quinta-feira, dezembro 05, 2013

Cinza depois da música na gaveta do fundo. A dama e o unicórnio. Amigo, queredes vos ir?





Porque é que algumas pessoas não gostam de poesia? 


Tão estranho isso me parece que frequentemente me interrogo bem como costumo interrogar as pessoas que gostam de ler em geral, exigentes na qualidade da prosa mas que não lêem poesia. Dizem-me que a poesia não lhes diz nada e ponto final.

O que há, pois, na poesia que convoca uns e deixa outros indiferentes?

Já aqui contei: um grande amigo meu, leitor exigentíssimo, para me provar que a poesia é pouco mais que nada, pegava num poema e lia-o de seguida. Uma coisa assim: "Alguma coisa desassossegou o espírito do lugar e propagou sementes de solidão e derramou ventos que mordem o vazio dos campos. É tempo de dizer adeus às almas".

E, meia dúzia de segundos depois de ter começado, tinha lido de carreirinha o poema e virava-se para mim, 'Pronto, está lido. Diga-me lá qual a graça disto?'

Eu dizia-lhe que ele é que estava a matar o poema, lendo-o assim, de supetão, e ele retorquia que os poetas é que, como são gente sem assunto, para fazerem render o peixe, de três em três palavras mudam de linha para ver se enganam os incautos. Eu ainda tentava argumentar com a respiração, com a pausa necessária para apreciar as palavras, coisas assim, mas ele atalhava, "ó menina, tretas!". Acabei por desistir.

E, no entanto, eu leio um poema, aquele mesmo que acima foi transformado em duas frases espalmadas e, lendo-o com vagar, parece que estou a degustar um néctar muito puro, a essência da essência.

Alguma coisa desassossegou
o espírito do lugar e propagou
sementes de solidão e derramou
ventos que mordem o vazio dos campos. 
É tempo de dizer adeus às almas.


Leio este pequeno poema de A. M. Pires Cabral e parece que é como se a sombra se tivesse imobilizado sobre um lugar desabitado, um lugar onde o vento esvaziou as almas. (Não é o caso das fotografias que aqui coloco e que mostram a vista que tenho in heaven, um lugar muito docemente habitado).

Rubras como poentes
estas vinhas. Rubras como 
o consolo que se ocultava nos bagos 
e, uma vez ocorrida no lagar 
a química benévola, 
deles se destila - e nos escalda.


E quase paro de respirar para sentir o rubro quente das videiras, os bagos de sangue, o calor que nos consola o corpo. E, no entanto, são apenas palavras.


*

Estou com isto porque hoje comprei o último livro da colecção da editora Tinta da China coordenada por Pedro Mexia, o 'Gaveta do Fundo' de A. M. Pires Cabral. Tal como os anteriores é um livro especial. Pedro Mexia é um bom olheiro, disso não haja dúvidas. A poesia que escolhe não é óbvia, não é daquela poesia que de tão fácil ou banal se torna descartável. Não: a que ele escolhe fica inscrita em nós.


Os livros, em si, têm cuidada edição - e se eu sou sensível a isso. A paginação é agradável, o papel é bom, o papel da capa parece uma seda rugosa muito agradável ao toque, o design das capas e as cores são elegantes.

Para vos mostrar, fiz uma das minhas instalações. E, como de costume, um dos livros tresmalhou-se, desta vez foi o do João Vário. Se fosse uma ovelha, eu assobiava por ele e ele acabaria por se chegar; mas, assim, como chamá-lo? Desisti e fotografei os que encontrei, este novo e mais o do Luís Quintais e o da Rosa Oliveira.

Depois, quando os vi juntos, as capas fizeram-me lembrar as capas dos livros de poesia da Brasília Editora ou da Portugália Editora feitas por João da Câmara Leme há milhares de anos atrás. Coloquei dois desses para vos mostrar as parecenças, um do José Régio e outro de José Gomes Ferreira.

Sobre écharpes em tons rubros conformes à saison:

Depois da música, Luís Quintais
Cinza, Rosa Oliveira
Gaveta de Fundo, A.M. Pires Cabral

e
Poemas de Deus e do Diabo, José Régio
Poesia III, José Gomes Ferreira

e

A Dama e o Unicórnio, Maria Teresa Horta


Quanto a este último, já aqui o referi por mais do que uma vez (ou aqui ou no Ginjal, não me lembro bem).

A Dama e o Unicórnio é um livro muito belo. É daqueles livros objecto que me apetece emoldurar, guardar numa vitrine, talvez colocá-lo junto ao meu leque de ripinhas de madeira de mil oitocentos e tal. Mas não é só livro: é livro e CD, voz de Ana Brandão dizendo os poemas e música de António Sousa Dias.


A produção executiva, a capa e paginação estiveram a cabo do Atelier 004 de Patrícia Reis - um grafismo invulgar, um bom gosto sedutor. Ou seja, uma obra especial, uma preciosidade (um presente de Natal ímpar, digo-vos eu). 


Se eu um dia fizer um livro acho que vou pedir à Patrícia Reis que o torne tão bonito assim (presunção e água benta, qualquer qual toma a que quer, ora essa)

Tenho estado a falar da forma mas, claro, o conteúdo é qualquer coisa... Poemas muito belos, um roteiro poético em torno da série de 6 tapeçarias La Dame à la Licorne descobertas em em 1841 e que podem ser vistas no Musée de Cluny.

Transcrevo, ao acaso, um poema e mostro-vos a fotografia de um outro:


A lenda    A história
o tormento    o afago
confissão de desejo

onde o poema fia
(...)
À mon seul désir
desafiando o amado
dedos esvoaçados

onde a pele adivinha

Ardilosa seduzindo
entre o jogo e o jogado
tomando o que pode

de si mesma rainha
SIGILO
         Seduziste-me
         Senhora
         e eu deixei-me seduzir

         de bom grado

         No sigilo de vosso
         colo
         na devassa de vosso espelho


O meu amigo diria que a Maria Teresa Horta não tinha muito que dizer sobre o sigilo e que, com menos de vinte palavras, despachou o assunto.

Eu, pelo contrário, pasmo com o murmúrio, o secretismo da sedução assim descrita - e para os quais bastaram menos de 20 palavras.

*

Por tudo isto, pergunto: o que é preciso para se gostar de poesia?

Saber respirar, saber adivinhar a música que se esconde no lado silencioso das palavras, saber dar o tempo necessário para que a luz ou a sombra escolham onde pousar?

Não sei.

Apenas sei que, para mim, a poesia é imprescindível.


***

A música lá em cima é Amigo, queredes vos ir? de Dom Dinis, cantada por Paulina Ceremuzynska


***

[Não me apetece muito agora dizer-vos isto porque é matéria muito pouco poética mas, assim como assim, deixem que vos informe: sobre o novo movimento de gente de bem do PSD que está capaz de esganar a ala passista e os cães com pulgas que tomaram de assalto o partido laranja, é descerem, por favor, até ao post já aqui abaixo]

***

«««« Não devo conseguir responder aos vossos comentários pois quero escrever sobre a Leonor e perdi um tempo danado com isto que acabaram de ler. Ponho-me a fazer formatações maricas e isto desalinha-se tudo e eu para aqui ando de volta, a pôr espaço de um lado, a tirar de outro... e o tempo vai sendo consumido com isto. E tanto que eu gostava de ir dar uns dedos de conversa, ando com saudades de conversar convosco »»»»

quarta-feira, dezembro 04, 2013

Rui Rio, Pacheco Pereira, António Capucho e outra gente honrada do PSD dizem que têm Uma Agenda para Portugal. Passos Coelho finge que assobia para o lado mas vai avisando que vai apresentar a sua recandidatura à presidência do PSD. A sua guarda-costas de serviço, Teresa Leal Coelho, não disfarça: arreganha o dente aos barões e diz (por outras palavras) que se vão catar.


