quinta-feira, janeiro 18, 2024

Parece que anda meio mundo intrigado, 'onde está o umbigo dele?', mas eu, sinceramente, acho que até se vê bem e, sobretudo, acho que mais vale olhar para o que se vê bem do que para o que mal se vê

 

Nunca tinha ouvido falar em tal pessoa. Afinal parece que, mais uma vez, é problema meu. Jeremy Allen White é, afinal, conhecido, afamado, premiado, parece que excelente e multifacetado actor. 

E eu, que vivo aqui como uma eremita social, afastada de redes socias, longe dos ecos da fama alheia, desconhecia a existência da figura.

32 anos, 1,70 m, casado, com dois filhos, divorciado, parece que vive agora com outra afamada figura do panorama artístico, Rosalia. 

Como sou a tal que torce o nariz aos maiores pitéus, olho para ele -- e olho pois nunca o vi actuar, não posso avaliar a arte -- e não o acho nada de especial. Não me parece muito bonito. A mim não me convencia ele.

E, no entanto, parece que é, para meio mundo, se calhar até para três quartos de mundo, um sex symbol. Tento aguçar a vista, olhar para ele sob essa lente. Pois nem assim. Não que seja feio, não que seja desagradável, capaz até de ter uma certa pinta, tem um ar um bocado desmanchado que me agrada. Mas falta ali qualquer coisa. Não sei. Há ali qualquer coisa que não está no sítio. 

E não é a tal questão do umbigo que parece que anda a intrigar toda a gente. Provavelmente a mãe fez-lhe a ele o mesmo que a minha me fez a mim: apertou-o bem, enfaixou-o, de modo a que o dito cicatrizasse 'bem fechadinho'. Não é pois a isso que me refiro, acho que é mais a ligação entre o nariz e a boca. Não sei. Ou as sobrancelhas, descaídas ou lá o que é, não sei. Ou, vendo com atenção, parece que há ali qualquer coisa que se destaca pela proeminência. Não sei. 

Mas o tema do umbigo não me interessa nem é por ser secundário. É mais porque, vendo bem, há coisas nele para que a gente pode olhar. Ora, havendo-as, porque perder tempo a olhar para o que mal se vê.

Não é?

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Jeremy Allen White in Calvin Klein Underwear | Spring 2024 Campaign

Directed by Mert Alas in downtown New York City



(Sobre aquela minha dúvida da proeminência, será o lábio de cima que é saído de mais?)

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E queiram, por favor, descer até ao mistério do olhinho azul do José Luís Peixoto

Só para saber se ele sempre teve olhos azuis

 

Numa operação de zapping, comecei pela 1. E passei pela Fátima Campos Ferreira, naquele seu tom repuxado, quase gongórico, a entrevistar o José Luís Peixoto. Sei que é escritor renomado, um dos mais publicados e, se calhar, até lido. 

Quem por aqui me acompanha saberá que, nesta como em muitas outras coisas, não sou flor que se cheire. Não é por mal nem para chatear nem para mostrar que sou diferente mas a verdade é que tendo a não gostar do que é consensual para a maioria das pessoas. Não gosto nem deste fofinho nem do fofinho Valter Hugo Mãe nem do fofinho em versão tentativamente alternativa Gonçalo M. Tavares. Não fazem o meu género nem como escritores nem como pessoas. 

Mas, lá está, posso ser eu que vou em contramão na autoestrada. Se calhar estes fofos, simpáticos, que gostam de se fazer passar por simples, quase simplórios (e, se calhar, estão a ser genuínos), são como é suposto os escritores fofos serem e eu é que não atino pois toda a gente, menos eu, sabe que os escritores se querem fofos e que, os homens em geral, se querem também muito fofos. E se há algum Editor aí desse lado que não concorda pois que faça o favor de o dizer.

O que aconteceu é que o meu marido quase saltou da cadeira quando viu aquele dueto: 'Não vais pôr-te a ver estes dois pois não?'. Sosseguei-o, que não, mas que pacientasse durante dois minutos só para eu aferir a minha opinião. Não precisei de dois minutos. Mudei. Aquela pessoa que ganha a vida a ser escritor não faz o meu género. Agora com uma coisa fiquei eu estupefacta: apareceu de olhinhos azuis clarinhos. Ora juraria que é moreno de olho castanho. Ou não? Sempre foi fofinho de olho azul ou, para reforçar a fofura, resolveu aplicar lentes cor de olho de boneca?

Só isso. A quem puder esclarecer, agradeço.

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Aqui neste vídeo não se vê bem mas, no plano que calhei apanhar, eram azulinhos, azulinhos sem tirar nem pôr.

Fátima Campos Ferreira em Primeira Pessoa com José Luís Peixoto


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PS: Mas não sou só niquenta com os nossos fofos escritores-estrela. Tenho muito mais opiniões assim que fazem com que frequentemente me sinta carta fora do baralho. Quando meio mundo gaba a última obra ou a qualidade da escrita ou a honestidade da narrativa de vários outros eu salto fora, assumo-me como freak, digo logo que o mal é certamente meu. Por exemplo: Lídia Jorge. Prémios e mais prémios. E, no entanto, como escritora não tenho paciência para ela, acho-a uma maçadora. Portanto, estão a ver. 

quarta-feira, janeiro 17, 2024

No dia em que a Irene soltou os cachorros, ia-nos acontecendo uma.
Portanto, para festejá-lo, vou ver uma casa fabulosa e convido-vos a virem também

 

O meu dia foi sobretudo disparatado. Uma peça do separador central da autoestrada, com a ventania, soltou-se e enfiou-se debaixo do nosso carro e, tal o estrondo, pareceu produzir o efeito de uma explosão. Depois, quando o meu marido abrandou e conseguiu fazer uma diagonal para levar o carro para a berma, aquilo fazia um ruído de tal forma excruciante que nos fez levar a pensar que o carro estava a despedaçar-se por baixo. 

Tivemos que chamar a Assistência porque a parte de ferro daquela coisa estava enganchada por baixo. O carro teve que ser levantado, claro, para desencravar e puxar aquilo. Depois, o senhor da Assistência chamou a polícia para registar a ocorrência. Com isto estivemos não sei quanto tempo ao frio e ao vento na autoestrada. Aparentemente o carro não ficou estragado mas já era de noite, não se conseguia ver nada, muito menos por baixo do carro. Tem que ir à oficina para ser inspeccionado por baixo. 

Mas, face ao que aconteceu e ao que poderia ter acontecido, tivemos muita sorte. E, sempre que apanho grandes sustos e vejo de perto acontecer qualquer coisa que pode acabar muito mal mas não acaba, sinto-me agradecida, agradecida pela boa sorte. 

A vida é sempre, queiramos ou não, um equilíbrio precário pois, pensando nós que o que está mal na nossa vida está noutro sítio (no meu caso, numa cama -- e refiro-me, obviamente, à minha mãe), do nada acontece-nos uma que, num ápice, sem termos tido tempo para reflectir ou para perceber o que nos estava a acontecer, nos poderia levar desta para melhor (bastava que aquilo tivesse entrado pelo vidro do carro ou que, no momento em que o carro pareceu explodir, o meu marido tivesse travado ou dado uma guinada que levasse os outros carros a virem para cima de nós, com as consequências que daí poderiam advir). Portanto, não tenho que lamentar o susto, o tempo perdido, o frio -- tenho é que estar agradecida por termos escapado ilesos.

Face a isto, penso que não vale a pena falar de mais nada. Só que cheguei a casa enregelada até aos ossos mas, depois de um banho quente, senti-me tão animada (ia dizer abençoada) que, sem pensar duas vezes, resolvi fazer uma tentativa junto de uma editora. Mas tão despassarada estava que, ao preencher o formulário de caracterização e envio, me esqueci talvez do mais importante. Quando dei por isso já o tinha enviado com essa estúpida omissão. E agora não vou enviar segunda vez, iria dar mau aspecto. Mas também não estou aborrecida. Há coisas piores. E tenho para mim que o que tem que acontecer acontece no momento certo, portanto não vou para aqui ficar a pensar no disparate que fiz.

E, para ser ainda melhor, ao abrir o YouTube, apareceu-me uma casa fabulosa. 

A arquitectura desta casa, a engenharia, a envolvência, a luz, a largueza e a harmonia dos espaços, os materiais, a intemporalidade, a decoração, tudo é fabuloso. É uma obra de Frank Lloyd Wright. Convido-vos a ver pois é uma maravilha. Quando me sair um super euromilhões hei-de descobrir um arquitecto deste calibre, um terreno deste género e hei-de pedir-lhe que desenhe a casa dos meus sonhos.

Inside One of Frank Lloyd Wright’s Final-Ever Designs | Unique Spaces | Architectural Digest

Today AD travels to Connecticut to tour Tirranna, one of legendary architect Frank Lloyd Wright’s final designs. Considered one of the greatest architects of all time, Frank Lloyd Wright produced over 1000 designs in a career spanning 70 years, revolutionizing architecture in the United States. A pioneer of organic architecture, Wright believed any building should exist in harmony with its inhabitants and surroundings–a concept that runs through the veins of Tirranna. Join Stuart Graff, president and CEO of the Frank Lloyd Wright Foundation, as he walks you through one of the final designs of Wright’s career.


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Uma boa quarta-feira
Saúde. Boa sorte. Paz.

terça-feira, janeiro 16, 2024

Love myself

 

Levei na cabeça por ter escrito o que escrevi ontem e não só por isso mas porque eu própria penso que não posso estar sempre a deixar-me afogar em preocupações e tristezas, decidi que hoje ia ser diferente.

Mas a minha cabeça deve mesmo andar perturbada pois por mais que procure parece que dentro dela pouco encontro. Quero arranjar outro assunto mas sinto-me a patinar em seco.

