Pronto. No post abaixo já falei da menina das unhas grandes que mereceu séria reprimenda do comentador-candidato e da pimpolha de olho gordo que diz que ela é que quer ser presidente da Junta. E falei também do presidente das cagarras que diz que tem mais que fazer do que gastar o seu santo latim com as eleições. E, portanto, com esse post que poderão ler a seguir, já fiz a minha boa acção do dia.
Agora, a propósito de um livrinho que aqui tenho -- Teresa Rita Lopes: Pessoa do meu Desassossego -- e vendo fotografias dela, linda, e do menos bonito António José Saraiva, e tendo estado antes a ler um artigo que Leitor, a quem agradeço, me enviou sobre assunto que me interessa (a beleza é um conceito objectivo?), resolvi alinhar no espírito marcelista e fazer de conta que isto que se está a passar no país é uma casting para um reality show e não uma eleição para a Presidência da República e, portanto, vou falar de tudo menos de política.
Dizia eu que, vendo o livro -- ela com um sorridente rosto bem desenhado, uns olhos claros e luminosos, um corpo jeitoso, e ele sem grande graça, feições acentuadas, só pêlo e cabelo, nariz pronunciado e assimétrico -- fez-me logo lembrar de um casal nosso amigo que, entretanto, tamanhas eram as guerras conjugais, acabou por se separar.
Vou mudar os nomes para evitar chatices mas tudo o resto é verdade: digamos que ela, médica conceituada, se chama Bia, e que ele, director de uma multinacional, se chama Zé.
...
Mas, já agora, se não se importam, vamos com música que vamos melhor. Vamos com a banda sonora de um belo filme, um filme que, ainda por cima, tem dois homens muito bonitos, sendo qu,e dos dois, um faz o meu género e o outro nem por isso. Mas aproximem-se, por favor.
Closer
......
Continuando.
E imaginem-no agora a ele: feiinho, carão comprido e assimétrico, mal jeitoso, moreno mas escuro demais (ou então, é por ser tão felpudo que a cor negra do cabelo e do pêlo o escurecem ainda mais), da mesma altura que ela, o que a obrigava a andar de sapatos rasos, ou, então, mais baixo -- quando ela se marimbava e se montava em cima de saltos altos.
Ele um paz de alma, bem disposto e bem humorado, tranquilo, um verdadeiro pachola.
Ela uma stressada, uma ansiosa e, imagine-se, uma ciumenta -- mas ponham ciumenta nisso.
Uma vez mandei-lhe, a ela, um amigo meu que estava precisado de consultar um médico da especialidade dela. Avisei-o: olha que ela é um bocado doida, boa gente, acho que boa médica, inteligente, mas olha, pirada mesmo. No outro dia, aparece-me ele, todo babado: mas olha lá, disseste que ela era uma maluca...? Só tu mesmo para a descreveres assim. Ela o que é é uma brasa, um mulherão, uma mulher interessantíssima. Aí lembrei-me que ele tinha razão mas que eu nem me tinha lembrado disso pois, na minha cabeça, era a doideira dela que sobressaía.
Pois bem, e de onde vinha a crise permanente em que aquela interessante mulher vivia? Dos ciúmes. Desconfiava dele e de todas as mulheres que se cruzavam com ele, das colegas, de toda a gente. Felizmente nunca embirrou para o meu lado. Quando eu lhe perguntava se não tinha olhos na cara, nem me percebia. Eu explicava-lhe: quanto muito, era caso para ele ter ciúmes, não tu. Não vês que ele não tem gracinha nenhuma? Quem é que olha para ele, ó mulher...? Atina.
Ofendia-se. Que não, que ele era um homem de mão cheia. Eu ria-me, dizia: o amor é mesmo ceguinho, caraças. Mas ela, em voz alta, para que ele a ouvisse, dizia-me que preferia ser casada com um homem feio pois, assim, nenhuma mulher queria saber dele.
Ao contrário de mim que andava com um pedaço de mau caminho ao lado, que fazia as mulheres ficarem todas a olhar para ele. Eu explicava-lhe: não tinha ciúmes, que olhassem à vontade, que achava compreensível, mas que olhar não tira pedaço e, assim sendo, com os pedacinhos todos no sítio, tanto me fazia que olhassem para o meu marido como deixassem de olhar.
