Passei o dia in heaven. Silêncio total. Nem os cães do outro lado da estrada ou ao longe se fazem ouvir.
Poder teletrabalhar é daquelas coisas boas que aconteceu na minha vida. Vou às instalações da empresa sempre que é preciso e, quando não é, trabalho a partir de casa. Se isto tivesse sido opção em todos os anos que desperdicei enfiada no trânsito talvez a minha vida tivesse sido bem melhor.
Digo isto e, mal acabo de escrever, faço uma pausa. A questão é que não estou absolutamente certa disto. É certo que foram horas e horas perdidas mas é também certo que nos habituamos a tudo. Tinha a vantagem de ouvir boa rádio enquanto conduzia, tinha a vantagem de poder fazer compras e tratar do que tinha a tratar à hora de almoço. Agora eliminei muito desse tempo absurdo gasto no trânsito mas preenchi-o com trabalho. Agora, quando tenho que tratar de alguma coisa, quase me sinto culpada, parece que estou a baldar-me. E ganhei hábitos ainda mais arreigados do que os anteriores: ligam-me tarde e más horas ou enviam-me mails seja a que hora for e estou sempre disponível. Mesmo que não me apeteça, estou disponível. Um disparate.
Mas, dizia eu, passei o dia in heaven. À hora de almoço finalmente consegui ir tratar do que queria: apanhar orégãos. Um calor de ananases. Claro que o meu marido ficou todo arreliado, dizia que não era hora nem estava temperatura para isso.
Mas tinha que ser. Com este calor, os orégãos já estão a querer secar e, para ficarem bons e se aguentarem cheirosos e com sabor campestre durante todo o ano, têm que ser apanhados em flor, mas em flor perfumada e viçosa. Tal o calor que estava, vesti um fato de banho, apliquei protector solar 50 e fui à procura dos meus chapéus. Tinha dois, um dos quais um belo chapéu basco de abas muito largas e com uma fita encarnada que trouxe de Bayonne há alguns anos. Não os encontrei. Quando pintámos a casa, faz um ano, tivemos que retirar tudo o que estivesse à vista. Provavelmente escondi-os e agora não faço ideia onde. Ou isso ou a mulher do pintor que volta e meia lá ia e parecia não ser lá muito boa da cabeça achou que a ela é que eles ficavam bem (aliás, ficaram de ir acabar algumas coisas e nunca mais apareceram nem atenderam o telefone, nem a nós nem ao vizinho da ponta da rua que no-lo tinham recomendado).
Portanto, fui ao cabide dos bonés e escolhi um. Já agora, para poderem visualizar a cena, acrescento que nos pés usava uns chinelos de conforto, daqueles que as enfermeiras usam. Habitualmente uso-os em casa. Portanto, tudo a condizer. E foi, assim, naqueles preparos que avancei para o campo. Uma camponesa fora da caixa, digamos assim.
Um calor, um calor. Andava dobrada, na ceifa, a escolher as hastezinhas mais jeitosas, pezinho a pezinho, e a sentir a transpiração a descer do boné para a testa. Tive que ir lá acima umas três vezes não apenas para depositar os orégãos numa mesa como para tirar o boné, lavar a cara, beber água.
Por volta das seis e tal, a jornada profissional quase concluída, enverguei de novo o fantástico outfit com a diferença que agora fui descalça: fui regar as árvores da frente, dar uma arrumadela na casa e dispor os orégãos em cima de um lençol (lavado!) em cima da mesa para ficarem a secar.
E ainda voltei lá abaixo (calçada, claro) para apanhar mais um ramo deles para levar para a minha mãe. Seca-os também e creio que dá alguns aos meus tios e provavelmente também alguns às vizinhas e amigas. Mas este ano há poucos, apanhei muito menos que nos outros anos. Não sei porque será. Não encontro tomilho e os orégãos devem ser metade do ano passado. Só espero que não tendam a desparecer.
Quando lá voltar a ver se vou fazer nova monda pois creio que os que estão agora a secar não chegarão para nós e para distribuir.
Conclusão: chegámos aqui bastante tarde e ainda fomos dar uma volta com o urso peludo que tem estado meio abananado pelo calor.
Entretanto, iam chegando fotografias dos meus filhos. Do lado do meu filho, jantaram na praia e depois foram para o areal. Estava calor e lá é que devia estar-se bem. Do lado da minha filha, jantavam no terraço com vista para o rio. Talvez se fizesse sentir alguma aragem.
E foi isto.
Esta sexta-feira vai ser difícil. Vou ter umas reuniões complicadas, o tipo de reuniões que gostaria de evitar. As reuniões desta quinta serviram para as preparar. Há decisões que penso que ninguém gosta de tomar. Mas isto é como quando comprava peixe à posta no mercado. Se queria levar postas do meio, tinha que levar também um bocado do rabo e da cabeça, com mais espinhas. Isso era tanto mais assim quando se tratava do safio. Assim é a minha profissão: tem componentes aliciantes, desafiantes, tem outras compensadoras e depois tem estas, aborrecidas, enervantes.
E agora vou descansar. Amanhã respondo aos comentários. Hoje já não dá. Daqui a nada são três da matina e daqui a nada tenho que estar a pé e de cabeça fresca.
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E porque gosto muito de casas e de estar em casa e gosto do silêncio e da quietude, deixem que partilhe este vídeo
The Silence Of Rumah Fajar
Meaning “The House of Dawn” in Bahasa Indonesia, Ruham Fajar is located in Bali and designed by Studio Jencquel. Offering outstanding views of Gunung Agung, the Balinese most sacred volcano, the residence encompasses the local culture from the main door entrance to the materiality it has been chosen. Dive into this amazing project with the natural sound of Bali’s environment as its soundtrack.
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