Ouço falar em fadiga, fadiga da guerra. Fala-se menos porque estamos cansados de ouvir falar da guerra -- é o que ouço. Não é o meu caso. Não falo porque não sei o que dizer de diferente em relação ao que digo desde o primeiro dia. Não posso fazer um post igual todos os dias e, por isso, vou falando de outras coisas. Mas a barbárie a que se assiste está no meu pensamento em permanência.
Os crimes filmados, testemunhados, comprovados e vividos em directo por correspondentes de canais de televisão de todo o mundo não podem ser negados, desculpados ou aceites. São crimes brutais, absurdos, injustificados.
A guerra avassaladora exclusivamente causada pela Rússia em território alheio não é apenas um inacreditável atentado ao direito internacional: é ainda a causa e o acelerador de uma crise económica mundial de que ainda não percebemos bem as consequências. O mundo inteiro vai ser vítima do desvario imperialista de Putin e dos seus seguidores.
Por facilidade, vou usar, uma vez mais, uma analogia que já aqui usei. Pode ser básica mas penso que é uma ilustração minimamente credível do que se passa no cenário de guerra,
Se o meu vizinho, mais rico e poderoso que eu, resolver que a minha casa há-de ser dele, e se eu, legitimamente, não for na conversa, há alguém de bom senso que ache normal que ele resolva arrombar as portas e entre pela casa adentro, de pistola em riste, montado numa máquina que arrasa tudo à sua passagem?
E eu -- escondida, temendo ser assassinada, vendo-o a destruir tudo, paredes, mobílias, a matar familiares meus -- deverei ceder? Deverei aceitar que ele ocupe a minha casa e me escorrace dela ou me obrigue a trabalhar como sua criada?
Ou, pelo contrário, é legítimo que me defenda?
E não é normal que os meus vizinhos -- conhecendo a sanha assassina do meu vizinho e sabendo que a seguir à minha casa, há-de querer anexar as casas deles -- me ajudem, me deixem pedras e outras munições para eu me defender?
Pode haver quem diga que, perante a ambição desmedida e a fúria do meu vizinho, a culpada das agressões sou eu que não me deitei no chão aceitando pacificamente que ele passe por cima, para ser roubada, violada, assassinada. Pode haver quem me acuse por me defender ou acuse os meus vizinhos por me ajudarem a defender-me.
Mas eu, se as circunstâncias fossem essas, enquanto me restasse um pingo de sangue, faria o que achasse correcto: defender-me a mim, à minha família, à minha casa, à minha liberdade, aos meus direitos.
E porque é assim que penso, percebo os ucranianos e desejo que se aguentem, que consigam resistir, que encontrem a coragem e a força necessárias, desejo que consigamos ajudá-los a manterem-se livres, que consigamos ajudá-los a escorraçar as tropas putinistas da Ucrânia. Desejo que todos, todos os que amamos a democracia e a liberdade, lutemos até ao limite das nossas forças para defendermos o que achamos correcto.
Lamento, choro as mortes, a destruição, o sofrimento ucraniano. Desejo fortemente que a Rússia saia do país que invadiu e que a paz regresse a solo ucraniano. Sou inabalavelmente a favor da paz pelo que desejo fortemente que a Rússia pare a agressão e a destruição que está a levar a cabo na Ucrânia.
E, ao mesmo tempo, desejo que a Rússia consiga resolver o problema interno que tem em mãos e consiga ver-se livre do regime putinista, um regime ditatorial, um regime corrupto, oligarca, déspota, brutal, infernal.
Como se tem visto, o mundo não será um lugar seguro enquanto um país tão imenso, com o maior número de ogivas nucleares, estiver nas mãos de um psicopata assassino.
Há riscos de que a guerra que Putin semeou na Ucrânia se espalhe e que os riscos escalem e fiquem descontrolados. É certo. Mas se o culpado é um único, o regime putinista, é este culpado que tem que ser travado. E julgado e condenado. E expulso de todos os lugares de onde possa desencadear mais agressão, mais destruição, mais morte.
Só poderá haver paz, uma paz verdadeira e digna, se a Rússia tirar as patas de cima do país que invadiu e permitir que os ucranianos voltem a viver uma vida normal, livres, independentes, alegres e confiantes no futuro.
15 comentários:
Concordo, sem hesitação ou reserva.
No entanto, certos sinais preocupantes levam-me a recear que, a seu tempo, a História venha a desvendar mistérios relacionados com indícios, que começam a tornar-se muito claros de que, por detrás de todo o sofrimento atroz imposto à população, existe, por parte do regime ucraniano, uma tentativa de manipulação da comunidade internacional bastante para além daquilo que é sensato ou necessário a fazer frente ao ignóbil agressor - que não é o povo russo, mas o regime que o oprime.
