terça-feira, agosto 05, 2025

Dar de mamar até as crianças terem 6 anos? Mas está tudo doido ou quê? Poupem-me.

 

Não vi, até agora, nenhuma concretização de jeito por parte do Governo Montenegro. Antes das eleições, já por duas vezes, era vê-lo, fanfarrão: que fazia e que acontecia, era só chegar ao governo, e todos os problemas se resolveriam em 2 ou 3 meses -- e, afinal, como é público e notório, tudo em que tocou ficou ainda mais estragado.

Por isso, não pode haver dúvidas sobre a minha opinião geral sobre a falácia Montenegro. Mas isso não me tolda o raciocínio. Sou, e creio que enquanto tiver a mente a funcionar normalmente, assim serei isenta. Pelo menos, esforço-me por isso. E é assim que hoje vou sair em defesa de Madame Palma Ramalho.

Enfim... mais ou menos...

No que se refere ao tema da legislação laboral, continuo sem perceber qual a necessidade de tanto fuzuê. Trabalhei durante anos e anos e nunca vi que a legislação fosse um problema. Saídas por negociação, saídas por extinção de posto de trabalho, saídas por despedimento com justa causa ou mesmo despedimento colectivo são o pão nosso de cada dia. Sem espinhas.

Claro que não se consegue despedir, unilateralmente falando, alguém só porque sim. Pode não se gostar nem um bocadinho de uma pessoa, pode saber-se que é um traste de primeira, que é uma pessoa tóxica ou psicopata, e, ainda assim, não conseguirmos livrar-nos dela. Sei do que falo. Passei por situações em que toda a gente queria ver uma doida varrida pelas costas: má profissional, má colega, perigosa mesmo. Em relação a mim, por diversas vezes, usou tácticas intimidatórias. E, ainda assim, o mais que conseguimos foi mudá-la de funções. Poderíamos, claro, ter avançado para um despedimento individual coercivo. Mas teríamos que carrear provas, teríamos que nos preparar para que um advogado nos fizesse a vida negra, teríamos que arcar com o risco de que fosse para as redes sociais deturpar tudo e causar danos reputacionais à empresa. Engolimos em seco e engendrámos uma solução em que fizesse o mínimo de estragos. Mas, ainda assim, continuo a defender que é preferível arcar com as consequências de ter gente pestilenta e imprestável nas empresas do que correr-se o risco de que patrões desonestos ajam discricionariamente contra trabalhadores indefesos que não lhes caiam nas boas graças.

Por isso, de cada vez que vejo que a bandeira da legislação laboral anda outra vez de mão em mão, dou um passo atrás e fico, cepticamente, à espera de ver o que vai sair dali. Felizmente, de forma geral, as montanhas parem ratos. Haja paciência.

Não quero com isto dizer que não haja aspectos a burilar. Há. Pormenores, aspectos específicos, pontuais. E, nesses casos, mais inteligente seria se partidos, sindicatos e associações patronais pensassem no País e não nas corporações em que se entrincheiram.

Mas, aqui chegados, eis que salta para a arena o tema da amamentação. O Governo quer limitar a redução de horário (duas horas) aos primeiros dois anos. Quando ouvi, pareceu-me normal, inócuo. 

Contudo, de repente, levantou-se um banzé do caraças, toda a gente a defender que as mulheres devem ter duas horas a menos de trabalho para amamentar crianças até aos 6 anos. De loucos. Pela cabeça de quem é que passa que é normal uma mulher dar de mamar a crianças com mais de 2 anos? Em especial, que o faz em horário diurno? Está tudo maluco ou quê?

Falo com conhecimento de causa. Foi há muito tempo mas a realidade é a mesma: uma mãe a amamentar os filhos.

Amamentei a minha filha até ela ter 13 meses. Já o contei: já falava e andava e ainda mamava. Mamava de uma mama, depois levantava-se, dizia, 'agora a outa', sentava-se na minha outra perna, encostava-se a mim, e mamava. Claro que o fazia depois de ter comido a papa da manhã, antes de sairmos, e, à noite, antes de ir para a cama. Por fim, só à noite. E eu confesso: fui eu que acabei com aquilo, já estava fisicamente saturada, já me custava. E foi um processo natural que ela também aceitou bem. Disse-lhe: 'A mãe já não tem mais leitinho nas maminhas. Sabes como vamos fazer? Já és grande, agora vais passar a beber um copinho de leite como os meninos crescidos'. E assim aconteceu, naturalmente.

De todas as minhas amigas, colegas e conhecidas eu fui a única que amamentei até tão tarde. Toda a gente achava um disparate, quase como se fosse uma cedência ao mimo de uma criança. Não quis saber. A minha intuição dizia-me que era benéfico para ela e assim foi.

