terça-feira, dezembro 24, 2019

À mesa com o Pai Natal - um preview do que poderá ser o repasto





O que, a esta altura do campeonato, tenho a dizer é que aquilo que está resolvido como menu para o almoço de Natal permanece ciência oculta. O meu marido, que gosta das coisas planeadas e estudadas, quase me persegue tentando que eu lhe diga como vou fazer. Quando lhe digo que não sei, porque não sei mesmo, fica inquieto e quase me obriga a pesquisar receitas. Ainda agora tivemos um diferendo. Quer que eu leia para saber como é. Já lhe respondi mil vezes que, para cada coisa, há mil receitas. Cada um que faz uma treta vai para a internet e conta como fez. Até eu. Quantas vezes já aqui escrevi receitas? Portanto, quero lá eu saber como é que uma faz e a outra deixa de fazer? Que maçada.

Agora uma coisa é certa: da leitura que, contrariada e mais do que apressadamente, fiz já me ocorreu que talvez precise de dois ingredientes que ainda terei que ir comprar: vinho branco e queijo parmesão. Tenho cá vinho branco, claro, mas é mal empregado para o uso em causa.

Vou levantar o véu: vou fazer sopa de bacalhau e tenho ideia de como deve ser mas só quando estou a cozinhar é que as ideias me vêm.

A ideia que tenho é fazer assim: numa panela bem grande  ponho umas cebolas,   uns dentes alhos, um bocado de abóbora e umas cenouras. À parte cozo uns ovos. Depois de cozidos separo a gema das claras. As gemas vão para o caldo. Com a varinha, transformo tudo num caldo que deve ficar bem de um amarelinho alaranjado. Num tacho ao lado, em pouca água, cozo uns lombos de bacalhau. Não junto na outra panela não vá soltar-se alguma espinha. Depois separo as lascas do bacalhau e retiro-as e, uma vez o caldo coado, junto umas massinhas. Quando as massinhas cozidas, junto-as bem como algum caldo remanescente à sopa. As lascas de bacalhau, bem entendido, também. Junto ainda uns grãos de bico e as claras cortadas aos bocadinhos. Não é para ficar empapado. Longe disso. Ao lado, vou ter uma tacinha com coentros picados e outra com hortelã. E outra, lá está, com queijo parmesão ralado. Cada um usará o tempero que entender. Mas não vi isto em lado nenhum, Simplesmente, aqui há algum tempo comi uma sopa de bacalhau que era gostosa que só visto e, desde então, tenho ideia de conseguir fazer uma ainda melhor.

Parece-me isto uma alternativa razoável ao bacalhau cozido com batatas e couves que é coisa que me chateia um bocado pois uma coisa é cozinhar para meia dúzia de pessoas e outra é fazer para mais do dobro. Para as postas ficarem direitinhas, para enfiar as couves numa panelona, etc, é sempre um desafio que acho que não compensa. E isto já para não falar no salsifré que é lavar couves gigantes que, como já contei, ultimamente já lavo na banheira (não com sabonete ou gel mas chuveiradas aparadas por um alguidar). Assim, com esta sopinha, está lá o bacalhau da ordem mas é coisa mais fácil de cozinhar e servir. Espero é que fique boa, apuradinha. Mas a minha auto-confiança faz-me acreditar que ficará.

Vou também fazer galo capão recheado. E aqui divido-me. Li uma recomendação na Madame le Figaro que me está a dar que pensar. Dizem eles que para garantir que fica tenro e saboroso se lhe deve dar uma cozedura prévia em água, sal, cebolas, salsa e cenouras. A seguir é que se deve rechear, pincelar com mel, azeite e ervas e, então é que deve ir ao forno. Mas há outras receitas que o põem a marinar de véspera com vinho branco e laranja e que depois deve ir umas horas valentes para o forno. São duas opções tão díspares que me deixam balançada. Tenho que ver para que lado me puxa a intuição. 

