domingo, setembro 13, 2015

Joana Amaral Dias na Vidas: a nudez, a gravidez, a política. "É menina! Oxalá seja mulher com liberdade". É isto uma mensagem eficaz em tempos de campanha eleitoral. Nestas alturas vale tudo?
[A propósito, recordo as duas vezes em que estive grávida]
E termino com uma sugestão ao Carlos Abreu Amorim


Quando engravidei, ao princípio, nunca ninguém dava por nada. Usava jeans que a minha mãe abria de lado e onde colocava um elástico que eu ia ajustando. E usava umas camisas floridas, larguinhas. Como não tinha enjoos, desejos ou daqueles sintomas usuais, é que ninguém sequer suspeitava; e eu não sentia necessidade de andar a alardear, achava que era coisa minha.

Depois, quando a barriga estava maior, e já era verão, usava vestidos à mamã (como, na altura, se dizia), larguinhos, coloridos. Lembro-me de um que a minha mãe me fez, encarnado claro com umas pintinhas, sem mangas, amplamente decotado com um folhinho à volta. Vejo-me nas fotografias, ar de miúda, vestido de miúda, sempre a rir... e com uma barriga que impunha respeito.

Na altura não era costume usar blusas justas sobre barrigas muito grandes. Também não era usual estar na praia com o barrigão à vista. Usava um biquini próprio, que tinha uma espécie de véu preso no soutien e que encobria a barriga. Quando não estava gente por perto, destapava-a para que os bebés sentissem melhor o sol.

Gostava muito da minha barriga que crescia imenso; das duas vezes toda a gente dizia que eu teria gémeos apesar de eu garantir que era só um. 

Gostava muito de, à noite, quando havia lua cheia, me pôr na varanda com a barriga ao léu. Achava que a luminosidade lunar haveria de ser boa. Nunca pensei porquê. Talvez achasse que traria felicidade. Mas quando estava quarto crescente eu também apresentava à lua, à noite, na varanda ou na janela do quarto, os filhos que viviam dentro de mim. Aí, se calhar, era para ver se cresciam bem.

Nunca pus cremes para estrias e, por sorte, nunca as tive. Gostava mesmo de ver a minha barriga, especialmente quando se mexia. 

A minha filha fazia movimentos curtos, mexia os braços, as mãos, os joelhos, os pés. Era possível, colocar as mãos sobre a barriga e ficar a senti-la a mexer-se. Punha música e falava com ela. Nasceu uma menina calma, sorridente, bem comportada. Dormia bem, mamava a horas certas, brincava sossegadinha.

Com o meu filho era muito diferente. Parecia que dava cambalhotas, os movimentos eram intensos, todo ele se revolvia, e com força. Chegava quase a ficar incomodada, quase mal disposta. Devia dar sapatadas que se reflectiam no estômago, sei lá. Sempre foi tremendamente irrequieto.

Nasceu enorme, não sei se se sentia apertado apesar do tamanho do barrigão. Ao fim de pouco tempo de nascer, tive que o tirar do berço porque dava voltas, punha a perna em cima, quase virava o berço.

Também era sôfrego a mamar, engasgava-se e quase sufocava, dormia mal, não parava sossegado, ia dando comigo em maluca pois não me deixava dormir mais que uma ou duas horas de seguida. E, como mamava daquela maneira, depois vomitava, tinha que mudar a roupa da cama. Ou seja, era cá fora aquilo que se adivinhava que seria quando estava dentro da barriga. 

No entanto, apesar da experiência traumática que foram aqueles primeiros meses do meu filho, durante muitos anos, eu sentia a nostalgia da gravidez, uma saudade enorme de sentir uma pessoinha a criar-se dentro da minha barriga, a ganhar vida própria, a adquirir a sua maneira de ser. 

Já contei muitas vezes que apenas pela vida que tinha - sem apoio familiar por perto, a viver numa cidade e a trabalhar noutra, tudo muito difícil, com problemas sempre que algum ficava doente - é que não tive uma meia dúzia de filhos. O meu corpo pedia para se transformar mais vezes - eu é que não lhe dei ouvidos.

Quando os meus filhos nasciam, tinha leite que não acabava; e eles, alimentados só com leite, sem suplementos, aumentavam a olhos vistos, saudáveis, cheios de vitalidade, felizes. 

Depois, vieram os momentos da gravidez da minha filha e da minha nora. Vivi esses momentos com felicidade mas de uma maneira muito diferente, com uma ansiedade que não tive quando tinha os meus filhos dentro de mim. Verdadeiramente só descansei, de cada uma das quatro vezes, quando os vi cá fora, bem, e as mães também bem.

Tenho verdadeira devoção perante uma barriga que transporta um filho em formação. Acho das coisas mais maravilhosas do mundo esta capacidade de uma vida se formar a partir de duas ínfimas células, multiplicando-se de forma inteligente, misteriosa, perfeita.

Uma barriga de uma mulher grávida é, para mim, uma coisa de uma beleza sobrenatural.

Talvez por isso me sinta chocada com a instrumentalização que Joana Amaral Dias anda a levar a cabo com a sua barriga, a sua gravidez. Há ali qualquer coisa de vulgar, como se, em política, valesse tudo, até a exposição da parte do corpo que, transformando-se para acolher um outro ser humano, pudesse ter o mesmo efeito que um cartaz de campanha.

É que uma coisa é pensar o corpo como um elemento estético, belo, uma mulher com outra pessoa dentro de si; e outra, muito distinta, é, em campanha, isso ser aproveitado de forma gratuita, perdendo o sentido mágico e transcendental, apenas para servir de bandeira eleitoral.

E se a fotografia anterior na capa da Revista Cristina já me parecia uma coisa sem jeito, a capa agora da revista Vidas do Correio da Manhã - em que aparece espalhafatosamente chocarreira - ainda mais vulgar me parece, quase chocante.



Joana Amara Dias, candidata do AGIR


Não me tenho por conservadora pois quer política, quer esteticamente, acho que estou o mais possível aberta à diversidade, à irreverência, ao inesperado. Mas acho que há coisas que merecem algum respeito: a beleza de uma barriga grávida não deveria ser instrumentalizada com vulgaridade.

Só falta, um dia destes, o Carlos Abreu Amorim, desesperado, numa de ver se salva a sua pafiosa coligação, nos aparecer também assim:


O actor Johnny Vegas aqui fotografado por Karl J Kaul,

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Bem. E a propósito dos pafiosos ou pafientos, desloquem-se por favor até ao post abaixo a fim de contribuirem para o peditório organizado pelo ainda Primeiro-Ministro para ajudar os pobrezinhos lesados do BES a pagar as despesas de porem o BES ou o Novo Banco em tribunal. Uma cena de crowd funding a la Láparo, não sei se estão a ver. Uma coisa esperta. Mais uma.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, um belo dia de domingo.


1 comentário:

Rosa Pinto disse...

Que mimo de leitura. Acho que é isso mesmo. Digo acho porque não tive o privilégio de ser mãe. BFS