Ao longo do dia vou espreitando as brincadeiras e as piadas que os meus amigos partilham no grupo. Há algum tempo que não participo. Mas, como eu, muitos dos que antes eram muito activos e tinham acesas discussões ou palpitantes conversas parecem ter-se acalmado ou passado para os bastidores. Mas tenho uma certa pena por não participar no próximo encontro, especialmente porque uma grande amiga que não participou no anterior desta vez vai estar lá e gostaria de pôr a conversa com ela em dia. Mas, pronto, não vale a pena lamentar. Não vou porque não quero ir. Sei que não ia ser boa companhia. Irei ao seguinte. 

Curiosamente, parece que agora das três pessoas com quem tenho mais afinidade, com duas delas antes não tinha nenhuma, uma porque nem dava pela sua existência e outro porque, vá lá saber porquê, embirrava à brava com ele. 

Mas agora gostava de estar com aquela que era sólida amiga. O marido correu mundo, dada a sua actividade. Ela, porque a sua profissão a obrigava a estar (é médica), ficava em casa enquanto ele andava por fora. Construíram a sua casa numa zona de campo, embora perto da cidade. E adoram a casa e o lugar. Muito ligado à cultura, com prémios e medalhas de mérito, dir-se-ia que ele vive num mundo que pouco tem a ver com o mundo dela (e vice-versa). E, no entanto, desde que os conheço, são parceiros de vida. Ao telefone, achei graça quando ela me disse: 'sempre tive a vida que quis, sou feliz'. E não tem telemóvel. Se calhar também não vê televisão. A minha mãe via-a sempre que ia ao centro de saúde e falava-lhe de mim como a mim me falava dela. Dizia-me que ela tinha um ar um pouco alternativo. Acredito, nunca foi de modas, nunca quis saber das opiniões alheias. 

Não sei como me veem a mim. Devo ser a única que trabalhou toda a vida em contexto empresarial e isso, do que vejo, desperta alguma curiosidade. As minhas amigas são maioritariamente professoras ou médicas. Dos homens, destacam-se também os médicos, muitos, alguns engenheiros, poucos advogados. Aquele que curiosamente parece ter uma vida mais excitante é aquele que, quando éramos miúdos, era dos mais neutros. Não só tem uma profissão incomum, direi extraordinária e com mérito, que o leva a vários países como consegue conciliá-la com os seus hobbies que são também inacreditáveis. Manda-nos vídeos fantásticos dos lugares mais recônditos do mundo. E talvez seja quem também tem a casa mais extraordinária, uma casa com muita mão dele.

Desejo ter mais disponibilidade mental para voltar mais ao convívio com eles. 

E há pouco a minha filha enviou-me uma imagem do comboio de luxo que vai percorrer a Itália, dizendo que temos que nos organizar para irmos. E eu fiquei com vontade, sim. 

E hoje, ao retirar as etiquetas ao que comprei, fiquei com vontade que venha o bom tempo para poder largar os casacos, para vestir blusas leves e coloridas e enfeitar-me com brincos e colares espaventosos, bem coloridos.

E um dia destes vou pegar numa tela e vou pôr-me a pintar a ver o que sai. Estou curiosa.

E a ver se o tempo melhora. Apetece-me passear, ir ver exposições, laurear. Mas agora, para além de tudo o que se passa e que me deixa apeada e, reconheço, completamente 'mongas', está sempre cinzento, tudo húmido, uma coisa meio deprimente. A chuva faz muita falta mas era bom que houvesse pelo menos um dia de sol. Sinto falta do sol e da alegria que ele traz.

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Como estive para aqui a escrever mas na verdade sem muito para dizer, deixem que partilhe convosco mais um daqueles vídeos que gosto de ver, que me põe bem disposta. Tem legendagem em português.

Love myself

In the quiet corners of our minds, there's a voice that tends to undermine and sow doubt - the inner critic. The negative one. The one who preys on our insecurities. Confirms our self doubts and attacks our confidence.  It might sound like, 'you should', 'why didn’t you?', or 'what’s wrong with you?'

Recognising this internal dialogue is important because it so often shapes our actions and decisions. When we're too hard on ourselves, it messes with our confidence and blocks our creativity. 

It's essential to name it, acknowledge its influence, and most importantly, not let it take the reins of our lives. Instead of allowing self-doubt to dictate our choices, we should strive to foster self-acceptance. By doing so, we empower ourselves to break free from the grip of the inner critic and embrace our authenticity.  

Embracing our imperfections and celebrating our unique qualities empowers us to step into the fullness of who we are meant to be. And it brings with it a profound sense of inner peace, enabling us to navigate life's challenges with confidence and grace.

Filmed in Hermanus, South Africa.

Featuring Catherine Brennon

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Um dia bom

Saúde. Alegria. Paz.

segunda-feira, janeiro 15, 2024

Este post não é sobre um vestido que não é de noiva

 

Um assunto que, no contexto da finitude da vida, sempre me perturba um bocado não é tanto o de aceitar que somos seres efémeros, passageiros numa viagem que não é infinita, mas o de que muitas vezes se está prestes a chegar ao fim sem que disso sequer se suspeite.

A primeira vez que essa ideia me assolou, e já falei disso aqui, foi quando uma tia do meu marido, uma tia queridíssima, muito bem disposta, sempre a levar tudo para a brincadeira, senhora de um recortado e fino humor, num certo dia em que o gato ia ficando entalado na porta, tendo-se assustado, deixou de falar. Toda a gente pensou que, sendo o afecto dela pelo gato tão grande, o susto tinha sido tão intenso que se tinha produzido ali um estranho efeito psicológico. Mas os dias passavam e a ela não recuperava a fala. E estava estranha, como se tivesse ficado um bocado debilitada. A família toda intrigada com tão bizarra reacção. Sobretudo intrigados, chamaram o médico a casa. O médico mandou fazer exames. E os exames não poderiam ter deixado a família mais perturbada: um tumor no cérebro. Não voltou a recuperar a fala e morreu pouco tempo depois. E, no entanto, antes do episódio do gato, nem ela nem ninguém suspeitaria que o seu fim estava bem próximo.

Com o meu tio aconteceu a mesma coisa e também já o contei. Forte, cheio de vitalidade, cores de pessoa com saúde para dar e vender. voz franca e forte, grande e bom conversador, amante de história e de política, sempre com vontade de relacionar assuntos do antigamente com a actualidade. E com um bom humor imbatível. Ria enquanto falava, ria de gosto. Quando o meu pai teve o AVC foi o grande apoio da minha mãe, sua irmã. Transportava-os às consultas, ajudava o meu pai nas escadas e a andar e a entrar e sair do carro. Estava sempre disponível, sempre bem disposto. Ele e a minha tia, um casal do mais bacano que há. Até que inesperadamente se descobriu que ele estava com um cancro avançado. Sem sintomas, dores, nada. Ao olhar as fotografias dessa altura, ele sempre na boa, sempre com aquele seu ar de homem saudável, nem ele nem ninguém desconfiava que não seria por muito tempo.

A seguir foi a minha tia que recebeu o mesmo veredicto. E foi a mesma surpresa. Num instante desapareceram. O casal a que não se conheciam doenças de relevo, sempre felizes, com uma vida saudável, foi-se sem que antes qualquer um tivesse percebido que o fim estava para breve.

Claro que, perante situações assim, duas atitudes podem ser assumidas: a pessimista, a de que não sabemos como estamos por dentro e de qual a nossa sina pelo que não vale a pena entusiasmar-nos com coisa alguma pois pode ser sol de pouca dura, ou fazer de conta de que nunca pensamos nestas coisas e viver a vida na boa, felizes por estarmos bem e não deixar que receios, porventura infundados, se aproximem de nós. Tendo a achar que a segunda é a melhor. 

Nos sítios por onde tenho andado não posso ignorar que tenho estado muito perto de quem está a caminho do fim da linha, com as angústias que isso sempre traz aos próprios e aos próximos. Para me distrair, penso que todos estamos a caminho do fim da linha. Desde que nascemos que o estamos. Uns mais depressa, outros mais rapidamente, uns com maior outros com menor sofrimento. Que dizer de uma menina que na escola é perfurada por um estilhaço do vidro da porta em que embateu? Ou de jovens que, talvez pela animação do álcool, se envolvem em brigas das quais nasce a morte de um deles? 

No outro dia morreu um familiar próximo de um amigo. Morte inesperada, prematura, deixando toda a gente consternada. E, no entanto, quando soube como foi, pensei que foi uma morte feliz e que a família deveria encará-la assim. Morreu sem o prever, sem sofrimento, de súbito, no local em que mais gostava de estar.

Os meus filhos vão achar que este post é deprimente e que eu deveria procurar a psicóloga. O meu marido, se os ouvir dizer isso, vai insistir no mesmo. Estranham ver-me assim e eu compreendo-os. Mas não sei se não é normal que eu pense nisto e se não é até racional que, com a serenidade possível, eu reflicta nestas coisas.

Uma amiga há pouco enviou-me uma mensagem a lamentar eu não ir a um almoço de grupo e a dizer para eu ligar a combinar alguma coisa. Mas, ao mesmo tempo, face às minhas actuais circunstâncias, a compreender que eu esteja sem grande disposição para participar em encontros em que toda a gente quer é estar animada e feliz e não a falar em preocupações ou com reflexões sobre a finitude da vida. Claro que toda a gente sabe que é finita mas, caraças, isso tem que ser dito em voz alta...? Acho que não. Por isso, reservo a minha participação para quando estiver a milhas de pensamentos destes.

