quarta-feira, janeiro 02, 2019

O meu primeiro dia de 2019
[Com a ementa do Almoço de Ano Novo]





Comecei o ano como gosto: a cozinhar para a família. E haveriam de chegar ruidosos, brincalhões, sorridentes. Os mais pequenos logo correndo uns atrás dos outros, o bebé com palavras novas, muito bem ditas: bacalhau, cereais, bochecha. Os outros perseguem-se, saltam, e, quando passam ao pé dele, soltam: 'Bacalhau', ao que ele responde prontamente: 'Bacalhau'. Hoje tivemos cá outro menino e, portanto, a minha menininha mais linda estava ainda em mais minoria. Trazia uma bonita maquilhagem (para crianças) que ainda valorizava mais os seus belíssimos olhos. Era ela e cinco rapazes. Vale-lhe a atenção da tia que vai desenhar com ela para a ensolarada secretária e a quem ela retribui penteando-lhe a farta cabeleira, fazendo tranças, ou seja, fazendo a tia sentir-se próximo do nirvana.


Ao almoço a mesa, apesar de bem comprida, é cada vez mais curta. Um dia destes teremos que equacionar fazer aquilo que já fazemos in heaven quando a lotação também quase se esgota: ter segunda mesa. Por enquanto, dado que o bebé ainda fica numa cadeirinha que é posta um pouco afastada  num canto de forma a não ocupar lugar à mesa e dado que ainda vão cabendo, ainda que já um bocado apertados, temos resistido a isto das duas mesas até porque ter toda a gente à volta da mesma mesa é parte da felicidade destes dias.

Depois de almoço, para além de jogarem à bola na sala (com uma bola muito levezinha...) e de andarem às lutas, o menino mais velho pegou na minha máquina e começou a filmar os outros a cantarem, a dançarem e a fazerem performances, cada uma mais maluca do que a outra. A seguir, para ver se sossegavam, fiz-lhes uma sabatina política e geográfica tendo ganho o mais novo (o mais novo a seguir ao bebé, claro, o que tem seis anos) evidenciando, uma vez mais, que é uma surpreendente esponja que absorve e assimila tudo o que ouve. É que até as palavras francesas diz com sotaque francês (como um Macron pronunciado como um parisiense de gema).


Quando saíram, levando a habitual marmita com o que sobrou, e depois da casa minimamente arrumada, resolvemos ir dar um passeio até ao lugar que, para mim, é um dos mais bonitos do mundo, talvez nem especialmente pelo lugar em si mas, sobretudo, pela assombrosa vista que dele se tem. Lisboa, magnífica, sob uma luz dourada, os navios deslizando num Tejo muito azul e muito tranquilo.

Quando regressámos já a noite começava a tombar e eu, mal me apanhei em casa, pus-me a ler o livro da Anabela Mota Ribeiro com entrevistas e fotografias de Saramago e Pilar e, apesar de ser bem interessante, adormeci.

Agora já estou no turno da noite. Já escolhi a roupa para amanhá, já pintei as unhas, já estive a ver as fotografias e os filmes, e, antes de me atirar ao tapete, aqui estou para vos dar conta destes meus pequenos nadas.


E, para os que são dados a culinárias, conto o que foi o Almoço de Ano Novo.

Para entradas: brás de farinheira, molhinhos, iscas às tirinhas.

Conto como fiz:
  • Brás de farinheira
Numa frigideira, coloco azeite com cebola cortada às rodelas muito finas. Frito em 'lume' não muito forte até a cebola estar bem macia. Junto o recheio de meia farinheira (usei da Beira Baixa) cortado aos bocadinhos. Mexi e fritei ao de leve. Juntei sete ovos grandes (uso matinados) e juntei um pacote pequeno de batata palha com pouca gordura e pouco sal. Envolvi tudo, ao de leve, até não se identificarem os ingredientes.
  • Molhinhos
Para quem não saiba, trata-se de rolinhos, presos por um cordel, de dobrada branca, muito fina, muito bem lavada. Compro-os já feitos em molhinhos. Apesar de já virem muito bem lavados, coloquei-os, ainda assim, de molho em água com abundante vinagre. Assim estiveram durante umas duas ou três horas. Depois coloquei-os numa panelinha para ficarem cobertos por água com um fio de azeite, sal, uma cebola, umas folhas de louro e um ramo de salsa. Coze durante muito tempo, talvez umas duas horas ou mais, a panela sempre tapada. Depois escorro, tempero com azeite e vinagre balsâmico.
  • Iscas
Não tem história mas pode haver quem não saiba. Compro cortadas fininhas. Frito numa frigideira com azeite, alho abundante e louro. Não devem ficar queimadas, nem secas, nem cruas. Para isso, o 'lume' não pode estar muito forte e devem ser viradas amiúde. Depois de prontas, cortam-se às ripinhas fininhas e servem-se assim. 

