domingo, julho 22, 2012

A menina é filha de quem? - leituras, limpezas e fotografias. E, de novo, convido-vos a verem a minha casa (de bonecas), aqui in heaven


Música, por favor

Beethoven, Sonata nº 8 - Ruben Reina no violino e Paulo Brasil no piano

*

Os meus dias aqui são dias de paz e felicidade. A minha recuperação vai andando a bom ritmo e, estando cada dia mais próxima da normalidade, tudo são prazeres a que não viro as costas. Hoje fui às compras ao supermercado (ou melhor, fui transportada, pois ainda não me aventurei a conduzir) e que bom é andar por ali, escolhendo o peixe para o almoço, escolhendo a fruta, os legumes. A mobilidade ainda não é perfeita mas, apesar das limitações, tudo isto são pequenas vitórias e grandes alegrias.

Aqui em casa continuam as limpezas e, claro, tal como ontem, quando o período de pé é mais longo e sinto que preciso de descansar, pego na máquina fotográfica e entretenho-me a fotografar a casa, depois sento-me, passo as fotografias para o computador, depois recomeço já pronta para mais faxina.

Hoje foi dia de leitura do Expresso - grande artigo o do Miguel Sousa Tavares!, grande artigo o da Clara Ferreira Alves! (porque não me apetece indispor-me nem indispor-vos, não falo da Perella e de outras empresas que, sob recomendação do ministro-fantasma Borges, e, ao que parece, também do Gaspar, por aí andam ganhando dinheiro e dando dinheiro a ganhar, e vamos ver se não de forma ilícita, enquanto nós vamos descontando e pagando mais e mais impostos para lhes pagar).

A seguir peguei num livro que andava com vontade de ler há algum tempo mas, como tenho alguns mixed feelings em relação à autora, fui protelando. Não se pode dizer que o livro seja extraordinário em termos literários mas é uma escrita corrida e o tema desperta curiosidade pelo que já li quase metade. Trata-se de 'A menina é filha de quem?' da Rita Ferro, um livro autobiográfico.



Rita Ferro lendo uma parte do seu livro,
em cuja capa se encontra uma fotografia sua em menina


Transcrevo um pouco para dar 'um cheirinho' a quem ainda não o leu:

(Falando das duas avós, a materna, viscondessa, e a paterna, a poetisa Fernanda Castro)


"Dava gosto observar as duas sogras: a cultura a concorrer com o berço, a qual, quando se esmera, leva a taça de olhos fechados, embora ali o nível se tenha equilibrado até ao fim. Em todo o caso, uma linha marcava subtilmente a distância: a minha avó materna jamais permitiu, até ao fim da vida, que o meu pai, seu genro, a tratasse se não fosse por senhora viscondessa, numa época em que o senhora dona e o tia eram alternativas.

- Chamar mãe à sogra é um bocadinho povo - ouvia-se lá por casa.

Já a minha avó Fernanda - lá está - pediu à minha mãe no próprio dia em que a viu casar-se com o filho:

- Não quero cá tias nem senhoras donas, Pó, trata-me por Fernanda.

A poetisa morou no prédio em que viria a morrer e se tornou histórico, onde antes vivera o político Joaquim Pedro Oliveira Martins e a mulher, e onde muitos nomes ligados às artes tinham, noutros andares, escrito ou desenhado: o escritor Ramalho Ortigão, o grande gráfico suíço Fred Kradolfer, o poeta José Gomes Ferreira e a mulher, Ingrid, e ainda os pintores Bernardo Marques e Ofélia, sua primeira mulher, que viriam a suicidar-se. A todos estes acrescenta-se ainda uma história de fadas: no andar superior, tinham também residido as senhoras Campos, já muito idosas, antigas aias dos príncipes D. Luís Filipe e D. Manuel.

O prédio ficou conhecido como o Soviete dos Caetanos, por ficar na Calçada dos Caetanos, nº6, e os meus pais, depois de deixarem Cascais como morada permanente, alugaram uma casa na mesma rua, no nº7, na rampa onde se instalara, para as décadas vindouras, o Conservatório de Música, mesmo em frente aos Estúdios Cor, hoje famosos por terem empregado Saramago, figura que eu seguia, já nessa altura, industriada à janela por meu pai:

- Aquele senhor que vai ali também escreve, como o pai, mas pensa de modo diferente. É comunista.

- O que é comunista, pai?

- Comunista é ires agora estudar com os teus irmãos!

No nº 6 da Calçada dos Caetanos, onde artistas bebiam de mais e gritavam versos ou ideias pela noite fora, a minha mãe arregalava os olhos com aquela chusma vestida à revelia da moda, cujos excessos a interditavam: muito gin a circular, certas liberdades de linguagem, uma grande intensidade em tudo o que se dizia e um teatro que a hipnotizava pelo contraste com o ambiente em que crescera.

(...)