Eu, que não sou de me bandear para os lados do PSD, fico contente com a notícia de que a gente de bem do PSD (que a há) se começa a organizar para ver se tira o tapete a este bando de irresponsáveis que para aí anda a fazer porcaria por tudo o que é canto e esquina.

Teresa Leal Coelho,
bodyguard de Passos Coelho, aqui com o vice-bodyguard

Já que o PS não consegue sequer falar baixinho (ainda hoje um fedelho armado em deputado, um tal Hugo Soares que devia estar escondido na despensa da AR para ver se ninguém dava por ele, resolveu perorar raivosamente contra Sócrates e Mário Soares e, pasme-se, do PS ninguém o mandou estar caladinho), ao menos que seja o próprio PSD a fazer a limpeza que se exige, correndo com Passos Coelho, Marco António, Aguiar Tinto, etc, etc, e, claro, com a guarda-costas Teresa Leal Coelho.


=> A acompanhar com expectativa positiva a evolução das movimentações que se vão seguir. 

(Cá para mim, a esta hora, Cavaco Silva deve estar a dizer isto mesmo à sua Maria)


&

Leonor e Duarte - uma conversa muito difícil




Quando chegou, Leonor cruzou-se com Afonso à saída dos elevadores. Meio a sério, meio a brincar, ele olhou-a de alto a baixo, ar apreciador e sussurrou com vago sotaque brasileiro, ‘Poderosa…!’. Leonor sorriu, gostava de começar bem o dia. 

O dia avizinhava-se mais do que preenchido mas tinha que arranjar um espaço na agenda para ter uma conversa com Duarte. Mas, antes de começar o dia, ainda queria fazer umas pesquisas na internet.

Pediu, pois, à Secretária que lhe ajeitasse os horários por forma a deixar-lhe uma meia hora livre para uma conversa com Duarte, em horário que conseguisse compatibilizar através da Secretária dele. 

Pouco depois, estando ela ainda a fazer pesquisas que a estavam a deixar certa mas muito apreensiva sobre o que muito provavelmente se estava a passar, a Secretária veio dizer-lhe que Duarte estava no gabinete mas que sairia dentro em pouco para uma reunião fora da empresa, seguindo-se um almoço e depois nova reunião pelo que só estaria livre mesmo ao fim do dia, isto se voltasse ao escritório. Leonor resolveu que o melhor, nesse caso, seria atacar já o assunto. 

Respirou fundo, olhou lá para fora, tentou controlar o nervosismo e avançou. 

Voltou a cruzar-se com Afonso, ‘Afastem-se que ela hoje veio para matar…’ disse-lhe ele baixinho e de forma disfarçada para que mais ninguém desse por isso, mas ela não prestou atenção.

Bateu à porta de Duarte e entrou. 

Duarte estava naqueles seus momentos de boa disposição, Muito bom dia a quem é uma flor. Então em que lhe posso ser útil, Madame? 

Leonor sentou-se e disse, Bom dia. Temos que falar, Duarte.

Duarte olhou descaradamente para o relógio, riu-se, Graças a Deus que daqui a nada tenho que sair. Até tenho medo de si, ui... Mas bom, se tem que ser… No entanto, enquanto aqui está ponha-se à vontade, se quiser pode descalçar-se.

Leonor sorriu, Não diga duas vezes senão ainda aceito.

Mas seria um gosto, Madame, até me ofereço para lhe massajar os pés. Veja lá, pense bem… E um café, aceita?

Isso aceito, sim senhor.

Duarte ligou à Secretária, Mais um cafézinho para mim e outro aqui para a nossa Doutora.

Quando a Secretária entrou, estava Duarte a assoar-se,  O Doutor devia pedir para analisarem a qualidade do ar aqui na sua sala, isso ou é do ar condicionado ou da alcatifa, anda permanentemente com alergia.

Duarte riu-se, Devo ter ar de bebé para todas as mulheres quererem tomar conta de mim... Isto não é defeito, Senhora, é feitio…! Rinite alérgica já lhe disse, coisa de família, em vez de sair com sangue azul saí com nariz a pingar. E não é só daqui, é em todo o lado. Dantes chamavam-lhe febre dos fenos, agora como já nem palha temos para comer, chamam-lhe rinite.

A Secretária saíu a rir.

Leonor pegou na conversa, Desde que o conheço, ainda estávamos lá do outro lado, já você sofria dessas alergias, não era?

Duarte riu-se, Já nem ligo. Devia pôr uns sprays, umas tretas, até devo ter isso para aqui, mas nunca me lembro. Mas então, Doutora, se é para brincarmos aos doutores, eu dispo-me e deito-me aqui no sofá para você encostar o ouvido ao meu peito a ver se a respiração está boa. O que me diz?

Leonor sorriu mas não deu saída. Duarte, você anda com algum problema?

Duarte soltou uma bem humorada gargalhada, Com algum?! Só com um…?! Era bom, era. Eu ando é com mil problemas. Não lhe contei já ontem? Mil. Mil! Até o gato está doente, imagine. E parece que agora entra água pela janela da cozinha. E a vedação do jardim tem que ser reparada. E aqui uns não compram, outros não pagam. E o Natal está à porta e a minha mãe e a minha sogra não se podem nem ver. E eu não suporto os meus cunhados. E o meu telemóvel anda marado, descarrega num instante. Continuo ou já chega?

Leonor sorriu. Problemas desses todos temos.

Duarte olhou-a de soslaio. Todos? Todos não. Você não. Você é a Miss Maravilhas, a si nada a afecta nem infecta. Tudo sempre em cima. 

Olhe que não, Duarte, olhe que não. Não tenho rinite crónica nem nenhum gato doente, nem sogra nem vedação mas tenho outros problemas.

Duarte riu-se, Deixe-me adivinhar. Cama fria?

Leonor empertigou-se, Não se estique, não vá por aí. E estou a falar a sério. 

E, então, encheu-se de coragem. Duarte, desculpe, é mesmo só porque quero ajudar... mas sou levada a crer que você está com problemas de dinheiro.

Duarte encostou-se para trás, riu, Olha! Que grande descoberta. Mas haverá alguém neste país que não o esteja?

Leonor sentia o coração a bater mais acelerado, Duarte estou a falar a sério. São já vários os indícios. Várias coisas não andam a bater certo. Se tem algum problema pode dizer-me, quero ajudar. 

Duarte ficou sério, agora parecia um pouco assustado, Um ou outro problema sem importância, coisas pontuais, nada de mais. Logo que eu tenha sossego, trato de tudo. Já lhe disse. Tanto drama por causa de uns míseros trocos.

Uns quantos mil euros, Duarte, aqui na empresa. Diz que tem as notas de despesa para regularizar e nada, o tempo passa e nada e nem é só pelo dinheiro, é que não podemos dar esta imagem, de uma certa balda. Não percebe? E vão aparecendo uns e outros indícios mais. Alguma coisa há.

