Estive como se estivesse de férias. Choveu todo o santo dia, em especial de tarde. Pouco fiz. Tenho várias coisas para fazer esta semana mas a vontade é pouca. Vi o Dont't look up e vi a Emily in Paris. Estou anestesiada com a ligeireza em doses mais do que duplas.
Não sei porque é que as televisões insistem em dar palco a gente que não tem nada para dizer senão dizer mal. Gente assim é um veneno. E as televisões espalham veneno. Portanto, quanto menos se vê, melhor.
A meio da manhã fizemos a nossa caminhada à chuva, numa altura em que era apenas uma chuvinha. O urso peludo molhado e feliz. Gosto de levá-lo à trela. Vai de trela curta, alinhado, bem comportado. Quando ando assim com ele até crio a ilusão de que consigo controlá-lo e torná-lo bem comportado. O pior é quando tem aqueles picos de energia, especialmente em dias como os de hoje em que está maioritariamente dentro de casa, sem poder gastar energia. Mas, na caminhada, ia feliz embora pingando. Os jardins também pingando. Muitas casas têm decorações de natal no jardim. Mas as decorações de natal parecem tristes assim à chuva, nos dias escuros.
Esta pandemia é bem capaz de modificar a nossa maneira de ser. Se calhar acabaremos todos um bocado mais afastados uns dos outros. Mas não sei. Uma porcaria de um vírus, uma coiseca ruim, desalmada e descerebrada, dá conta da nossa vida.
O ar que respiramos é a fonte dos contágios. Espaços fechados são ratoeiras.
A civilização levou a que as empresas se concentrassem longe das zonas habitacionais, torres energeticamente eficientes, sem trocas de ar com o exterior para evitar que esfrie ou que aqueça e se gaste mais dinheiro a manter a temperatura ideal. Ratoeiras.
Claro que agora, com isto, algumas empresas, alguns espaços -- os mais conscientes, os mais endinheirados -- já adaptaram os seus sistemas de climatização, extraindo o ar respirado e injectando o ar do exterior. Mas basta que haja avarias ou que a manutenção não seja correcta para que o burro esteja nas couves.
Não iremos voltar à saudável vida no campo pois a agricultura de subsistência é mantimento para umas famílias, não para comunidades.
A vida nas cidades é cara, há muitos transportes a pagar, muita despesa a fazer, e toda a gente quer comprar tudo a baixo custo.
Em todo o lado as empresas, sejam de que ramo forem (excepto as que comercializam produtos de luxo ou as que se dedicam à ficção, às miragens, ou seja, aos unicórnios para enganar os pategos), defrontam-se com a impossibilidade de vender produtos ou serviços de qualidade pois quase ninguém os quer pagar, toda a gente quer saldos, borlas, fancaria. Podem ser produtos fabricados em lugares remotos em que se explora mão de obra infantil ou escrava, podem ser serviços em que se recorre a imigrantes que fazem qualquer coisa para sobreviverem ou a mão de obra desqualificada e precária. E não vale a pena apontar ao dedo ao vizinho do lado. Somos todos assim.
Foi para isto que caminhámos.
Não sei se há pandemia que nos volte a colocar nos eixos. Creio que não. Agora é este corona, outro dia há-de ser outra porcaria qualquer, depois são os vendavais, as chuvas diluvianas, as temperaturas avassaladoras, incêndios descontrolados.
Mas os humanos são mais burros que os mais descerebrados e invisíveis vírus: não aprendem nem por mais uma. Só se prendem com ninharias, só gostam de maledicência, são egoístas e parvos.
E vou mas é acabar de escrever pois até parece que estou apocalíptica, a anunciar o fim do mundo -- todos com um big calhau na tola.
Mas acho que não, isto é mesmo de ter estado o dia todo sem fazer nada, um dia escuro, sempre a chover. Tanta roupa que tenho para lavar. Mas lavar roupa com um tempo destes...? Como é que seca? E também me chateou que às quatro e tal da tarde já tive que acender a luz para conseguir ler, parecia quase de noite, um tempo da treta.
Agora lembro-me que se calhar também fiquei um bocado blue por ter visto no Emily in Paris um restaurante onde almocei há não tanto tempo quanto isso, um restaurante especial, e onde gostaria de voltar mas onde agora, com tudo isto que não se vê jeito de acabar tão cedo, não sei se voltarei.
Quando penso em Paria, agora penso em ir de carro, se calhar até com alguns dos meninos. Mas como metermo-nos a viajar com a porcaria do ar todo embruxado, tanta gente a bufar coronas pelas goelas e pelas ventas...? Gaita.
Bem. Passa das duas da matina. Vou-me deitar que esta segunda volta a ser dia de trabalho. As minhas short férias só duraram este domingo.
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