sexta-feira, julho 30, 2010
Setúbal uma cidade pouco cuidada
Vivo noutra(s) cidade(s) há muitos anos e, desde então, perdi o relacionamento quotidiano com Setúbal. Deveria tê-lo para poder falar com melhor conhecimento de causa. Mas, como não me importo de ser questionada, e embora me custe falar assim de uma cidade a que supostamente me deveria sentir muito ligada, vou escrever um pouco daquilo que penso sobre esta cidade.
Era, na altura, uma cidade de província mas uma cidade até relativamente descontraída, não sei se pelo facto de ter praias ou de ser próxima de Lisboa. Mas, talvez por ser pequena, era basicamente uma cidade de província.
Ao contrário de outras cidades, Setúbal nunca foi uma cidade que propiciasse um fácil convívio com as praias de que dispõe. A excepção seria com Albarquel mas era uma praia totalmente conotada com uma classe baixa, que ia a pé, com farnel e garrafão.
Para as outras, era difícil ir-se. O acesso não era fácil. Para a Figueirinha, Galapos e, ainda mais, para o Portinho da Arrábida ou se ia de carro ou então ter-se-ia que ficar sujeito aos escassos autocarros (e creio que apenas os havia para a Figueirinha). De carro (e, logo, com a família), tinha que se ir de madrugada para se arranjar estacionamento não muito longínquo. Para a Tróia, praia para que, quando andava no liceu, geralmente ia durante quase todo o período de férias grandes, tínhamos que apanhar o barco e depois andar a pé até à costa (pois a praia ao pé dos barcos também era do ‘povo’).
Ou seja, não havia o hábito de se ir regularmente à praia sempre que nos apetecesse, fosse Verão ou Inverno (nem sei se havia barcos e autocarros ao longo do ano inteiro), mas ir à praia para passear, ir para uma esplanada. O que, por exemplo, acontece com Almada e as praias da Costa de Caparica, em que toda essa imensa zona de praias tem vida própria: restaurantes, esplanadas, lojas, passeios, transportes públicos frequentes todo o ano, amplo estacionamento, não se verifica com as praias de Setúbal.
Quem, naquela altura, se aventurasse a ir passear em Setúbal para a beira-mar até podia ficar ‘mal vista’, conceito muito comum nas cidades pequenas, em que todos se conhecem e onde se desenvolve uma moral puritana e conservadora.
Mas o pior é que toda esta mentalidade fechada que levou a que uma cidade fantasticamente servida de praias, se alheasse delas no seu quotidiano, levou também a todo um programa de desenvolvimento fechado, anti-progresso.
É certo que a cidade ao longo de décadas tem sofrido ciclos de desemprego que a têm empobrecido.
Mas a crise não escolhe, em abstracto (ou por fatalidade), mais umas regiões que outras: quanto muito, fustigaria mais duramente aquelas que não têm recursos naturais dignos de registo. Ora isso não é o caso de Setúbal que teria tudo para ter um desenvolvimento sustentável, para ter progresso, para atrair jovens, empresas, para atrair população em geral, para fixar indústrias e para desenvolver turismo de qualidade.
Contudo, desde sempre e vá lá saber-se porquê, tem tido uma gestão que não atende a nada disso, uma gestão desleixada, sem visão, sem ambição.
Casas que eu vi degradadas há 30 anos ou mais, ainda lá estão, cada vez mais degradadas. Prédios de mau gosto ao lado de casas pequenas, cada um virado para seu lado, passeios meio rebentados com amontoados de pedras ao lado, terrenos baldios ao lado de prédios supostamente de alguma qualidade mas sempre com algo de duvidoso (a traça, os acabamentos – há sempre qualquer coisa de inevitavelmente suburbano), pequenos bairros sociais no meio de zonas que, paisagisticamente, mereceriam todo o cuidado e carinho, paredes e muros sujos por todo o lado, contentores de lixo abertos no meio de passeios, a aberração sem nome no Largo de Jesus, o mau aspecto (de forma geral) dos restaurantes, o serviço amadorístico, a falta de limpeza das ruas, o fraco comércio, o trânsito um bocado anárquico, uma oferta cultural pobrezinha, tudo isto me faz pensar que a cidade precisa de um rumo, de estratégia e, depois, em articulação com isso, precisa de arrumação, de limpeza, de organização, de reestruturação, de um projecto integrado a todos os níveis, de um multi-plano de formação para todos, nomeadamente formação em cidadania para a população que se acomodou a este status-quo, que se tornou pouco exigente, que aceita viver no meio do desleixo institucionalizado e que até já já acha que isto faz parte do DNA setubalense.
Claro que nem tudo é tão triste e tão mauzinho assim, há pequenos nichos de qualidade. Mas são excepção, poucas excepções que não atenuam de forma alguma o aspecto geral de Setúbal, que teria tudo para ser o oposto daquilo que, de facto, infelizmente é.
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