Uma vez, teria eu uns quarenta e picos, um colega disse, com ar irredutível, que quem dissesse que depois dos quarenta estava fisicamente tão bem quanto antes estava a mentir. Eu, admirada: 'A mentir?!. E ele: 'Com os dentes todos'. Na altura, bati três vezes na madeira e disse, de fininho, que, por acaso, eu não tinha tido, até ao momento, razões de queixa. Nestas coisas não gosto de me gabar. É aquilo de que não acredito em bruxas mas lá que as há, há. Nunca fiando. A gente gaba-se e, parece que não, parece que atrai. Portanto, mesmo que a gente se sinta bem, deve ir com calma na constatação.
Quer a nível emocional, quer a nível físico sentia-me para as curvas.
Onde é que os quarentas já lá vão...
Mas fui na maior descontração. Quando me deitei, em tronco nu, para o médico me fazer a ecografia mamária e ele me perguntou se tinha dores nos seios, fiquei admirada: porque pergunta? Ele tinha posto as películas junto à luz. Disse-me: é que tem alguns quistos.
O médico disse que o melhor era fazer uma artroscopia. Outros médicos disseram que não viam qualquer razão para isso. Mas, como o ortopedista me disse que aquilo era só fazer três furinhos e que no dia seguinte saía do hospital a andar, até fui na cantiga de que, já que ia ser anestesiada, espreitava era logo para os dois joelhos.
E estas coisas começaram a fazer-me perceber que, se calhar, o meu corpo já não estava igual a quando tinha vinte anos.
Este ano foi aquilo do coração. Ainda há dias fiz mais um exame que durou cerca de sete horas. Li o relatório e não percebo bem. Parece-me que nada de mais mas que, se bem interpreto aquilo, qualquer coisa que não sei se é coisa, se é coisita.
Num outro exame, ao ver para ali num exame o que me parecia ser uma irregularidade, outra pessoa disse que era normal pois com a idade o corpo vai-se alterando e que certamente eu não esperaria que o meu corpo estivesse sem quaisquer marcas da idade.
A minha mãe, que já está a aproximar-se dos noventa, tem as mesmas perplexidades. Quando tem alguma dor nas costas ou alguma coiseca, diz com espanto: mas o que é isto? Sempre estive tão bem e agora isto?
Aí sou eu que lhe pergunto se acha que ainda podia ter a coluna igual a quando tinha dezoito anos.
Mas é uma chatice, isto.
A mim o que me preocupa quando percebo que alguma coisa já não está exactamente igual ao que estava quando eu fazia aqueles despreocupados checkups iniciais é recear que vá de mal a pior, é recear que seja qualquer coisa degenerativa. É que se for só algum desconforto menor e ocasional e que se trave ou controle com caminhadas e comida saudável, está tudo bem. Agora se uma pessoa vai para velha a sério, a sentir-se velha, com achaques, com falta de vontade de se mexer, sem disposição para se rir e mandar tudo o que é preconceito e treta para o quinto dos infernos, aí, sim, deve ser uma seca das valentes.
A nível intelectual e emocional, para já -- e deixa cá bater três vezes na madeira -- so far so good. Pelo menos que eu dê por isso. Às tantas estou toda para aqui toda optimista julgando-me ainda escorreita das ideias e, afinal, os outros já andam a cochichar pelos cantos: 'coitadinha, tão gagá que já está...'
Enfim.
Resumindo: o importante nisto tudo é gostar de viver, é querer aproveitar o tempo e a vida que temos, é sentirmo-nos agradecidos pelo acaso que fez com que tivéssemos a oportunidade de viver esta aventura. E o resto são trocos.
Bola para a frente.
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Mas nada como dar a palavra a quem a sabe toda: as Avós da Razão
O que mais pega na velhice?
1 comentário:
Problemas similares, mas no masculino.
A Vieira
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