quinta-feira, maio 26, 2016

Postal ilustrado de Sintra




De vez em quando vou a Sintra mas, como tantas vezes me acontece, chego cedo, vou à minha vida, estou todo o dia onde tenho que estar e saio ao fim da tarde, por vezes já de noite, meto-me no carro e faço o caminho de regresso. Ou seja, passear pela vila, descansada, turista, calcorrear as ruas de máquina em punho, isso não dá.

Mas hoje deu. No outro dia, antes das nove, já os autocarros despejavam turistas e já as ruas se acotovelavam tentando encaixar mais um. Mas vi isso do carro. E não é que goste de frequentar locais a transbordar, mas gosto, isso sim, de me sentir estrangeira pois parece que é a maneira certa para ver as coisas com olhos de primeira vez.


Ao passar pela esplanada lembrei-me de, não há muito tempo, ao chegar de manhã e, ao passar por lá, ouvir chamar o meu nome e ver uma mesa cheia de homens de fato e gravata, folgazões, contando piadas e rindo, dizendo que me juntasse a eles. Juntei-me, claro. Com receio do trânsito, tínhamos chegado cedo demais e ali ficámos fazendo tempo. 

Desse grupo de bons malandros já não trabalho com nenhum. De vez em quando falamo-nos ou vemo-nos mas a animação que então reinava entre nós de cada vez que nos juntávamos, essa ficou naquela mesa, sob as árvores, numa manhã em Sintra que não sabíamos que ia ser a última.

Mas a vida é assim mesmo, de vez em quando pega nuns e leva-os para um lado, pega noutros e empurra-os porta fora e, alguns, sabe-se lá como, são poupados. Mas, de facto, pensando bem, poupados a quê?

Enfim, adiante, que hoje isso não é tema.

Hoje, então, passeei com tempo, por minha conta. Fotografando, espreitando as lojas, vendo as pessoas que passavam, olhando as árvores, as gigantes e belas árvores de Sintra. E olhando os muitos idosos que, em ruidosos bandos, enchem as ruas de várias línguas. Muitos italianos, muitos mesmos. Mas também muitos jovens, casalinhos jovens. 

Não se percebe, mas a jovem mãe estava a amamentar o bebé enquanto caminhava rua acima

De mão dada, como uma adolescente de férias, radiante de ter roubado tempo para usar gostosamente o tempo, por ali passeei também eu, e comprei queijadinhas e travesseiros, almocei, fotografei, desviei-me de outros turistas, feliz da vida.
Com pouco me sinto feliz, parece que basta desviarem-me uns poucos quilómetros da minha rota usual para já eu me sentir livre de pesos, descontraída, como se estivesse num país desconhecido, à descoberta. 
Agora há muitos tuk-tuk, muitos. Os cavalos estão parados à espera de clientes, que preferem andar a pé ou de tuk-tuk (não sei se é com k ou com c)


Para além das usuais lojas para turistas, há muitas de qualidade, com peças antigas ou artesanato urbano de qualidade. Numa vi um senhor a querer saber se podiam enviar uma grande garça de madeira para o Canadá. A bela peça custava cerca de 300 euros e valia bem o valor. E percebi que a transação se ia concretizar. Ou seja, do que observei por ali, são turistas com poder de compra e não daqueles que varrem tudo sem gastar um tostão furado.



Lá vi também o novo museu das notícias que, vá lá saber porquê, pelos vistos para ser percebido pelos turistas de língua inglesa, se chama News Museum. Não entrámos. Apesar de estarmos com tempo, uma outra maratona nos esperava e, por isso, hoje foi mesmo apenas flanar, curtir, esticar as pernas, desfrutar.

