quarta-feira, dezembro 11, 2013

Eu, o Natal, o diabo do consumismo e a lembrança de um senhor que há uns dois ou três anos encontrei no estacionamento do Colombo (e que, se calhar, ainda por lá anda)


Nos dois posts a seguir a este, divulgo dois exemplos de cidadania e peço-vos que não deixem de os ver. Há pessoas fantásticas e tudo o que dissermos sobre a sua luta e sobre a dignidade com que a exercem é pouco. Esta terça feira José António Pinto deixou-me emocionada quando ouvi as suas lúcidas e corajosas palavras. Uma pessoa com coluna vertebral e amor ao próximo é assim que se deve mostrar perante os deputados eleitos pelo povo. Uma lição.

Outro que não se cansa de denunciar a promiscuidade e a putrefacção que alastra em locais onde a transparência deveria imperar é Paulo Morais.

Mas isso é mais abaixo. Aqui, agora, a conversa é mais pequena, a dita small talk.

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Confesso que não tenho paciência nenhuma para o ímpeto consumista de natal, nenhuma, nenhuma, nenhuma. No entanto, uma coisa é eu não estar à espera de ser coberta de presentes e, quando me perguntam o que quero, dizer que não quero nada, e outra é eu defraudar as expectativas de quem gosta de receber presentes. 

E, assim sendo, vá de comprar coisas para miúdos e graúdos e, entrando nessa onda, acabar a comprar mais do que inicialmente queria.

Já para não falar em fotografias que tiro às centenas ou milhares e que, para escolher algumas para oferecer, perco horas, hooooraaaass, a ver uma por uma, desesperada, farta, a fazer listas para esta, aquela e aqueloutra (que, depois, na FNAC, para imprimir, são outras tantas horas pois, embora sejam feitas em regime de self service, é preciso esperar pela vez, marcá-las para impressão, e, depois ir levantar os envelopes cheios de fotografias e voltar a separá-las por destinatário; uma seeeeca...!). 

Tudo isto me leva um tempo infinito de que não disponho e que me deixa à beira de um ataque de nervos. Além disso, para as compras, só disponho de um bocadinho à hora de almoço (isto se não tiver compromissos como é o caso desta semana em que praticamente todos os dias tenho reuniões e almoços de serviço) ou ao fim de semana – em qualquer dos casos a pior altura para fazer compras.

Em síntese: um stress. E a casa vai-se enchendo de sacaria e mais sacaria. Depois é preciso separar e fazer embrulhos porque, como é bom de ver, trago tudo em sacos pois não tenho tempo para esperar que os embrulhem nas lojas.

Dispondo de pouco tempo, faço as compras em centros comerciais pois, havendo lojas para tudo e mais alguma coisa, é mais fácil cobrir quase todas as necessidades no mesmo local. O drama é que os centros comerciais, pelo menos os maiores, estão a deitar por fora às horas em que por lá ando. Arranjar lugar para o carro é logo a primeira dificuldade.

Na segunda feira, quase a correr de loja para loja, lá aviei mais uma porção de ‘encomendas’. Por fim, mal conseguia dar passo de tão carregada que ia, até me tremiam os braços, credo. Para ajudar à festa, quando coloquei o bilhete na máquina para sair do parque, a máquina dizia que o bilhete era inválido. Carreguei no botão e ninguém respondia, uma fila de carros enorme já atrás. Finalmente, lá a senhora me falou através da máquina e a cancela lá se levantou. Deve ser o sistema de validação que, de tão sobrecarregado, de vez em quando empanca. 

Consumismo mais estúpido! E eu a alinhar nisto. Todos os anos a dizer que me vou deixar de tal coisa e todos os anos a cair na mesma armadilha.

Agora por barafundas nesta altura do ano, lembrei-me de uma coisa que presenciei aqui há uns dois ou três anos por alturas do Natal.

Para quem conheça o estacionamento da catedral do consumo que dá pelo nome de Centro Comercial Colombo saberá do que falo. Aquilo tem 4 pisos e cerca de 7.000 lugares de estacionamento. Cada piso tem não sei quantas saídas e cada uma dá para seu sítio bem distinto. Uma pode dar para entrar na A1 no sentido Aeroporto/Norte, outra pode dar para Benfica, outra pode dar para a A2/Sul, outra para A5/Cascais e por aí fora. Quem não saia na saída adequada e não se mexa bem naquela confusão de estradas com várias vias em que, se não se entra na via correcta já de lá não sai, está o caldo entornado.