Tirando isso, posso acrescentar que fui comprar uns pijamas para a minha mãe pois no fim da semana foi transferida para um local onde vai continuar a ser cuidada e, dos pijamas que tem, uns acho que são talvez quentes demais e outros talvez frescos de mais pelo que, apesar de ela não se queixar, arranjei-lhe uns bonitos que não são quentes nem frios. E, porque precisava desvairadamente de me alienar e estava tudo em saldos, apesar de não precisar de nem mais uma só peça de roupa até ao fim da minha vida (mesmo que viva até aos cento e cinquenta anos), marimbei-me para isso e cedi à tentação: uma blusa, uma camisa e um poncho. Quero lá saber. Até uns brincos e um colar mega hiper coloridos eu comprei. Apetece-me ter vontade de me revestir de todas as cores.

E quando fui ao supermercado comprar peixe, legumes, kefir e etc, resolvi fazer um desvio até à cosmética e, vendo um creme transparente que diz conter ácido hialurónico, não quis cá saber de coisas e comprei-o também. Pode não preencher ou reafirmar mas mal não deve fazer e imagino que seja uma sensação fabulosa colocar na cara um creme transparente como água.

Quando cheguei a casa, como tinha andado a provar roupas, antes de trocar de roupa tomei banho e usei aquele gel que se transforma em espuma e que supostamente tem poderes de relaxamento que recebi de presente de natal. Deve ter feito um bom efeito pois mal me sentei no cadeirão adormeci profundamente.

E acordei com vontade de voltar a escrever com aquela motivação aguda que me causa um frisson miúdo nas entranhas. E, caraças, quero mesmo acreditar que um dia vou conseguir descobrir uma editora que acredite que o que eu escrevo tem público e resolva apostar em mim. 

Um dia há-de acontecer. Tenho esperança.

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E porque não quero que fiquem a olhar para isto e a achar que estou é a ficar deprimida ou mais lelé da cuca do que era costume ou que só tenho pensamentos que não interessam nem ao menino jesus, termino com umas fotografias que mostram Julia Fox num evento da Sotheby em Nova Iorque na semana passada. E, tal como tive o cuidado de informar no título da mensagem, o vestido não é de noiva nem consta que ela tenha namorado. Igualmente encantadora é a carteirinha de mão que a sua acompanhante levava. Não que me passe pela cabeça pôr-me nestes preparos mas, ainda assim, acho que aqui devo deixar registo de tamanha ousadia (ou maluquice).




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Desejo-vos uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Alegria e esperança. Saúde.

domingo, janeiro 14, 2024

A comunicação social e as mentiras do Ventura

-- A palavra ao meu marido --

 

Já aqui escrevi várias vezes que acredito que o crescimento do Chega resulta em grande parte da comunicação social levar o Ventura ao colo e da forma como o MP e a comunicação social tratam os processos ou pseudoprocessos que envolvem políticos e outras figuras mediáticas ou com poder.  

O Ventura não tem uma única proposta para o País, não diz o que faria sobre os diversos setores se fosse eleito. Cavalga o que vai mal, anuncia medidas populistas inconcretizáveis, mente e não tem uma ideia, nem aproximada, sobre o orçamento de Estado e muito menos sobre os custos  e proveitos que o compõem. 

No entanto, o que é que a comunicação social divulga sobre os discursos do Ventura? 

Divulga os sound bites, muitas vezes mentiras, sem se dar ao trabalho, que seria o verdadeiro trabalho de jornalista, de informar que o Ventura está a mentir. 

Ainda hoje, no Congresso, o Ventura avançou mais uma vez com um número sobre os gastos com a igualdade de género que já foi bastamente demonstrado que é mentira. No entanto, é um dos excertos do discurso que passa em tudo o que é notícia. O único jornalista que ouvi referir que o Ventura diz, impunemente, as mentiras que lhe apetece foi o Anselmo Crespo na cobertura que  a CNN fez do Congresso do Chega. Que raio de jornalistas e jornalismo temos que divulgam mentiras, que sabem que são mentiras, e não o referem?

Outra moda agora dos comentadores e jornalistas/comentadores é transmitirem a ideia que o Chega vai crescer muito nas próximas eleições. É mais uma ajuda para o Ventura porque  a ideia de vencedor angaria os votos de quem gosta de estar com quem vence. Seria útil que, de uma forma séria e isenta, a comunicação social tratasse o Ventura como ele merece. Se não me engano, uma análise correta das sondagens revela não haver nenhum crescimento exponencial do Chega.

O Ventura  e o Prof. Marcelo são um filão para  a comunicação social que temos. No entanto, não teriam interesse por aí além para a comunicação social de que precisamos.

Antes de terminar, ainda uma palavra para o Pedro Nuno Santos. Hoje veio com um discurso meio sem jeito sobre o governo do PS.  Assim, infelizmente, não vai longe. As pessoas querem abordagens simples e pela positiva. E reincidiu na conversa da empatia. Tem muito que aprender com o António Costa. O Pedro Nuno não se deve esquecer que, ao contrário de todos os PM anteriores, o António Costa sairá do governo com uma imagem bastante positiva. O António Costa é, aqui concordo com a maioria dos comentadores, o maior ativo do PS.

sábado, janeiro 13, 2024

A falta que nos faz uma Philomena Cunk...

 

Nos dias em que estou mais cinzenta ou, pior ainda, mais bege, procuro salvação no YouTube. E geralmente encontro-a. 

Uma bacana que gosto sempre de ver é a Philomena Cunk. Imaginem a Paula Moura Pinheiro a fazer programas culturais, geralmente sobre história (mas pode ser também sobre literatura), mas a fazer perguntas completamente desconcertantes. Não que a Paula Moura Pinheiro não seja óptima e não faça programas que são um balão de oxigénio nas nossas experiências televisivas. Poderia era haver uma Paula Moura Pinheiro II, clone da I, que fizesse uma série paralela em que desse cabo dos entrevistados, mas um dar cabo bem disposto, saudavelmente estarola.

Adoro ver o ar sério com que a Philomena faz as perguntas e o ar educadamente desconcertado dos entrevistados que, geralmente, tentam responder não dando parte de fracos e tentando encontrar uma forma inteligente e polida de continuar num registo profissional.

Sinto falta disso na comunicação social. Ou há humoristas escancaradamente humoristas, muitas vezes fazendo tangentes à vulgaridade, ou há aquel@ nov@s humoristas que gostam de se desconstruir e de revelar as suas carências ou taras, tudo condimentado com muito palavrão, uma cena tardo-adolescente para a qual não tenho grande pachorra. 

Mas assim como a Philomena Cunk, que aborda temas culturais mas com uma abordagem geralmente descontextualizada e hilariante mas sem que a sua expressão o demonstre acho que não temos cá ninguém.

Poderia arranjar inúmeros exemplos mas uso o primeiro vídeo que agora me apareceu.

"Moments of Wonder." Philomena Cunk on the Second World War


E um bom fim de semana, ok?


sexta-feira, janeiro 12, 2024

Choninhas e baldas. E etc.

 

Volta e meia, em cima de tudo o resto há as coisas que se estragam. Ontem houve uma coisa que se partiu e que tem que ser arranjada. Onde pensávamos que resolveriam o assunto, disseram que não e deram o contacto de um homem.

Hoje, estava a chegar do hospital, atrasada pois estive lá mais tempo do que esperava e o trânsito também estava pior do que desejável, apareceu o dito. O meu marido ficou no jardim a suster a fera que ficou desaustinada e eu entrei com o expert.

Caraças. Se há coisa para a qual eu não tenho paciência é para nhonhinhas, nheco-nhecos. Mediu e remediu, apontou e tornou a apontar, pediu-me para eu segurar a lanterna, pediu para eu espreitar a ver se via não sei o quê, deu exemplos para validar as suas teorias, queria mostrar-me vídeos para justificar o que dizia. Eu já só queria que o homem se calasse. E ele não se calava. Depois estava demasiado perfumado. Não suporto homens demasiadamente perfumados. 

Às tantas o meu marido ligou-me. Não percebia o que se passava. Eu poderia ter dito as medidas por telefone mas o homem disse que um milímetro a mais ou um milímetro a menos poderiam ser a morte do artista pelo que tinha que ser mesmo ele a vir tirar as medidas. Mas, julgava eu, era coisa para uns cinco minutos no máximo. Qual quê? Não cronometrei mas mais de meia hora foi. Espreitava para dentro daquilo, oferecia-se para fazer uma limpeza às entranhas da coisa, mas tudo em slow motion, tudo com longas pausas entre palavras. Um desespero. Pessoas assim levam-me à loucura. Já só me apetecia correr com o homem de qualquer maneira. Que choninhas do caraças, senhores.

Acabei por me pôr a andar e ele, que remédio, a andar e a falar atrás de mim, depois saí porta fora e ele a querer atrasar o passo. É que, no meio disto, dizia que não ia conseguia fazer um orçamento exacto pois se alguns parafusos se partissem ao retirar, tinha que pôr parafusos novos, ou se os parafusos novos não fossem exactamente iguais, poderia ter que fazer furação nova. Por isso, não sabia. E eu, impaciente de todo: 'Faça assim. Diga o valor aproximado e diga quanto pode ser mais, no máximo, caso surjam esses imprevistos'. Ele olhou-me como se não percebesse, como se eu estivesse a dizer uma coisa impossível. E queria voltar a colocar dúvidas e entraves a um orçamento exacto. 

Eu já só pensava que nem pensar voltaria a ter um tal patarata em casa. Ah, às tantas, ao mexer, ao desmontar para ver se tirava as medidas exactas, deixou cair um pouco de pó. Ficou aflito, pediu uma vassourinha e uma pázinha. E eu que ele deixasse, que eu já limpava, que não se importasse. Mas gente assim não desiste. Viu os apetrechos da lareira e pôs-se a varrer e a limpar.

Lá fora, ao frio, às escuras, o meu marido e o cão. Claro que poderia ter ele entrado e deixado o cão na rua. Mas a perspectiva de ir aturar um empata daqueles era ainda pior do que ficar à seca na rua.

