domingo, janeiro 07, 2018

Zuckerberg diz que o seu objectivo para 2018 é corrigir o Facebook.
Mas eu, meus Caros, o conselho que vos dou é que não se fiem e tenham mas é cuidado.




Não é novidade para quem por aqui me acompanha: nunca senti vontade de me arregimentar ou sequer curiosidade por essa coisa do Facebook. Praticamente todas as pessoas que conheço estão lá e as razões que invocam a mim parecem-me razões para não estar lá: não quero saber o que andam os outros a fazer, estou-me nas tintas para ver os pratos que comem, os sapatos que calçam, os vestidos novos, selfies com a paisagem em fundo ou fotografias de família. Se me referem, com nostalgia, a possibilidade de verem o que fazem e por onde andam amigos de infância ou colegas de liceu ou universidade, fico na mesma: estão bem onde estão, no passado, sorridentes, brincalhões, sem calvície ou barrigas, sem rugas ou papos.


Mais: vamos supor que me dava alguma coisinha má e punha uma fotografia minha (ainda que desfocada) ou que escrevia uma bacorada qualquer. Alguma vez me imagino a espiar, ansiosa, quem é que lá punha ou não punha like? É que nem pouco mais ou menos. 

Ainda há dias ouvi uma colega -- que tinha por pessoa desempoeirada -- a dizer que uma outra tinha publicado uma fotografia em que mostrava o novo corte de cabelo e que fulana, beltrana e sicrana já lá tinham ido pôr um like. Ouvi e não disse nada mas, por dentro, fiquei perplexa: então ela anda a acompanhar as fotografias que a outra põe e a ver quem é que lá vai pôr likes...? Qual o propósito ou a lógica disso? 

Ou, ainda esta semana, na copa, ouvi umas quantas a conversarem sobre a nova namorada de um outro e com quem é que essa namorada se dá ou com quem é que antes era casada -- e tudo a partir do que viram no Facebook.. 

Ou, e ate já aqui o contei, uma extraordinária discussão a que, há tempos, assisti na casa de banho do escritório onde trabalho, porque uma se tinha desamigado de uma outra e isto depois de um qualquer comentário menos agradável da outra que, por sua vez, dizia que a outra é que tinha interpretado mal. Uma verdadeira conversa de outrazinhas.


Ou seja, um clube de exibicionismo, voyeurismo, coscuvilhice e intriga a nível galático.

Talvez nem toda a gente o use por motivos mesquinhos ou inconfessáveis e esteja ali apenas porque sim, para conviver com a família que está longe, para recomendarem livros uns aos outros ou coisa do género.

Pode ser. Mas é o princípio da coisa: aquilo é um painel de publicidade. É isso que sustenta o Facebook. A imensa informação fornecida por cada pessoa (o tipo de imagens de que gosta, os assuntos pelos quais mostra interesse) é usada para definir o seu perfil. Chama-se 'profiling'. O Facebook, a partir do profiling permanentemente actualizado pelas próprias pessoas, determina os produtos pelos quais as pessoas revelam alguma apetência e vai, aberta ou subliminarmente, induzindo o interesse por parte dos incautos utilizadores da tentacular rede social. Os algortitmos que movimentam a imensa máquina do Facebook estão permanentemente a ser actualizados e, sem o saberem, os seus utilizadores são os cordeiros silenciosos que facilmente são (ou podem ser) manipulados na direcção que mais convém aos interesses do Facebook.


Obviamente isto acontece com o Facebook como com o Google. Mas o modelo de utilização do Facebook parece-me o mais perigoso e perverso motor de alienação e submissão.
Claro que haverá comunidades bem informadas, que sabem defender-se e usar a rede de forma inteligente. Mas serão minorias.
E depois há ainda os mecanismos de habituação e recompensa que o Facebook usa de forma deliberada para incentivar a utilização permanente.


E a questão não é apenas essa: é também o imenso manancial de informação pessoal que reside nos sistemas informáticos do Facebook e que podem vir a ser usadas, no futuro, de forma que os próprios não desejem. As pessoas pensam: ah a minha página é privada, só os meus amigos vêem o que lá ponho. Ok. Mas é informação que reside algures, na nuvem, que pode vir a ser pirateada, usada sabe-se lá quando, por quem. Parecerão hipóteses remotas e improváveis a quem nunca pensa nisto mas é bom que saibam que tecnicamente são hipóteses absolutamente possíveis e que, num mundo desregulado como o nosso, até que algum travão consiga seja activado, muito estrago pode acontecer.

E mesmo que a informação de cada um não seja usada de forma maliciosa a título individual, há a utilização da informação anonimizada por parte de empresas que adquirem toda esse monstruoso volume de Big Data para fins potencialmente perigosos, como é o caso da Cambridge Analytics sobre a qual já aqui falei -- que é das mais interessantes e sinistras empresas da actualidade e que deveria motivar atenção redobrada às democracias. Cada Parlamento deveria ter um grupo de estudo destas novas realidades para saber como legislar de forma preventiva para que as democracias não sejam subvertidas através de mecanismos como os que são o objecto de empresas como a CA.

Leio que Zuckerberg anuncia que o seu maior objectivo para 2018 é 'corrigir' os erros do Facebook

CEO reveals this year’s ‘personal challenge’ as site faces relentless criticism over spreading of misinformation and damage to users’ mental health
Amid unceasing criticism of Facebook’s immense power and pernicious impact on society, its CEO, Mark Zuckerberg, announced Thursday that his “personal challenge” for 2018 will be “to focus on fixing these important issues”. (...)
Não acredito que seja possível pois o monstro está fora da caixa e, portanto, fora de controlo. A menos que Zuckerberg acabe com o Facebook. Como isso não é possível pois estamos a falar de uma empresa gigantesca, com milhares de postos de trabalho, movimentando uma parcela importante da economia, nada há a fazer (para além de pequenos remendos para fazer de conta).


Seja como for, nada como ouvir a opinião de quem já trabalhou para o Facebook. Os riscos de que falam, os malefícios que referem devem merecer toda a nossa atenção. Ou um vídeo que aconselha o abandono do vício do Facebook.






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