quinta-feira, outubro 27, 2016

Podia ser um aprendiz de líder* mas não: é apenas um aprendiz de maluco
[Ena Jorge, tanto peixinho... Anda ver o Oceanário...]


Continuo com ele. Algum psicólogo que aí esteja que explique isto. Pensará o meu subconsciente que, com tanta maluqueira por que passo durante o dia, já só me sinto bem entre doidos? Ou quererá ele, o meu subconsciente, que eu perceba que não tenho razão de queixa já que malucos a sério são de outro calibre que não aqueles aprendizes que animam o meu dia?

Le Puy en Velay, França

Pois não sei. O que sei é que saio cedo de casa e só regresso bem de noite e, todo o santo dia, é um entra e sai e um 'temos um problema' ou 'posso dar-lhe uma palavrinha?' e, pelo meio, telefonemas, dezenas de mails, reuniões. E eu, aqui chegada, às quinhentas da noite, só me apetece uma de duas: ou um duche prolongado ou pôr-me a ver vídeos malucos. Como duche prolongado a esta hora faria o meu marido rifar-me já que agradece que eu, ao menos, não faça barulho, opto por me pôr aqui a rir a ver endoidados verdadeiramente encartados. Nisto dos doidos varridos tenho alguns de estimação. Agora voltei ao João Vuvu ou João de Deus.

Há bocado estive a ver o Sócrates com a Judite. Aquele penteado e aquela pintura de olhos não favorece especialmente o rosto. Refiro-me à Judite, bem entendido. Ele igual a si próprio. De cabeça erguida, afirmativo, oferecendo o peito às balas. Pode ser que um dia eu reconheça que me enganei redondamente. Mas, até lá, vejo-o como sempre o vi. Indiferente às polémicas e aos cães que ladram na beira da estrada, ele e a sua carruagem continuam a passar.


A vida é curta para ser gasta com logros, ódios, sombras negras, ocas vaidades. 

Caíu um assessor por, ao que se diz, mais uma falsa licenciatura. Cai debaixo de uma pública humilhação. A ser verdade o que se lê nos jornais, interrogo-me se o que ele sentia ao ser tratado por doutor ou engenheiro compensava o risco de vir a passar por este vexame. Eu diria que não.

Mas cada um sabe de si. Quem sou eu para julgar sobre as motivações dos outros?

Juliette et les Esprits, Montpellier, França

Não ligo a tretas, à imagem, a tudo o que me parece fútil e efémero. Não me passaria pela cabeça dizer que sou doutorada. Para quê? Qual o gozo disso? Se fosse, tudo bem. Mas não sendo, para quê querer parecer o que se não é? Sou licenciada numa altura em que eram 5 anos intensivos, fiz pós graduações, cenas de programas de gestão de alta direcção e tanta coisa que já nem me lembro bem. Não tenho o hábito de registar o que faço, ou os cursos, seminários ou conferências em que participo. Vejo CVs em que cada passo que dão aparece plasmado como se tivessem posto um pé na lua. Nem me encaixo nos europasses, como é bom de ver. No outro dia pediram-me um CV actualizado e até me deu vontade de rir a versão antiga que encontrei. Optei por escrever de novo, sintetizado, sem palha. De tudo isso, espremido, o que uso hoje é quase nada. Pouco do que preciso tem a ver com isso. Serve-me de mais a literatura, um poema lido ou ouvido, a música, o conhecimento das pessoas e da vida do que de toda a teoria com que tentaram empanturrar-me. Felizmente tive o discernimento de dosear o que retinha. 

Cada vez mais acho que as pessoas que se levam muito a sério não são boas da cabeça. Ou são umas chatas que não se aguentam ou são chanfradas. 

Não sei se foi ontem ou antes de ontem, vi um bocado da entrevista de Jerónimo de Sousa na televisão, não sei em que canal. Pensei: 'ora aqui está um homem bom'. E fiquei contente por ter pensado isto. Acho que é das melhores coisas que se pode dizer de um homem. Não faço ideia se o líder do PCP estudou mas isso é tão irrelevante face ao que ele tem de densidade humana e de carisma que parece até estultícia trazer esse assunto para aqui.

Em Palmitas, Mexico, toda a cidade foi pintada com coloridos fortes

Mas enfim. O sono com que estou faz destas: já nem sei a que propósito veio esta conversa. Mas pronto, é um sinal para me despachar, mostrar o vídeo que estive a ver há bocado, pegar na trouxa (qual trouxa?) e ir pregar para outra freguesia.

E, entretanto:

Vai chamar pai a outro!




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As fotografias de casas mostram pinturas que enganam os transeuntes incautos.
(Mais no Bored Panda)

(*) Aquele asterisco no título tem a ver com o malandreco do Sócrates ter dito à Judite que o António Costa ainda está a aprender a ser líder. Cá se fazem, cá se pagam. Olho por olho, dente por dente. Mas inócuo. Coisa de mano velho e mano novo. 


Lá no título, o aprendiz de maluco não tem nada a ver nem com o Costa nem com o Sócrates: é apenas o filho do pai aqui de cima.  