A Natália [Correia], então, electrizava-nos. Pisava como uma imperatriz, tinha o timbre de uma soprano, falava como se declamasse no tom dos génios e das divas, e olhava para nós como se fôssemos larvas: não tinha filhos nem a menor paciência para crianças e confessava-o sem escrúpulos. Guardava uma raiva surda às mulheres exclusivamente domésticas e apontava-as a dedo, sem caridade, berrando para nosso sobressalto:

- Mulher imunda!

(...)

O Ary [dos Santos], caramba, que levava à minha avó presentes sofisticados, como lenços Hermès, marrons glacés ou flores tão raras que pareciam pássaros! Quando se cruzava connosco, perguntava-nos invariavelmente que ano frequentávamos, nas escolas ou liceus, para virar as costas antes da resposta - décadas mais tarde apanhá-lo-ia em flagrante a tentar catrapiscar-me um marido, e não escondo o que este me fez rir ao abrir muito os olhos para me rogar salvação."

**

E, continuando a mostrar-vos o produto das minhas expedições fotográficas, e esperando não vos maçar para além da conta...

Mostrando ao Poeta como estão as minhas uvas que ou padecem de excesso de calor ou de alguma maleita que não foi tratada:



Como respondi num comentário de há dois dias:
Muitos cachos secaram. Mas subsistem outros que não sei se vão resistir
pois alguns bagos já me parecem querer secar e as folhas estão assim, sarapintadas.


E agora voltando a entrar em casa. Ontem fiquei com pena de não se ver o prato das louças Fortuna e, por isso, hoje fotografei uma outra peça feita lá, também oferta dos meus pais: uma travessa que tenho em cima do aparador que está junto à mesa de jantar.



Como se vê, é uma travessa de barro pintado manualmente. É pesadíssima. É da Fortuna Ofícios.
À frente, uma galinha das Louças Bordallo Pinheiro.
Por trás, na parede, um grande espelho


Ontem falei dos muitos galos que tenho pintado e mostro-vos um deles. 



Parte do quadro. Aqui não dá para ver bem pois tirei a fotografia com flash, o que criou algumas alterações
Sobre as penas do rabo e das asas tem purpurinas de várias cores, brilhantes, o que o torna muito glamouroso


Mostro-vos também, de novo, a minha pequenina árvore renascida depois de a termos dado por perdida, quando uma rajada de vendo derrubou a árvore, uma grevílea, então já alta. Apesar deste calor e apesar de tão novinha agora que renasceu, cresceu imenso nestas semanas.

Está assim, vista de dentro da sala:



Como se vê, rebentou junto ao que resta do tronco da mãe
Está entre duas pedras enormes que saíram aqui da terra
e que agora usamos como bancos (e como elementos decorativos)


E como num dos comentários ao post de ontem, foi referido que a minha casa parece uma casa de fantasia, de bonecas, provo que assim é, de facto.

Com vossa licença, voltamos a entrar numa das casas de banho, por sinal a mesma de ontem. No parapeito da janela que está junto à banheira e que tem uma cortina de linho com renda feita pela minha mãe, tenho duas meninas.



Esta menina está a tomar um banho de espuma, de espelhinho na mão, enquanto um gato a observa
de cauda toda arrebitada
(É uma figura em chapa metálica pintada)



Esta outra menina prepara-se para ir apanhar um banho de sol lá fora, havaiana no pé, uma formosura
(É de material sintético pintado)



E esta madame está de cuequinhas pelo meio da pernoca gorda, enquanto fuma o seu cigarrinho
Não consegui apanhar, na fotografia, a parte de trás que também tem piada: em cima do autoclismo,
está a sua mala de mão e o telemóvel. Acho o máximo.


Ou seja, Ana, como vê, é mesmo uma casa de bonecas. Ontem, em cima da lareira, já estava uma,  com as 3 de hoje, já faz 4. E comigo, já vai em 5...!

**

E, por hoje é isto, meus Caros Leitores. 
Já é domingo e o que vos desejo é que seja um belo dia, que o vivam com boa disposição e muitos sorrisos!

9 comentários:

rosaamarela disse...

BOM DOMINGO!!!
(já estou no batente outra vez...)

Sobre a autora acho-a um pouco pretensiosa, mas já li livros dela... quando vi o post de repente pensei que UJM era aquela senhora, Jesus credo, assustei-me.

Sobre a decoração da sua casa, gosto muito do artesanato português (verdadeiro).

TB tenho algumas coisas na minha casa (a minha mãe era alentejana e gostava de TUDO o que a fazia lembrar o Alentejo. Vivo na casa que herdei dos meus pais, logo...

Entretanto com as minhas viagens e as da minha filha, tenho de tudo um pouco.

bjs

Isabel disse...

Adorei outra vez este post. É um pouco sobre decoração. Gosto muito de decoração tenho muitos livros (daqueles da Taschen e outros) e tenho algumas centenas de revistas, das quais não me consigo desfazer.

Achei a sua pintura lindíssima e a bonequinha de lata é a mais gira.
É tudo muito bonito.
Depois destes dois post fiquei com vontade de ir buscar os galinácios que tenho guardados e voltar a expo-los. Vou arranjar um cantinho e depois hei-de fotografá-los para lhe mostrar.