O conselho que dou a quem não esteja habituado a tirar o carro do Colombo é que dê as voltas que for preciso dentro do parque até encontrar uma saída que aponte no sentido correcto, ou seja, que não se aventure a sair por uma que não é a certa pois isso pode dar problemas dos diabos.

Pois bem. Como estava eu a dizer, aqui há uns poucos anos, estava eu a dirigir-me ao meu carro quando um senhor a pé, de sotaque alentejano cerrado, já com alguma idade, com ar meio perdido, me perguntou onde é que era a saída do parque.

Só pela pergunta vi logo que se avizinhava um problema dos grandes.

Disse-lhe que, em cada piso, há não uma mas várias saídas e que, portanto, ele tinha que escolher a que lhe convinha. Olhou para mim sem perceber bem a dimensão do problema. Perguntei-lhe para onde iria ele quando dali saísse. Disse-me que ia para Beja. Só me apeteceu gemer: Ai.... Mas mantive a compostura para não o assustar. 

Perguntei-lhe se pretenderia ir pela 25 de Abril ou pela Vasco da Gama uma vez que isso corresponderia a opções distintas logo depois de sair, e isto saindo pelo local correcto. Olhou para mim admirado. Perguntei-lhe por onde é que tinha vindo. Tinha vindo pela 25 de Abril. Então eu disse-lhe que teria que apanhar uma saída que dissesse A1/Aeroporto/Eixo Norte Sul ou Eixo Norte Sul/A2. Perguntou-me onde eram essas saídas. No meio daquele mar de carros era difícil dizer-lhe; aconselhei que, quando se metesse no carro, fosse andando até descobrir setas que dissessem isso. Vi-o com ar um pouco atrapalhado e então ofereci-me para o guiar, que se ele quisesse eu me metia no meu carro e ele que viesse atrás que eu daria com a saída certa. Disse-me que não, que tinha acabado de chegar, que a mulher, para ir adiantando, já tinha ido andando para o centro comercial, que ele tinha ficado ali para perceber por onde sair e que, então, ia à procura dela. Fiquei ainda mais aterrada. À procura dela? Impossível, nestas alturas, em hora de maior afluxo, encontrar alguém sem referências: é encontrar agulha em palheiro. Ainda por cima o Centro não apenas tem 3 pisos de lojas como tem várias zonas circulares, em que, quem se meta numa, não tem hipótese de se cruzar com quem ande numa das outras. Disse-lhe que o melhor seria telefonar-lhe a perguntar onde é que ela estava. Já com ar afogueado e a começar a ficar preocupado disse-me que só tinham 1 telemóvel e que ele é que estava com ele. Fiquei sem saber o que dizer. Disse-lhe que se não a visse logo, o melhor seria tentar encontrar algum funcionário ou o balcão das informações para a chamarem pelo microfone.

Perguntou-me então onde é que era a escada para o centro comercial. Escadas e elevadores há também vários em cada piso. Lá lhe indiquei qual a escada mais próxima. Perguntei-lhe se tinha fixado onde tinha deixado o carro e vi que ele ficou também apreensivo.

Apesar de estar já cheia de pressa e percebendo a dimensão do problema que ali estava armado, oferecei-me para o ajudar. Disse que não era preciso, que se havia de desenrascar mas eu vi que ele já tinha percebido que se tinha acabado de meter numa valente duma enrascada. Vim-me embora preocupada e volta e meia ainda penso nele. Tomara que ainda não ande por lá perdido, sem saber do carro nem da mulher.

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Relembro: o importante aqui hoje são os dois posts a seguir. A sério.

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Hoje no Ginjal tenho a Eunice Muñoz a dizer Eugénio de Andrade.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quarta feira!


2 comentários:

Pôr do Sol disse...

Cara Jeitinho,
Tenho todos os Natais a mesma cena. O meu marido detesta fazer compras. Acusa-me de não me organizar, comprando ao longo do ano as lembranças para o Natal.

Por mais que lhe fale do espirito da época, que lhe diga que gosto de gostar daquilo que dou a esta ou aquela pessoa, que compro os presentes de acordo com os destinatários, não adianta.