Lá vim, então, a andar, abrindo o portão, o homem ainda a querer explicar cenas, a justificar e a sustentar teorias sobre as cenas. Creio que o interrompi e lhe disse: 'Está bem. Mande o orçamento que conseguir. Obrigada.' e bye bye. Há com cada um.

Também há uma fuga de água num dos tanques da caldeira. Há uns dois meses. Veio cá um que disse o que era e que ia mandar um orçamento. Até hoje. No princípio do mês passado, estava noutro país, não sei se de férias se em trabalho. Depois no fim do ano estava a banhos, de férias, num país africano. Depois que não sei o quê. Até que finalmente era hoje. Sim, sim. É o veio. Tipo mais baldas nunca vi. Sempre altas conversas, grandes desculpas e grandes promessas. Um bocas. Caraças.

Só espero que apareçam mais uma catrefada de imigrantes que venham compensar a falta de mão de obra que há em todos os sectores. 

Tirando isso, só se for o que a funcionária do hospital que estava a ocupar-se da minha mãe conversou comigo. Uma simpatia. Não sei como já estava a falar-me da sua ansiedade, dos seus ataques de pânico, de como gostava de não ser tão magra, já estava a fazer-me confidências. Qualquer dia pergunto se me permitem que filme e publique. Depoimentos avulsos sobre a vida de pessoas desconhecidas.

De manhã também liguei para uma amiga da minha mãe que lhe tinha ligado. Não sei como, passado um bocado, já estava a falar-me das suas maleitas, do que faz, do que não faz, das doenças prevalentes na sua família, em como todas as da sua geração estão a ir desta para melhor. Isto dito sem dramas, entre sorrisos.

Também tenho mais histórias do balneário da piscina mas ficam para outro dia.

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Os fantásticos sapatos são apenas algumas das modas de gosto duvidoso que podem ser vistas em 30 Questionable Fashion Choices That Have Been Shared On This Instagram Page

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Um dia bom

Saúde. Boa sorte. Boa onda. Paz.

quinta-feira, janeiro 11, 2024

Sobre hospitais públicos e privados. Episódios. Histórias. E sobre o DN, o JN, a TSF, e o The Guardian, o Madame le Figaro, o Correio da Manhã Jornal

 

Nem valerá a pena a gente pôr-se para aqui a dissertar sobre as pregas e os plissados da vida. Não há nada de novo a dizer. Desde o início dos tempos que se sabe que, por fora, de repente, vê-se uma coisa mas, ao pé, com tempo, se percebe que há a parte que é ocultada pelos efeitos, e isto já para não falar nos avessos.

Tenho experiência de frequentar hospitais públicos e privados. Já passei noites no exterior sem saber nada dos doentes que tinham sido devorados pela dinâmica hospitalar, já andei entre macas onde gente grita e tosse e escarra e vomita e chora e grita, eu própria já passei uma noite e uma manhã no meio de gente em camas encostadas umas às outras, gente que gritava que estava a urinar-se ou outras cujas fraldas eram mudadas à frente de todos, onde os doentes mentais gritavam e choravam a noite inteira desestabilizando ainda mais a desgraça que ali se vivia. 

Já tive os meus pais internados em hospitais públicos e em hospitais privados.

A grande e terrível diferença está nas urgências e nos serviços de observação. Nos hospitais públicos que conheço a falta de espaço, a falta de meios e a falta de organização são gritantes e a dignidade dos doentes e o respeito pelos acompanhantes são totalmente ignorados. 

Uma vez internados, as diferenças esbatem-se. A disparidade que subsiste terá mais a ver com a privacidade, especialmente quando, nos privados, se está num quarto individual. Mas não tenho razão de queixa nos internamentos (dos meus pais) em hospital público. Para os doentes, em particular quando estão mesmo doentes, na prática nem dão muito pelo local nem se importam com existirem ou não frescuras.

Estar num hospital privado, em quarto individual, é quase como estar num hotel com todos os serviços incluídos. Sobretudo há a preocupação do serviço ao utente e à família. Há sempre alguém que atende o telefone, alguém que está disponível quando queremos uma informação sobre o nosso familiar ou um médico que nos explica a situação e as perspectivas. E isso faz muita diferença pois ter um familiar internado e não conseguir encontrar ninguém que nos informe cabalmente é frustrante.

Mas, como tudo, é relativo. E, sobretudo, é para quem pode pagar (sobretudo, que tenha um seguro com um grande plafond ou tenha ADSE e poupanças). 

Contudo, uma coisa é comum: o sofrimento de quem está doente e a angústia dos familiares.

Vejo muitas vezes os familiares de um doente internado na mesma ala da minha mãe, que está num hospital privado. Tenho impressão que estão lá quase todos os dias e, não sei porquê, estão muito na sala de espera. Vejo sempre um homem que talvez seja um pouco mais novo que eu. E vejo um rapaz e uma rapariga que presumo que sejam irmãos. Os jovens conversam, riem-se, outras vezes falam com ar sisudo, parecem reflectir e recebem e fazem chamadas. Parecem esquecidos do homem que imagino que seja o pai. Acho que nunca os vi a dirigirem-se a ele, nem nunca vi o homem a falar com eles ou ao telefone. O mutismo daquele homem faz-me muita impressão. Já calhou partilhar o elevador com eles. Os jovens conversando, o homem em silêncio, um ar muito triste. De vez em quando vejo-os a irem ao quarto mas pouco depois saem. Imagino que seja a mulher do homem e mãe dos jovens que esteja internada. Como nada sei, só posso presumir e, dada a ala que é e dado o pouco tempo que estão no quarto, presumo que a pessoa esteja maioritariamente a dormir o que nem sempre é muito bom sinal.

No outro dia falei de um homem que saiu e voltou pouco depois com um jovem que pensei ser o filho. São outros, não estes de que agora falo.

Mas a angústia dos que temem perder o seu ente amado é a mesma. Nada sei da história de cada uma daquelas pessoas que ali está internada. 

Cada um terá a sua história.

No outro dia, por alturas do Natal, num fim de semana, no átrio cá em baixo, o átrio vazio, três tias podres de betas falavam muito alto (como as ultra betas sempre fazem). Uma dizia que não ia subir e as outras duas: 'Olha agora...', 'Olha-me esta...!', 'Deixe-se disso, venha lá...'. E a beta zangona: 'Não vou! Depois do que ele disse, que não queria ver-me, acha que ia aparecer...? Nem pensar, né...?', e as outras: 'Esqueça lá isso, não ligue, venha lá...'. Nisto chegou um super beto, alto, porte real, pinta de beto de Restelo, Estoril ou Cascais, ultra-pintarudo: 'Atão? Temos reunião aqui em baixo?'. E as outras: 'Imagine que esta agora não quer subir...'. E ele: 'Ah essa tem graça, conte-me lá...'. E a beta azeda: 'Disse que não me quer ver. Acha que eu ia?' e as outras: 'E ela a dar... Ouça: esqueça. Venha lá.'. Face ao impasse, o betalindão sacou de um cigarro, fez um sorriso complacente de macho alfa e disse: 'Vocês entendam-se que eu vou até lá fora fumar um cigarro'. 

Entretanto, despachei-me da obtenção da credencial de acesso e subi enquanto o grupinho continuava naquela. Apesar de preocupada, achei um piadão.

São episódios que, mais betice ou mais pobreza, mais tristeza ou mais euforia (porque nem sempre os hospitais são locais de sofrimento, também são locais em que se nasce e em que as famílias vão em festa) pontuam sempre estes locais, fait divers com que podemos sempre distrair-nos das nossas preocupações. Os tais refegos que nem sempre se veem, que nem sempre têm relevância, mas que, de uma maneira ou de outra, fazem parte da vida daqueles locais.

Lembrei-me agora de falar disto pois, com este problema dos jornalistas com salários em atraso, tenho pensado na minha própria experiência como leitora e nas diferentes motivações que me animam quando procuro a imprensa.

Os tempos são outros, não podemos recuar aos tempos da fundação dos brilhantes títulos (DN, JN, etc) nem podemos, sequer, recuar aos tempos a seguir ao 25 de Abril. 

Falo por mim. Já não leio jornais em papel. 

E o jornal que mais leio é o The Guardian. De longe, é o jornal que, para mim, melhor cobre a informação sobre uma variedade alargada de temas que me interessam. E tem boas fotografias, vídeos interessantes. De longe, o que mais me agrada.

Depois, se me apetece a leveza, alguma fofoca, alguns temas sobre moda ou decoração ou culinária, vou para o Madame le Figaro. Há superficialidade, claro, mas há também elegância e diversidade. E também preciso disso na minha vida.

Há outros nos internacionais mas aqueles dois são os primeiros do dia e os que, mesmo quando não tenho tempo ou cabeça para nada, não passo sem espreitar.

Depois, nos portugueses, percorro, geralmente en passant (até porque, ao não ser assinante, metade não consigo abrir), o Expresso, o Público, o DN. Mas basta ver um que os outros geralmente não diferem muito. Um que agora gosto de espreitar é o CM. Desgraças e parvoíces. Mas acho uma certa graça pois há ali muito do submundo que tem muito da vida real, a vida que se vê nos hospitais públicos, nos locais onde a vida se pode ver despida de selfies e instagrams. Como também não consigo abrir os conteúdos pagos, não consigo ir ao detalhe. Mas fico estupefacta com os que se matam, se esfaqueiam, os que desaparecem, gente que vive anonimamente até que um dia vai parar a uma morgue, um homem de 180 kg que teve que ser retirado pela janela, por bombeiros, uma igreja à venda numa cidade. Coisas assim. Não leio artigos de opinião nem notícias que envolvam política ou coisa do género. Ainda assim, pasmo comigo mesmo. Mas sinto que tenho que conhecer melhor este mundo que é bem paralelo em relação àquele que frequento.

