segunda-feira, maio 18, 2015

Sou mãe de um benfiquista convicto* mas a verdade é que não nutro especial simpatia pelo Benfica. Nem especial nem sem ser especial. Para dizer a verdade, nem sou de vibrar com clube nenhum. Por isso, não é disso que vou falar. Vou antes falar de uma coisa muito diferente: de um fazedor de nuvens


Há quem pegue em tintas e espalhe a cor sobre as telas, inventando flores, corpos, sombras, pontos de luz. Há quem trabalhe a pedra, a madeira, o metal e deles extraia formas abstractas, expressivos rostos, movimentos inventados. Há quem adivinhe acordes, reinterprete antigas sonoridades, traga melodia, ritmos e harmonia ou provocação à vida dos outros.

E há os que absorvem a vida que os rodeia, que interpretam os olhares dos outros, as palavras não ditas, que sonham formas diferentes de tecer frases e, com elas, constroem histórias, crónicas, poemas.

E tantos, tantos artistas de tantas artes. A dança, a fotografia, o teatro, o cinema, etc - tantos.

De Berndnaut Smilde não sei dizer se é um escultor, se é sequer um artista - os mais entendidos que o digam, que o cataloguem, que o julguem. Eu, na minha santa ignorância, acho que sim; artista de uma arte do efémero, do intangível, do imprevisto. Faz nuvens.





Eu vejo e acho lindo, acho o género de coisa que seria capaz de me comover se visse acontecer perto de mim. E, vendo as imagens, não olho para as nuvens que ele cria como algo de triste, aquele peso e negrume que tantas vezes se associa à nuvem. A mim parece-me uma impossibilidade sedosa, macia, branca - que se materializa. E que, depois, desaparece. 




Pode parecer aos mais puristas da coisa - e eu reconheço que, em tudo o que se prenda com arte, sou impura, ímpia, mas que me perdoem os entendidos, percebam que é aquela inocência própria dos ignorantes - que fazer figuras improváveis que se movem com o vento ou fazer nuvens dentro de uma sala é mais técnica e habilidade do que outra coisa. Talvez, mas poderia dar-lhes para fazer motores ou produtos químicos e não para fazer coisas belas, irreais, coisas que nos levam para uma dimensão incomum.

- É tão bom ser nuvem,
ter um corpo leve,
e passar, passar.

- Leva-me contigo.
Quero ver Granada.
Quero ver o mar.

- Granada é longe,
o mar é distante,
não podes voar.

- Para que te serve
ser nuvem, se não
me podes levar?

- Serve para te ver.
E passar, passar.


[de Eugénio de Andrade]


A Vanity Fair dá-lhe destaque e, para quem sinta curiosidade, pode ver aqui o que lá é dito. 


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* - No título, refiro apenas o meu filho como benfiquista quando originalmente a minha filha também foi manipulada para o ser. O meu cunhado, na altura ainda solteiro e bom rapaz, sempre foi benfiquista convicto, mesmo daqueles tinhosos. E então, quando apanhava o irmão de costas (sportinguista igualmente convicto), ensinava os sobrinhos, crianças de colo que ainda mal falavam, a responder à pergunta 'quem é o glorioso?' com 'benfica' levantando, ao mesmo tempo, a mão para fazer o V de Vitória. E, assim, cresceram os meus ricos filhos, sendo instruídos no misterioso culto do Benfica. Ela, pouco dada a futebóis, mais tarde tornou-se agnóstica, ao passo que ele se manteve fiel aos primeiros ensinamentos e festeja e vibra com ardor, como se uma vitória do seu glorioso fosse coisa importante na sua vida. (Que há-de uma mãe fazer...?)

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Bem, mas que venha a nuvem de Berndnaut Smilde
uma escultura feita de chuva imaterial - como que feita de luar, de lágrimas invisíveis e felizes.


 

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Estava a apetecer-me terminar com bailado. Aqui está.

Moon water

- numa interpretação do Cloud Gate Dance Theatre of Taiwan



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Desejo-vos, meus Caros leitores, uma semana muito boa a começar já por esta segunda-feira.
Saúde, sorte e amor é o que vos desejo a todos. 
(E dinheiro para os gastos, claro.)

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