Para prato de substância: bochehas e queixadas de porco

Fiz em tachos separados e já explico porquê.
  • Bochechas
Num tacho coloco azeite no fundo, duas grandes cebolas cortadas aos bocados, uma cenoura grande às rodelas, salsa e coentros abundantes, as bochechas, dentes de alho, vários dentes de alhos, cubro com mais duas cebolas e rego com um pouco de vinho branco e mais um pouco de azeite. Depois de ferver, baixo o calor e fica a cozinhar em calor brando, o tacho tapado. Talvez também umas dias horas.
No fim, coloco as bochechas num tabuleito findo, com cuidado para não se desmancharem. Escorro a parte mais líquida do caldo que se formou no tacho e, com a varinha, desfaço a cebola, os alhos, a salsa, a cenoura até ficar um molho muito cremoso. Rego, então, as bochechas com esse molho espesso e saboroso.
  • Queixadas
As queixadas têm osso e fiz à parte para poder moer o molho das bochechas à vontade, sem receio que o caldo contivesse lascas.  
As queixadas foram feitas quase da mesma maneira mas juntei também alecrim e louro, porque, aqui não ia moer. Foram servidas assim mesmo. 
Para acompanhar tinha puré de maçã. Comprei feito, sem açúcares adicionados, puro purá de maçã cozida. 
  • Fiz ainda arroz de substância para acompanhar
Chamo-lhe de substância mas é assim: Num tacho coloco azeite e alhos com carne de vaca e porco picadas, não muita. Junto também um bocadinho, pouco de chouriço de carne cortado aos bocadinhos. Depois juntei cebola picada e salsa. Juntei ainda uma cenoura grande ralada. Juntei o dobro da quantidade de arroz em líquido (uma parte do caldo escorrido das bochechas e a parte restante em água). Ficou a cozinhar. Depois juntei o arroz. No final, quando tinha um pouco de caldo, juntei um ramo de hortelã e mexi para o sabor se misturar.

Houve alface para salada.

Depois uvas e tarte de framboesas e árvore de natal de limão (os bolos, como habitualmente da Padaria Portuguesa).

Acompanhámos com tinto alentejano, um monocasta, Sangiovese 2013. Sumo de laranja para crianças e para quem não é dado a vinhos.

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E fiz questáo de fotografar uma vez mais aquele navio que me enche de pena e espanto: o Rio Arauca continua fundeado a meio do Tejo há mais de um ano com um grupo de tripulantes que de lá não pode sair, apenas contando com a boa vontade de uma empresa que manda regularmente mantimentos para que, ao menos, sobrevivam,


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E permitam que termine este post com um vídeo que nada tem a ver com o que acabei de escrever. Mas tem a ver comigo, com o meu amor à natureza, com o meu respeito e veneração pela diversidade e beleza da natureza.

A história de Pamela Gale Malhotra e do marido Anil que há duas décadas cuidam de um bocado de terra, um espaço maravilhoso que parece mesmo o paraíso na terra


Sejam felizes em 2019.

5 comentários:

CCF disse...

Feliz ano novo! Estou a habituar-me a passar por aqui.
~CC~

Portuguesinha disse...

Parece delicioso e pode vir cá cozinhar sempre que desejar, ehhe.

Onde compra a dobradinha já enrolada?
Fiquei muito curiosa.

E deliciada :)

Um Jeito Manso disse...

Olá ~CC~

Pois, então, saiba que gosto de sabê-la por cá. Venha e sinta-se em casa, ok?

E um Ano Novo em grande, com tudo de bom para si!

Um Jeito Manso disse...

Olá Portuguesinha,

Cozinhar ao domicílio...? Pois, sei que está a dar. Mas não sei não, parece que me sinto bem é com os meus tachos e panelas.

Quanto aos molhinhos, se nunca os viu à venda é porque pelas suas bandas não se usam. Mas pode pedir para fazer num talho ou quiçá fazê-los em casa, comprando a dobrada. Pesquisando na net poderá ver imagens.

Bom apetite!

E um belo Ano Novo!

AV disse...

Não conhecia os molhinhos, embora já tivesse visto as tripas aos molhos transmontanas. Vai ser este o ano de experimentar com esta ideia.

Um abraço,


Ana