quarta-feira, março 01, 2023

Coisas mais fofas

 

Durante quase treze anos tivemos na nossa família uma cãzinha muito meiga, uma santa que, a esta hora, deve estar a olhar por nós a partir do céu dos cães. Nunca desobedecia, nunca rosnava, era uma ternura, uma brincalhona. Os meus filhos adoravam-na e nós também.

Quando o meu filho começou a trabalhar (a minha filha já trabalhava há mais tempo pois é mais velha), deixando de poder levá-la à rua a meio do dia (morávamos num apartamento), passei a ir levá-la a casa dos meus pais à segunda de manhã, indo buscá-la à sexta à tarde. Custou-nos. Mas era melhor para ela.

Nessa altura foram os meus pais que se afeiçoaram fortemente a ela. O meu pai levava-a a passear à praia ou ao campo e a minha mãe dançava sob o seu olhar atento. Contavam-me as suas proezas e meiguices quase como se falassem de um neta mais nova.

Daqui
Depois foi o meu pai que teve o AVC e, com a revolução que isso representou lá em casa, era totalmente impossível ela lá continuar.

Foi uma época complicada para toda a família. 

E para a nossa cãzinha mais fofa também: passou a ficar todo o dia sozinha em casa. Não me lembro se o meu marido de vez em quando dava um salto a casa à hora de almoço. Só que, nessa altura, já ela estava com os problemas de saúde que advinham da sua idade avançada.

Sofri com os seus desmaios, sofri com a sua falta de força resultante de uma anemia, sofri quando tinha que ser internada ficando a olhar-me com tristeza, sofri, sofri muito, mesmo muito, quando aceitámos o que a veterinária nos vinha dizendo, que já não fazia sentido continuar a prolongar-lhe o sofrimento. Chorei como se chorasse a morte de um ente muito querido. 

Durante anos não consegui falar dela, tantas as saudades que tinha e tanto que a nossa decisão me tinha pesado.

Por isso, nem queria pensar em voltar a passar por tal situação, achava que não suportaria outro idêntico sofrimento.

A nossa fera derretida com o mimo de um dos meninos

Até que há um ano e meio, depois de filhos e netos muito insistirem na alegria que seria voltarmos a ter um cãozinho na nossa família, o meu coração abriu espaço para um outro amigo.

Depois de algumas tentativas falhadas, fomos ver um peludinho cuja mãe era pastora num monte alentejano. Quando ligámos ao dono, um pastor, mal o ouvíamos, só se ouviam badalos. Apareceu-nos depois, vindo directamente do monte, e tinha um tufo de pelo no banco do carro. Peguei-o imediatamente ao colo e ele logo se aninhou em mim. Amor à primeira vista.

Um Serra de Aires, um puro cão pastor, não tem nada a ver com uma Boxer. É teimoso, irrequieto, tem uma vontade muito própria, é refilão, de vez em quando mostra os dentes (embora cada vez menos), de vez em quando rosna (embora cada vez menos, cada vez mais baixinho, ficando depois a olhar de lado a ver se ficámos zangados) e tem um energia infindável. Mas é uma companhia alegre, é inteligentíssimo e de uma doçura que talvez supere a da nossa querida cãzinha. É-nos de uma total dedicação e tem manifestações de uma tocante ternura. E adora toda a família.

Sei que um afecto assim dificilmente se compreende por quem não tem ou nunca teve um cão. Mas quem já conheceu o amor verdadeiro e incondicional de um cão certamente compreende.

O nosso urso mais fofo agora com o pêlo em vias de ficar igual ao que era antes da tosquia

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Este vídeo aqui abaixo mostra como são afectuosos estes queridos amigos.

Beije o seu cão e registe a sua reacção


Um dia bom
Saúde. Amor. Paz.

2 comentários:

Pôr do Sol disse...

Ora aqui está um assunto de que gosto mais, realidade, inteligência natural, calor, amor sem limites.

Tem razão, só quem já teve um amor destes poderá compreendê-la.

Toda a vida lidei com cães, mas só quando os tive em minha casa, fazendo parte do agregado familiar, lhes reconheci a sua importância. São seres inteligentes ,meigos, divertidos, capazes de nos compreender na tristeza e na doença, tornando-as mais suaves.

Sofri com a ausencia deles como nem sempre aconteceu com familiares. Ainda hoje sinto saudades do pousar da sua pata na minha mão.

Votos de boa saúde e tempo para viver o seu ursinho poseur, fofo e cheio de personalidade.

Um Jeito Manso disse...

Olá Pôr de Sol

É mesmo um poseur, tem razão. Eu chamo-o e digo: 'olha para a dona, deixa tirar uma fotografia' e ele ali fica à espera que eu foque, enquadre, etc. Claro que se, entretanto, passar outro cão ou ouvir ladrar ou ouvir vozes na rua (se estivermos em casa), marimba-se para a pose e lá vai ver se tem que intervir...

Mas, de resto, é uma fofura. E o que ele gosta dos miúdos... Ou quando eles chegam, miúdos e graúdos, a festa que faz... Vai a um, salta, vai a outro, salta, um por um, saúda todos.

E com a minha mãe, por exemplo, mal ela se senta no banco de trás, onde ele também vai, deita-se e põe a cabeça nas pernas dela, para ela lhe fazer festas.

Há um afecto incondicional e inocente. Faz muita companhia, é um amigo presente e activo, legre, meigo. E teimoso... (mas também ainda é pouco mais que um cachorrito...)

Percebo muito bem quando diz que quando nos falta um amigo assim faz-nos sofrer mais do que alguns familiares. Isso é muito verdade.

Saúde e tudo de bom para si e para os seus, querida Sol Nascente.