quinta-feira, julho 31, 2014

BES (quase) ao fundo: em 6 meses um prejuízo de 3,57 mil milhões de euros. E as contas, ' informação financeira não auditada', não foram assumidas pela equipa de Vítor Bento. Percebe-se. Se ainda lá está grande parte dos membros da equipa de Ricardo Salgado, equipa responsável por este buracão, que assumam eles o lindo serviço que ali está! [Actualização: Entretanto, saíu um comunicado do Banco de Portugal a suspender administradores que vinham da anterior equipa (presidida por Ricardo Salgado) e a proibir o direito de voto do GES no BES. Aleluia! Aleluia!]



Let the power fall





Numa leitura rápida do documento entregue à noite à CMVM relativo às contas do BES no 1º semestre o que vejo, em primeiro lugar, é que a equipa de Vítor Bento, Moreira Rato e José Honório foge destes números como diabo da cruz. Dizem que o buraco (de 3,57 mil milhões de euros que ali está) resultou de uma gestão anterior à chegada deles e que, nos poucos dias em que lá estiveram, não tiveram tempo para validar se o que ali está é mesmo aquilo e, muito menos, explicar como se chegou ali.


Percebo-os. Aliás, acho que outra coisa não poderiam fazer.




Vejo no site do BES que a Comissão Executiva (para quem não esteja muito por dentro destas coisas, poderei dizer que a Comissão Executiva de uma empresa é o grupo de pessoas que, na administração, de facto gere a empresa, neste caso o banco, no dia a dia) tem a seguinte composição:



Vítor Augusto Brinquete Bento - Presidente, necessidade de ratificação da cooptação em Assembleia Geral 
José Alfredo de Almeida Honório - necessidade de ratificação da cooptação em Assembleia Geral 
António José Baptista do Souto 
Jorge Alberto Carvalho Martins 
Rui Manuel Duarte Sousa da Silveira 
Joaquim Aníbal Brito Freixial de Goes 
Amílcar Carlos Ferreira Morais Pires  
João Eduardo Moura da Silva Freixa  
Stanislas Gerard Marie Georges Ribes 
João de Almada Moreira Rato, necessidade de ratificação da cooptação em Assembleia Geral

em que, a bold, estão os membros da Comissão Executiva que trabalhavam com Ricardo Salgado e que ainda estão em funções no BES. 






A Comissão Executiva (CE) é, pois, parte integrante do Conselho de Administração, o qual não tem funções executivas mas que, de forma geral e descrito de forma simplista, monitoriza a actividade da  CE e analisa e aprova operações estratégicas.

Se analisarmos a composição do Conselho de Administração do BES temos outra surpresa:


Alberto Alves de Oliveira Pinto - Presidente

Vítor Augusto Brinquete Bento- necessidade de ratificação da cooptação em Assembleia Geral

Bruno Bernard Marie Joseph de Laage de Meux – Vice-Presidente

José Alfredo de Almeida Honório - necessidade de ratificação da cooptação em Assembleia Geral 

António José Baptista do Souto

Jorge Alberto Carvalho Martins

Aníbal da Costa Reis de Oliveira
Rui Manuel Duarte Sousa da Silveira
Joaquim Aníbal Brito Freixial de Goes
Ricardo Abecassis Espírito Santo Silva
Amílcar Carlos Ferreira Morais Pires
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos
João Eduardo Moura da Silva Freixa
Pedro Mosqueira do Amaral
Isabel Maria Osório de Antas Mégre de Sousa Coutinho
João de Faria Rodrigues
Marc Olivier Tristan Oppenheim
Vincent Claude Paul Pacaud
Rita Maria Lagos do Amaral Cabral
Stanislas Gerard Marie Georges Ribes
Horácio Lisboa Afonso
Pedro João Reis de Matos e Silva
Xavier Musca
João de Almada Moreira Rato - necessidade de ratificação da cooptação em Assembleia Geral 

Idem, a bold, os administradores que faziam parte da equipa liderada por Ricardo Salgado e que ainda estão em funções: a grande maioria.



Ou seja, pasme-se - depois de tudo o que tem vindo a ser descoberto, coisas que do ponto de vista da gestão são gravíssimas e do ponto de vista de ética e de respeito pela regulação são reprováveis e que, conforme os jornais noticiam, indiciam comportamentos que podem vir a ser considerados ilícitos criminais - a maioria dos seus responsáveis ainda está em funções.

Saíram os membros da família mas os outros, que também puseram em prática ou foram coniventes com essas práticas, ainda lá estão.