Geralmente ao fim de semana acabavam cá em casa. Ela não sabia cozinhar e, para além de tudo, andavam sempre de candeias às avessas. Então, iam de tarde para a praia ou para a casa de fim de semana, ela devia estar a moer-lhe a paciência horas a fio, discutiam, odiavam-se e, para evitarem estar no trânsito quase a esganarem-se um ao outro (com a filha pequena a presenciar), vinham asilar cá em casa. O meu marido passava-se. Eu, quando pensava no que havia de ser o jantar, já contava que eles me aparecessem. O meu marido dizia que, a tratá-los daquela maneira, então é que nunca mais deixavam de aparecer, que eu lhes desse conservas. Claro que não ia fazer isso. A verdade é ele não tinha paciência nenhuma para os ter cá aos fins de semana à noite, a discutirem um com o outro ou sem se falarem. Eu não me importava, gostava deles. De facto, também tinha pena dela.
O motivo das zaragatas era sempre ao mesmo: ciúmes doidos dela, uma coisa sem explicação.
O motivo das zaragatas era sempre ao mesmo: ciúmes doidos dela, uma coisa sem explicação.
O meu marido não disfarçava a impaciência, não descansava enquanto não os via pelas costas (apesar de ser bastante amigo dele, colega de curso). Ela, vendo-o assim, dizia-me: olha lá, ele devia ver isso, anda sempre ansioso. Eu tentava que ele não a ouvisse, senão dizia-lhe directamente que ela era doida varrida.
Por vezes estávamos com outro casal amigo e, aí, o outro dizia abertamente, Olha lá, ó Zé, mas como é que consegues aturar uma maluca destas? Manda-a passear, pá.
Penso que ele a aturou durante tantos anos por causa da filha, receava que ela não fosse boa mãe. E ela não queria separar-se dele nem à lei da bala, uma paixão doida. Mas ele também gostava dela.
Ainda hoje estou para perceber como era possível tal disparate sendo ambos pessoas inteligentes.
Separaram-se, claro, e, durante uns tempos ainda nos íamos encontrando, sobretudo com ele. Conhecemos-lhe não sei quantas namoradas. Íamos lá a casa, percebíamos que já tinham juntado os trapinhos, a coisa parecia séria. Na vez seguinte, já era outra. Intrigada com a saída que uma criatura daquelas tinha, chegava a pensar: na volta a Bia tinha razão, na volta, com este ar de santinho, de porreirão, este Zé ainda nos saíu um valente mulherengo. Não sei, nunca percebi. Ela também foi arranjando namorados. Uma vez estava a almoçar num restaurante, ouvi nas minhas costas uma voz familiar. Para não me virar à descarada, para me certificar, apurei o ouvido. Era uma conversa de engate, uma conversa de treta, mesmo um bocado chunga. Tinha a certeza que era ela mas, dada a situação, não quis que ela me visse, achei que poderia sentir-se envergonhada. Quando estava perto da porta olhei de soslaio mas ela estava tão entretida que não me viu. Continuava bonita, talvez até mais bonita, uma mulher deveras interessante, bem vestida, com muita pinta. Era, então, directora num dos grandes hospitais de Lisboa (não é aquela de que no outro dia falei, do S. José, esta é outra). Em frente dela estava um homem mais velho, baixo, mal jeitoso, feio, nem sei se não teria um capachinho. Pensei, aterrada: Mas como é que é possível? Deve ser tara. Gira daquela boa maneira e numa conversa daquelas com um horroroso e parvalhão daqueles?
Separaram-se, claro, e, durante uns tempos ainda nos íamos encontrando, sobretudo com ele. Conhecemos-lhe não sei quantas namoradas. Íamos lá a casa, percebíamos que já tinham juntado os trapinhos, a coisa parecia séria. Na vez seguinte, já era outra. Intrigada com a saída que uma criatura daquelas tinha, chegava a pensar: na volta a Bia tinha razão, na volta, com este ar de santinho, de porreirão, este Zé ainda nos saíu um valente mulherengo. Não sei, nunca percebi. Ela também foi arranjando namorados. Uma vez estava a almoçar num restaurante, ouvi nas minhas costas uma voz familiar. Para não me virar à descarada, para me certificar, apurei o ouvido. Era uma conversa de engate, uma conversa de treta, mesmo um bocado chunga. Tinha a certeza que era ela mas, dada a situação, não quis que ela me visse, achei que poderia sentir-se envergonhada. Quando estava perto da porta olhei de soslaio mas ela estava tão entretida que não me viu. Continuava bonita, talvez até mais bonita, uma mulher deveras interessante, bem vestida, com muita pinta. Era, então, directora num dos grandes hospitais de Lisboa (não é aquela de que no outro dia falei, do S. José, esta é outra). Em frente dela estava um homem mais velho, baixo, mal jeitoso, feio, nem sei se não teria um capachinho. Pensei, aterrada: Mas como é que é possível? Deve ser tara. Gira daquela boa maneira e numa conversa daquelas com um horroroso e parvalhão daqueles?