Detesto grandes CComerciais.O meu de eleição é o das Amoreiras ou o Alegro.

Este ano, depois do ROUBO nos subsidios, com muita pena reduzi presentes e tambem me socorri de fotografias para fazer algumas lembranças.

Sem sair de casa, com o site da Fotosport(deve haver outros) mas este funciona muito bem, fiz alguns albuns digitais e molduras. Por mail informaram quando a encomenda ficou pronta, fui à loja que escolhi e gostei do resultado.

Ainda me faltam dois ou tres miminhos mas vou optar por goluseimas.

Um beijinho e continuação de boas compras

Anónimo disse...

Essa história do cavalheiro de Beja é hilariante, mas ao mesmo tempo dramática. E comovente. Senti uma enorme simpatia pelo sujeito. Quanto ao Colombo, acho aquilo deplorável, grotesco do ponto de vista da Arquitectura, de fugir com tanta confusão, enfim, uma lamentável decisão camarária (à época) de se ter autorizado semelhante mamarracho na cidade. Desde que abriu, fui lá apenas 2 vezes e nunca mais lá voltei. Nem volto! Só de olhar para o edifício, sinto arrepios! Depois, detesto, do fundo da alma, Centros Comerciais. E detesto o Colombo! Aquilo é feio, grande demais, confuso, uma chunga! Foi uma das piores apostas que se fez. Poderíamos, por exemplo, ter aceite a ideia, mas sempre fora da cidade. Seguimos um modelo americano, patético aqui na Europa e desprezámos, deixando cair a nossa Baixa lisboeta e outras Baixas, como a do Porto, por exemplo. Em vez de se ter tentado estimular e dar facilidades ao comércio nas avenidas, nas ruas do centro e Baixa da capital, como tantas outras cidades europeias fizeram (Viena, Zurique, Paris, Praga, Roma, Barcelona, enfim, a lista é longa), apostámos na porcaria dos Centros Comerciais. E não foi apenas Lisboa, ou o seu centro/baixa, que ficou a perder, mas tantas outras cidades e vilas. Veja-se Cascais. Se as diversas Câmaras tivessem tido uma política diferente, de impostos, facilidades diversas, para com os comerciantes, muitas dessas lojas que hoje se encontram nos tais Centros Comerciais estariam nas ruas, nos centros dessas cidades e vilas (como se vê em muitos dos países europeus, não só nas capitais, mas em quase todos os outros centos urbanos). Ao apoiar a dinamização do comércio no centro das cidades e vilas, as câmaras poderiam, se o quisessem, permitir a abertura dos tais Shoppings na periferia. Agora o que vemos é em minha opinião lamentável. Mas a malta gosta e vai lá, passa lá fins de semana inteiros. Famílias aos magotes! Infelizmente, para quem não gosta, como é o meu caso (e de meus filhos), ocasionalmente temos de lá ir, pois nas circunstâncias actuais, é lá que está o que se pretende adquirir. Uma chatice! E nós que temos uma capital como Lisboa, um Porto, tantas outras cidades e vilas bonitas para deambular pelas suas ruas, de loja em loja, oferecem-nos Centros Comerciais! A Baixa lisboeta mete dó. Mesmo a Av. da Liberdade podia ser bem melhor! Quanto a compras natalícias, desde há um par de anos que se estabeleceu no seio da família alargada que só se dá presentes à criançada. Para mim, o Natal é tão só uma festa de família, sem qualquer sentido religioso ou comercial. Uma tradição que vem de longe, dos avós do Douro (já que os da Beira-Alta eram diferentes). O que se compra é para depois se estar em amena cavaqueira com familiares (e amigos). O tal vinho, gastronomia, etc. Nunca tive grande apetência para aqueles longos momentos (temos familiares assim) da abertura das prendas. É uma seca! Mas, enfim, respeite-se quem tem opinião oposta. E prefiro os Natais longe da urbe. No campo, de preferência! Há ali algum simobolismo, não sei. Ou porque assim foi connosco quando eramos em jovens.
P.Rufino
PS: quanto aos Centros Comerciais, sabemos bem que as decisões camarárias tiveram a ver com o peso e pressão de quem está por detrás dos mesmos. O dinheiro pesa muito!