Duarte reagiu tentando aparentar naturalidade, Se me derem dois ou três dias para procurar papéis nos bolsos dos casacos, na pasta, nas gavetas e para os pôr por ordem, acaba-se o dramalhão.

Mas Duarte, esta conversa já vem de há quanto tempo...? E de vez em quando a verba aumenta. Não percebe que não é possível? Que não pode ser? Que, se isto não se regulariza, vou ter que reportar?

Duarte impacientou-se, Porra, outra vez a mesma conversa!  E estava a ficar com o pescoço malhado e já todo agitado.

Leonor assustou-se um pouco, tentou acalmá-lo. Esqueça isso agora. Deixe lá agora os papéis. Mas diga-me: posso ajudá-lo?

Duarte foi peremptório: Pode, chiça. Já lhe disse. Deixe-me em paz.

Leonor olhou-o nos olhos e, sem grande convicção disse: É jogo, Duarte?

Ele atalhou, Não se meta onde não é chamada! E o que é que uma santinha como você sabe da vida para poder julgar uma coisa dessas? Não é jogo nenhum, tenho sorte ao amor não teria sorte ao jogo. Parvoíce.

Leonor fixou-o bem e, enchendo-se de coragem, de facto quase a medo, confrontou-o: É cocaína, não é Duarte? 

Duarte desatou-se a rir, Mas está a viajar na maionese, ó Leonor? Passou-se? Está a ver-me com ar de junkie? Poupe-me. Olhe: e veja mas é se não espalha um disparate desses!

Leonor hesitou, Duarte, não insisto. Mas pense no que anda a fazer. Peça ajuda. Não vou falar com ninguém. Vou aguentar isto por mais algum tempo. Se precisar estou aqui. Sabe disso, sempre estive. Não o vou julgar. Seja o que for. Mas não se destrua, Duarte.

Ele ficou a olhá-la em silêncio. Depois, de mãos nos bolsos, foi até à janela. Fungava, talvez estivesse a chorar ou talvez fosse apenas aquela alergia. 



Leonor esperou um pouco. Teve vontade de se aproximar dele, de lhe pôr a mão no braço. Mas não foi capaz. Depois saíu.

*


A música lá em cima é uma vez mais Agnes Obel, desta vez com Fuel to Fire.

Aos que aqui chegaram hoje, informo que esta história vem no seguimento do episódio de ontem intitulado Leonor e a mulher de Duarte em noite de medos e lágrimas que, por sua vez, já era seguimento de outros sempre devidamente referidos.

Num registo muito diferente, caso tenham vontade de ler sobre a venda - maioritariamnete ao estrangeiro - dos CTT e, a seguir, sobre o inenarrável Bruno Maçães, o Alemão, desçam, por favor, até aos dois posts seguintes.

Permitam ainda que vos convide a visitarem o meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa, onde tenho hoje uma história, A Flor Maior do Mundo, dita por José Saramago.

*

Resta-me, por hoje, desejar-vos uma bela quarta feira. Saúde e alegria!

Bruno Maçães, o Alemão, segundo a imprensa grega ('oh no...', reagiu ele no Twitter); ou o tonto ou a luminária segundo Constança Cunha e Sá na TVI 24; ou o imberbe fanático segundo Daniel Oliveira.



Bruno Maçães, aqui armado em macho man.
(Fotografia obtida no Expresso - fotografia essa que, conforme lá se pode ler, foi divulgada pelo próprio na sua página do twitter )


(Fotografia obtida no site do Governo)
Logo que tomou posse me interroguei aqui se a escolha de tal personagem para Secretário de Estado dos Assuntos Europeus seria piada. 

Há casos em que a intuição não falha. Uma anedota parecia estar a preparar-se.

E a anedota aí está, à vista do mundo.

José Sócrates divulgou o caso no domingo na RTP: numa reunião na Grécia, Bruno Maçães armou-se em Lili Caneças, uma finesse acima da carne seca, deu um chega para lá nos países do sul e foi mais alemão que os alemães no ataque cerrado aos interesses dos países que têm vindo a ser prejudicados neste processo de ajustamento. De tal forma foi que os jornais se referiram a ele como 'o alemão' - e não foi por ele ser alto, espadaúdo, louro e de olhos azuis.


Ouvi e não me espantei: que outra coisa seria de esperar...?

Nestes últimos dias não se tem falado noutra coisa pelo que não é por ser tema novo que aqui o trago. 

Apenas o faço porque quero que aqui, no Um Jeito Manso, fique registada mais esta aventura dos colaboradores de Passos Coelho. E, em vez de me pôr a repetir o muito que se tem dito, permitam que vos recomende o artigo de Daniel Oliveira no Expresso: Os imberbes fanáticos de Passos Coelho.


Para os que não queiram ler o artigo todo, transcrevo alguns pontos:

"Bruno Maçães (...) escreveu no Expresso Online, no Diário Económico e num blogue de direita. Justiça lhe seja feita: nunca escondeu a sua alma radical. Fã de Sara Palin - que "representa o melhor da democracia americana"  -, recebeu a troika e a austeridade de braços abertos. (...) Não deixa de ser assustador pensar que alguém que espera que uma intervenção externa no seu país "seja para durar" venha a ser um dos principais assessores políticos do primeiro-ministro desse mesmo país? 


(...)

Como não falta sentido de missão ao jovem assessor, resolveu oferecer o seu "génio político"  a um país tão carente de neurónios e assim contribuir para erradicação do flagelo da estupidez nacional, atenuando o incómodo que tantas vezes o assaltou: "há alturas em que me convenço que as pessoas à minha volta não são particularmente brilhantes

(...)
Como já tinha dito em Portugal, Maçães reafirmou que não vê grandes vantagens em alianças entre Portugal e a Grécia, Espanha, Itália ou até França.
(...)

É natural que, por essa Europa fora, esta imberbe pandilha cause admiração e espanto. Como se pôs um país que está a viver uma das piores crises da sua longa história nas mãos destes aprendizes?"



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Sobre a privatização dos CTT que leva a propriedade de mais de metade da empresa para fora do País, o que deixou os Secretários de Estado todos contentes (a sério...!) falo no post já a seguir. De passagem, falo também de Marques Mendes, essa criaturinha que por aí anda a espalhar uma coisa e o seu contrário, e falo dos juros da dívida da maravilhosa operação de troca da dívida.

**

(A ver se ainda cá volto com mais um episódio da história da Leonor.
Hoje se calhar não vou responder aos comentários para ver se tenho tempo para a história. )

terça-feira, dezembro 03, 2013

'Mais de metade dos CTT vendidos fora do país' - "É um sucesso que nos dá conforto e segurança", rejubilam os Secretários de Estado Manuel Rodrigues e Sérgio Monteiro, ambos de bandeirinha na lapela. Como se poderá classificar esta atitude...? Patriotismo de pernas para o ar? Demência? Governar com os pés?


O que está escrito no título poderia ser uma piada de mau gosto mas é a dura realidade. Estamos a ser governados por quem deita foguetes de contentamento quando vende as jóias da coroa (e os CTT têm sido até agora uma das jóias da coroa, gerando um enorme cash flow, pagando enormes impostos e distribuindo generosos dividendos ao patrão Estado) ao estrangeiro. 

