No post a seguir a este falo das fundamentas razões para que Portas se tenha baldado à tomada de posse do Maduro, da forma como os irlandeses gozam com o Gaspar chamando-lhe Ministro das Finanças da Troika e do look de pintas do Relvas, agora com cabelinho puxado para trás à força de gel.
Mas agora, aqui, a conversa é outra. Com vossa licença, vamos lá.
- Só peço da vida ficar junto de você. Contemplando esse queixinho mais... Como pode se dominar? Eu, assim bonitinha, ficava me admirando no espelho. Nua eu me beijava por todo o corpo.
- O senhor parece louco - e uma risadinha de sapeca.
Enterrou o nariz no cabelo dourado, mordiscou a pontinha da orelha. (...)
- Perna comprida. É isso que está reparando?
- Sabe que esse joelho tem uma covinha?
- Cuidado, doutor. Não elogie tanto. Se eu gostar do senhor, como é que vai ser?
- Você é virgem, anjo?
- Certo que sou. Nem o doutor tinha o direito de perguntar. O senhor é pai, não é? Basta pensar nas suas filhas.
- Só perguntei porque sabia da resposta.
- Minha experiência começou tarde. O primeiro beijo eu dei com vinte anos. Assistia a cenas de amor no cinema e não me emocionava. Daí namorei um viúvo quinze anos mais velho. O primeiro beijo foi esse viúvo que deu. No começo não senti nada.Com a repetição fui vendo como é bom.
- Ah, é bom. Um beijinho só, anjo. Gostou do viúvo?
- Um pouco. Até hoje é louco por mim. Só eu querer, casa comigo.
- Gosta de homem mais velho?
- Prefiro um senhor maduro com experiência de vida.
- Basta ver o seu narizinho.
- Que é que tem?
- Ele fica maior quando você me olha. Os lábios são dois ninhos de beijos.
Bem quieta, deslumbrada, o dente branquinho; e repente, agarrou-lhe três dedos com a mãozinha suada:
- O doutor é mesmo um amor!
Ele arremeteu aos beijos no rosto afogueado, babujando o lóbulo da orelha. Apertava-lhe as bochechas em delírio:
- Que boquinha, anjo. Ó rostinho mais adorado.
Sopesou de leve o seio maduro, polpudo, com biquinho.
- Vim aqui de louca. Não fica bem. O pior é que gosto do sargento.
- Aposto que é um bruto, mau carácter, monstro moral.
- Sou moça direita. Preciso tirar o doutor da minha cabeça.
E o conto continua e neste e nos outros aparecem pequenas traições, pequenas fantasias, equívocos, desencontros, desentendimentos, amores falhados, desejos por satisfazer, amores proibidos, imaginados, perdidos.
Aqui há dias estava com vontade de falar neste livro, Guerra Conjugal, de Dalton Trevisan mas depois tive dificuldade em escolher um trecho, é tudo gostoso, uma linguagem suculenta, pitoresca, picaresca. Nesse dia acabei por optar por falar no amor de António José Saraiva e Teresa Rita Lopes (amor não isento de 'casos' intermédios e que, apesar de lindo, carinhoso e terminado, foi forte enquanto durou. E, Teresa Rita Lopes, mesmo depois de findo o amor enquanto base de uma relação conjugal, ficou, para sempre, ligada a ele através de um afecto absoluto).
Como quase todas as pessoas a quem a vida ainda não proporcionou um amor para a vida, Pedro Mexia gosta de falar da sua condição de solteiro e gosta de dissertar sobre a fragilidade do amor, sobre a precariedade dos laços, sobre as muitas possibilidades de que a coisa corra mal. Várias crónicas suas já versaram sobre este tema.
Não é o caso da crónica desta semana na revista Actual do Expresso, uma inteligente e muito interessante crónica sobre Bucéfalo, o cavalo que resolveu ser advogado 'num tempo em que, na ausência de grandes homens, temos que nos contentar com os seus cavalos'. Uma crónica brilhante, esta, escrita da forma escorreita e quase erudita a que já nos habituou (continuo a relutar em falar de erudição em relação a Pedro Mexia, não apenas porque ainda não tem idade para ser erudito mas porque enveredou por um caminho tão mediático que temo que se perca algures pelo caminho; os eruditos não costumam gostar tanto de aparecer, percebem os riscos que a exposição excessiva comporta).