Fazendo agulha para o tema do momento, a crise mediática de momento. Lamentando muito o que está a passar-se com os trabalhadores do Global Media Group, tenho que dizer que, nos tempos que correm, ou há qualidade, diversidade, diferenciação ou não vale a pena. Não reconheço isso no DN e o JN nunca frequentei. A TSF foi durante muito tempo uma rádio de referência. Com a saída de Fernando Alves desapareceu a minha principal ligação à TSF.

Agora um aspecto quero referir: o que está mal, muito mal nisto é que empresas e marcas importantes sejam vendidas, quase às cegas, a fundos que ninguém conhece e que nada têm a ver com as empresas que compram, que estão ali apenas para ganhar dinheiro, seja por vender edifícios seja por dispensar pessoas, reduzindo custos, seja pelo que for e não para desenvolver o negócio. Depois de tantos exemplos nefastos de fundos opacos com capitais em offshores, como se explica que ainda se continuem a fazer negócios destes sem que nenhuma entidade valide previamente a lisura, a transparência, a legitimidade, o cumprimento fiscal, etc?

Penso que nada há a fazer, a nível público, para salvar estas empresas pois, a salvar estas, ter-se-ia que salvar todas as outras de qualquer outro sector, e não vejo que nem o DN, nem o JN, ou a TSF ou as outras do grupo sejam estratégicas para o país. Penso que o que há a fazer é apenas, e não é pouco, obrigar os accionistas e os gestores a cumprir a lei,  caindo a pés juntos sobre os prevaricadores.

Mas, caraças, que sirva de exemplo para:

 1- Negócios futuros, seja em que âmbito for. Tudo deve ser escrutinado antes de qualquer operação se concretizar,

 2 - Para o jornalismo que compreende que tem que se reinventar e apostar na qualidade e na diferenciação, senão inevitavelmente soçobrará.

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Desejo-vos um bom dia

Saúde. Alegria. Paz.

quarta-feira, janeiro 10, 2024

O ano de 2024 quase pessoa a pessoa
-- as previsões de Paulo Cardoso na companhia do ganda maluco do Alvim que ali esteve caladinho a ouvir com atenção e muito respeitinho

 

Depois de talvez um mês de interrupção, eis que consegui voltar à piscina. E que bem me soube. Não foi só a água quentinha, foi o exercício, foi aquela confraternização no balneário, foi a graça da senhora muito obesa, nua, no duche, escandalosamente contorcendo-se para conseguir chegar com a mão às partes pudibundas enquanto na galhofa diz as coisas mais inverosímeis. Hoje uma delas, ao conversarem sobre uma reportagem da véspera sobre o tempo que as crianças levam agarradas aos telemóveis, dizia que tinha lá em casa uma com sessenta anos que era a mesma coisa. E dizia que o ameaçava: 'Não acreditas que tantas horas de roda dessa porcaria vão limpar-te a cabeça por dentro...? Quando estiveres maluco julgas que vou estar aqui para aturar as tuas maluquices? Nem penses! E já lhe disse muitas vezes: quando fores desta para melhor julgas que vou sentir a tua falta? Não. Nada. Já estou habituada a estar sozinha...' e ria enquanto várias outras, todas nuas, besuntando-se com creme, faziam coro com ela.

Eu, no meu canto, toda pudica, a toalha à volta para não me apresentar como vim ao mundo, sorria ao vê-la sempre tão desinibida e brincalhona. Outras vezes diz que vai arranjar um papagaio para ter com quem falar quando está em casa. Ainda gostava de ver o senhor para perceber como funciona aquela dinâmica.

Depois fui ver a minha mãe. Está melhor. Depois de a ter visto praticamente à beira de ir desta para melhor, graças à perícia e persistência da equipa médica, apesar das diversas maleitas graves, está a conseguir dar a volta. Daqui a nada está a ter alta. Melhor, a ser transferida. Alta não pode ter. Vai continuar a ser acompanhada mas fora do hospital. Só espero é que corra bem, que se adapte bem, que goste, que continue a recuperar bem. 

Preciso de descansar a cabeça. Acontece-me agora isto: ao fim do dia sinto-me esgotada. Deixo-me dormir no sofá e depois custa-me imenso a acordar. Ou é de toda esta situação ou é o somatório disso com o pós-gripe. Sinto-me mesmo esgotada. 

Enfim. Agora que a vejo a melhorar, já só me apetece ir de férias, afastar-me de preocupações, descansar a cabeça. 

Hoje também, num bocadinho de manhã, voltei a pegar numa coisa que andava a escrever e da qual me tinha afastado, incapaz de ter ideias ou vontade de puxar por elas. Senti-me bem ao reler o que tinha escrito. Parecia que estava a sentir-me a ressuscitar, quase como se nestas últimas semanas tivesse andado a viver numa realidade paralela, subterrânea, e agora esteja a voltar à superfície.

Poderão pensar que é fragilidade a mais da minha parte ter ficado assim com a crise de saúde da minha mãe. E até pode ser que seja. Tal como referi antes, talvez venha a falar no assunto mais tarde. Agora não. Mas acreditem que foi uma situação atípica, com contornos inesperados, em que me vi virada de pernas para o ar. Uma coisa é o desenrolar normal de uma doença. Outra, muito diferente, é o que tem acontecido com a minha mãe. Mas está melhor e isso é o que importa. 

Na segunda-feira, quando vínhamos do campo, como sempre quando estamos no carro a partir das sete da tarde, posicionámo-nos na Antena 3, com o Alvim e a sua impagável Prova Oral. Aí ele disse que esta terça-feira lá teria outro doido, o Paulo Cardoso, a falar nas previsões para 2024. Fiquei com pena de não ouvir pois imaginei um programa completamente louco.

Pois bem. Agora ao abrir o YouTube, aparece-me o vídeo da Prova Oral. Nem fazia ideia que gravam e que se pode ver depois.

Agora fui à procura das previsões para o meu caso. Boas. Fiquei contente. 

É coisa louca a gente ligar a isto mas não quero cá saber. A minha mãe disse-me muitas vezes que acha que a minha maneira de ser é um bocado racional de mais. Penso que preferia que eu embarcasse na dela, nas suas emoções, nas suas fobias. Mas cada um é como é e eu não sou assim. A maneira de ser dela tem uma forte componente que é o oposto. Perante os medos dela, tantas vezes irracionais, sempre consegui manter-me serena (pelo menos, exteriormente), não me deixando contagiar e tentando desmontar aqueles medos inibidores de que ultimamente tanto tem sofrido. Mas sou assim em geral (excepto quando há doenças reais, graves, daqueles que me são mais próximos, pois aí, sinto-me impotente e isso desarma-me, apeia-me, tira-me o tapete, o chão). No meu trabalho, quando o stress parecia tomar conta de toda a gente, eu também me mantinha intacta, tranquila, pés na terra, a cabeça a funcionar sem ceder aos arroubos emocionais dos demais. 

Ora esta minha racionalidade parece contraditória com esta parvoíce de gostar de ler os horóscopos. Bem sei que sim. Mas é o que é. Além disso, há que deixar espaço para as coisas sem explicação.

Os caranguejos nascidos naquele intervalo de datas que o Paulo Cardoso ali diz parece que têm tudo para virar o jogo, ir à luta e vencer. É o que preciso. Sorte e persistência. Tenho muita vontade de ter uma vida nova. A ver se é desta. A porcaria de 2023 trocou-me as voltas todas, foi chatice atrás de chatice, preocupações permanentes. Ora tenho necessidade de ter projectos e novos objectivos e entusiasmos em vez desta sucessão de preocupações que me minam por dentro, que me esvaziam, que me sugam a energia. Preciso mesmo. 

Pode ser que o Paulo Cardoso tenha razão, pode ser que os astros se alinhem para me levar ao colo em 2024. Vou fazer figas. Vou mesmo.

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Para quem queira saber como vai correr-lhe o ano ou o que fazer para se precaver caso as previsões não sejam famosas, aqui está o programa na íntegra.

Paulo Cardoso - As previsões para 2024 na Prova Oral


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Um dia bom
Saúde. Boa sorte. Paz.

terça-feira, janeiro 09, 2024

A beleza de viver

 


Claro que o dia foi pessimamente escolhido. Chuva e um impossível frio antártico, dentro e fora de casa. 

Mas, nas actuais circunstâncias -- antes, antevendo o que estava por vir, depois, os exames e consultas, depois as idas aos hospital e, em cima disso, sempre temendo que alguma coisa aconteça --, já não íamos ao campo talvez há um mês. Tempo demais.

Como a minha mãe felizmente está francamente melhor e esta segunda-feira a minha filha lá ia, resolvemos tirar, nós os dois, o dia de folga e, depois da visita no domingo, seguimos para o campo.

Chegámos de noite. Não vos digo nem vos conto... Um gelo. Mal abrimos a porta sentimos logo: parecia que estávamos a entrar numa câmara frigorífica. A casa gelada, gelada, gelada. 

Ainda por cima, como há algum tempo, creio que no verão, estiveram a colocar tubagem nova na salamandra, agora, ao acendê-la, desatou a sair uma fumarada. Portanto, noite gelada, tivemos que abrir as portas para limpar o ar. Ou seja, mais frio entrou.

Afinal, hoje, de dia, o meu marido esteve a inspeccionar a situação, voltou a colocar lenha e a deitar-lhe fogo e percebeu o que se passava. Quem lá esteve, instalou um registo no tubo. Pelo menos foi o nome que ele deu a uma coisinha que roda que, se bem percebi, ou deixa ou não sair o fumo. Portanto, rodou aquilo e imediatamente o fumo deixou de sair e a sala ficou quentinha. 

Só que hoje, para além do gelo cá fora, choveu todo o dia. Portanto, não esteve agradável. Se fosse para estarmos mais dias, ao segundo ou terceiro dia já a casa se teria climatizado e já se estaria bem. Além disso parece que esta terça-feira já nem vai chover. Mas querendo vir esta segunda-feira, mal deu para usufruir. Chegámos no domingo à noite e saímos esta segunda, por volta das seis e meia. Não deu para nada. Ou melhor, para quase nada. Quase.

