quarta-feira, julho 24, 2019

Paris, Lisboa





Escolho uma música que, com uma certa pena, penso que pode parecer até banal. Faz parte daquilo a que se chama, também com banalidade, o imaginário de muita gente. Uns acordes que rasgam a alma de quem um dia se sentiu perdido, de quem, para sempre, se desencontrou do seu destino. E quem ouve, mesmo que não tenha vivido histórias de perdição, sente a dor e a solidão de quem se detém tentando encontrar o caminho de volta a uma casa onde um dia sonhou ser feliz.
Esta terça-feira, na Avenida de Paris, passou à frente do carro, na passadeira, uma mulher alta, magra, com um vestido preto, até aos pés, sem mangas, e o vestido ficava-lhe solto apesar de estreito, e ela parecia vinda de um outro tempo. Tinha o cabelo ruivo apanhado mas de forma solta e uns brincos muito grandes, em vermelho. E caminhava como se não tivesse pressa, como se não tivesse para onde ir. Todos os outros andavam rapidamente, excepto aquela esfíngica mulher. Fiquei a vê-la. Não sei se parecia perdida ou se ia apenas a pensar ou a sentir o prazer de existir. Pela forma leve como andava, poderia pensar-se que seria bailarina. Ou alguém com asas na alma. Ou alguém que caminhasse nua.

No espaço em que consegui vê-la, parecia ausente. 

Depois segui e certamente não mais a verei. Assim é a nossa vida. Cruzamo-nos com pessoas que não nos vêem ou que nós não vimos, seguimos por outros caminhos, perdemo-nos sem nunca nos termos encontrado. Estranhos, invisíveis, para sempre desconhecidos. Insignificantes pontos de luz que se cruzam por acaso e que seguem o seu caminho como se nunca tivessem coincidido no mesmo espaço, no mesmo tempo.




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As fotografias, tal como no post abaixo, são de Jörg Colberg e encontrei-as na Vogue 

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