cada coisa.

Enfim, publico na mesma mas vou ter que ensiná-lo, Pirata.

Há muitos tipos de amor e todos eles igualmente reconfortantes para quem os vive: amor filial, amor paternal, amor maternal, amor fraternal, amor romântico, amor apaixonado, amor para com animais de estimação, etc.

Qualquer destes amores deve ser sentido e 'praticado'.

Percebe?

Assim fica melhor, é mais abrangente pois adapta-se a todos os tipos de amor. A expressão que o caro Pirata usou não apenas não é muito apropriada aqui neste salão (é que nem colocou a bolinha encarnada), como não é tão abrangente como a que referi.

Por isso, de futuro, se me permite, diga assim: 'o amor é para ser sentido e praticado'.

Certo?

E olhe - podemos e devemos falar de amor, sim! Falar de amor é uma coisa boa, potencialmente contagiante. E é um bom antídoto contra a depressão, a neura, a desmotivação.

Ok?