É que, seja como for, vá lá eu saber porquê, tal como sempre acontece quando lá estou, dormi que me fartei. E só isso já é bom. E dormi sem acordar a meio, sem sonhos maus. Dormi que foi um regalo. Acordei descansada.

E ainda consegui dar uma esticadinha pelo campo. De sombrinha aberta, com frio. Mas que se lixem as condições atmosféricas adversas quando se está in heaven.

A terra está verde, atapetada de musgo, há zonas cobertas de etéreos líquenes, o feto que nasce todos os anos de sob uma pedra está viçoso, pujante de vida, um tronco caído de uma pequena árvore, descarnado, parece uma espada esperando o momento de ser garbosamente empunhada, há cogumelos carnudos, húmidos, de um rubro antigo, e encontrei um, imagine-se, lilás, irreal. 

Fascino-me. 

Não preciso afastar-me da minha casa para descobrir maravilhas do outro do mundo.

E depois confirma-se o milagre pelo qual eu tanto esperava: os esquilos voltaram. Sob alguns pinheiros voltaram a aparecer as pinhas roídas. Que alegria. Espero que nunca mais tenhamos que fazer alguma coisa que os assuste e afugente. Gosto de sabê-los por lá, confiantes, livres, como se aquele fosse o seu heaven.


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Agora que tenho estado cara a cara com os mistérios da finitude da vida, com a fragilidade e, ao mesmo tempo, a força dos fios que unem os corpos à vida, gostei imenso de ver o vídeo que abaixo partilho. Também eu me tenho interrogado sobre muitas coisas e me tenho imposto a necessidade de degustar com prazer os pequenos prazeres: olhar o céu, deixar-me estar a ver o voo de um pássaro, encantar-me com a perfeição de uma flor efémera e campestre, contemplar os muitos tons de verde, ouvir uma música de olhos fechados, pensar naqueles que mais amo, sentir e agradecer a paz à minha volta.

The beauty of living

Wrinkles, lines, scars - there are many ways that time leaves its mark on our bodies.  Yet mainstream culture dreads getting older - we are urged to fight the ageing process, and many feel pressure to lie about their age.  But as Betty Friedan famously said: "Ageing is not 'lost youth' but a new stage of opportunity and strength."  

With age can come confidence, and freedom to realize who we really are.  As we age, we grow into a deeper kind of beauty, one which works its way from the inside out. It’s a more authentic beauty because it radiates from within.  So let’s celebrate lives well lived. And feel lucky to wake each morning to appreciate what the new day has to offer.

Filmed in McGregor, South Africa. 

Featuring Annie Norgarb.


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Um dia bom
Saúde. Boa sorte. Paz.

segunda-feira, janeiro 08, 2024

Votos de boa sorte e de felicidade a Pedro Nuno Santos e António Costa no primeiro dia do resto das suas vidas

 

Sim, ouvi o discurso de Pedro Nuno Santos. Tem entusiasmo, carisma, garra. Tem uma visão e a visão dele é boa: quer fazer crescer o País, não quer deixar ninguém para trás, quer elevar o nível das valências nacionais. E está certo. Penso que tudo isto é indiscutível. Contudo, penso que ainda não engoliu sapos suficientes para perceber que é preferível, em determinadas circunstâncias, alguma prudência para não correr riscos desnecessários, nomeadamente o de ter que engolir mais uns quantos. 

Pode ser que tenha feito as contas todas e saiba onde vai buscar o dinheiro para tudo o que anunciou e pode ser que já se tenha concertado com as partes envolvidas em todas as medidas para as quais já publicamente apontou objectivos. Se o fez e tem a certeza que pisa terreno seguro, então nada tenho a dizer. Mas, se o não fez, talvez esteja a dar passos maiores que as pernas. Até porque, para gerir uma casa, é preciso ter boa cabeça e um sentido de harmonia, para gerir uma empresa é preciso boa cabeça, bom senso, paciência, boa visão ao longe e ao perto e muito mais que isso, mas, para gerir um País, é preciso tudo isso mas, antes, tem que se subir para o patamar a partir do qual se ouvem e concertam todos os intervenientes mesmo os que defendem interesses contrários.

Mas, daqui até 10 de Março, Pedro Nuno Santos há-de ser aconselhado, assessorado, apoiado. O próprio coro de reacções adversas provenientes da oposição e dos media ajudá-lo-ão a calibrar medidas, ajustar opiniões, corrigir a trajectória ou a velocidade.

Seja como for, volto a dizer, apesar de lhe reconhecer uma impetuosidade que, aqui e ali, pode vir a ser-lhe um pouco atrapalhativa (digamos assim), não tenho dúvidas de que Pedro Nuno Santos está a anos luz dos líderes dos outros partidos. 

  • Direi que penso que é menino para cilindrar ainda mais, quiçá de vez, o pateta do Montenegro (que, para além de não ter ideias nem jeito, tem uma falta de bom senso e de decoro que causa desconforto, que maça; por exemplo, hoje falava deste período de mortalidade elevada com um incomodativo e despropositado sorriso sarcástico na cara, fazendo-me sentir vergonha alheia). 
  • Mas Pedro Nuno Santos torna também irrelevantes a azeda Mortágua e o nulo Raimundo. 
  • E torna ridículos quer o pateta da IL (de que não consigo fixar o nome) quer o vendedor de banha da cobra do Ventura, torna muito claro que estes dois não passam de maus actores a fazerem papel de tontos num filme de tontos para um público de tontos. 

Para finalizar, só espero que Pedro Nuno Santos seja humilde e saiba rodear-se de pessoas experientes e francas e que peça muitas vezes a opinião de António Costa, uma pessoa com uma excelente visão a 360º e um pragmatismo ímpar  -- e quem diz o Costa diz outros veteranos da política socialista com quem terá sempre a aprender. E que daqui até 10 de Março saiba reservar todos os dias um bocado para trabalhar com especialistas das diferentes áreas, para se documentar, para reflectir, para colher experiências -- ou seja para se preparar o melhor possível para o que tem pela frente.

Uma palavra ainda para me referir a um tema que acho que deveria ter abordado no seu discurso, nem que fosse ao de leve: o da Justiça. Claro que houve vários outros que não aflorou e que são eixos fundamentais, alicerces, pilares e vigas de uma estrutura sólida. Num discurso destes não há lugar para tudo, bem sei. Mas a Justiça, por ser um pilar fundamental e por ter já dado provas mais do que suficientes de que está podre, ou parcialmente podre, merece uma atenção prioritária. Como cidadã, sinto que a actuação do Ministério Público se traduz em riscos graves para a nossa democracia. O que o MP, perante a inoperância e o olhar cego e quase tonto de uma PGR desfasada da realidade, e sob o beneplácito de um PR diminuído, tem feito é de susto. E ninguém pode sentir-se em segurança numa situação destas. Pode Pedro Nuno Santos achar que não é um tema popular ou que é terreno minado. Mas se tem passada larga e parece gostar de dar o peito às balas, é luta à qual não deveria furtar-se. Melhor: não deverá furtar-se. É isso que espero de um homem de bem, ainda mais sendo um democrata, um humanista, um socialista.

Acabo este texto com uma palavra de agradecimento a António Costa. Só não sou mais exuberante pois parece que ainda não consigo admitir que esta barracada do MP tenha acontecido, ainda espero que, a curto prazo, os magistrados que fizeram isto, mais a Gago que aparou a porcaria feita, se retratem, peçam desculpa e se enfiem num buraco bem escuro, escondidos, com vergonha da porcaria que andam a fazer. E só espero que António Costa continue a ser um político de referência para Portugal e, se for o caso, para a Europa. António Costa é um político brilhante, um governante de excelência, um cidadão exemplar. A ele muito devemos. Mas porque ainda tem muito, muito, muito para nos dar, fico à espera de vê-lo em novas funções para poder continuar a agradecer-lhe.

PS: Uma nota de rodapé dirigida a Marcelo Rebelo de Sousa. Nas legislativas tenho votado no PS. E nas próximas continuarei a votar no PS. Repare no que estou a dizer: nas últimas não votei no António Costa. Votei no Partido Socialista. Nas próximas não vou votar no Pedro Nuno Santos. Vou votar no Partido Socialista. E, como eu, certamente todas as pessoas que votaram antes no Partido Socialista (e, cá para mim, muitas que não votaram antes mas vão votar agora). Percebeu, Sr. Presidente? Mas percebeu mesmo? 

domingo, janeiro 07, 2024

Do outro lado --- casos reais de saúde mental contados por profissionais da área

 

Nos dias que atravesso a relação entre saúde física e saúde mental é recorrente. Dito desta maneira, se calhar fica a ideia, errada, de que a saúde mental não é física. Creio que é embora nem sempre rastreável através de exames médicos. Ou seja, não há controlo analítico ou RX ou ecografias para se perceber se uma pessoa está com uma depressão, sofre do Síndrome de Munchaüsen ou se, simplesmente, está a atravessa um período conturbado. E se nos é relativamente fácil saber que, se estamos com uma patologia evidente, por exemplo, se fracturamos um osso, devemos procurar ajuda médica, já para as questões mentais pode não ser óbvio. Ou porque achamos que faz parte da nossa maneira de ser, ou seja, não é coisa que deva ser tratada, ou é coisa passageira que saberemos ultrapassar, creio que não é às primeiras que as pessoas, em geral, percebem que devem procurar ajuda.