Esta gente critica muito da Constituição mas eu, que nunca a li, pergunto: e não haverá lá nada que proíba esta venda ao retalho e a preço de saldo de empresas estratégicas a entidades estrangeiras?! 

E, se não houver, o que está Cavaco Silva a fazer em Belém que não atende a nenhum dos muitos sinais de alarme que estão a tocar há bastante tempo?

Isto que está a acontecer é um drama. 

Manuel Rodrigues com a bandeira na lapela

Sérgio Monteiro com a bandeira na lapela

Além disso o que agora está a ser vendido representa 70% do capital dos CTT - e mais de 50% já vão voar para fora do País. 

Dentro de meses serão postos à venda os restantes 30% e, nessa altura, o Estado fica sem nada desta preciosa e emblemática empresa e, muito provavelmente, vai quase tudo para fora de Portugal. Uma tristeza. Uma pena. Uma coisa revoltante.



Quase me apetece enfiar-me debaixo duma mesa e pôr-me a chorar de impotência e raiva perante aquilo a que se está a assistir.

É que, além disso, esta venda é pura opção deste desGoverno pois, em termos de troika, os objectivos já estavam até ultrapassados. Isto é mesmo opção desta gente que demencialmente acha que exportar jovens e vender empresas ao estrangeiro é uma coisa boa. 

O Governo de Passos coelho e Paulo Portas estará a querer desertificar o país para depois o venderem às postas? 


Pergunto isto e vejo que eu própria já estou atrasada no meu raciocínio: a quantidade de casas e de propriedades que já estão a ser vendidas a estrangeiros mostra que o próprio país já está a ser estraçalhado a toda a velocidade na boca destes pitbulls.



*

Estou a escrever enquanto ouço Marques Mendes, essa criatura de fraca envergadura (e não me refiro à física), na SIC N, a cantar vitória com o facto da albuquerca ter dado mais um pontapé na dívida, empurrando-a para os próximos anos e aceitando trocar os juros actuais por outros que são quase o dobro, juros agiotas. 


Repito o que disse ontem: não é mau reestruturar a dívida. Mau é fazê-lo de forma incompetente e sem ser por bons propósitos.  Muito mau.


Acho que se combinaram todos erguer uma cortina de conversa fiada e de banha da cobra para continuarem a enganar os incautos. 


Posso eu ser branda ao falar nisto...? Não posso. Brandos face a tudo isto são os que, de três uma: 
  • Ainda estão na ignorância 
  • Ou são cúmplices desta política selvagem e despudorada
  • Ou são cobardes.
Não encaixo em nenhum dos 3 grupos. Temos pena.

*

Esta última imagem provém, como se vê, do blogue We Have Kaos in the Garden.

Leonor e a mulher de Duarte em noite de medos e lágrimas





Ao fim do dia Afonso enviou um mail a Leonor dizendo: 6º de temperatura no máximo. Persiste na maluquice de ir andar à noite para a beira do rio?

Leonor respondeu: Está dispensado (aliás só costuma ir porque quer). Hoje vou fazer compras de natal.

Afonso respondeu: Para isso ainda é preciso mais coragem. Até amanhã então, vou sair. Porte-se bem, olhe a austeridade, não gaste o que não tem. Mas para mim não se iniba, gaste à vontade.

Leonor não estava para graças. Respondeu apenas: :)

Mas não foi fazer compras. Pelo caminho foi ouvindo Riverside, recomendação do seu bom amigo. Dirigiu-se ao rio mas não saíu logo do carro, deixou-se ficar a ouvir uma e outra vez, olhos fechados, o pensamento em círculo, E agora? E agora faço o quê? E só pensava no problema que tinha em mãos e na agressividade de Duarte. Tomara ter alguém ali a seu lado.
Why do I go here all alone, dizia a canção
Depois foi andar sozinha, o ar muito frio, o coração apertado, as mãos nos bolsos. Tanto, tanto frio, uma maresia aguda, uma preocupação que não sabia com quem dividir.
Down by the river by the boats 
Where everybody goes to be alone 
As noites assim junto ao rio têm um mistério que encanta os apaixonados mas que assusta quem por ali anda desprotegido. Leonor sentia o frio tão frio, o ar húmido, a aragem cortante. E mantinha a passada certa, apressada, avançava contra os medos. Tantos os medos.
Down by the water the riverbed  
Somebody calls you somebody says 
swim with the current and float away 
Depois, gelada, cansada, conduziu até casa e tomara que tivesse antes sido para bem longe, que tivesse flutuado nas frias águas do rio para outro continente, e foi ouvindo a mesma música uma e outra vez.

Quando estava a chegar a casa, desejando um duche bem quente e demorado, tocou o telemóvel. Não conhecia o número. Estranhou uma chamada de um número que não identificava àquela hora. Hesitou mas pensou que, se fosse algo de mau, não teria o número visível. Atendeu.
- Leonor?
Quem fala?
- É Maria João, mulher do Duarte. 
Leonor atirou-se para o sofá, aterrada, como que um antecipado sentimento de culpa. O que seria? Àquela hora? Algum acidente?

Sim, sou eu. Diga. Aconteceu alguma coisa?
Um silêncio do outro lado e depois, em voz ansiosa, Não sei, acho que sim mas não sei. O meu marido não anda nada bem. Anda muito nervoso, anda estranho, não dorme, grita com os miúdos, hoje falou-me em demitir-se, em ir para fora. Diz que está com problemas na empresa, que discutiu consigo, por isso lhe estou a ligar, procurei o seu número no telemóvel dele. Desculpe-me mas é que não sei o que fazer, não sei o que se passa.
Leonor sentiu-se trémula. Cheia de frio. Cheia de medo. Medo também de estar a empolar uma coisa sem importância. O que dizer?
- Está?
Estou, sim. Estava a ouvi-la.
- Desculpe, é que não a ouvia. Desculpe estar a incomodá-la a esta hora mas é que ele saíu de casa agora, ia desnorteado, nervoso, discutimos, discutiu com os filhos, e eu sem saber a quem pedir ajuda, mas não estou a pedir ajuda, estou só a querer perceber, desculpe a esta hora.
Deixe, não tem mal. Mas não sei bem o que lhe dizer. Ele anda nervoso, sim, mas acho que é o normal, é a pressão normal, se calhar ele anda mais cansado, são fases, passam, se calhar não há razão para preocupação, talvez ele devesse descansar.
- Mas ele disse que teve uma discussão consigo, que nunca esperaria isso de si. Eu em condições normais nunca lhe telefonaria por causa de uma coisa destas mas, da maneira que o vejo, já nem sei o que hei-de fazer e se pergunto é porque se eu soubesse o que se passa talvez pudesse ajudá-lo, não sei.
Mas não foi nada de especial, coisas de trabalho, diferentes maneiras de ver as coisas, nada de mais.
- Mas a empresa está mal, não está? Não sei se é também isso que o está a deixar preocupado.
Mal? Não. Mal não. Passamos por uma fase muito difícil, a conjuntura é a que se sabe mas, enfim, dadas as circunstâncias até não nos podemos queixar.
- Ah, pensei... como deixaram de pagar prémios e como cortaram os ordenados, pensei...