Dir-se-á que começa a cheirar mal... ( https://mosaicosemportugues.blogspot.com/2022/04/comeca-cheirar-mal.html )
Cheguei até aqui: "não há atenuantes para justificar os crimes de Putin, tal como não pode haver perdão e tal como nada do que se passa pode ser esquecido." Primeiro não concordo de todo e se fossemos a atribuir culpas, upa upa, a começar na prostituta da lynden, passando pelo maluquinho da nato, tínhamos muitos de quem falar. Segundo, o seu belicismo chateia, é por pessoas como você que isto ainda não acabou, o que quer com este seu exercício da mais abjeta das propagandas, ainda que bem intencionado? Um prolongamento da guerra até o bandalho do zelenski, esse corrupto com milhões no exterior, fascista que prende todos os opositores a torto e a direito, peão das nicas do biden, entrar em Moscovo (ah, ah, ah)? A terceira guerra mundial? Ó Um Jeito Manso, acorde: estamos a caminho duma guerra global, a UE é governada por burocratas não eleitos, os povos europeus empobrecem todos os dias e o mais importante é fazer a paz na Ucrânia, e nessa paz os ucranianos vão perder bastante território - por culpa do seu próprio regime, nada disto era inevitável em fevereiro, mas é a vida, e tem de ser assim, sob pena de irmos todos para o galheiro - estou farto de belicistas de sofá. Um bom domingo, em paz.
Nesta guerra, há três posições de principio;
-Os putinistas, com as mãos cheias de sangue.
- os imperialista,s pró-americanos.
-e os outros, ( onde me incluo ) que, não defendendo nenhuns, preferem por exclusão de partes, um mundo com liderança politica e económica dos Americanos, por oposição a Chineses e Russos.
Tal como na religião, (sendo eu ateu) prefiro de longe, viver num país católico, a viver outra religião qualquer seja ela qual seja.
É uma questão de principio, e o meu, é este.
Tem toda a razão, UJM, toda a razão !!
E para aqueles que entendem que devemos facilitar alguma vitória ao nazi Putin para o apaziguar, devemos lembrar o que disse Churchill quando o primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, Adolf Hitler, Benito Mussolini, Édouard Daladier, entre outros. ofereceram a Checoslováquia a Hitler para que este não iniciasse uma guerra.
E as palavras foram:
“Entre a desonra e a guerra, escolheram a desonra e terão a guerra”
https://alexborges.medium.com/entre-a-desonra-e-a-guerra-46d32080729c
" ... as ações de Moscovo ao longo dos últimos anos quer na Moldávia, na Geórgia, na Crimeia e agora na Ucrânia, as ações de Moscovo desfizeram dúvidas quanto à postura bélica assumida pelo presidente Putin."
https://apropositodetudo.blogs.sapo.pt/com-o-pcp-nada-acontece-por-acaso-nada-320790
António,
Pois a mim o que me cheira mal é Putin continuar a destruir um país vizinho, a matar gente e a violar a lei internacional.
Que Zelenskyy peça ajuda parece-me muito natural. O que ma admira é que ele se aguente inteiro e firme. Se calhar muitos outros já teriam quebrado. Mas ele continua a tentar honrar o compromisso que assumiu quando foi eleito presidente da Ucrânia -- ou seja, continua a não entregar a Ucrânia.
Não percebo o que é isto tem de estranho.
Lúcio,
Gostava de perceber, em concreto, qual a sua ideia: a Ucrânia deveria render-se e aceitar ser anexada pela Rússia? É que é isso que a Rússia quer e é por isso que invadiu a Ucrânia, destruindo-a enquanto a Ucrânia não se render. É isso que defende?
E não lhe parece claro que belicista é quem acha bem que Putin esteja a destruir um país vizinho?
Eu quero a paz, quero que Putin pare de destruir e matar.
É tão difícil de perceber?
Ccastanho,
Eu defendo o direito internacional, a democracia, o respeito pela liberdade e direito à autodeterminação dos povos, defendo a paz.
Condeno as ditaduras, as tiranias, as oligarquias, o desrespeito pelo direito internacional, condeno quem invade países, condeno quem desencadeia a guerra.
Se calhar estamos quase de acordo.
Vivemos tempos difíceis, essa é que é essa.
Caro Anónimo/a.
Concordo e gostei de ler.
"Entre a desonra e a guerra, escolheram a desonra e terão a guerra" -- tal e qual. É isso mesmo.
Muito obrigada pelas suas palavras e por ter trazido aqui essa frase cristalina.