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E desçam, por favor, caso queiram ler recordações minhas a propósito do maluco que apanhava moscas.

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9 comentários:

Estátua de Sal disse...

Para quê corer tanto, demais, se nunca conseguiremos ultrapassar a nossa morte, nem pela direita nem pela esquerda?

Um Jeito Manso disse...

Bom dia,

Primeiro: gosto de vê-la por aqui, Estátua.

Segundo: uma pergunta dessas, assim à queima-roupa, e para ser lida ainda mal o sol despontou de entre as nuvens não é coisa que se faça a uma mulher indefesa.

Mas adiante que o cheiro a pólvora ainda se faz sentir e nunca se sabe se, de onde esse partiu, não virão mais.

Presumo que se refira ao facto de eu andar com sobrecarga de trabalho. Ando, de facto. Mas, sabe?, estas coisas nunca são voluntárias (não fui eu que disse: ponham mais trabalho em cima que eu aguento, aguento...) mas claro que poderia ter dito: é trabalho a mais, não quero.

Só que isto não é de andar a tentar ultrapassar a morte mas é mais no sentido de 'há aqui uma crise e é preciso tentar tirar o pai da forca'. Ou 'entre mortos e feridos, alguém tem que se salvar - e vai lá ver o que consegues fazer'. E uma pessoa, inserida numa organização, sente que não tem como negar a ajuda que é pedida.

Posto isto, a ideia é organizar rapidamente as coisas para que fiquem com a autonomia suficiente para andarem por si. Nessa altura, o meu acompanhamento será em doses mais normais.

Sou o oposto dos viciados em trabalho. Trabalho por gosto mas trabalhar não preenche a minha vida. Preciso de espaço para fazer outras coisas. E preciso de tempo para descansar - só que aí tenho este biorritmo: em vez de me deitar cedo, é o que se vê.

Por isso, saiba, Estátua de Sal, não ando a correr para atingir o pódio ou o altar.

E, verdade seja dita, a correria em que ando ainda não me retirou a capacidade de parar, de olhar à minha volta, de apreciar as coisas boas desta vida.

E é isto. Para a próxima a ver se o seu tiro não é mesmo no meio da testa senão ainda se arrisca a que, por aqui, deixe de andar uma maluca à solta pela floresta.

Um bom dia para si, Estátua de Sal!

Abraham Chevrolet disse...

Deixe-me contar-lhe uma coisa que decerto ouviu: aqui há dias,quando do último ataque informático de nível internacional, a TSF entrevistou,para o noticiário,o professor doutor José Tribolet,na opinião de muitos um grande especialista em Informática. E dizia o prof. Tribolet: as pessoas dizem-me, quando falo nestas coisas,ò Tribolet,estás a assustar o pessoal!Mas não,é a verdade que eu digo.
Imaginem um engravatado,armado em professor,que frases não construiria ao invés desta clareza! A diferença entre os grandes e os pequenos são visíveis em tantas coisas...

Anónimo disse...

O próximo é que está bem :)

Anónimo disse...

Enquanto conseguir manter bem clara essa linha divisória dos dois mundos a coisa está em perfeitas condições. É a chamada loucura saudável :)
Quando as misturar a coisa já piará mais fino mas nessa altura não perceberá a amálgama em que se enrodilhou.
eheheheheh
um beijo
GG

Um Jeito Manso disse...

Olá Abe (e desculpe o diminutivo mas sou preguiçosa),

Não o ouvi agora na rádio mas ouvi-o outras vezes e ao vivo. É um bacano que fala uma linguagem popular e que diz coisas muito claras e objectivas. Mas, talvez por isso, anda há séculos a pregar no deserto. Se um dia as redes e os grandes sistemas do país aterrarem ou aparecerem virados do avesso não será por falta de alertas dele.

(Achei curiosa esta sua referência quando o vejo andando, geralmente, por mundos menos tecnológicos).

E um bom dia para si, Abe!

Um Jeito Manso disse...

Olá Anónimo,

Vou pedir-lhe uma coisa: para a próxima a ver se gasta uns segundos mais comigo, ok...? É que foi tão minimalista no que escreveu que não sei se está a dizer-me que a cena de matar as moscas é que é do seu agrado ou se o próximo que está bem é outro.

Um belo dia para si, amigo do próximo!

Um Jeito Manso disse...

Olá GG!

Espero que tudo esteja bem consigo.

E se fossem só estes dois mundos... Mas, sabe lá, são vários... Grande parte das pessoas que conheço só conhece um dos meus lados. Se cada uma testemunhasse ameu respeito haveria de parecer que estavam a falar de pessoas diferentes.

E acho que não há o risco de se misturarem porque há fronteiras intransponíveis entre eles.

Ou se calhar, pensando melhor, já se misturam... Não faço ideia. Será que já estou lelé da cuca, GG? O que lhe tem parecido?

E um abraço e um grande dia para si, GG!

Anónimo disse...

ehehehehheh
continuie assim que está no bom caminho
Ando ótima
lá diz o outro "esta vida são 3 dias e dois já passaram"
Beijos
GG