Note-se que o buraco brutal não é apenas um rombo no património da família Espírito Santo, porque, se fosse só isso, azarinho o deles já que tudo isto resulta da gestão que sancionaram  - o brutal buraco é também, e sobretudo, um rombo no património de muitas famílias e empresas. E parece que se anda a brincar com isso.


Agora as contas:

Vejo que todos os rácios que aferem a solvabilidade bancária baixaram para níveis que não cumprem os mínimos recomendáveis e vejo que a exposição às empresas do Grupo é escandalosa. 

Sabendo-se que são empresas falidas ou em vias disso, prudentemente foram consideradas provisões para encaixarem o incumprimento. 

Vejo que foi reconhecida a imparidade entre o valor contabilístico da participação da PT e o seu real valor. 

Em relação a Angola, assumiu-se a opção benigna (isto é, que o governo de Angola vai chegar-se à frente).


Claro que muito mais há a dizer e, claro, se cada dia que passa se vão descobrindo mais cadáveres em decomposição, é difícil saber se o que está espelhado nas contas é tudo o que há a espelhar. O perímetro de consolidação é grande, disperso, muitas empresas fora e, portanto, parece difícil apurar todas as práticas desviantes em tão pouco tempo. Tomara que não apareçam mais desgraças nas auditorias que estão em curso mas é difícil que não apareçam. Talvez não sejam é da monta das que apareceram em catadupa nestes últimos dias.

Ou seja, admitindo que o 'grosso' da porcaria já veio ao de cima, parece ter havido a vontade de evidenciar grande parte das ligações perigosas entre as empresas da família (e que perigosas elas são!) e de contabilizar já tudo o que é buraco. Ora isso é benéfico. O que se pretende é transparência pois só assim se poderá restaurar a confiança. E a confiança é o motor que faz mover a economia e o sistema bancário.


De notar, contudo, que o trabalho de evidenciação dos 'podres' parece ter-se cingido ao crédito concedido às empresas do Grupo, isto é, dinheiro canalizado do BES para financiar empresas falidas do Grupo Espírito Santo. Penso que não foi feita uma análise do mesmo género a outras empresas que receberam financiamentos e que dificilmente vão poder cumprir com as suas obrigações.

No entanto, admito que o Banco de Portugal (que andou ceguinho no que se refere às transferências de dinheiro do BES para as empresas do Grupo) tenha andado minimamente atento no que se refere a crédito concedido em geral (a outras empresas ou organismos). Por isso, não vou entrar por aí. Mas era bom saber-se que isso está sob vigilância não vá terem sido concedidos avultados empréstimos a empresas que não apresentaram as correspondentes garantias, não vão somar-se novos grandes buracos a um buraco que já não é passível de ser tapado 'às boas'.

Era também bom que fossem rapidamente detectados quem foram os responsáveis, mandantes e executores, de práticas gravíssimas como as de desviar dinheiro dos clientes, sem o acordo deles, para financiar empresas falidas do Grupo. Isto, a ter mesmo existido, é crime e grave e, dados os montantes em causa, é mesmo muito grave. Era bom saber-se que essas pessoas iam ser afastadas e o mais brevemente possível. O sistema bancário só vive com agentes acima de qualquer suspeita.

É que as práticas muito graves de que se tem tido notícia são tanto mais graves quanto afectaram pessoas que tinham as suas poupanças no BES, pensando que era um banco de gente séria, e que, quando deram por ela, o dinheiro tinha sido convertido em obrigações ou títulos que valem bola, zero, coisa nenhuma.

Mas, partindo já para as conclusões, uma coisa é certa: o banco precisa de se recapitalizar. Como já aqui vos tinha dito, reinava o nervosismo no Banco de Portugal ao perceber-se que, de facto, não sabiam de nada e que tudo o que Carlos Costa andava a dizer não passava de andar a vender refrescos. Que a almofada chegava, que o banco estava blindado, que a exposição estava contida. Ele a dizer isto e os factos a transvasarem para a opinião pública, denunciando a incorrecção do que ele dizia. entretanto remeteu-se ao silêncio - e ainda bem. Quando fala e a gente uma hora depois vê que ele se voltou a enganar, só desprestigia ainda mais o papel do BdP na regulação bancária a que se tem vindo a assistir em Portugal.

Diz Carlos Costa que há privados interessados interessados em acudir ao BES. Acredito que sim mas apenas em abstracto. O Banco vale uma ninharia, as acções estão a preço de uva mijona. Tentador. Mas, na prática, nas presentes circunstâncias, quem é que se arrisca a meter-se numa 'furada' destas sem saber ao certo as contas, com a maltinha da equipa de Salgado toda ainda dentro do Banco? 