Com receio que seja pouco, também se encomendaram duas peças de piano. Pianistas cá em casa não abundam mas, atendendo que não se esperam sonatas ou nocturnos, creio que os existentes darão conta do recado. Estou a falar mas, sinceramente, não sei bem o que é isso do piano. O meu filho é que encomendou e quando eu pensava que ele ia encomendar entrecosto, encomendou piano. Seja o que for, carne com ossinhos de roer é coisa com que a malta cá de casa se lambe. Talvez não todos mas, pelo menos os que têm ainda muito marcada a sua onda carnívora, não se fazem rogados. A minha dúvida é como é que, com o forno cheio com um galo capão que é do tamanho de um boi (e que quero aperaltar com batatinhas de lado) e que vai estar horas no forno, vou, ao mesmo tempo, conseguir assar os dois pianos.

Bem. Se verá. O que for, soará. E, de seguida, se comerá.

A minha dúvida também é se me ponha ainda a fazer tiropitas. Acho que só com um forno industrial daria conta de tamanho recado. A questão é que é uma família com muito homem e todos de muito alimento. E as mulheres também são bons garfos. Portanto, de cada vez que faço uma coisa, com receio que todos queiram provar, tenho sempre que fazer muito. E, às tantas, na cozinha, quase não dou vazão.

Para a véspera, que não é em minha casa, vou levar camarões selvagens. Já cá os tenho e daqui a nada cozo-os. Outro risco. Neste caso, a questão é o sal. É a olho mas tem que ser na mouche. Salgados seriam horríveis, sem sal seriam um pãozinho deslavado. Ora, traçar a bissectriz em tal matéria não é coisa que possa ser científica. E, a olho, é preciso ter mão e fé. E aí, sim, vou levar também tiropitas: umas de alheira, outras de farinheira e outras de salmão. Todas com ricota e maçã. Só que vão lá estar mais pessoas do que eu pensava e, portanto, terei que fazer bem mais. Já comprei sementes de sésamo, de chia e de outra coisa de que agora não me lembro para pôr na massa folhada, coladas ao mel. Mas isso não vou aqui contar como é, penso que toda a gente deve saber. Gostava de fazer algumas verdadeiramente diferentes mas, para já, não me ocorre. A receita que conheço, das tiropitas gregas, não são nada como eu as faço. Têm ricota ou ricota e espinafres e, que eu saiba, mais nada. Eu é que já vou na alheira, na farinheira, no salmão fumado. Como se costuma dizer: o céu é o limite. Ou seja, um dia destes ainda faço tiropitas com uma nuvem lá dentro. 

Mas, pronto, se as coisas me saírem bem, depois logo vos conto como as fiz. Até lá, é ainda tudo na base do 'logo se vê'.

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As imagens mostram Ed Wheeler vestido de Pai Natal no meio de pinturas bem conhecidas.


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Esta terça-feira ainda tentarei vir cá desejar-vos uma noite e um dia de Natal felizes. Digo-o com a sensação de que estes votos não serão bem recebidos por todos já que, para algumas pessoas, o Natal traz um triste sentimento de solidão ou de perda ou de abandono. É em especial para essas pessoas que vai o meu pensamento e o meu abraço.

4 comentários:

AV disse...

Gosto sempre de ler os seus menus. Em relação ao dilema do forno, o capão vai precisar de algum tempo de ‘descanso’ depois do forno, sobretudo se for para a sua opção #2; talvez o piano possa ser quase cozinhado com antecedência e depois pincelado com um glacê/marinada/glaze e terminado no forno enquanto o capão ‘descansa’?
Boas festas e dias felizes.

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Minha Rica UJM,

Um Natal maravilhoso para si e para todos os seus - especialmente os seus pimentinhas.

Um grande abraço.

Um Jeito Manso disse...

Olá AV,

Pois que a culinária se cumpriu, o repasto satisfez e os restos também já quase voaram ao jantar. Com sorte esticam para o almoço desta quinta-feira.

Como lerá, segui em parte a sua sugestão. Não pre-cozinhei o piano pois como não precisa de muito tempo (cerca de uma hora), foi para o forno quando o capão saíu para descansar.

Na recta final, couberam os dois um quase a roçar em cima e outro assente em baixo mas como a temperatura já estava baixa não houve crise.

Tbanks a lot.

E dias felizes!

Um Jeito Manso disse...

Olá Francisco,

Muito obrigada. E foi maravilhoso, sim. Os pimentinhas (e houve mais crianças) endiabrados e felizes. Espero que o seu dia tenha sido também bom, rodeado de estima e aconchego.

Dias felizes para si, Francisco. E vai daqui um grande abraço!