segunda-feira, outubro 31, 2022

Segredo para um coração feliz

 


As romãs estão grandes, pesadas. Tenho que as ir apanhando apesar de a casca ainda não estar bem tingida. Como estão tão grandes e pesadas, a casca de algumas abre e vão caindo bagos. Outras tombam e rebentam na queda. Mas já estão boas. Levei outra vez à minha mãe. Disse que ia dar uma grande ao meu tio. Fui agora pesar uma delas para não escrever aqui uma coisa fora da realidade. Pesava 538gr. 

De manhã, ao pequeno-almoço, junto bagos ao abacate, ao muesli e ao kefir. Ao almoço ou o jantar junto bagos à salada. Gosto bastante. Dão frescura e crocância. Comer só romã não tem muita graça, acho. Mas misturada é uma bela mais-valia.

As laranjas também vão caindo. Ainda pouco maduras, impossíveis de aproveitar. A casca também abre e caem deixando os gomos desfeitos no chão. Se calhar estão desabituadas de tanta água da chuva.

Com as limas a mesma coisa mas caem intactas. Uso-as para fazer chá e para temperar em vez do limão. Gosto muito de limas, são sumarentas, cítricas e com um toque a canela.

O jardim está muito verde, viçoso, húmido, e todos os dias temos que ir à socapa inspeccionar a aparição de mais cogumelos. Rebentam e crescem de um dia para outro. Há-os brancos, pequenos, pé filamentar, alguns mal se vêem, parecem pintinhas brancas, mas também os há castanhos, grandes, gordos. E há uns muito dissimulados, espessos como madeira, colados aos troncos. Temos sempre medo que o cãobeludo lhes chame um figo e não fazemos ideia do efeito que produziriam.

E hoje à tarde finalmente pusemos umas novas iluminações solares que, no outro dia, comprei. 

Uma é uma grinalda com bolas brancas de papel que, quando se iluminam, ficam com uma cor quente, bonita. A outra é um projector com sensor. E a terceira, a mais controversa, é uma fita daquelas que se ilumina em pontinhos corridos. 

O meu marido, se, em geral, tende a ter mente aberta, nestas coisas é assaz conservador. Conservador e minimalista. Isto de eu querer ter grinaldas ou fitas luminosas no jardim tira-o do sério. A mim não. Sou toda a favor de energias renováveis; e ter luzinhas que se acendem à noite depois de terem acumulado energia durante o dia parece-me muito bem. Acabei eu por colocar quase sozinha a grinalda e a fita pois ele teme que o jardim fique a dar-se ares de natal. Não gosta, é avesso a excessos, a pimpineirices, a gracinhas. Não gosta nada. Sobriedade é o seu nome do meio. Como não adoptei para mim nenhum dos seus nomes, sobriedade comigo não consta. Pelo menos, nestas coisas.

A grinalda ficou junto à vedação no terraço da cozinha. Assim há sempre luz. E acho que até fica com um ar bem bonito e acolhedor. O projector foi pacífico, ficou a apontar para a porta lateral e foi ele que o pôs.  O que deu luta mais a sério foi a fita das luzinhas. Quando comprei, pensei que fossem luzinhas brancas e só quando cheguei a casa é que, vendo a embalagem, fiquei na dúvida se não serão luzinhas às cores. Resolvi ir trocar. Ele disse que não era preciso, que se poriam pelo natal. Mas eu acho que não, se não é para trocar, vamos esperar pelo natal porquê? No corredor lateral que dá acesso ao jardim das traseiras, perto da porta do lado, achei que se poderia colocar no muro, entre floreiras suspensas. Creio que nem se vê da rua. Nem assim ele queria pôr. Pus eu. Consideremos que está ali a título experimental. Se se vir da rua e for feio, retiro e logo se vê. Mas agora quero ver como fica. As outras, entretanto, já estão acesas. Presumo que o botão da fita não ficou ligado. Amanhã tratarei disso.

Tenho ainda a reportar que enquanto dava atenção ao francês que a minha menina linda estava a praticar, o mais novo foi para o meu computador. Disse que ia jogar ou ver vídeos. Deixei, claro. Passado um bocado vi-o a teclar furiosamente. Perguntei o que estava a fazer. A irmã disse: 'está a ver se descobre o teu código de acesso'. Fui ver. O teclado bloqueado. Tanto para mexeu e carregou que o teclado bloqueou, não tugia nem mugia. E foi ela, sozinha, que resolveu tudo. Apenas fui solicitada para escrever a password de desbloqueio de ecrã no teclado virtual que ela invocou, indo depois às definições de teclado.

Gera-se sempre uma tal dinâmica que cada um chama e mexe para seu lado. Quando damos por ela já fizeram das suas. O meu marido diz: deixa-los mexer em tudo, fazem o que querem, por isso não te admires. O mais novo, então, é exímio em deixar-nos às escuras. Já por duas vezes nos deixou sem conseguir ver televisão tal a jardinagem que fez nos comandos da box ou da televisão.

Em contrapartida, a irmã está cada vez mais decidida: ela põe a mesa, ela serve os pratos, ela arranja a comida ao irmão mais novo e, no fim, quer ser ela a lavar a louça. E lava tudo com rapidez e perícia, mesmo tachos e frigideiras. E acelera-me para eu ir limpando e arrumando ao ritmo a que ela lava. Ao lanche também quis ser ela a tratar de tudo e, quando resolveram querer ovos mexidos, quis ser ela a fazê-los. Batidos com água, conforme aprendeu com o pai.

Pelo meio, houve pinturas de halloween e não apenas fui a pintora como eu própria acabei com cara de bruxa. Os trabalhos de casa que eram para ser feitos e o estudo que era para ter acontecido ficaram um pouco comprometidos, claro. Não consigo arranjar determinação para os forçar ao que quer que seja. Já dei para esse peditório. Agora é a vez dos pais deles.