Tenho alguns livros da Rita Ferro que já li, mas não é uma escritora que aprecie por aí além, no entanto este livro sendo autobiográfico deve ser interessante até pelas referências a personalidades conhecidas (pelo que me pareceu). É sempre curioso conhecer estas pessoas pelo olhar de quem conviveu com elas.

A sua árvorezinha está muito jeitosa e o recanto parece bem simpático.

A UJM parece já bem melhor, desejo-lhe a continuação das melhoras e uns bons dias aí no seu Heaven.

Um beijinho e bom domingo

Anónimo disse...

Olá jeitinho, senti-me honrada pela referencia no post e até um bocadinho "encavacada", envergonhada. Obrigada, mas a sua casa é de uma imaginação, de um colorido, faz lembrar contos de fada coisas boas, alegria. Que maravilha, é também o seu espírito, como diz da infância. Nunca perca esse espírito alegre, despretencioso, critico e fantasioso.
Beijinhos e até para a semana que vou de férias desanuviar. Ana

Um Jeito Manso disse...

Olá Rosita,

Imagino a surpresa se eu fosse a Rita Ferro... mas não sou, não senhora. Este livro lê-se muito bem pois todos nós somos sempre um pouco 'cuscos' e gostamos pormenores da vida das pessoas, especialmente quando se fala de pessoas que conhecemos (hoje a ver se ainda consigo aqui colocar uma parte em que fala de Fernando Pessoa).

Com as vossas viagens imagino que deve ter muitos objectos interessantes que tornam as casas sempre cheias de vida e que se prestam a que se recordem os locais por onde já se passou. Também gosto sempre de trazer objectos dos vários locais.

Um beijinho, Rosita!


PS: Espero que já não esteja a trabalhar porque trabalhar ao fim de semana é obra...!

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel,

Já somos duas a gostar de decoração. Também tenho aqui um armário cheio de revistas de decoração e não consigo deitar nenhuma fora. E também tenho vários livros de decoração. Gosto imenso de ver casas, de arranjar a minha casa, gosto mesmo de tudo o que se prenda com a casa. Sou, aliás, toda 'caseira' (característica dos caranguejos...?).

Vou ficar à espera de ver a sua 'capoeira'...

Eu estou melhorando, cada dia um pouco melhor; ainda um bocado empenada mas acho que, cada dia que passa, já andando melhor e já chega a haver alturas que me esqueço (há bocado estive sentada no chão a fazer um colar; quando me fui levantar é que foram elas... sentei-me no chão como se estivesse normal mas, de facto, ainda o não estou bem...)

Quanto ao livro da Rita Ferro, este lê-se muito bem, estou a gostar, é adequado a ler em férias, na boa, sem grandes exigências mas mantendo o interesse ao longo do livro.

Um beijinho, Isabel!

Um Jeito Manso disse...

Olá Ana,

Envergonhada, ora essa... envergonhada de quê?

Gostei tanto de ler o que escreveu, acho que reflecte tão bem o espírito da casa e o meu próprio... Apeteceu-me mesmo reforçar a ideia para que visse que acertou na 'mouche'. Referi-me a si com todo o carinho, agradecida pelas suas palavras tão acertadas.

Na minha vida profissional e social não tenho total liberdade de movimentos mas na minha vida pessoal e dentro da minha casa tenho e, por isso, dou largas à minha maneira de ser e, talvez por isso, sinto-me sempre agradecida, abençoada, feliz, porque posso ser como sou. A minha casa reflecte muito isso e acho que os blogues também.

Gosto de receber, gosto de proporcionar boa disposição a quem me visita (embora, quando alguma coisa me irrita, como é o caso das medidas deste governo, não deixe de o dizer e aí, santa paciência, sou 'curta e grossa').

Resumindo: agradeço imenso as suas palavras e será sempre bem vinda a este blogue (como seria, certamente, muito bem vinda na minha casa).

Tenha umas belas férias, tranquilas, felizes!

Um beijinho, Ana!

rosaamarela disse...

Olá resposta em directo, aposto que está o PC.

Tenho andado aqui a cuscar a ver se a"via".

Estou "ainda" a trabalhar, e vai até amanhã de manhã.

Um Jeito Manso disse...

Olá Rosita,

Ainda no batente? A sério? Mas é médica, enfermeira, bombeira? Como é possível, sempre a trabalhar, tantas horas...? Está de plantão? E não lhe dá o sono?

... isso era bom para mim que de noite é que estou 'para as curvas'... Já passa das 3 da manhã e ainda aqui estou... Por isso, tem razão: ainda estou mesmo no PC. Mas vou desligar que isto não são horas e amanhã tenho mesmo que me despachar que vou ter um dia cheiinho.

Bom trabalho, Rosita, e espero que passe depressa para poder ir descansar.

Um beijinho!

Anónimo disse...

Obrigada jeitinho.Realmente sinto-me bem vinda e aconchegada neste blog.Revejo-me nele,mesmo quando é curta e grossa( também gosto dessa sua faceta)e aprendo muito.
Obrigada pela sua doçura.
Um beijinho e boas férias para si também.
Ana