Leonor fechou os olhos, pôs a mão na cara, apeteceu-lhe chorar. Ficou sem saber o que fazer. Meu Deus. Duarte, Duarte, o que se passa?, pensou.
- Está?
Estou. Estou muito cansada, sabe. Tinha acabado de chegar a casa. Não me leve a mal. Percebo a sua preocupação mas não sei bem o que lhe dizer. Talvez convencer o Duarte a ir ao médico, a tirar uns dias. Mas deixe estar que eu amanhã vou conversar com ele. Depois, se eu achar que devo falar consigo, descanse, eu falo. 
- Obrigada. Agradeço. E desculpe a maçada. Obrigada.

Leonor desligou o telemóvel, pareceu-lhe que a mulher do colega estava a chorar ou a controlar-se para não chorar. Deitou-se no sofá, tapou-se toda com uma manta, cabeça e tudo, e desatou a chorar. Tanto o estranhamento, tanto o medo pelo que se poderia estar a passar, tanta a impotência. Em silêncio ouvia-se a perguntar, Duarte. Duarte o que se passa?

No dia seguinte tentaria falar com ele num outro registo e tomara que não se estivesse a passar nada de grave mas estava com um mau pressentimento. Adormeceu ali mesmo no sofá, a tremer.


*

  • A música linda, linda, é Riverside de Agnes Obel (e o vídeo merece também ser visto com atenção).

  • Para um registo nos antípodas, para saberem a minha opinião sobre o grande feito da troca da dívida da troca-tintas-albuquerca e, a seguir, sobre as arrecuas da cobra-crata, é descerem, por favor, até aos dois post seguintes.
  • Num formato um pouco diferente do habitual, tenho hoje o meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa onde tenho poesia dita por Eugénio de Andrade e as minhas palavras perdem o tino por causa de um certo Green God. Muito gostaria de vos ver por lá.

NB: Hoje, uma vez mais, não consigo reler o que escrevi, passa das 2 da manhã e o sono é mais que muito. Já sabem, qualquer coisinha relevem, está bem? Mas coisas graves, avisem-me, sim?


*

E resta-me desejar-vos, meus Caros Leitores, uma bela terça feira!

Trocar dívida por dívida em vez de a pagar. Pagar mais juros para não pagar o que se vence agora. É isto um grande feito do Governo de Passos Coelho?... É o tanas. Isto é apenas aquilo a que se chama reestruturar a dívida. Até podia ser uma coisa boa se fosse por uma boa causa (por exemplo, para evitar o empobrecimento do País através de uma política criminosa de austeridade). Assim é apenas empurrar com a barriga, é apenas mais um barrete.


No post abaixo falo de mais uma barraca de Nuno Crato, o recuo de gatas em relação ao exame a que queria sujeitar todos os professores contratados. E falo de assessores do Governo com vinte e tal anos e que, muito justamente, têm como hobby jogar playstation.


Agora aqui falo do que se anuncia como um feito: por todo o lado ouvi os papagaios do regime passista a cantarem vitória com esta manobra financeira da troca da dívida, pagando juros mais elevadas - que isto é um bom sinal, que isto revela a confiança dos investidores em nós. Uma conversa que até me dá ânsias, vinda de quem vem. É a Maria Luís Albuquerque, é o Paulo Portas, é o Arnaut e mais toda essa gente que há uns dois anos rasgou as vestes de revolta por terem ouvido Sócrates dizer que a dívida é algo que se gere. Nessa altura toda essa gente esgalgou as goelas: gerir a dívida??!!! Qual quê??!?! A dívida é para pagar! Toda! Já! Em nome dessa profissão de fé toda essa gente ditou e aceitou esta louca política de austeridade cega.


Ora que toda essa gente pare para pensar - se é que têm neurónios em número suficiente para o fazer (coisa de que muito justamente toda a gente duvida). 

Dois anos e meio de austeridade deram em quê?  Que dívida é que já pagaram? A que pagaram foi para se irem endividar noutro lado. Pelo contrário não têm feito outra coisa senão aumentar a dívida. Estava em 90% do PIB e já lá vai em 130%.

Falavam de Sócrates que aumentava a dívida para arranjar estradas, pontes, escolas e outros luxos que tais.

Pois bem. Com isso deu emprego a muita gente, criou riqueza e fez com que muita gente pagasse impostos para sustentar a saúde, a educação, a segurança, etc .

Estes incompetentes não arranjaram escolas, não fazem estradas, nada, nada, nada. Não dão trabalho a ninguém, causam falências, estão a destruir o tecido económico e social do País e... para quê? Para aumentarem a dívida da forma destrambelhada a que estamos a assistir.


E agora, em vez de pagarem a dívida, trocam-na por outra... e por aí andam cantando vitória?

Trocar a dívida por outra de mais longo prazo, negociar juros mais baixos, é coisa normal e chama-se reestruturar a dívida e é coisa que vem sendo pedida por toda a gente com dois dedos de testa desde o início e sistematicamente negada por Passos Coelho e seus seguidores - mas isso deve ter como objectivo único o de conseguir um alívio para que a economia possa relançar-se, para gerar crescimento, para que, de facto, se consiga depois pagar a dívida. Agora, da forma como estes inteligentes estão a fazer, é apenas a prova da capitulação, do erro, do embuste. Não pagam, não porque queiram aliviar a austeridade e fomentar o crescimento, mas porque não podem.


Papagaios, camaleões, cambada, gente sem vergonha. 


*


Sobre devolução dos 20 euros dos exames aos professores contratados há mais de 5 anos, é descerem, por favor, até ao post seguinte.

segunda-feira, dezembro 02, 2013

Depois de Nuno Crato recuar em quase toda a linha na questão dos exames aos professores contratados, inclusivamente devolvendo os 20 euros que lhes tinha extorquido, depois do Helder Rosalino ter recebido os sindicalistas que 'invadiram' os ministérios, depois de nomearem para chefe da PSP o responsável pelos polícias que não impediram os outros de avançar escadaria da AR acima, o que mais nos espera? Passos Coelho convidar Mário Soares para ser o candidato do PSD à Presidência da República...?!?! Só pode, né?


A cobra sibilante, essa criatura que destrói de forma sistemática o edifício do ensino público em Portugal, estraga mesmo tudo onde toca. Tudo. Com aquele seu ar de ratazana sombria e sorridente, só faz porcaria, só, só. Mas aparece sempre com aquela sua voz de mamar doce a fazer de conta que está tudo bem, que estava tudo previsto desde o início. Uma coisa e o seu contrário para ele é tudo igual e, pelo caminho, vai ficando um rasto de descrédito, de falta de carácter, de insustentável leviandade, desrespeito pelos outros (neste caso, acima de tudo, desrespeito pela classe docente) e falta de vergonha na cara.

Depois de ter inventado essa sevícia de obrigar os professores contratados a pagarem uma prova que poderia servir para os lançar no desemprego e de ter inventado toda a espécie de absurdos argumentos a defender a imprescindibilidade desse exame, eis que hoje, depois de uma reunião com a UGT, aparece de marcha atrás a dizer que assim é que é bom, ai tão bom, todos na maior amizade, e que afinal aquela prova que ia purgar os ignorantes que nem escrever sabem, só vai ser feita para a minoria que ensina há menos de 5 anos. E que até vai devolver o dinheiro a todos os outros...! 


Nem mais!

