Esquece o que eu escrevi, deita-te aqui perto
e ouve só as minhas palavras sem sentido
o balbuciar que eu solto antes da voz,
tudo o que há tanto tempo trago preso na garganta.
Nem o ritmo da cantilena aprendida na infância,
nem a música da poesia:
ouve apenas o balbuciar, o sopro antes da voz,
quase um estertor, mas a dizer agora
que estamos vivos.
Nada sei de ti,
dos múltiplos tus em que te desdobras,
em que sobrevives e renasces
cada dia.
E não saber é a minha única força face a ti.
E de noite sentíamos a respiração do deserto,
os lençóis molhados sobre os nossos corpos,
deitados no chão do terraço da casa nova.
Ouvíamos chacais.
Mas muito longe.
Como eu teria amado o silêncio do mundo
se sobre ele permanecesse a marca dos teus passos.
Só este resto de neve ainda fala de nós,
como se este viver fosse apenas atravessar este campo
sem mais nada no fim.
É o mais difícil para mim.
Como falar de quem amamos por nos não amar
quando mais nos ama?
Nunca saímos dessa encabulação,
antes de uma boa gargalhada, de um chope ou de uma cachaça:
antes de chegarmos a entender que rir é toda a metafísica em acto.
No sabías hablarme. Por eso
nos echamos al catre
y dejé que jugaras con mi cuerpo
toda la noche
- qué te crees tú?
Era Madrid en los años ochenta.
No lo lleves nunca demasiado en serio.
Tu amiga de verdad,
A.
Seja o que tiver que ser o que vem pela manhã,
cada dia o mundo se desfaz, para que outro mundo nasça.
*
Os poemas escritos são de Luís Filipe Castro Mendes em Lendas da Índia.
Se ainda tiverem um suplemento de paciência para me aturar, muito gostaria que dessem ainda um salto até ao meu Ginjal e Lisboa, a love affair. As minhas tórridas palavras andam com calor em volta de um poema de José Alexandre Caldas Ribeiro. A música continua maravilhosamente a cargo de Manuel de Falla.
*
E já é quinta feira. Que seja um belo dia. Sejam felizes.
6 comentários:
Este é o seu lado "lúdico"?
Confesso que não é o que mais gosto, mas também acho interessante. Traz coisas diferentes...
Gostei muito do penúltimo video, o da dança. Gostei da música.
Os poemas agora vou relê-los, porque li-os enquanto ia vendo os videos, e acabo por não me concentrar.
Um beijinho e boa quinta-feira
Gostei dos poemas.
Olá, Isabel,
A sua pergunta e as aspas fizeram-me rir. Quase a consigo imaginar, a fazer a pergunta com ar desconfiado.
No entanto, não lhe sei responder. Este é seguramente um dos meus lados, não sei se é lúdico, se é provocador, se é apenas feminino, se é maluco, se é outra coisa qualquer.
Mas, seja do que for, não é, também, seguramente o meu único lado de qualquer destas vertentes.
Aborrece-me o que é previsível, igual, monótono. E, provavelmente por isso, saem-me coisas assim.
Ontem, uma vez mais, ao sentar-me aqui não fazia a mínima ideia do que iria falar. Além do mais estava cansada, cheguei a casa tarde, tinha saído muito cedo, estive fora de casa quase 15 horas, não estava fisicamente grande coisa e, quando estou assim, ainda mais me dá para espantar o cansaço ou as maleitas, xô...xô...! E, então, vai daí, fui buscar poesia, moda, música, dança, charme, e misturei tudo de uma forma que me pareceu fazer algum sentido.
Quando acabei, lá para a 1 e tal ou quase 2 da manhã, nem me lembro, já estava melhor, menos cansada, mais bem disposta.
Os poemas de Luís Filipe Castro Mendes são uma maravilha.
Um beijinho, Isabel!
Também me fez rir.
E caramba! Como consegue escrever tudo isto assim de seguida,e descobrir estes videos... cansada!
Imagino que "descansada" deve ser um furacão.
Podia dar-me um bocadito dessa energia toda.
Agora a sério, acho que a UJM deve ser uma pessoa bem interessante. Ao pé de si ninguém se deve aborrecer.
Um beijinho e bom fim-de-semana
Isabel,
Como é que consigo? Simples. Não pensando. A coisa faz-se por si. Escrevo sem pensar, sai tudo 'ao natural'.
Quanto a ser um furacão quando estou descansada, acho que não é bem assim. Quando tenho pouco que fazer fico stressada e não me apetece fazer nada. Funciono melhor sob stress e, quando estou stressada só me apetece descontrair, e se estão todos sisudos só me apetece rir, se estou sem poder andar só me apetece voar. (Já a avisei várias vezes que não sou lá muito boa da cabeça).
Um beijinho, Isabel e até sábado (espero eu).
Pronto, lá está!
Ao pé de si, seja como for, ninguém se deve aborrecer.
Até depois, então.
Um beijinho
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