sexta-feira, junho 23, 2023

Quando se descobre que, afinal, os muito ricos não são invulneráveis

 

Já se sabe como acabou a aventura das pessoas que embarcaram no Titan. Com sorte a dita implosão catastrófica foi inesperada e radical não lhes dando tempo a perceber o triste desfecho das suas vidas.

Depois de ouvir os nossos ilustres marujos especialistas em submarinos percebe-se que aquela expedição milionária padecia de défice de segurança a diversos níveis. Dizem que, na Europa, provavelmente, não teria havido licenciamento pois, do que se parece saber-se, parece que não seguia diversas normas de segurança.

Não sei, não percebo nada do assunto. Por isso, não falo nisso.

Vou falar de outra coisa. 

Nisto, o que me faz espécie é a apetência pelo risco que alguns muito ricos têm. 

Desde os que se montam no foguetão (para irem ali acima, num ápice, e virem logo recambiados de volta, uns minutos a ir e vir por centenas de milhares), até agora a estes que não iam ao espaço mas ao fundo do mar por $250.000 (para irem ver, por um óculo do tamanho do óculo de uma máquina de lavar roupa, destroços do Titanic), há todo um vasto leque de 'experiências radicais' para os muito milionários.

É certo que para os muito ricos, mais 250.000 menos 250.000 não fazem qualquer diferença. Mas o que os leva a embarcar em situações em que qualquer vulgar mortal percebe que pode haver risco de vida? Aliás, eles assinam termos de responsabilidade em que assumem que foram informados e estão bem cientes de que pode haver risco de vida. Porquê?

Eu creio que é porque se acham de tal forma os maiores que quase se convencem de que estão acima das vulnerabilidades normais. Penso que se convencem que o temor é coisa dos fracos que não saem da cepa torta.

Convivi relativamente de perto com algumas dessas pessoas muito ricas. Parte delas são pessoas de famílias tradicionais, desde há muito montados em cima de grandes riquezas. Mas, em torno dessas pessoas, gravita sempre um grande número de pessoas que se tornam muito ricas ou porque casam com alguém da família e, de certa forma, passam a aceder aos elevados recursos dos outros, ou porque, pelas suas funções, passam a fazer parte do círculo mais estreito, usufruindo de muitas mordomias.

Esses são os que mais deslumbrados se mostram. Ao passo que os muito ricos 'de origem' geralmente não ostentam a riqueza nem são dados a grandes excentricidades, os outros são geralmente atrevidos, gostam de se fazer passar por irreverentes, destemidos, sempre vitoriosos.

Toda a sua vida passa a ser uma exibição da sua excelência. Têm acesso a bons advogados para que os seus actos estejam sempre contratualmente blindados, têm acesso a bons médicos para fazerem check ups regulares e para atalharem, sem qualquer restrição financeira, qualquer pequeno problema. E têm acesso aos melhores hotéis do mundo, a viagens fantásticas com guias personalizados, e tudo pago pelas empresas. E têm secretárias que lhes tratam de tudo sem terem que perder tempo a organizar ou ao telefone com quem quer que seja. 

Portanto, não só têm a vida absolutamente simplificada como tudo lhes parece possível, pois todos os riscos estão, à partida, mitigados.

A única coisa que difere disto são as situações radicais, acessíveis apenas a pessoas como eles.

Vou dar um exemplo ínfimo, que não tem nada a ver com isto, mas que ilustra este sentimento de impunidade.

Fiz várias viagens de carro com algumas pessoas do tipo que referi. Escuso de dizer que os carros que usam são sempre de super topo de gama, teoricamente 100% seguros. Mas há os limites que o código de estrada impõe, há os imprevistos técnicos, há os erros humanos, etc. Pois bem. Era normal irmos a 180 ou mesmo um pouco mais. Escuso de dizer que eu abominava aquilo, o que os divertia imenso. Eu ia pregada ao banco. Para além disso, pelo menos dois deles eram exímios em acelerar, se necessário for, colando-se ao da frente e apenas se desviando no limiar do acidente. Eu quase que tinha que fechar os olhos. E eles, os maiores, invencíveis, prego a fundo, a desafiar tudo e todos.

Apanharam multas, claro. Mas há advogados para 'limpar a barra' e provavelmente também não eram eles que as pagavam. Mas, mesmo que pagassem, não era coisa que lhes fizesse qualquer mossa. 

Apostavam, claro, em que não iam apanhar multas nem ter acidentes. E riam-se daqueles que, como eu, se preocupavam com essas minudências.

Mas isto é apenas um insignificante exemplo. 

Não é que não tenham amor à vida. Claro que o têm. O que acham é que nunca lhes vai nunca acontecer nada de mal e, se acontecer, acham que têm os meios para se 'safarem' de qualquer 'alhada' em que se vejam metidos.

É bem verdade, João, que são precisos muitos pobres para se fazer um rico. E também é verdade que o mundo real está muito longe de ser um mundo perfeito. Mas o que posso dizer é que é pena que os muito ricos não resolvam ser excêntricos fazendo coisas radicais que sejam úteis e não fúteis.

Só que há nisto um outro aspecto. Os muito ricos não gostam de ser maçados Gostam de fazer coisas, ficar felizes por as terem feito, e, uma vez feitas, partem para outra. 

Ora se se meterem em actividades de resgate a migrantes, por exemplo, dificilmente se conseguem livrar de maçadas pois a seguir ao resgate dos pobres que se fazem ao mar sem quaisquer condições haverá que enquadrá-los, arranjar-lhes alojamento, trabalho, etc. Ou seja, uma carga de trabalhos. Ora meter-se em cargas de trabalhos não é para os muito ricos. Para isso, tem os seus 'colaboradores', 'assessores', advogados, etc.

Enfim.

Agora o que eu gostava é que os nossos jornalistas investigassem estes aspectos, fizessem reportagens bem estruturadas, que fossem ouvir os muito pobres e os muito ricos, eventualmente que os pusessem até frente a frente. Seria bom que se fosse mais fundo na análise das coisas, que a comunicação social (e a opinião pública) não se ficasse apenas pela espuma dos acontecimentos.

Mas fazer o quê? O mundo é mesmo um lugar complicado.

1 comentário:

Segismundo disse...

Há bocado dei comigo a pensar assim: é pá, mas que chatice, pá, a guerra nunca mais acaba, pá. Depois fui dar uma volta e aprofundei o assunto: é pá, esta guerra está mesmo pra durar, catano! E lembrei-me que a Irmã Lúcia, só lhe falta um milagre pra ser santa, é que podia acabar com a guerra. É bem capaz disso, o que é que vocês julgam?! Dizem que na Fnac está um livro que ensina como é que se acaba com a guerra. Outra coisa que às vezes me passa pela cabeça é que a guerra podia acabar antes do meio-dia; por exemplo, às 11:47. Porque depois podíamos ir todos almoçar fora. Isso é que era, caraças! Estou cá a pensar: mandava vir uma dose de amêijoas fresquinhas com muito picante, não, picante não, pá, nem pensar, talvez com pimentos e uma boa salada. Ah, é verdade, lembrei-me agora, e uma garrafa de vinho branco pra festejar. E uma boa sandes de presunto com um flash de piteira! E uma carcaça com muita maionese e um cachorro quente! É pá, isso é que era, caneco! Ai caraças, isso é que era bom! É pá, eu lembro-me de cada uma! Pra ter ideias é cá comigo. É pá, desculpem lá, mas agora tenho que ir ali sacudir um tapete. Viva Portugal.