Ao longo da minha vida tenho-me cruzado com pessoas que, creio, teriam ganho em ter tido acompanhamento psicológico. Uma amiga, por exemplo, saiu directamente de um comportamento tímido e reservado para um totalmente desbragado, sem prestar atenção a nada do que lhe dissessem, entregando-se, sem defesas, a toda a espécie de situações que eram, à vista de todos, situações inviáveis, perigosas, ratoeiras nas quais se ia perder. E, no entanto, atirava-se de cabeça. E saiu de umas para outras, num percurso errático que lhe deixou marcas. Penso que ainda hoje continua a ser como era quando entrou neste registo: atirando-se de cabeça, adolescente até à medula, sem conseguir dosear as emoções, mostrando de forma inocente as suas perplexidades e frustrações. Não sei como é que um psicólogo poderia ter ajudado mas acredito que sim.

E tive um colaborador que era calado, calado, calado. Nunca se percebia o que lhe ia na cabeça, nunca dava opinião, nunca era capaz de fazer um ponto de situação razoável pois, temendo as dificuldades que sentiria até o trabalho estar concluído, dizia sempre que não sabia quando o acabaria. Tive vários problemas por causa dele. Ninguém conseguia relacionar-se de forma saudável com ele. Parecia ter sempre capital de queixa, notoriamente sentia-se injustiçado, mas nada fazia para contrariar essa situação. Por exemplo, numa reunião, pedia sugestões sobre um tema. As pessoas falavam, opinavam, sugeriam. Ele nada. Quando eu lhe perguntava qual a opinião, fazia um esgar de contrariedade, quase sarcástico, dizia que não queria dizer nada porque os outros antes já tinham dito tudo. Uma vez, sem ninguém perceber porquê, do nada, deu-lhe um ataque de fúria, levantou-se, pegou na cadeira em peso e bateu com ela no chão até a despedaçar. Depois virou costas e foi-se embora. À sua volta, estavam todos estarrecidos. Não vi. Contaram-me. Na verdade, acho que ficaram em pânico pois ele passou do habitual estado de quase zombie a monstro desaustinado. No dia seguinte, chamei-o e perguntei-lhe o que tinha sucedido. Com ar espantado, certamente fingidamente espantado, disse-me que se tinha passado porque a cadeira não prestava, que estava sempre a desencaixar-se mas que tinha vindo mais cedo e a tinha montado, que já estava boa. Penso que era um caso em que teria beneficiado de acompanhamento pois alguma coisa naquela cabeça não estava bem encaixada.

E já nem falo numa outra que, sob a capa da santinha, da boazinha que levava bolinhos feitos por ela para distribuir pelos colegas, que trabalhava horas a fio, até de madrugada e que surpreendia todos pois quando os mais madrugadores chegavam já lá a encontravam, frequentemente fazendo trabalho que nem lhe competia, numa de ser amiga dos que precisavam de ajuda, e que veio a revelar ser dona de uma mente perversa, causando sérias perturbações familiares, sérios danos profissionais, chegando até a causar medo a quem com ela lidava mais de perto. Face à gravidade dos casos em que a soube envolvida, mais diria que seria caso até de internamento.

E, do que tenho visto e sabido, não apenas beneficiam de acompanhamento as pessoas que padecem de algum problema, como os acima referidos, como aqueles que, tendo que lidar com essas pessoas, chegam a um ponto de exaustão ou infelicidade ou permanente dúvida sobre como lidar com a situação que, precisam mesmo de alguém sabedor que, de fora, ajude a encaixar as peças soltas do puzzle e forneça pistas sobre como melhor levar a vida adiante.

O Observador, que não tenho por hábito acompanhar enquanto jornal, tem esta louvável iniciativa de ter um 'canal' em que se debruça sobre os labirintos da mente, quer convidando pessoas a falar sobre os seus problemas e sobre como conseguiram procurar alívio com acompanhamento profissional quer convidando justamente diversos profissionais da área da saúde mental que aqui falam sobre casos concretos. "Do Outro Lado" é a nova rubrica do projeto Mental, do Observador.

Escolho, para já, apenas dois dos vídeos, o primeiro porque me impressionou bastante, até porque desconhecia que havia um síndrome identificado para este tipo de patologia, e o segundo porque me fez lembrar o caso de um colega dos meus filhos que me preocupou bastante na altura e o do filho de um colega meu, um rapaz que, de tão viciado, não apenas deixou de estudar como quase deixou de viver, tornando-se até agressivo para os pais.

“Do Outro Lado”. A doente borderline que inventava sintomas para ser cuidada pelos médicos

A vontade de ajudar a primeira ("e última") paciente com síndrome de Münchhausen levou o psiquiatra João Carlos Melo a uma dedicação que desafia os limites habituais da relação terapêutica.


"Do Outro Lado". O caso do rapaz que jogava online 22 horas por dia

Um paciente dependente de videojogos que não falava nas primeiras consultas. Uma psicóloga grávida pela primeira vez. O caso ajudou Rosário Carmona e Costa a tornar-se a psicoterapeuta que é hoje. 

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Desejo-vos um belo dia de domingo
Saúde. Serenidade. Paz.

sábado, janeiro 06, 2024

O Ministério Público, o Tribunal de Contas, Montenegro, etc. [A porcaria continua]
A palavra ao meu marido

(a escolha da palavra 'porcaria' é de minha responsabilidade pois a que ele usou foi outra)
.

 

O MP continua numa senda autofágica. Tanta porcaria faz que acabará por implodir. O que aconteceu hoje relativamente à divulgação feita pelo MP sobre o inquérito ao António Costa repugna qualquer pessoa de bom senso. É absolutamente inqualificável. Que tipo de pessoas são estes magistrados? Que interesses defendem? Ninguém os põe na ordem? Ninguém poderá a partir de hoje dizer que o MP não tem uma agenda politica  e que não quer interferir na politica. Vai ser um fartar vilanagem até às eleições. Curiosamente, ou não, também o PR promulgou hoje o decreto lei que o MP refere estar na base do inquérito. Existem sempre umas "coincidências" curiosas entre a atuação do MP/PGR e a do PR. Claro que o Prof. Marcelo, que ia estar calado mas dá hoje uma entrevista, aos costumes disse nada. Até hoje nunca foi capaz de criticar esta 'bandalheira', sendo ele o responsável pela nomeação da PGR.

Também foi transmitido pelos diversos canais de TV o texto do recurso (lá se foi outra vez o segredo de justiça) enviado para a Relação pelo MP. É confrangedor. Afirmam que o mentor da "coisa" foi o Galamba. 

Pasme-se, parece que se preparava para apresentar no Conselho de Ministros documentos sobre o assunto. É "obviamente" um caso de polícia. Então agora os ministros apresentam documentos no Conselho sobre os assuntos que tutelam? Opinam sobre os assuntos que devem decidir? Dão instruções sobre os assuntos que estão na sua esfera de atuação? Onde é que já se viu isto? 

Abre-se um inquérito, escuta-se o tipo durante 4 anos, enxovalha-se o tipo e a família nos jornais e se possível mete-se o tipo na choldra, em preventiva, mesmo que ao fim de dezenas de milhares de escutas apenas meia dúzia possam, mesmo para a mente perigosamente persecutória dos MPs serem investigadas. É tão trágico que nem sequer dá para rir. 

Já agora, se o Galamba era o cérebro da coisa porque é que meteram todos na prisão durante uma semana para interrogatórios e ele não foi na leva? E se o Galamba se propôs esclarecer o MP, qual a razão para ainda não ter sido ouvido? Ainda por cima quando o MP estava a preparar o recurso ao despacho do juiz de instrução? A falta de respeito do MP pelos cidadãos revela-se nestes procedimentos. Quem os autoriza? Quem os sanciona?

Já agora hoje ouvi mais uma peça sobre o processo Vortex na TVI. O principal suspeito menciona o Montenegro vários vezes em conversas telefónicas. Então a PGR não abre um inquérito ao Montenegro e não faz um comunicado a dizer que abriu o processo como fez ao António Costa? Qual é a diferença nas duas situações? Parecem exatamente iguais. O MP atua de formas diferentes em situações semelhantes?

Devo referir que também não concordo com a violação do segredo de justiça no caso Vortex e que não sei se é caso ou não para abrir um processo ao Montenegro. Quero é frisar que a justiça só é justiça se for independente e proceder de forma semelhante em situações iguais. De facto, a reforma da Justiça a começar pelo MP é prioritária. Para além da reorganização do MP, da redefinição dos poderes dos magistrados e da definição de procedimentos e de  mecanismos de controlo também a seleção dos magistrados deve obedecer  a critérios rigorosos. Os recursos humanos são fundamentais em qualquer organização e os muitos magistrados do MP, pelas provas dadas, é óbvio que não prestam.

Outro assunto: hoje foi noticiado que o Tribunal de Contas desancou a privatização da ANA feita em 2012. O que dirá a direita que louva o Passos Coelho desta "corrida em osso"? Mas como conseguirão os Senhores Magistrados do Tribunal de Contas explicar que levaram onze anos para analisar a privatização? É de loucos!

Também hoje o Montenegro disse uma piada de ir "às lágrimas". Referiu que o José Luís Arnaut não se pronunciará sobre a localização do novo Aeroporto nem influenciará a decisão do Montenegro & Companhia. Boa piada, "só contaram p`ra você".

sexta-feira, janeiro 05, 2024

Os grandes agentes da bandalheira

 

Hoje queria que o meu marido escrevesse qualquer coisa sobre a palhaçada do recurso do MP a propósito da palhaçada do chamado caso Influencer, tudo uma palhaçada em que não se acredita, um desconhecimento total do que é o mundo real, uma subversão total do que é o papel do Ministério Público, um disparate sem tamanho. O que dizem ali só me dá vontade de perguntar se não há maneira de os mandar prender pois são perigosos para a sociedade tal a deformação que vai naquelas cabeças e tal o real poder que detêm. 

António Costa, na entrevista a Nuno Santos, disse que continua a achar que este modelo de funcionamento da máquina da Justiça é o correcto e acrescentou que pressupõe um funcionamento hierárquico.