Ou isto havia um raide, com aquela gente toda dali para fora e uma equipa experiente a tomar conta de tudo, e a chegar a conclusões em tempo recorde, ou não vejo como é que o BES escapa sem uma injecção de apoios de outra ordem (ou a verba que a troika tinha reservado mas cuja utilização agora vai ser penosa pois vai exigir cortes em quem não os esperava ter, ou qualquer outra figura que se arranje).


Parecer-me-ia razoável que a família vendesse rapidamente a sua participação no BES para com, o fruto da venda, saldar algumas dívidas, e que os novos donos convocassem uma Assembleia Geral para nomear nova administração. Se isso não acontecer, não terá o BdP poder para impor uma administração completamente 'limpa' do passivo reputacional que esta carrega?

Os novos depósitos baixaram consideravelmente e tenderão, nesta fase de incerteza, a reduzir-se à mínima expressão. Tomara que os clientes não acorram aos balcões. Ora sem depósitos, o banco não se aguenta. E se não se aguenta isso será uma desgraça impensável para o País.



O BES não é o BPP. O BES é um Banco cuja queda feriria de morte muitas famílias e muitas empresas. Como o disse aqui quando Passos Coelho - armado em farroncas, acompanhado pelo seu séquito de papagaios - disse que o Estado não se iria meter neste assunto, acho que é preciso prudência nas palavras e sangue frio e muita cabeça na análise das implicações de cada acto.


O que ele deveria dizer é justamente o contrário: que o Governo e o BdP tudo farão para que o BES não vá ao fundo, ou seja, o equivalente ao que o Draghi fez quando, ao dizer que o BCE tudo faria para combater a especulação e a crise financeira, estancou a especulação, isto é, a crise.



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Entretanto, vi que saíu um outro Comunicado, um Plano de Reestruturação do BES, Plano do BES para o Futuro, este já assinado por Vítor Bento. Não acrescenta muito, claro, nem poderia acrescentar (não houve tempo para ir mais além), mas assume que é indispensável um aumento de capital e uma responsabilização de quem causou tamanha ruína e fala no que é a medida mais óbvia e imediata (se bem que, nestas coisas, nunca é possível o imediatismo): a venda de activos. Já aqui falei nisso várias vezes. Vender à pressa para tapar alguma coisa. Só que, face à dimensão do buraco, não estou bem a ver que activos possam ser vendidos no curto prazo que valham coisa que se veja. Mas, enfim, isso é obviamente parte do que tem que ser feito. 


Falo nisto e tento abstrair-me da aflição em que estão os trabalhadores do GES e do BES. Não mereciam isto. Aliás, nem os trabalhadores, nem os clientes, fornecedores, nem os contribuintes (porque, de uma maneira ou outra, isto vai pesar em todos eles - isto é, em todos nós).

Quanto aos culpados de toda esta infame situação, a justiça que faça o que tem a fazer. Esta quarta feira decorreram novas buscas, desta feita na sede da Rioforte. Tomara que não se embrulhem em infindáveis investigações. Tomara que tudo isto seja rápido para a credibilidade no sistema bancário português se restabeleça rapidamente.



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Caraças. Isto não acaba. Quando vou dar isto por terminado, espreito as notícias e já há novo comunicado. Mas esta gente não me dá tréguas?

Agora parece que Carlos Costa está a acordar. Como sempre, acorda tarde e devagarinho. De qualquer maneira: aleluia!



Banco de Portugal inibiu direitos de voto do grupo Espírito Santo no BES. 


O Banco de Portugal determinou a "inibição dos direitos de voto inerentes à participação qualificada que a Espírito Santo Financial Group e a Espírito Santo Financial (Portugal) detêm no BES", afirmou o regulador em comunicado.


Na prática esta decisão retira à família Espírito Santo qualquer poder de decisão sobre o banco.



Banco de Portugal suspende Joaquim Goes, António Souto e Rui da Silveira


Suspensão de administradores do BES e inibição dos direitos de voto da ESFG são algumas medidas adotadas pelo regulador para garantir estabilidade do banco e a concretização do aumento de capital


O regulador anunciou  em comunicado a "suspensão, com efeitos imediatos, dos membros dos órgãos de administração com os pelouros de auditoria, compliance e gestão de riscos, bem como os titulares do órgão de fiscalização", assim como a inibição "dos direitos de voto inerentes à participação qualificada que a Espírito Santo Financial Group (ESFG) e a Espírito Santo Financial detêm no BES".