Nunca percebi, essa é que é a verdade.
Claro que é o que não falta: mulheres interessantes que gostam de homens feios, sem piadinha nenhuma.
Assim de repente, estou a lembrar-me de um dos casos mais castiços: o de Sartre. Feio todos os dias, tinha as mulheres que quisesse. Parece que se entusiasmavam com o poder de argumentação dele, com a argúcia e acutilância do seu raciocínio.
Assim de repente, estou a lembrar-me de um dos casos mais castiços: o de Sartre. Feio todos os dias, tinha as mulheres que quisesse. Parece que se entusiasmavam com o poder de argumentação dele, com a argúcia e acutilância do seu raciocínio.
Um que é outro caso é o Sean Penn. Não é que seja feio mas não é nada que se compare com as mulheres que caem de amores por ele: Madonna, Robin Wright, Charlize Theron (cujas fotografias mostrei lá mais para cima).
Outro, pouco engraçadinho mas que tem tido umas mulheres lindas é o Salman Rushdie. Veja-se a bela Padma Lakshmi.
Ou Sarkozy e Carla Bruni.
Pois eu, lamento, não sou dessas. Sempre gostei de homens bonitos. Se é mal enfronhadinho, se é pãozinho sem sal, se tem ar de quem não tem punch, se a gente olha para ele e só vê fealdade, se é mais baixo que eu, se tem umas mãos pequeninas, pois, então, paciência e boa viagem.
Falo assim como se ainda estivesse numa de casting, escolhendo de entre quem se apresenta a concurso. Claro que não. Mas ainda tenho olhinhos na cara e ainda sei apreciar o que me agrada.
E, para mim, a coisa é simples e vai de encontro ao que li nos artigos da Nature, em que David Deutsch disserta sobre o que é a beleza. Diz ele que, na base de tudo, estão razões que têm a ver com a atracção sexual e, isso, claro, por questões de reprodução. A espécie apura-se no sentido de saber identificar os bons reprodutores. Perpetuar a espécie parece ser, afinal, a razão disto tudo. Pois eu, primitiva que sou, ainda afino por esse diapasão: bonito e interessante, para mim, é o homem que eu acho que tem uma boa pegada (na feliz expressão dos brasileiros) e que, pelo rosto, pela forma como olha, pelo corpo, pelas mãos (as mãos são importantes), pela forma como anda, pela forma como se senta, pelo sentido de humor, pela inteligência, pelo bom feitio, pelo bom carácter, por tudo isso (e de que aqui já falei várias vezes nas minhas várias Receitas de Homem), identifico como sendo um potencial bom parceiro, ou seja, elegível.
E leia-se: bom parceiro ou elegível mesmo que não seja para mim. Acho o Bruno Alves, o Zidane ou o Clive Owen homens bonitos, interessantes e que devem fazer feliz qualquer mulher -- e digo-o, como é mais do que óbvio (e fica até ridículo referi-lo), desinteressadamente.
Até me dá vontade de rir escrever isto.
Lembro-me sempre do meu filho se ter escandalizado comigo quando me ouviu dizer que acho o Bruno Alves um giraço de se lhe tirar o chapéu, alguém que me fazia querer ver os jogos de futebol: oh mãe, deves estar a gozar, um sarrafeiro daqueles..! Pois. Mas a verdade é que talvez também por isso. Sempre fui mais de bad boys do que de copinhos de leite. Fazer o quê?
(Deve ser aquilo da propagação da espécie: um sarrafeiro sempre deve defender melhor a fêmea e as crias --- e eu aqui devia encaixar uns smiles para se perceber que estou no gozo mas não o faço, embirro com smilezinhos)
E já nem sei a que ponto queria eu chegar com esta conversa toda pelo que agora nem me ocorre qual a moral da história.
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E portanto, assim sendo e nada mais tendo a declarar a não ser que estou com sono, fico-me por aqui.
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Relembro que, para quem prefira alta política, a crónica de mais uma jornada da campanha eleitoral pode ser lida já a seguir.
4 comentários:
Eu até fico ofendido de não estar aqui referido, mas pronto. A prova da conjectura de Poincaré também é simples :)
Por acaso, Pedro, aplicando-lhe mentalmente uma aceleração do tempo, até me parece que daqui por anos estará parecido com ele, com o Poincaré, e aí talvez beneficie um pouco, mas, claro, desde que deixe de depilar as sobrancelhas. Ainda assim, temos pena.
Nunca mais me armo em engraçado. Venho aqui no melhor dos espíritos e saio debaixo de pragas e maldições.
Ri.
Pois no meu caso não sei. Beleza? Inteligência? Humor? ... mistura-se tudo com grande dose de conversa.
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