Mal fora que lhes ficasse com o dinheiro mas daqui lanço uma pergunta ao ex-matemático Crato: sabe quanto é que esta sua brincadeira de mau gosto vai custar aos contribuintes?

Fazer os exames, distribuí-los, arranjar mecanismos de cobrança, e agora arranjar mecanismos de devolução do dinheiro, com toda a carga administrativa associada, quanto custa? Quanto?! E para nada. Dinheiro gasto para nada. 

*

Hoje estive a fazer baby sitting à hora de almoço e, depois do meu amor pequenino que está adoentadinho ter adormecido, entretive-me a ler a Sábado. Mais valia não ter lido: assessores e mais assessores no Governo, resmas deles, paletes, uma gaiatagem inexperiente, um que até tem como hobby jogar playstation, putos de 20 e tal anos sem experiência profissional de qualquer espécie. A ganharem belos ordenados para serem assessores, imagine-se...! Certamente para assessorarem outros tão ou mais ignorantes que eles.


E nós, meus Caros, a pagarmos esta desbunda. Não há dinheiro para as reformas, não há para os subsídios de desemprego ou para os abonos de família, não há para pagar os ordenados dos trabalhadores a sério - mas há para pagar a esta miudagem, tal como há para pagar pareceres a advogados, a agências de comunicação e a outros redis de boys e acólitos.

E ainda querem que eu me modere e use palavras doces para falar de gente tão estúpida e incompetente? 

Bolas para isto!

*

As imagens, como é bem patente, provêm do extraordinário blogue We Have Kaos in the Garden.


Duarte e Leonor (as coisas começam a complicar-se)





Dia de reunião de Direcção. Manel à presidência, o Dr. Lampião de um lado, Leonor do outro e todos os restantes à volta da grande mesa oval.

Os dados da empresa são apresentados, as vendas, os custos, as margens, a evolução dos projectos, elementos relativos a recursos humanos, a assuntos jurídicos e fiscais. Cada um se vai pronunciado sobre a sua área, a reunião vai avançando.


Quando chega a vez de Duarte, que está anormalmente mal humorado, as coisas começam a complicar-se. Engana-se, faz afirmações que não consegue sustentar, desculpa-se sem fundamentação, não consegue explicar porque continua aquém dos objectivos e tudo debaixo de um nervosismo que chega a incomodar. Quando o presidente o confronta e lhe pede que tente conduzir os assuntos de outra forma, com uma inesperada agressividade responde que só se receber ordens por escrito. Os outros entreolham-se, o clima não costuma ser este, as coisas andam complicadas, toda a gente o compreende, mas Duarte parece não se esforçar, ou não se empenhar suficientemente. Parece que há ali qualquer coisa que não anda a bater muito certo.

Quando diz aquilo de querer ordens por escrito, faz ao mesmo tempo um gesto brusco, como que com vontade de se levantar. Nessa altura, toda a gente em silêncio, Manel diz secamente, Duarte, se não estás bem mais vale que saias da sala.

Duarte levanta-se precipitadamente quase fazendo cair a cadeira e sai, batendo com a porta.

Leonor troca olhares de espanto com Afonso e com o Dr. Lampião. Qualquer coisa se está a passar.

A reunião prossegue sem que ninguém comente o que se passou. Dir-se-ia que nada de incomum aconteceu, todos aparentam a serenidade usual.

Quando a reunião está prestes a terminar, abre-se a porta e eis que Duarte está de volta, sorridente, bem disposto, aquela alegria esfuziante tão sua característica, ainda com o sobretudo, cachecol e óculos de sol, despenteado, percebe-se que deve ter ido dar uma volta. Manel pergunta-lhe, Então, já esfriaste as ideias? 

Duarte riu, bem disposto como se estivesse a entrar de novo e viesse para a paródia, Peace and love. Dei vinte voltas ao quarteirão e, com o griso que está lá fora, esfriei logo a cabeça. Estava na esperança que já tivessem acabado para desandarmos daqui e nos irmos atirar ao bacalhau da ordem.

Manel manteve-se sereno, Estamos quase.

Até a reunião acabar, Duarte mexeu-se na cadeira, puxou as meias bem até aos joelhos, fez desenhos, meteu-se com os colegas do lado, bebeu água como se não houvesse amanhã, piscou vezes sem conta o olho a Leonor. 

Afonso disse, Este gajo tem bicho carpinteiro. Manel riu-se na direcção de Duarte, Eras hiperactivo em criança se bem me lembro, certo? 
- Hiperactivo e precoce. Lembras-te da prima Zezinha?
Manel sorriu, Está calado e presta atenção senão terei que te convidar outra vez a ires dar outra curva.

Quando a reunião acabou e iam a pé para o restaurante, Leonor ia conversando com o seu amigo Dr. Lampião, como ela lhe chamava. Viu bem aquele despropósito, Leonor?

Estranho, não foi? As coisas não andam bem com ele. Será que está com algum problema? Primeiro num nervosismo que até contagiava, a seguir entra numa euforia disparatada. E os resultados na área dele andam péssimos e, sinceramente, ainda não consegui perceber bem porquê.
- O Manel tem uma paciência ilimitada com ele.
São primos, é natural que tente não arranjar problemas. É o mal de ter família próxima nas equipas. Ainda por cima o Duarte parece que anda nem sei bem como dizer, desorbitado ou lá o que é.

Estavam eles nisto, aparece o Duarte por trás, põe-se entre os dois, um braço por cima dos ombros de cada um, todo brincalhão, Então os pombinhos…? E dirigindo-se ao colega mais velho, Um dia ainda vou dizer à Maria Alice deste seu affair aqui com a nossa brasa.

Leonor, nem reagiu habituada que está a brincadeiras deste tipo, mas perguntou, Mas então, Duarte, que diabo foi aquele desacerto ao princípio? Passou-se ou quê? E era lá caso para isso? Não percebi.

Duarte riu-se, TPM, Leonor, TPM. Não dizem que toda a gente tem os dois sexos? Pois bem, eu tenho o meu lado de gaja muito activo nestes dias, fico com uma neura que não lhe digo nada. 

E afastou-se a rir para se ir meter com outro. Leonor chamou-o, Espere. Daqui a nada vou ter consigo.

Duarte riu-se, Com certeza. Vou estar à sua espera. Para não darmos nas vistas, desta vez pode ser naquele hotel da Praça de Espanha?

Leonor sorriu e respondeu, Não me confunda com a sua namorada. ... Praça de Espanha, então? É lá que se encontram? … Mas agora a sério, depois de almoço vou lá ter ao seu gabinete.

Simulando desilusão, ele respondeu, Pronto, se não quer ir ter ao hotel, recebo-a nos meus aposentos. Mas vou ter a lareira acesa para estarmos mais confortáveis, pode ser? E lá foi, rindo, fazendo-lhe adeus, e a meter-se com toda a gente.

Leonor fez-lhe também adeus na brincadeira. E tranquilizou-se. Bem disposto como Duarte estava, a coisa iria, certamente, ficar resolvida.

O almoço foi a boa disposição de sempre. Ninguém abordou, nem sequer ao de leve, o destempero matinal de Duarte.

Entre Leonor e Afonso não transpareceu mais intimidade do que entre quaisquer outros. Manel também não demonstrou qualquer acinte em relação a Duarte e este também não mostrou nem sombra de constrangimento pelo sucedido. O normal, portanto: gente civilizada é assim.