Pois, aí está a questão: o modelo poderia ser bom num mundo perfeito, por exemplo se a Procuradora-Geral percebesse qual a sua função, tivesse alguma visão ou prática hierárquica. Mas não, é uma nulidade absoluta. Acontece que se poderia dizer que não seria grave pois a malta do MP é tudo gente escorreita, atinada. Errado. Não apenas andam em roda livre como acham que podem justicializar a política e lançar lama sobre quem lhes apetece, apeando politicamente quem lhes apetece.

Portanto, estamos entregues a um bando de incompetentes, lunáticos, doidos varridos, vingativos que andam por aí fazendo o que querem e, certamente, divertindo-se à tripa forra com os abalos que causam na democracia.

E Marcelo Rebelo de Sousa caladinho, assistindo passivamente ao que esta gente anda fazer, nomeadamente a minar a credibilidade do nosso regime. Marcelo, Marcelo, que mal lhe fica este silêncio...

Mas o meu marido anda engripado, cheio de tosse, não teve paciência para escrever.

E o pior é que, logo depois de ter ouvido excertos do recurso, ouvi um histérico e descompensado Montenegro não apenas a querer que a gente se esqueça do tema da sua casa, como que a gente se esqueça da porcaria a granel feita pelo governo de Passos Coelho que ele tanto defendeu (e que fez porcaria e da grossa e em toda a linha, nomeadamente com as privatizações, incluindo a malfadada privatização dos CTT), como ainda a querer que a maltosa que vota sempre nos populistas mais populistas, os que são contra tudo e todos, nos que tanto votam no PCP, no BE como no Chega, agora votem nele, o grande líder da bandalheira.

Pedi ao meu marido que, então, falasse nisto. Tosse, tosse e tosse e diz que não está com saúde para falar de gente desqualificada. Caraças para esta gripe que não desgruda da gente. Bem, ele não usou aquelas palavras para se referir aos desqualificados mas, como este blog é um blog de família, estou a traduzir usando palavras bem comportadas.

Ora eu, que ando com a cabeça feita em água, a caminhar sobre um chão minado de brasas, em que todos os dias acordo bem cedo com um nó no estômago, tentando (por vezes debalde) depois adormecer por mais um pouco, também não estou com cabeça para zurzir a valer como a tropa do MP e o Luís Montenegro merece ser zurzida.

Fico-me, pois, por aqui. 

Mas a Penélope está em grande forma. Não fala do totó da cara alegre, porque o tema é o da Justiça, mas não poupa os outros. Ide até lá, é o que tenho a dizer: Ao Ministério Público: há limites para a não admissão de um erro grave. A Procuradora-Geral continua alheada


quinta-feira, janeiro 04, 2024

Fui caçada por uma psicóloga. Estranhei.
Mas, para dizer a verdade, gostei.

 

Nestes meus dias tão incertos em que a inquietação vive dentro de mim, estou a começar o ano como o acabei. Ainda hoje, ao responder a um amigo, lhe disse que o almoço teria que ficar para depois já que, por ora, vivo neste limbo em que a palavra de ordem é 'cada dia é um dia'. No hospital tento que me apontem perspectivas, me esclareçam com aquele nível de exactidão que, para mim, é fundamental. Mas ninguém me diz o que eu quero ouvir. Basicamente tudo anda à volta disto: 'cada dia é um dia'. 

Para qualquer pessoa isto deve ser horrível. Não sou a primeira e certamente não serei a última a passar por estas situações. Mas, para quem, como eu, é das ciências exactas, penso que isto é ainda pior. É como se me pregassem rasteiras, me tirassem o tapete, me deixassem sem chão, sem rede, me deixassem sem eixos referenciais. Navegação à vista, sem regras, sem gps, numa meio de uma nebulosa.

A novidade foi que ontem a médica, depois de conversarmos, me disse que já iam ter comigo ao quarto. Não percebi. Já iam ter comigo? Quem? Ela e outra médica? Porquê? Mas tão admirada fiquei que nem me ocorreu verbalizar as dúvidas.

Mas estava lá, lá fiquei. Até que entrou uma pessoa com bata, que tomei por médica, que se apresentou e disse que gostava de falar comigo. Levou-me para uma sala. Lá fui, atarantada, sem saber qual era a dela. 

Simples: queria apoiar-me. Eu meia parva. Apoiar-me? A propósito de quê? 

Disse-me que a equipa lhe tinha transmitido que achavam que eu estava a precisar de apoio. Eu parva a tentar pensar no que é que eu teria feito ou dito que tivesse levado a equipa a pensar nisso. Depois pensei: capaz de isto ser 'cilada' da minha filha. Mas não entrei por aí, ou seja, não quis saber exactamente quem e porquê, achei irrelevante. 

O relevante, pareceu-me, é que se eu tinha sido caçada, então a caçadora que levasse a dela avante. Porque não?

Portanto, no meio de todo este turbilhão, uma novidade: uma conversa com uma psicóloga. 

Devo dizer que gostei. Achei interessante. Descodificou algumas coisas, deu-me pistas para melhor lidar com a situação. No fim, disse-me que doravante a procurasse.

Hoje, quando cheguei, não a vi. Estava numa de não a procurar, a pensar que a conversa tinha sido boa, útil, e que, como aquelas dicas, já eu ia ver tudo sob lentes novas, mais claras. Portanto, não era precisa outra sessão.

Quando ia a sair, vi-a e pensei: caraças, como é que agora vou conseguir escapar-me?

Ela, mais rápida que eu, perguntou se eu podia esperar pois queria falar comigo. Disse-lhe que estava de saída. Pediu cinco minutos. Achei que seria indelicado não atender ao seu pedido.

E, portanto, segunda sessão. Eu sentada num sofá, ela numa cadeira ao pé de mim. 

Parece-me perceber que a história também lhe desperta atenção, noto que as perguntas não são apenas um caminho para conduzir a sessão, são também curiosidade.

Tal como na primeira sessão, também na de hoje, às tantas desatei a chorar. Tento travar pois parece-me absurdo não conseguir conter-me. Felizmente ela não me diz coisas constrangedoras como 'chore à vontade' ou 'não faz mal chorar, chore que faz bem'. Nada. Se o fizesse eu achá-la-ia vulgar e sentir-me-ia ridícula. Pelo contrário, não se mostrou nem espantada nem comovida ou caridosa e continuou a olhar para mim com atenção, à espera que eu continuasse a falar, como se o meu choro fosse uma contingência com a qual não estava para se distrair. Ainda bem.

Acho-a muito inteligente, perspicaz. Por vezes, estou a falar e ela adivinha o que vou dizer. Ou faz perguntas que revelam que já antevê qual vai ser a resposta e vejo que fica contente ao constatar que adivinhou mesmo. 

No fim disse-me quando lá estaria de novo e que eu a procurasse. 

Uma experiência interessante. Fico a pensar no que ela diz e, na minha cabeça, as coisas apresentam-se já de outra maneira, parece que já fazem mais sentido. Havia uma perspectiva que eu nunca usava e que, se calhar, é justamente aquela pela qual as coisas devem ser vistas.

Eu que em tempos pensei ser psicóloga, que gosto de ouvir outras pessoas e a quem outras pessoas costumam contar coisas, vejo-me agora no papel contrário. Ela diz que é bom eu falar com tanta franqueza e tão abertamente. É certo. Não sei falar de outra maneira. Admito que algumas pessoas rodeiem, baralhem, usem meias palavras. Isso deve dificultar a vida aos psicólogos. Eu falo sem qualquer dificuldade do que me preocupa ou do que me custa mais e, mesmo perante algumas inesperadas, respondo o mais sinceramente possível.

A minha dúvida em continuar tem mais a ver com a necessidade: fico com a sensação que ela já me tirou algumas palas que eu tinha em frente dos olhos, já me mostrou outras linhas de raciocínio que eu nem ousava pensar que existiam. E, portanto, tenho a sensação que ela já fez o que tinha a fazer e que, a partir de agora, é comigo.

Ela diz que acha a situação tão complexa que qualquer pessoa teria forçosamente dificuldade em lidar com ela pelo que está em crer que eu beneficiaria em ter mais algumas conversas com ela, mesmo depois de a minha mãe sair do hospital. Tenho dúvidas. O único aspecto que me deixa receptiva à ideia é que gostei mesmo de falar com ela, acho-a mesmo inteligente e objectiva, rápida, arguta. Falar com pessoas assim é um exercício que me motiva. 

Enfim. No meio destas circunstâncias difíceis, estas duas conversas foram duas inesperadas e agradáveis surpresas. Bem que a minha filha andava a dizer que achava que eu só teria a ganhar com isto. O meu marido também. Aliás, contei à psicóloga uma situação envolvendo o meu marido, em que eu não achei nada bem o que ele tinha dito e lhe pedi para não voltar a fazê-lo, e ela, surpresa das surpresas, disse que achava que ele tinha feito muito bem. Contei-lhe a ele e, claro, parece que tinha marcado golo, que claro que tinha feito bem, que era óbvio, que eu é que nunca lhe dou ouvidos, etc, etc. Agora percebi porque, lá está, ela colocou em cima dos factos um referencial que eu nunca usava e à luz do qual as coisas fazem outro sentido.

Ou seja, é sempre saudável, mentalmente saudável, ouvir quem nos mostre outras perspectivas e que mostre como as coisas podem fazer mais sentido quando encaradas sob lentes que antes nunca nos tínhamos lembrado de usar.

Tirando isso, a ver se durmo uma noite descansada. Peguei a gripe (da qual não estou completamente curada) ao meu marido e agora é ele que se farta de tossir durante a noite (e durante o dia também). Enfim. Uma gripe estuporada esta, difícil de curar. Os meus filhos estão na mesma, tiveram-na e ainda andam a ver se conseguem livrar-se do que sobra dela.

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Desejo-vos um dia bom

Saúde. Cabeça fresca. Paz.