E este domingo de manhã, aproveitando a aberta do bom tempo, fomos passear e apanhar sol para a beira-mar com a minha mãe. Muita gente, muita vida. As pessoas começam a curtir o ar livre. Adoro isso. E a minha mãe, toda jovem e fresca, lesta na passada, conversadora e animada, também gosta.

Há bocado, ao fim da tarde, já hora nova, fui para o terraço onde habitualmente nos juntamos para tomar as refeições ao ar livre ou conversar. Fui ver anoitecer, ver as luzinhas solares (que ali estão desde o verão e que, na altura, também deram bastante luta) começarem a iluminar o espaço. Estava sozinha com o computador a ver se via o The Good Doctor. Mas distraí-me e não vi. Fiquei-me pela contemplação do momento. Um pássaro passou por ali. Silêncio. Anoiteceu. Soube-me tão bem estar ali, uma tranquilidade total. Pensei que me sinto bem, que os meus se sentem bem -- e que não peço muito mais que isso. Pensei também que, se um dia me der para tentar meditar, naquele momento em que é suposto pensarmos em situações ou lugares aprazíveis, vou pensar em instantes assim, instantes de serenidade e paz.


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Tenho pena que o vídeo abaixo não tenha legendas em português. A experiência de vida de Lize Venter é impressionante e um exemplo. Depois de uma infância marcada por um sofrimento obscuro, violada por um irmão mais velho, eis que agora consegue o apaziguamento que lhe permite ter o coração feliz. Muito bonito.

Secret to a happy heart - Finding Wonderland

Trigger Warning - This film contains reference to sexual abuse, which may be triggering for some viewers.  If you have been affected by a similar issue and you need someone to talk to, please reach out to an organisation or individual near you for help.  Take care.

“The secret is to surround yourself with people who make your heart smile. It’s then, only then, that you’ll find Wonderland”

Our relationships teach us about so much more than the hearts of the ones we love - they teach us about ourselves.  Relationships show us how to love and be loved, as well as who we want to be in life and who we don't. 

Surround yourself with those who bring out the best in you. The ones who not only want to see you smile but also try to make you smile when you’re down. The ones who try to make your day brighter. The ones who know your value and your worth and remind you of it. The ones who help you bloom.

And have the courage to be a good friend to those who choose you.


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Nesta noite de eleições brasileiras, as imagens são pinturas de Tarsila do Amaral e vêm ao som de Choro N° 1 (Heitor Villa-Lobos) pelas mãos de Turibio Santos

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Nota: Obviamente ficaria angustiada, desgostosa e preocupada se ganhasse o troglodita do Bolsonaro. É um Trump em versão ainda mais abestalhada e ainda mais ignorantão. Uma calamidade para o Brasil e para a humanidade. Foi, pois, com alívio que vi que foi derrotado. Que não volte. Que não faça estragos nem alimente ódios agora que se foi.

Mas tenho que ser sincera: não fico especialmente feliz com a vitória de Lula. Acho que o Brasil mereceria melhor. Não percebo como um país tão grande, tão incrível e diverso como o Brasil não consegue melhor do que um Lula para se posicionar contra o obscurantismo populista, violento, grosseiro e perigoso de um Bolsonaro. 

Mas, enfim, é o que é. 

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Uma boa semana a começar já nesta segunda-feira
Saúde. Serenidade. Felicidade. Paz.

4 comentários:

Maria disse...

Olá UJM, que bons momentos relata , de satisfação, de anti stress no seu paraíso.
Que bom! Oxalá goze essa paz por muito tempo...
E os netinhos, já tão desembaraçados, é mesmo uma casa cheia ... Obrigada pelo seu relato maravilhoso!
Uma boa semana . Maria

Corvo Negro disse...

Olá UJM.
Duas dicas:
- As romãs (mesmo que não estejam bem rosadas) devem apanhar-se às primeiras chuvas, porque com a chuva abrem e apodrecem. Guardadas num local seco duram até ao Natal.
- As laranjas caem porque são picadas pela mosca da fruta, ficam amareladas mais cedo, com manchas, e caem. Armadilhas para a mosca da fruta desde o fim da floração até à colheita, não soluciona totalmente, mas ajuda a preservar algumas.
Tenha uma boa semana.

Um Jeito Manso disse...

Olá Maria,

Os meus netos estão a entrar naquela fase em que espigam... crescem a olhos vistos, de semana para semana estão maiores. Só um é que ainda é verdadeiramente menininho, o de cinco anos. Os outros upa-upa. Por enquanto só um é que está maior que eu (mas bem maior que eu) mas ela também já não falta muito e os dois que se seguem para lá caminham. E decididos, com gostos bem definidos, conhecimentos que me espantam.

Estar com eles é uma surpresa e uma alegria.

E com os meus filhos é o de sempre: tenham a idade que tiverem, são sempre os meus filhos queridos. Conheço-os muito bem, adivinho como estão pela voz, pelo semblante. Gosto de saber que estão bem. Falo com eles todos os dias.

E estar em casa, num ambiente tranquilo e em que há contacto com a natureza, é para mim um bálsamo.

Um bom feriado, Maria. E muito obrigada.

Um Jeito Manso disse...

Olá Corvo,

Pois! Tem razão! Hoje mais uma data delas já rachadas, já apanhei mais umas poucas e umas estavam moles por dentro. Amanhã vou apanhar o resto, acho eu. Não sabia que duravam tanto. Boa ideia se derem até ao Natal.

Vou ver se descubro onde arranjar essas armadilhas ou tratamento para as laranjas.

Obrigadíssima. Preciosas dicas!

Um bom feriado, Corvo.