Uma boa semana
Olá Anónimo
Estive a ler a referência que enviou. E é isso: esta guerra veio provocar um separar de águas. Perante um crime desta dimensão custa a crer que haja quem se coloque do lado de Putin ou no muro, a assistir, apontando o dedo ao agredido em vez de penalizar sobretudo o agressor.
As intenções de Putin são claras e verbalizadas, de forma explícita, por ele.
Quem quer fantasiar em torno não se sabe bem de quê, arranjando pretextos ou atenuantes para esta guerra incompreensível e inaceitável, fá-lo por conta própria, por cegueira, por desfasamento da realidade, não sei.
Obrigada pelo link que enviou.
Uma boa semana.
Ora, ora, "palavras leva-as o vento" ou "palavras loucas, orelhas moucas" , assim se diz a quem faz uma análise tão insatisfatória de uma guerra anacrónica. Estamos no séc. XX I. !!!!!!
Olhe, vou perder 10 minutos com isto porque você me merece respeito e em determinada altura de 2020 encontrei em si e no blogue algo que me dava esperança: senti-me próximo de si.
1 – “(… ) a Ucrânia deveria render-se e aceitar ser anexada pela Rússia? É que é isso que a Rússia quer e é por isso que invadiu a Ucrânia, destruindo-a enquanto a Ucrânia não se render. É isso que defende? (…)” Não me parece que seja íntima dos líderes russos e estes têm sido parcimoniosos quanto ao que realmente querem, é difícil perceber, não me parece que a senhora tenha uma bola de cristal. Por mim, nesta fase, é o Donbass, a Crimeia, o corredor que liga a Crimeia por terra à Rússia e a manutenção do corredor ucraniano de Odessa, para que não fiquem ainda mais chateados do que já estão e que tenham uma saída para o mar. Claro que há coisas que se podem negociar, eventualmente chunks territoriais que a Rússia ocupa. A segunda condição, é uma garantia formal de que a Ucrânia não adere à OTAN, seja em que circunstância for. A terceira, é o desanuviamento do clima na Europa ‘proper’, levantamento de algumas sanções e fim da linguagem belicista (recordo que ainda hoje Serguei Lavrov, diplomata altamente respeitado, que é nada menos do que a segunda figura do Estado russo foi impedida de voar para a Sérvia à conta de sanções abstrusas).
2 – “(…) Eu quero a paz, quero que Putin pare de destruir e matar. É tão difícil de perceber? (…)”. Não é muito difícil de perceber, difícil de perceber é a sua repulsa pela negociação, não me passava pela cabeça que fosse de tal forma manipulável pelos média, que por seu turno estão ao serviço duma agenda de poder muito pouco recomendável. O mesmo é dizer que isto se joga em mais do que um tabuleiro e essencialmente trata-se de os EUA mostrarem aos chineses quem manda. Sabe quem perde, para além da Ucrânia? Ora faça lá um pequeno exercício, de preferência quando for abastecer a viatura.
3 – Eu gosto imenso de si, fiquei perplexo quando li aqui certas coisas. Transformar Zelenski num herói, defender aberta e acriticamente as posições de um regime fascista que comete pelo menos tantos crimes de guerra quanto o opositor, nem uma palavra sobre a censura global imposta aos cidadãos europeus à boleia, mais o dinheiro que se vai embora para armas (re-militarização da Europa) o Ambiente que se foda, todos a empobrecermos e por cima o espectro de um terceira e final guerra mundial. Eu gosto mesmo de si. Já passei os 10 minutos. Um abraço para ti, Um Jeito Manso.
Maria,
Tudo isto perturba. Acontecer uma coisa destas em pelno Sec. XXi. Haver quem não se indigne. Haver quem defenda a rendição. Haver quem condene os que apoiam quem quer lutar pela sua liberdade.
Em que mundo vivemos...? É assustador, não é?
Uma boa terça-feira, Maria.
Olá Lúcio,
Agradeço os 10 minutos ou mais que 'perdeu comigo'. Para tentar retribuir a generosidade, escrevi um post inteiro que, na medida do possível, reflecte o que penso.
Olhe, Lúcio, não brinque comigo. Defende a paz? É? Ou defende a rendição, a perda de soberania e a perda liberdade, o fim do direito internacional? Ou defende que se crie uma via verde para Rússia entrar por onde quiser?
Isso é defender a paz?
Desilude-me, Lúcio. Não esperava isto de si.
Eu consigo nunca 'perco tempo' Um Jeito Manso, já lá irei ver o tal postal, fosga-se, espero que não seja gráfico, porque fotografias de bombardeamentos e de grávidas violadas as melhores são as de Dresden e as de Bergen-belsen, inegavelmente. Porque se amofina tanto comigo quando sabe que eu até sou um gajo com piada que só quer que se faça a paz? Hum?
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