(E não é que, por ter falado nos bolos, agora estou aqui com uma vontade danada de ir à cozinha assaltar a caixa e atirar-me a um belo travesseiro...? Não sei se vou conseguir resistir, vou já avisando)


Quando íamos a caminho da Periquita II (que a original está fechada), dei com o fantástico homem-estátua da fotografia aqui abaixo. As pessoas lá se põem ao lado dele para a selfie do costume e ele não é de modas, quando estão para se irem embora sem deixarem dinheiro, ruge e aponta o lugar onde devem deixar a paga. Numa varanda mais acima, um manequim completa o quadro com mais um apontamento de fantasia.


E num recanto, num lugar sem qualquer imagem religiosa mas com uma cruz em cima, alguém pintou umas mãos postas. Gostei de ver. Mesmo sem o simbolismo religioso, duas mãos juntas são sempre um símbolo de esperança, de prece, de agradecimento.

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Lawrence's
Inaugurado em 1764 é o hotel mais antigo da Península Ibérica.

She walks in beauty, de Lord Byron


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 Lá em cima Natalie Merchant interpreta The Letter
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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta-feira.


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2 comentários:

Rosa Pinto disse...

Sintra é bonita. Má para as alergias. Detesto aquele clima. Sempre húmido e ventoso.
Sintra só mesmo para visitar.

P. disse...

Gosto muito da bela Vila de Sintra. É simplesmente encantadora. Passear por ali é uma das coisas que muito gosto de fazer. Em tempos, cheguei a colocar a possibilidade de ir para lá viver, mas minha mulher opôs-se por causa da humidade em excesso, que ela não gosta. Na verdade, mesmo no Verão, Primavera e Outono, quando em Lisboa, Cascais, Ericeira, etc, está sol, embora com vento por vezes, Sintra apresenta-se, muita das vezes nublada, o que é chato, embora a mim não me perturbe por aí além. Se há uma coisa que detesto é a chuva. Se estou em casa, à lareira, até acho graça, mas na rua, passo-me! E, pelas razões atrás mencionadas acabámos por não ir viver para lá, quando ainda se podia comprar uma bela casa a preços menos excessivos do os actuais. Sintra tem belíssimas casas antigas onde apetece viver, naturalmente, para quem gosta, como eu, de casas grandes, com jardim. Ao que soube outro dia, já há alguns chineses a farejar por ali e um deles comprou um desses palacetes, ali na Rua Alfredo da Costa para construir um Hotel, embora mantendo a estrutura exterior, como obriga a Câmara. Nessa mesma Rua, pode comer-se muito bem no restaurante Incomum, salve a publicidade, mas convém reservar. Num canto dessa Rua, ali perto, fica uma pequena esplanada, onde se pode tomar uma bebida e é agradável. Mais adiante, a subir, atravessando uma rotunda, creio, e na direcção da Câmara, por aquela rua larga com bons passeios, logo no início dela está a mais famosa pastelaria de Sintra, a Sapa, onde se produzem as conhecidas queijadas – as originais, nada de confusões com outras casas, como a Periquita, etc, que também as vendem, mas não são as originais. As verdadeiras são na Sapa! Tenho-me surpreendido com o desconhecimento de muita gente de Lisboa, que nunca ouviram falar da Sapa. Como é possível! Só conhecem a Periquita e os seus travesseiros. Mas, aquelas queijadas são um “must” e únicas. E o café, lá dentro, com aquelas mesinhas pequenas, antigas, e as cadeiras e vista incrível sobre Sintra vale a pena. E muita gente desconhece! Já tenho saído daqui de Cascais com sol e chegado lá com névoa. Mas, Sintra é assim, por causa daquele microclima. E no Lawrence come-se bem, ou comia-se até há pouco, embora a preços um pouco elevados. Gosto daquilo. Eça referiu-se ao hotel (nos Maias, se não erro), que seria uma estalagem, ou albergaria, ao tempo. Gosto dos parques de Sintra, do seu casario antigo, das suas ruas e ruelas, do seu ambiente, da sua atmosfera, é romântica à noite, só tem um defeito, sem perdão: não tem uma livraria (de jeito), nada! Como é possível?
P.Rufino