O regulador liderado por Carlos Costa  refere que "a substituição destes membros deverá ser assegurada por proposta dos acionistas, com eventual cooptação pelos membros em funções".

Estas medidas juntam-se à imposição da "realização de um aumento de capital por parte do BES" tendo o Banco de Portugal incumbido a administração de "apresentar um plano de capitalização cuja execução permita, a curto prazo, o reforço dos fundos próprios para níveis adequados de solvabilidade".


Aleluia! Aleluia!


Uma vez mais dá ideia que este Carlos Costa anda a reboque do Pedro Santos Guerreiro que esta quarta feira já tinha alertado para o óbvio: os que, na anterior equipa de gestão de Salgado, eram responsáveis pelos pelouros de auditoria, compliance e gestão de riscos ainda estão em funções no banco.

Não seria melhor o Pedro Santos Guerreiro ir tomar conta do Banco de Portugal e pôr o Carlos Costa com dono? Ou assumir que o Carlos Costa passa a não executivo do BdP e que a sucursal executiva é o núcleo duro da Economia do Expresso (Pedro Santos Guerreiro/Nicolau Santos/ e, vá lá, talvez também o João Vieira Pereira)...? A mim parecer-me-ia melhor.



A mim também me teria parecido melhor que o Costa tivesse saído com este comunicado mais cedo para eu não ter tido que gastar o meu latim com o que escrevi acima. A esta hora já podia estar a dormir. É que ninguém me poupa, senhores.

Adiante.

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A música lá em cima é Robert Fripp: 1986 from "Let the power fall".

As imagens são graffitis, fotografias, cartoons - o que, assim à pressa, arranjei na net sobre o tema.

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Ia descansar a cabeça, escrevendo outra coisa qualquer num post autónomo mas vi as horas, quase uma e meia da manhã e amanhã tenho que me levantar mais cedo e começo o dia logo com uma reunião em que tenho que estar acordada, tanto mais que me cabe a mim fazer a despesa. Por isso, fico-me por aqui. Mas, para não me ir deitar a pensar em provisões e implosões, imparidades e barbaridades, é aqui mesmo que junto uma música e um poema.


Com vossa licença, portanto: Stabat Mater

Arvo Pärt





O homem que visou o pássaro no seu voo já não existe.
Nem a sua tosca mão segurando o punho do revólver.
Nem o passo caindo em espiral entre as ervas.

O beijo. O encontro das bocas no seu último degrau.
Nem sequer a escada de caracol
Subindo como volutas de madeira até à varanda,
Nem a varanda onde sonhavas sob o traje de linho.

Não existe a mulher
Que saboreava furtadas cerejas
Nem a ira do ginete no seu cavalo atrás dela
Nem o cavalo como um vento encerrado na sua pelagem.
Chegado o momento, tocados pelos dedos do vazio,
Qual a diferença com o que nunca foi?



[Estações de Juan Manuel Roca in Os cinco enterros de Pessoa, numa tradução de Nuno Júdice]


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Nota: Volta e meia transcrevo excertos de artigos, nomeadamente do Expresso online como é o caso vertente. Ora, quando transcrevo, faço copy paste e, portanto, vem como lá está. Se tem erros ou letras a menos ou outras coisecas do AO, é assim que fica. Essas partes acabam por destoar daquilo que eu escrevo, em que escrevo sem ligar ao AO. Posso, além do mais, dada a pressa com que escrevo e o estado de sonolência que, às horas a que escrevo, já me ataca, cometer erros, faltas de letras, vírgulas fora do sítio. Feito este aviso, só posso pedir a vossa compreensão para o pot pourri que aqui vos apresento.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta-feira. 
Sejam felizes, apesar de tudo, está bem?

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2 comentários:

FIRME disse...

Os deuses andam,loucoooos! O meu espelho,ouviu a conversa que passo a transcrever:PAI...a culpa é só tua!filho;MINHA??? Morri há mais de dois mil anos !!! PAI,aborrecido; ENTÃO:>>>>só pode ser do ESPÍRITO SANTO! Filho; já começava a não acreditar em tiiii...FUI Á RASCA OUVIR AS NOTÍCIAS,pouco animadoras!

Concha disse...

Tenho gostado do que escreve sobre o GES no BES,que me tem ajudado a iluminar um pouco a trapalhada que isto tudo gerou e provavelmente continuará a gerar.Não pude deixar de soltar uma gargalhada ao "séquito de papagaios".desejo-lhe um excelente fim de semana de preferência no seu Heaven que parece fazer jus ao nome.Gracias.