Depois de almoço, tal como combinado, Leonor dirigiu-se ao gabinete de Duarte. Estava ao telefone, todo divertido, contando piadas, rindo. Fez sinal a Leonor para se sentar na mesa de reuniões.

Quando acabou o telefonema, Leonor perguntou, Então, Duarte, é hoje?

Ele sentou-se à sua frente, sério, ar de quem se ia confessar.

Não vai acreditar, Leonor, mas não tive tempo. Não queira saber, aqui, como sabe, é um stress, só chatices, só reuniões, almoços, jantares, um pincel, e em casa, ou é a minha sogra com achaques, ou é a minha mulher que já nem dorme à espera dos telefonemas da mãe, ou são os miúdos, um que chega às tantas da manhã e se balda às aulas, outro que tem treino nem sei onde, ela que muda de namorado como de toilette, ou se põem a discutir uns com os outros e todos com a mãe, uma tourada. Tive lá eu tempo de tratar daquilo… Ora! E não tem mais nada com que se preocupar? Mas também qual é a pressa, Leonor? Já agora gostava de perceber.

Leonor levantou-se, Qual é a pressa? Eu não quero acreditar, Duarte! Está a gozar comigo? Sabe o que é que começo a achar? Que a coisa é séria. E, se é séria, não vai ser ao meu nível que se vai resolver.

Duarte pegou nos papéis que estavam à sua frente e afastou-os com violência. A ameaçar-me? Tem graça isto: a Leonor a ameaçar-me! Ao que chegámos…!

Leonor manteve-se imperturbável. Isto está a arrastar-se para além do razoável. Tenho vindo a dar o tempo que tem pedido mas acho que já passou tudo o que é normal. Não dá, Duarte. O que se passa? 
- Não passa nada, caraças!
Caraças?! 
- Sim, Leonor, caraças. Vá para o caraças!, e já aos gritos.
Mas você está doido… Está com algum problema, Duarte?
- Não me chateie. Não tenho problema nenhum. Ou melhor: tenho um problema sim. Chama-se Leonor. Olhe, ponha-se mas é  fora do meu gabinete.
Leonor saíu, tentando conter o nervosismo. Alguma coisa se estava a passar com Duarte, agora já não tinha dúvidas. Que situação. E agora?

Quando foi ter com o seu amigo para trocar impressões, já ele tinha saído. A Secretária disse, Já lá foi de férias, todo contente por ir rever o neto. Leonor sorriu mas pensou na falta que ele lhe ia fazer com os seus preciosos conselhos - conselhos sempre short and sharp mas infalíveis.

Leonor estava francamente preocupada, sem saber o que fazer. Sem querer contar a ninguém, não parava de pensar, um pouco atordoada, Que situação... Caraças!


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  • Este episódio vem na sequência de um outro, um bocado lá mais abaixo, intitulado 'Leonor, a mulher' que, por sua vez, já era sequência de outros. 
(De vez em quando dá-me para escrever em directo, sem rede, estes folhetins blogosféricos. Cada maluco com a sua maluquice.) 

  • A música lá em cima é Katie Cruel interpretada por Agnes Obel  

  • Permito-me informar que, já aqui abaixo, poderão ler, ouvir e ver um interessante testemunho sobre a perigosidade da austeridade. É Mark Blyth e podem crer que ele sabe do que fala.
  • E, como se não bastasse, muito gostaria ainda de vos convidar a irem de passeio até ao meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa. Hoje, para além da boa música e vozes africanas, tenho as palavras voadoras sem tecto, sem chão, sem dono, de E. M. de Melo e Castro e o que eu gostei de andar de balouço com ele nem vos conto.

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E, por hoje, por aqui me fico. 
Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma semana muito boa a começar já por esta segunda feira. 
Apesar de fria e de ser segunda feira, um dia sempre ingrato, pode ser boa - porque não?

domingo, dezembro 01, 2013

A austeridade é uma ideia perigosa - digo eu, diz Mark Blyth e diz toda a gente que tem mais do que um neurónio. Estamos a precisar é de ressuscitar o Dia da Restauração que isto de estarmos nas mãos de quem funciona com um único neurónio - e ainda por cima um neurónio coxo - é uma grande chatice.


Domingo não é o melhor dia para falar de coisas sérias mas o facto é que, se me ponho a escolher dias, tantos são os assuntos que convocam o meu interesse que alguns acabarão por ficar para trás.

Austeridade. Vou voltar ao tema da austeridade, esse muro que levanta uma barreira entre os liberais e os humanistas. (Sei que esta dicotomia não é lá muito canónica mas escrevo antes de pensar e tenho tanto que fazer aqui hoje que não me posso deter em taxonomias. Adiante).

De vez em quando, se algum indignado levanta a voz, aparece o usual coro de ofendidos clamando contra a violência da linguagem. Sendo Portugal o país por excelência dos brandos costumes e da suprema mansidão, se alguém chama os bois pelos nomes, aqui d'el rei que não havia necessidade, que nisto, até ao fim, há que manter os punhos de renda.

Pois bem, que os usem até que a guilhotina caia sobre o seu próprio pescoço quem gostar de se deixar matar por delicadeza. (Disse Rimbaud: Par délicatesse j' ai perdu ma vie - mas ele foi um afortunado: perdeu a vida e voltou para o contar; não se fiem em igual milagre os delicados desta vida).

A questão é que toda a política que está a ser seguida em especial em Portugal - onde nos coube, por pouca sorte, um governo da mais infeliz indigência mental - é não apenas errada como perigosa. E o drama maior é que não estamos a falar de uma teoria académica que está grosseiramente errada mas de uma burrice passada à prática, de um brutal sacrifício que está a ser infligido à grande maioria da população e que continuará a causar danos por muitos e muitos anos.


O empobrecimento e o retrocesso civilizacional que está a ser imposto a Portugal não resolvem nenhum problema, nenhum - pelo contrário só os agravam. 

Muito gostaria que dispusessem de uns minutos do vosso tempo para ouvirem Mark Blyth, professor de Economia Política na Brown University que esteve a semana passada em Portugal para uma conferência na qual se discutiu se a austeridade cura ou mata. 





Muito interessante também a entrevista que passou na TSF e que pode ser ouvida dobrada em português. Seria bom que os que, tendo um número normal de neurónios, deixaram que eles se afogassem aquando das lavagens à cabeça a que se deixaram submeter, tentassem ver as coisas segundo esta perspectiva e percebessem que a dívida aumentou 40 pontos percentuais desde que Passos Coelho tomou conta do Governo (passou de cerca de 90% do PIB para 130%), o défice continua bem longe das metas, o desemprego está umas centenas de milhares acima do que era suposto, os jovens qualificados saem do País aos milhares e milhares, toda a gente está mais pobre (excepto Américo Amorim e mais uns happy few) e por aí fora.


Que ninguém se deixe iludir, pois, que ninguém se deixe tomar por parvo.