Na altura, só havia licença de amamentação no primeiro ano da criança.

Com o meu filho, foi diferente. Sempre speedado, com um ritmo sempre difícil de acompanhar. Mamou até aos 4 meses, mas sempre foi um desatino. Quando a minha filha mamava, era um momento tranquilo: aninhava-se em mim e mamava pausadamente. O leite do meu peito sempre foi proporcional às suas necessidades. Com ele sempre foi o oposto: mamava sofregamente, mamava, mamava, com uma força e uma velocidade que não dava para acreditar, parecia que estava sempre esgalgado de fome. Claro que depois engasgava-se. Eu assustava-me imenso, ficava sem conseguir respirar e eu levantava-o, abanava-o. Enquanto isso, o meu peito ficava a esguichar leite enquanto ele tossia, engasgado, o leite a atingi-lo na cara, a entrar-lhe para os olhos e, quando se desengasgava, chorava, incomodado. O meu peito, face a tal sofreguidão, produzia leite até mais não poder, transbordava, encaroçava. Quando chegou aos 4 meses, deixou de querer mamar. Tive um desgosto grande, uma grande preocupação. Custou-me muito que esse elixir, essa garantia de saúde, não pudesse ser-lhe proporcionada. Tentei de tudo, mas ele foi taxativo. Fechava a boca, torcia-se, rabiava, esperneava. O leite acabou por ir secando. Por essa altura, já tinha introduzido a comida sólida no seu regime, e era só disso que ele queria. Não papas, que isso o agoniava, queria era sopa, comida com sabor. Devorava comida normal. Mas, bebé que era, como tinha que beber leite, dava-lhe no biberão. Mas só de eu lhe pôr a tetina na boca, começava com vómitos. Tinha que apanhá-lo a dormir, para lhe dar leite à socapa. Mas criou-se, cresceu, fez-se grande e forte. E mantém-se um bom garfo.

A tendência agora é que a amamentação seja exclusiva até aos seis meses. Acompanhei o processo pelos meus netos.

Mas o facto de haver mais um ou dois meses de amamentação em exclusivo ou de ser claro que o leite materno é uma mais valia e que prolongar-se até aos dois anos pode não ser o disparate que antes parecia, não significa que seja natural, saudável (lato sensu), amamentar uma criança para além dos dois anos, em especial durante o dia. Diria que é um absurdo sem pés na cabeça e duvido que haja mais do que meia dúzia de mulheres que o faça. Duvido muito.  

Dito isto não quero dizer que não faça sentido que as mães (ou os pais, à vez) não devam ter redução de duas horas de horário de trabalho até as crianças terem 6 anos. Chamemos-lhe 'licença de acompanhamento parental'. Isso, sim, faz sentido.

Relembro os meus tempos de jovem mãe, com horário rígido, sem redução após eles terem 1 ano. Eu com uma menina quase bebé, depois grávida e com ela ao colo ou pela mão, depois com um bebé de colo e ela, pequenina, pela mão. Não usava carro nessa altura. Nessa altura o meu marido estava na Marinha, sem flexibilidade para me apoiar mais, e, depois, quando saiu de lá, entrou para uma multinacional que o tirava frequentemente de Lisboa e do País. Não foram tempos fáceis. Mas era o que era e, apesar dos sacrifícios, sobrevivemos. Na boa. 

Mas poderia ter sido melhor. Não tive mais uns quantos filhos por me ser tão difícil (e por não ter suporte ou apoio logístico para as dificuldades do dia a dia). Tivesse eu tido uma vida mais facilitada e não teriam sido dois, teriam sido uns três ou quatro filhos. Se bem que o que eu gostava mesmo era de ter tido uns seis. Mas era impensável, ingerível.

Mas agora que o mundo mudou e que a flexibilização de horários é uma coisa normal, que o regime de trabalho pode ser híbrido, pode -- e deve -- ir-se mais longe.

A demografia em Portugal é uma lástima. Mesmo que os imigrantes nos venham dar uma ajuda no rejuvenescimento populacional, não chega. 

Tudo deve ser feito para incentivar a natalidade e o mínimo que se pode fazer é garantir que os pais possam acompanhar minimamente os seus filhos pequenos, trabalhando menos 2 horas por dia até que atinjam os 6 anos.

Isso e mais medidas: todas são poucas para incentivar os pais a terem mais filhos. Creches gratuitas, horários flexíveis e reduzidos sem redução de ordenado, abono de família generoso e crescente consoante venham mais filhos para a família. E o mais que, razoável e inteligentemente, se saiba pôr em prática.

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