Pedro Mexia (aqui muito bem acompanhado: com um ex e com um actual do Governo Passos Coelho...) (claro que esta fotografia aqui é meio disparatada mas encontrei-a e achei-lhe uma certa graça) |
Mas, se não falou de acidentes e desgostos conjugais na crónica de 'Fraco Consolo', foi ao livro de Trevisan que se referiu na sua crítica literária desta semana, atribuindo quatro estrelas a este livro. Pontuação justa.
Foi com um sorriso que li a forma como Pedro Mexia foi varrendo as páginas desta Guerra Conjugal.
(...) Daí que estes casais de Trevisan vivam uniões frágeis ou fictícias: sentem-se viúvos, comunicam através de bilhetes acerbos, ela é com frequência esquiva, ele é corno manso, sofrem de varizes, derrames, frustrações. Um ou outro protagonista ainda se deslumbra poeticamente com a beleza física, narizinhos, maminhas, dedinhos dos pés, 'a bundinha era banda de música com bumbos e bandeiras'; mas o encantamento é fugaz, e dali a pouco eles xingam as mulheres de 'fêmeas' ou 'flores podres'. Elas são lixo. Eles também.
Escreveu Pedro Mexia e escreveu bem.
(Cá para mim, quando acabou de escrever, deve ter pensado: por estas e por outras é que não me caso.)
De qualquer forma, não interessa o que ele pensou lá da vida dele: o que interessa é que tem razão quando pontua bem este livro. A Guerra Conjugal é um livro mesmo bom. Dalton Trevisan é um mestre dos contos e da escrita em língua portuguesa
//\\
- As fotografias que ilustram este post são da autoria do fotógrafo Steven Meisel.
- Já sabem que para saberem sobre algumas das últimas a nível da nossa pobre política, é no post abaixo.
- Mas, se me permitem a falta de vergonha, muito gostaria de vos ter também lá pelo meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa. Hoje, depois de ter lido um poema de Tatiana Faia, escrevo sobre um homem perdido nos seus labirintos, ocultando os seus pequenos medos. A seguir, na música, por recomendação de um Leitor a quem muito agradeço, tenho uma nova grande intérprete, Yuja Wang, que toca, ao piano, Chopin, Gluck e Strauss. Uma maravilha, é o que vos digo.
//\\
E, por hoje, já chega.
Tenham, meus Caros Leitores, uma bela semana a começar já por esta semana.
Saúde e alegria!
2 comentários:
Olá UJM,
Gostei de conhecer a sua opinião sobre o livro "Guerra Conjugal", de Dalton Trevisan, e certamente Pedro Mexia está atento ao desfiar de traições, ciúmes e confusões, aí expressos, em suma, aos encantamentos e desencantamentos do casamento, por isso não quer arriscar...
Um beijinho
"Nesse dia acabei por optar por falar no amor de António José Saraiva e Teresa Rita Lopes (amor não isento de 'casos' intermédios e que, apesar de lindo, carinhoso e terminado, foi forte enquanto durou. E, Teresa Rita Lopes, mesmo depois de findo o amor enquanto base de uma relação conjugal, ficou, para sempre, ligada a ele através de um afecto absoluto).
Como quase todas as pessoas a quem a vida ainda não proporcionou um amor para a vida, Pedro Mexia gosta de falar da sua condição de solteiro e gosta de dissertar sobre a fragilidade do amor, sobre a precariedade dos laços, sobre as muitas possibilidades de que a coisa corra mal. Várias crónicas suas já versaram sobre este tema"
Belo pedaço de prosa e de realismo. De facto, não se sabe quase nada da vida, até que ela nos proporcione um amor para a vida. Essa é que é essa!
Enviar um comentário