*

Este texto está a ser escrito no dia 1 de Dezembro, Dia da Restauração


"Nigela Lawson é viciada em cocaína e em comprimidos". "Bárbara Guimarães é alcoólica e também viciada em comprimidos". Ambas são figuras destacadas no panorama televisivo, ambas conhecidas também pela sua sensualidade. Divorciaram-se ambas na sequência de queixas de violência doméstica por parte dos maridos, maridos esses, respectivamente Charles Saatchi e Manuel Maria Carrilho, que, desde que as acusações vieram a lume, têm feito uma sistemática campanha para arrasar a imagem das ex-mulheres. Não sei se são culpados das acusações de agressões mas lá que são responsáveis por violentas campanhas de violência mediática, lá isso são. E escrevo isto quando sei que este sábado foi morta outra mulher (Celina, 47 anos, Castro Verde) na sequência de longo historial de violência doméstica. A 34ª vítima este ano.


Há uns meses atrás o mundo foi surpreendido ao ver a sensual Nigella a ser agredida em público, num restaurante, pelo marido. Na sequência disso ela pediu o divórcio e ele viu a sua reputação arrasada.

Mas eis que agora os jornais estão cheios de uma revelação não menos surpreendente. Nigella nos últimos 10 anos terá sido consumidora de cocaína e de comprimidos em larga escala. O marido, o milionário Charles Saatchi, nunca desconfiou. Supostamente, como contrapartida para se manterem caladas e sobretudo para que o marido nem sonhasse com o que se passava, as duas ex-assistentes dela, as irmãs Grillo, teriam tido permissão da Higella (como agora Saatchi lhe chama numa alusão ao seu suposto estado de pedrada - high) para gastarem o dinheiro que quisessem com o seu cartão de crédito.


As irmãs foram acusadas de desvio de dinheiro da conta de Nigella e, em tribunal, defenderam-se contando a 'verdade'. Claro que Saatchi não se tem esquivado a dissertar sobre os condenáveis hábitos da mulher, hábitos esses que diz que desconhecia. Por causa disto, já se fala na possibilidade de Nigella ser despedida do Channel 4 onde agora tem estado a trabalhar como júri num programa de culinária. E, seja como for, de vítima rapidamente está a passar a culpada perante a opinião pública.

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Também Manuel Maria Carrilho não se tem cansado de revelar com todo o pormenor os hábitos descontrolados de Bárbara Guimarães que vão desde tomar diariamente dezenas de comprimidos, a beber vinho até à embriaguez, a encher-se de silicone, a viver obcecada com a idade e com o aspecto físico, e sempre de rastos a seguir a cada apresentação de galas ou coisas do género. A partir das entrevistas que ele tem concedido quase ficamos a pensar que, como mãe, Bárbara Guimarães deixa muito a desejar e, que, como pessoa, é fútil e desorganizada.


A semana passada, uma vez mais na fila do supermercado para pagar, deitei mão a uma revista e fiquei, uma vez mais, petrificada com a maldade de Carrilho ao dizer tudo aquilo, com desumano detalhe. Destrói-a. Seja ou não verdade, uma coisa é certa: quem a vir de novo a trabalhar vai olhar para ela de uma outra maneira. 

Bárbara Guimarães regressa aos écrans de televisão este domingo, apresentando o Factor-X. 


Imagino como se deve estar a sentir, a pressão, a insegurança. Como já aqui o disse anteriormente não sou especial admiradora dela mas, independentemente disso, lamento o que lhe está a acontecer e só espero que consiga reunir forças para enfrentar com dignidade este e todos os desafios que tenha pela frente. 


Sofrer humilhações em privado é coisa insuportável. Sofrê-las em público deve ser mil vezes pior. Por isso, é de admirar a força, a coragem, a capacidade de superação que pessoas como Bárbara Guimarães ou Nigella Lawson demonstram quando, depois de tudo o que vêem escrito sobre si próprias, conseguem manter-se de pé, cabeça erguida, a darem o peito às balas. 

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E eu fico a pensar se o que está a acontecer com Nigella Lawson e com Bárbara Guimarães não é aquilo que as mulheres que são vítimas de violência doméstica mais temem: que, apresentando queixa contra os maridos, venham a ser objecto de vinganças, de maldades, de destruição? O que é isto senão uma destruição sistemática, implacável em praça pública? É uma coisa aterradora. É que mesmo que uma consuma cocaína, outra beba, ou que tenham pavor de serem postas de parte nas televisões onde trabalham, ou que façam qualquer outra coisa, isso não deveria nunca ser tão humilhantemente exposto na praça pública onde serão, por muitos, crucificadas e desprezadas. 

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Este sábado Celina, uma mulher de 47 anos com 3 filhos, saíu de casa. Ia levar a filha de 9 anos à patinagem. O ex-marido saíu-lhe ao encalço e, ali mesmo, atingiu-a com um tiro na cabeça. Morreu. A filha de 9 anos terá assistido ao crime. Diz a vizinhança que, quando estavam juntos, era conhecido o historial de violência doméstica. Dizem que, depois da separação, o ouviam dizer que ainda acabava com ela. Acabou mesmo. 




Celina foi a 34ª mulher a ser assassinada este ano em Portugal por maridos, companheiros ou ex. Não entram nesta contabilidade as mulheres cujo carácter é destruído na praça pública e que, não sei como, conseguem continuar a parecer que estão vivas.

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Permito-me informar que, para conhecerem a opinião de outro instigador da violência em Portugal, poderão ler o meu post a seguir onde falo da entrevista do filósofo Rui Nunes concedida ao Expresso deste sábado

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E, por hoje, por aqui me fico. 
Desejo-vos, meus Caros Leitores, um domingo muito bom, vivido em paz.

'Aquilo que me perturba em Portugal é a mansidão' diz Rui Nunes, o filósofo. Não sei o que deu nos seniores, todos a apelarem à violência. É este, é o Mário Soares, é o Papa Francisco (o mais explícito, o mais radical de todos). Isto só visto!




A Europa, tal como está organizada, chefiada por burocratas cínicos, destituídos de cultura, no sentido mais profundo do termo, funciona como uma pátria concentracionária (...)

(...) Porque a Europa vai sentir um dia a ira daqueles que viram morrer os seus como lixo às portas dessa pátria mítica. A Europa vai pagar isto. 

- Quando regressa a Portugal também encontra essa ira dos excluídos?

Não. Aquilo que me perturba em Portugal é a mansidão. Isso é terrífico. Este povo foge, não enfrenta.


[Breve excerto da entrevista concedida por Rui Nunes a Alexandra Carita no Actual do Expresso.]


Rui Nunes tem 66 anos e se calhar também seria classificado como um velho do Restelo pelos ignorantes que assim têm designado Mário Soares e as pessoas que estiveram na Aula Magna (ignorantes esses que notoriamente nem sabem quem foram esses senis, apalermados do Restelo, na volta uns 'tios' já gagás). Digo ´seria classificado' porque sei que a esses ultra-montanos e a essas virgens ofendidas nunca lhes passaria pela cabeça ler esta entrevista de que aqui falo.

Adiante.

E já que parece que os anciãos estão todos a virar uns perigosos revolucionários, uns trauliteiros de primeira, venha daí mais um: Fausto.

O caso é que a minha amiga Leonor manda dizer que tem estado a ouvir as músicas recomendadas pelo seu amigo Dr. Lampião e que, para aqui hoje, vem a calhar o 'Eis aqui o agiota' do Fausto, rapaz com 65 anos acabados de fazer.



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O autor da fantástica fotografia é Spencer Tunik,  fotógrafo muito conhecido por fotografar grandes grupos de pessoas nuas.